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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO EM 25 DE ABRIL DE 1864

PRESIDÊNCIA DO EXMO. SR. CONDE DE CASTRO

VICE PRESIDENTE

Secretarios, os dignos pares

Conde de Peniche

Conde de Mello

(Assistem os srs. presidente do conselho, e ministros da guerra e da fazenda).

Pelas duas horas e meia da tarde, tendo se verificado a presença de 46 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente contra a qual não houve reclamação.

O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Deu conta de Um officio do ministerio do reino, participando que no dia 29 de abril corrente, pela uma hora da tarde, haverá recepção em grande gala no paço da Ajuda por ser o anniversario do authorga da carta constitucional.

ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO DO PROJECTO DE LEI ABOLINDO O MONOPÓLIO DO TABACO

O sr. S. J. de Carvalho: — Sr. presidente, sinto que me caiba a palavra em occasião em que não está presente o illustre ministro a quem respondo. Entendia mesmo que a discussão se devia adiar até s. ex.ª chegar, e proporia isto mesmo, se não fosse a consideração de que s. ex.ª proferiu já nesta camara as rasões justificativas do projecto que se discute.

Sr. presidente, sinto porém que o nobre ministro não esteja presente, porque V. ex.ª e a camara, comprehendem que, cabendo me a palavra depois de 8. ex.ª, é claro que o meu fim não póde ser outro senão responder ás considerações que s. ex.ª apresentou nas ultimas sessões.

Começou o illustre ministro o seu discurso na primeira sessão levantando a questão politica, e exaltando com ella os brios um pouco amortecidos da maioria que o acompanha. A emphase com que permittia confutar todos os calculos e argumentos apresentados pelo sr. conde d'Avila, correspondeu á vehemencia da apostrophe com que, dirigindo se á opposição, a accusava por mover, caso estranho, uma guerra politica ao actual gabinete, guerra cujos planos a minha ingenuidade atraiçoara, pondo os a descoberto com as preguntas que na ultima sessão dirigira a s. ex.ª permitta me o illustre ministro que eu acuda a este seu reparo, e que em testemunho da propria ingenuidade que s. ex.ª me reconheceu declare, que assim é, que assim foi, que tentei pôr a descoberto com as minhas preguntas a questão poética, mas que a não levantei, que a não podia levantar mesmo, que não tinha nem auctoridade nem poder para isso, porque as questões politicas não as cria o arbitrio da opposição. As questões politicas impõe-se por sI mesmas como taes, vêem com as circumstancias que as determinam, não ha manejo da opposição que as possa crear, mas tambem não ha evasiva do governo, nem tatica da propria maioria que as possa evitar.

E a questão actual é uma questão politica, nem póde deixar de o ser, porque é uma questão de confiança, e n'esse campo a colocou o illustre ministro no principio do seu discurso, quando apresentou a sua convicção como garantia unica da verdade dos seus calculos. Mas as questões politicas conduzem-nos a conflictos que esta camara não póde levantar, exclama o illustre ministro. Perdoe-me porém s. ex.ª, em nome d'este falso principio ser-nos ía negada a apreciação de todos os actos do governo. As questões politicas são tão consentaneas com a indole dos poderes publicos como as questões litterarias e como as questões scientificas o são com a indole das academias e dos corpos scientificos. «Não levante a camara conflictos»! Conflictos com quem? Com o governo? Para os evitar seria necessario transigir sempre com as suas idéas. Com a outra casa do parlamento? Para os previnir seria necessario que em vez de camara nos convertêssemos em mesa chancella dos actos da outra casa do parlamento. Mas o governo não vive só com o voto e com a opinião da camara dos srs. deputados; vive com o apoio das duas casas do parlamento, com o concurso do voto de ambas, com a sua confiança. Quando a perde, demitte se, e quando se não demitte perdendo-a, quem provoca o conflicto é o governo que sáe fóra da esphera da acção que lhe marcam os principios constitucionaes (apoiados).

Por consequencia não tratemos de saber se a questão é politica ou se deixa de o ser, para que possamos aprecia-la devidamente; nem tão pouco se impressione a camara com a consideração de que a opposição a julga tal, por assim convir aos seus fins politicos.

A tactica empregada pela opposição seria n'este ponto tão legitima como aquella a que se soccorreu o illustre ministro quando exclamou: «Não se deixe surprehender a maioria pelos calculos do sr. conde d'Avila, não se impressione com as previsões atterradoras do digno par; o projecto actual não vae criar um desfalque na receita publica, ao contrario vae augmenta-la, é esta a minha segura convicção; tenho d'isso toda a certeza, ha todas as probabilidades de que assim succeda.» E n'esta certeza provavel estava a rasão da confiança que o illustre ministro queria impor á maioria que o acompanha, e n'essa confiança estava para nós opposição a questão politica.

Mas as questões politicas, disse eu já, impõe-se por si mesmas, e a questão que se debate, questão economica de gravissimo alcance, é pela sua propria importancia uma questão politica; e tanto o é que o governo fez d'ella questão ministerial.

N'este ponto receiando as consequencias de tal declaração, é que o illustre ministro tem por vezes insistido com asserções que não podemos deixar sem reparo.

Disse s. ex.ª que o governo não faz questão do meio porque se realise a transição; que o governo o que pretende é que passe o principio do projecto a que chama principio de liberdade. Mas pergunto eu a s. ex.ª, proclama o governo o principio da liberdade absoluta? Não; proclama a liberdade, mas a liberdade com restrições; logo essas restrições são o que constitue o pensamento do ministro, são as suas idéas, são o seu systema, traduzido e encarnado nas disposições do projecto. Rejeitadas ellas que fica? Modificadas essencialmente como o foram n'esta casa pelas commissões reunidas, onde está a coherencia de idéas e a firmeza de opinião do illustre ministro?

Mas a minha questão é o principio, exclama o illustre ministro; não póde ser, a questão para o governo não é que a camara vote o principio vago e abstracto da liberdade, a questão é o systema pelo qual o governo conciliando os interesses do fisco com a idéa de liberdade, restringe essa liberdade tanto quanto for necessario para garantir ao thesouro uma maior renda. Mas esse systema formula-se nas disposições do projecto rejeitadas. Mas morreu o systema, nada vale a idéa, nada vale o principio porque não póde ter applicação.

Foi por isso que eu na penultima sessão pedi ao illustre ministro explicações a tal respeito. S. ex.ª fingiu-se surprehendido com a minha pergunta, e sorrindo da minha ingenuidade, declarou á camara que eu acabara de revelar a tactica da guerra que a opposição movia ao actual gabinete. É um par novel, dizia s. ex.ª, que menos familiarizado com estas evoluções de tactica parlamentar, nos vem pôr a descuberto o plano do inimigo. Não convindo a s. ex.ª dar perante a camara as explicações que eu lhe pedia, illudiu as preguntas a que estava obrigado a responder, e com a tactica de velho parlamentar encontrou uma evasiva facil na diversão que procurou, contando á camara como é fecunda em bons resultados a ingenuidade dos pares novéis, segundo a qualificação de s. ex.ª, qualificação pela qual gradua a consideração que possam merecer a s. ex.ª as preguntas que lhe dirijam os membros d'esta camara. (Entrou o sr. ministro da fazenda.) Folgo de ver entrar na sala o sr. ministro da fazenda, velho parlamentar, em cuja fronte vejo hoje immurchecidas as coroas que conquistou, pugnando a favor das idéas que hoje combate.

Em 1854 dizia o illustre ministro, quando se discutia na outra casa do parlamento, a que s. ex.ª pertencia, a questão do contrato do tabaco, em referencia ao illustre deputado, o sr. Carlos Bento, que o illustre ministro em uma d'estas imagens pitorescas com que esmalta os seus discursos, punha encarapitado no edificio de Xabregas, o seguinte: «Direi ao illustre deputado, o sr. Carlos Bento, que se o estado tiver de estabelecer a régie, como é minha

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opinião que se deva vir a estabelecer, ha de montar uma fabrica roais barata e com melhores machinas.» Tudo mudou de 1854 para cá. Não só a régie se tornou um systema absurdo; mas a propria fabrica que era má passou a ser óptima, e já não é possivel estabelecer nenhuma em melhores condições. Já não ha melhores machinas do que as que a fabrica possue, e que são as mesmas de 1854, e porque as não ha melhores nem tão boas, expropriem se em nome da utilidade publica!

Não me surprehende a contradicção. São frequentes entre nós nos homens que têem largo tirocinio de vida publica. Nem é necessario justifica-las com a consideração de que entre uma e outra das opiniões oppostas passou o periodo de longos annos, que n'esse periodo se modificaram as circumstancias, e que segundo ellas se modificou a opinião. Taes considerações são inuteis perante os factos que hoje presenciamos. A instabilidade de opinião sobre um dado assumpto encontra-se, não só de anno para anno, mas de dia para dia. Hontem era absurda a régie, hoje é aceitavel. Hontem a arrematação era pessima, hoje pro-põe-se que se arremate de novo. Hontem era fatal o praso marcado para se estabelecer entre nós a liberdade do tabaco, hoje aceita-se a prorogação desse praso! E no meio d'esta instabilidade de opiniões, que muito era que eu perguntasse ao sr. ministro de que disposições do projecto fazia e. ex.ª questão ministerial! Mas s. ex.ª não respondeu, nem podia responder, nem sabia responder. Quem assegura a s. ex.ª que não seja obrigado a negar ámanhã a opinião que hoje sustenta? Por isso o unico expediente de que s. ex.ª podia lançar mão, foi aquelle de que se aproveitou. Não respondeu, e voltando-se para a maioria, exclamou: «Olhae, a opposição deseja saber em que ponto o governo colloca a questão politica, para dirigir sobre esse ponto os seus ataques». Este serviço tinha-o eu prestado ao governo, sem consciencia d'isso, e pagou-m'o o illustre ministro com aquelle sorriso de campaixão que aos capitães da expedição europea na Ásia mereceu ha poucos annos a ingenuidade do inimigo que tentava sobre elles uma sortida nocturna, levando accesas as lanternas nas pontas das lanças.

Sr. presidente, o illustre ministro não disse de que disposições do projecto fazia s. ex.ª questão ministerial; e como o havia de dizer, se todo o empenho de s. ex.ª foi o provar no seu discurso que nenhuma rasão tinha para aceitar as modificações e alterações que á proposta original do governo propozeram as commissões reunidas? A camara tem de certo presentes ao seu espirito as considerações com que o illustre ministro pretendeu provar que não havia rasão alguma para que o governo cedesse da sua opinião aceitando o pensamento das nossas commissões reunidas. Ora, se o sr. ministro tem, como se prova, por esse facto tão pouca consideração pelas disposições do projecto que discutimos, que muito é que lhes não dê a importancia de considerar questão politica a approvação dessas disposições! Ouçamos as considerações do illustre ministro e vejamos como ellas se oppõem ás que apresentou o illustre relator da commissão.

Disse o nobre relator da commissão que convertida em lei a proposta original do governo, se constituia na mão dos actuaes contratadores o monopolio de facto, monopolio de que de certo aufeririam avultadíssimos lucros; e que ao contrario, aceita a transição proposta pelas commissões, esses lucros reverteriam para o thesouro, porque o preço da nova arrematação havia da subir na proporção das vantagens da liquidação do monopolio. Que respondeu a isto o illustre ministro? Respondeu que não acreditava em taes lucros. Mas se não acreditava para que transigiu com a idéa de que taes lucros se davam? Se não acreditava em taes lucros para que vera declarar á camara que aceitava a substituição da commissão para que se não dissesse que pretendia proteger os interesses dos contratadores? Mas não basta dizer não acredito, é necessario dizer em que rasões se funda para não acreditar. As rasões apresentadas pela maioria da commissão era necessario oppor outras rasões. O illustre ministro argumenta nos com a sua convicção, mas não baeta isso. È necessario que nos diga em que rasões essa convicção se funda; e é isso o que o sr. ministro nos não tem dito.

Com referencia á receita que o estado deve cobrar pelos generos existentes no fim do actual contrato, diz o relatorio da commissão que essa receita se deve calcular em réis 1.500:000$000 a 1.600:000$000 réis; mas esse calculo declarou o illustre relator da commissão que era hypothetico, e o ministro que não combateu tal asserção no seio da commissão, vem declarar agora perante a camara que tem elementos seguros em que possa fundar os seus calculos; que sabe ao certo a importancia do tabaco em ser que existe no contrato, calculando essa importancia em 2.700:000 arráteis ou 1.239:300 kilogrammas.

Ora, se o illustre ministro da fazenda tinha esses dados, porque não os apresentou? Se tinha todos esses documentos que justificavam os seus calculos, porque não os submetteu ao exame da commissão? Se os tem n'esta conjunctura e não os tinha ha dias, como se diz que esta questão estava estudada? Como se póde assegurar isso quando ainda durante esta discussão estava s. ex.ª recebendo os esclarecimentos fornecidos por uma commissão que s. ex.ª nomeou depois de apresentada á consideração do parlamento a proposta original do governo? Se o illustre ministro julgava taes esclarecimentos indispensaveis para a discussão dá proposta que apresentou á camara, como os pode dispensar quando elaborou essa proposta? E de passagem direi, com referencia ao calculo do sr. ministro, com relação ao tabaco em ser, que tal calculo nada esclarece a discussão, quando mesmo seja rigorosamente exacto, como eu não creio que seja. É provavel que a quantidade desse tabaco suba a uma cifra maior do que aquella que o illustre ministro nos apresentou; mas quando mesmo não exceda ou quando lhe fosse inferior, não sei que desse facto se possa deduzir qualquer rasão a favor da proposta original do governo. O que é facto, cuja verdade taes calculos não destroem, é que os contratadores actuaes na justa previsão de que fosse convertida em lei a proposta original do governo, haviam trabalhado por tornar o mais importante que possivel fosse o monopolio de facto que a lei depunha nas suas mãos, e que para esse fim eram meios seguros os grandes depositos do tabaco e a grande manipulação d'elle, convertendo-o em generos de que o mercado se não poderia abastecer desde logo. 1

Mas, sr. presidente, voltando á importancia dos dados apresentados pelo illustre ministro, pergunto que fé nos podem elles merecer? Não ouviu a camara o illustre relator da commissão declarar já que taes calculos eram falsos; pois se o illustre relator da commissão os accusa de falsos...

O sr. Eugenio de Almeida: — Perdão, de inexactos. O Orador: — De inexactos, embora; para o argumento vale o mesmo, e se o illustre ministro modificou a sua opinião transigindo com a do digno par, não valem de certo mais as rasões do relator que as do ministro?

O sr. Eugenio de Almeida: — Eu disse que os calculos eram exagerados.

O Orador: — Bem, que sejam exagerados, importa ainda o mesmo para a questão.

Fallou ainda o illustre ministro na ementa; mas aceitará tambem b. ex.ª a ementa como base segura para os seus calculos? Não sabemos todos o que é a ementa? Eu tenho aqui presente e podia lêr á camara um mappa que prova bem o que é a ementa. Não o leio porque d'essa leitura nenhuma luz viria á discussão, lerei só uma nota para esclarecimento do texto, e essa vale alguma cousa (leu).

Quer dizer que a cada doença doa empregados escrivães da ementa corresponde uma lacuna nos documentos que elles nos podiam fornecer, e como esses empregados, ao que ouvi, de avançada idade nem sempre estão de saude, e já a velhice é doença, suceede que a lacuna que n'este mappa se dá com relação ao mez de junho, se póde dar repetidas vezes com detrimento da verdade dos calculos quando por todas as outras rasões devêssemos confiar n'elles.

Sr. presidente, a verdade é que não dispomos dos necessarios elementos para um estudo consciencioso da questão que se discute. Não argumento com a minha ignorancia, confesso-a, e não me envergonho d'ella; de homens cuja competencia se nos tornaria insuspeita ouviu a camara já a confissão sincera de que não conheciam a questão e votavam pelo inquerito. E esta confissão em nada deprime o seu merecimento; não sabem porque não podem saber, porque lhes faltam os elementos de estudo. Do que se tem passado lá fóra têem elles pleno conhecimento; sabemos todos como esta questão tem sido tratada na Europa, é até esta uma erudição facil, tantos são os elementos de que o espirito póde dispor para se illustrar; saíndo porém dos dominios da theoria e da historia, pratica do que se tem feito em outros paizes, entrados em Portugal, começa o reino das trevas que nenhum raio de luz dissipa. Estranha contradicção, mas frequente contradicção do nosso espirito. Inquirimos para não resolver, e resolvemos com pressa, com precipitação mesmo para não inquirir. Em Portugal um longo inquerito sobre qualquer questão significa adiamento indefinido d'essa questão. Inquire-se para não resolver; ao contrario quando se não deve resolver sem inquerir, resolve-se arriscada e precipitadamente só para tirar a rasão ao inquerito, e para dar por escusado o estudo!

Voltando porém á apreciação das considerações apresentadas pelo illustre ministro, continuo insistindo sobre a idéa de que s. ex.ª parece haver-se imposto a obrigação de confutar as razões com que a commissão justificava as alterações por ella feitas na proposta original do governo. Em vista d'isso não pareceria mais logico que o governo se recusasse a aceitar a substituição que a commissão lhe propoz, e que o governo sem rasão plausivel aceitou?

A unica rasão que foi apresentada pelo illustre ministro para a aceitação da substituição apresentada pela commissão (insisto em chamar lhe substituição porque este projecto que estamos discutindo em nada se parece com a proposta originaria do governo), foi a da não querer que no publico se suspeitasse que o governo insistia sobre a proposta primitiva para proteger os lucros exagerados que por ella se concediam aos actuaes contratadores. Estranha rasão, que nem eu, nem a camara podemos de certo aceitar. Esta rasão, repito, não se póde admittir, é necessario rebate-la com toda a energia; é uma proposição herética, que eu nunca quereria ver avançar nas casas do parlamento, e muito menos quando é um membro do gabinete quem a apresenta. Tal proposição é uma injuria feita á dignidade da camara e á dignidade do governo.

Pois os poderes publicos d'esta terra já se acham tão faltos de dignidade propria, tão pouco conscios dos seus deveres que se possam julgar assoberbados pelo monopolio do tabaco; que possam receiar a calumnia qualquer que seja o modo porque ella se apresente?

Pois se o sr. ministro da fazenda se julga hoje assoberbado pela influencia do contrato, não poderá ámanhã julgar-se assoberbado tambem pela influencia do banco, passado ámanhã pela influencia de qualquer companhia, depois ainda pela de qualquer poderoso argentario? Onde está, que a não sinto, a força de tal rasão, e o peso de tal argumento? A calumnia!... a calumnia despreze a, cumpra com o que todo o homem publico deve á consciencia do seu dever, e ao respeito pela sua propria consciencia.

Não começou o illustre ministro o seu discurso declarando que tinha visto sempre caír lhe aos pés a calumnia? Pois deixe a a seus pés e não a levante. O contrato assoberba os poderes publicos, morra o contrato!... Pelo amor de Deus, proposições destas não podem saír nunca d'aquelle logar. «Transigi com a commissão para que se não dissesse que transigia com os interesses do contrato,» Onde nos leva este principio de constante transacção com a calumnia? Não sabe o illustre ministro o que a respeito da arrematação dos bens de Arouca disse de s. ex.ª com toda a Bem rasão a imprensa? Com a maior será rasão, repito, porque devo á verdade e aos sentimentos do illustre ministro esta sincera homenagem de respeito.

Mas por este facto julgar-se-ia 8. ex.ª obrigado a não mandar proceder a novas arrematações?

E o que digo com relação aos bens de Arouca digo-o tambem com relação a outras accusações que se levantaram na imprensa, que são infundadas, e com que o espirito faccioso especulou; mas sobre as quaes deve recaír a indifferença dos homens publicos. Pois o governo póde porventura determinar os teus actos pela influencia da calumnia? Pois qualquer homem publico póde com dignidade transigir com tal influencia? E falla em - coragem o illustre ministro (apoiados); a verdadeira coragem está em obedecer apenas ao impulso da sua convicção e á consciencia doa seus deveres (apoiados). E depois d'esta declaração concluiu o illustre ministro dizendo, que o governo cumprira moral e politicamente o seu dever! Não o podia dizer. Não cumpriu nem moral nem politicamente o seu dever; não o cumpriu politicamente, porque deixou de sustentar as idéas que na outra casa do parlamento tinha defendido e sustentado com o concurso da maioria que o apoia; não cumpriu moralmente o seu dever, porque n'essa instabilidade de opinião, n'essa contradicção de idéas, n'essa incerteza de principios está a quebra do primeiro dever moral do homem publico que é o ter convicção e sustenta la com firmeza.

Continuando na apreciação das considerações apresentadas pelo illustre ministro, referir-me hei ao que r,. ex.ª disse com respeito á estipulação do minimo marcado pelo sr. conde d'Avila para a futura arrematação. O illustre ministro surprehendeu-se de que o digno par podesse apresentar o calculo que apresentou, e sobre essa. apresentação formulou um dilemma fatal. Ou a questão, dizia o illustre ministro, não está estudada, e n'esse caso não tendes os elementos para formar o vosso calculo, ou está estudada e não deveis votar pelo inquerito. O illustre ministro fingiu ignorar que póde haver, como ha, elementos para firmar o preço provavel da arrematação, sem que por esse facto te signifique que a questão do tabaco está convenientemente estudada em todas as suas relações. Com effeito o digno par o sr. conde d'Avila não necessitava do inquerito para poder fixar o minimo do preço pelo qual se devia effectuar a nova arrematação. Pois em quanto calculou o digno par esse minimo? Em 1.800:000$000 réis. Qual é o rendimento do actual contrato? É o de 1.748:000$000 réis, incluindo no preço da arrematação a importancia dos direitos recebidos nas alfandegas; logo, attenta a circumstancia do consumo crescente, o calculo do digno par não era exagerado, e era facil de fazer. Mas eu creio mesmo que o digno par podia ter ido mais longe, que podia ter elevado a mais de 1.800:000$000 réis o minimo do preço da nova arrematação, e para isso bastava apenas que aceitasse o principio estabelecido no relatorio da commissão, de que as vantagens da liquidação do monopolio deviam ter um preço real e importante na praça a favor do thesouro.

E porém notavel, sr. presidente, que o nobre ministro estranhasse que o sr. conde d'Avila tenha apresentado o minimo do preço da futura arrematação, não tendo para isso, na opinião de s. ex.ª, os dados necessarios, quando s. ex.ª diz que os tem, e que eu creio que os terá, têm toda a duvida em declarar perante a camara qual é esse minimo. Não comprehendo a rasão dessa hesitação, pois não seria esse um dado importante para a discussão? Creio que sim.

Combatendo o systema de arrematação, com que aliàs s. ex.ª transigiu, aceitando a substituição da commissão, disse s. ex.ª que = o regimen do monopolio pela arremação, era de todos os systemas o que promettia menos ao thesouro auferir uma maior receita =. Esta proposição está em diametral opposição com os factos que a historia economica dos paizes em que os diversos systemas se tem applicado, nos apresentam na questão.

Tomei nota da preposição apresentada por s. ex.ª, e conservo lhe até a redacção da phrase, porque o meu espirito hesitara em attribuir ao illustrado espirito de s. ex.ª um tal paradoxo. Pois o systema da liberdade não renderá muitissimo menos? Pois nos paizes onde vigora o systema da liberdade, não da liberdade que estabelece este projecto, mas da verdadeira liberdade, onde o tabaco entra no direito commum, não dará elle uma muito menor receita para o thesouro, do que nos paizes onde vigora o systema do monopolio? Pois a Dinamarca, pois a Belgica, a Hollanda a Russia ou o Zolwerein tiram do tabaco, nem absoluta, nem relativamente uma fonte de receita igual á que nós tiramos? O Zolwerein com a sua população de perto de trinta milhões de habitantes, tira apenas do rendimento do tabaco 1.300:000$000 réis, menos quasi uma terça parte do que nós auferimos com o systema do monopolio pela arrematação.

Em vista d'isto pois poderá o sr. ministro sustentar a sua proposição? Não é possivel. Houve de certo equivoco da parte de s. ex.ª

Outra rasão apresentada contra o systema de, monopolio pela arrematação foi a de que o nosso paiz era na Europa o unico onde esse systema se sustentava. Não comprehendi a força do argumento, mas sem que eu saiba o porquê, vi que tinha prendido por algum tempo a attenção de s. ex.ª, tirando d'elle conclusões que me pareceu prestarem um fraco auxilio á argumentação de s. ex.ª Pois o que s. ex.ª disse com relação á arrematação não se poderá dizer tambem com relação ao systema inglez que s. ex.ª copiou?

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«O systema da arrematação é mau porque somos o unico povo na Europa que hoje o tem adoptado.» Porque se não na de dizer o mesmo do systema inglez? Pois encontra-se elle em algum outro paiz? Não colhe este argumento contra o proprio systema, cuja apologia o illustre ministro tentou? De facto taes argumentos nada valem, nem significam. Um systema qualquer de administração vale pelo que é, e não pelo numero de adeptos que esse systema tem conquistado. A Inglaterra tem o seu systema de administração de tabaco, nenhum paiz lh'o tem copiado, e nem por isso poderá deixar de ser o melhor. Em politica a auctoridade dos exemplos estranhos nem sempre colhe, porque não há principios absolutos. O que aqui é bom póde ser mau em qualquer outro paiz, e o que lá for optimo póde ser péssimo aqui.

O illustre ministro, com a intimativa de uma profunda convicção declarou com orgulho á camara que tinha dado um golpe certeiro e mortal no monopolio. Perdoe-me s.ex.ª, mas condoeu-me a sua illusão. N'este ponto faz me s. ex.ª lembrar aquelle heroe da epopéa grega, que trazia na propria lança com que feria o inimigo, o remedio para lhe cicatrizar as feridas! S. ex.ª póde ter despedido um golpe de força no seu inimigo fidagal; mas o facto é que depois d'elle receber o golpe levanta a cabeça e mostra mais vida e força do que a que tinha antes de mal ferido. O monopolio não morreu; o monopoho vive, vive na proposta original do ministro, e vivirá ainda votada a substituição das commissões.

E quer a camara uma prova segura de que lhe deu nova força e vigor o golpe mortal do illustre ministro? Ouça a representação dos monopolistas, veja como elles abençoam a mão que pretendia esmaga-los.

Eu vou lêr parte d'essa representação (leu). Por isso se vê que a proposta original do ministro, proposta que na opinião de s: ex.ª era a arma com que despedia o golpe fatal sobre os contratadores, os protegia tanto nos seus interesses que votam por ella com euthusiasmo, e que representam perante os poderes publicos a favor d'ella,

Movido por estas idéas é que eu na primeira sessão, quando me coube a honra de abrir o debate, insisti sobre a conveniencia do adiamento, até que os poderes publicos estivessem devidamente instruidos pelo inquerito que eu propunha. Essa minha proposta feita, com toda a sincera intenção, de que n'esta questão se lançasse a luz, que por ora a não esclarece, foi mal recebida pelo governo, e s. ex.ª o nobre ministro da fazenda declarou que ella não significava mais do que um expediente da opposição, que pão se atrevia a combater, frente a frente, a idéa do projecto protegida pela áurea de uma grande popularidade.

S. ex.ª não foi um rigoroso apreciador do pensamento que determinou a minha proposta. Eu propunha a nomeação de uma commissão de inquerito, não como expediente de opposição, mas porque mais de um facto me tinha mostrado evidentemente que os poderes do estado não estavam habilitados para resolver esta questão.

Citei em abono d'esta minha asserção a instabilidade das opiniões da commissão de fazenda, que se pronunciou ha seis mezes a favor da arrematação, e passados esses seis mezes a favor da liberdade; mas mais ainda, citei a instabilidade de opinião do sr. ministro da fazenda, que na camara dos srs. deputados sustentou um projecto absolutamente differente daquelle com que poucos dias depois se conformava no seio das commissões reunidas.

Votando pois pelo inquerito adduzi a meu favor todas estas circumstancias, que me parece provam sobejamente que não ha elementos seguros para resolver esta questão. Esta minha opinião não é tão absurda que não tenha sido apoiada por homens cuja competencia é insuspeita, nem a doutrina da minha proposta é tão singular que não tenha sido aceite em circumstancias analogas em outros parlamentos cuja auctoridade em mais de uma occasião vejo citar. Em 1835 a Fiança, que dispunha como elementos de estudo dos dados insuspeitos fornecidos pela régie, viu sem assombro propor e aceitar o inquerito parlamentar de que aliàs tirou grandes resultados. A redacção da minha proposta é quasi a mesma redacção da que então votou o parlamento, como a camara conheceria da leitura que d'essa proposta em uma das passadas sessões fez o digno par, o sr. conde d'Avila. Estranho pois que tal proposta seja combatida, e muito mais que o seja com as rasões que contra ella produziu o illustre ministro.

Sr. presidente, disse eu ha pouco que o projecto original do governo tinha soffrido modificações importantes, e que essencialmente alteravam o calculo com que o governo abonava a medida que propunha; permitta-me a camara que èu insista sobre este ponto tanto quanto o pede a clareza da demonstração. Segundo o relatorio do ministro o saldo, a favor do thesouro, adoptado o systema de liberdade é de 200:000$000 réis, cifra redonda. Para chegar a esse resultado o illustre ministro calculou sobre uma dada importação e importancia do imposto, variavel, segundo as diversas condições do tabaco importado, logo a qualquer modificação no imposto que o ministro propõe corresponde Uma alteração no calculo que s. ex.ª formou. Vejamos pois as condições da proposta e as alterações que essas condições soffreram.

Uma d'essas condições era que o tabaco em rolo pagasse 1$200 réis por kilogramma; mas as commissões da camara dos senhores deputados reduziram esse imposto a 1$000 réis; logo a differença de 200 réis dá no calculo do sr. ministro a subtracção de 72:277$600 réis, que em tanto importam 200 réis multiplicados por 381:888 kilogrammas (em que o sr. ministro calculava a importação do tabaco em rolo.

E cabe aqui notar que não colhe o argumento produzido por s. ex.ª na passada sessão, de que a diminuição do imposto não traz comsigo diminuição de rendimento na alfandega, porque o consumo tambem augmenta. E verdade que póde augmentar e que deve augmentar, mas não é crivei que augmente na proporção necessaria para que dê uma receita superior ou igual á que o sr. ministro calcula no seu relatorio. Diminuindo o imposto o consumo deve crescer, mas a receita tambem deve diminuir (apoiados).

Apresentado n'esta camara o projecto original do governo foi remettido ás commissões que o reformaram essencialmente, provando essas alterações aceitas pelo governo a instabilidade da sua opinião sobre tão importante assumpto.

A primeira d'essas alterações foi a do praso, dentro do qual se decretou a liberdade do tabaco. Essa alteração é com effeito importante, porque proclamar a applicação de um principio não é adiar essa applicação. O illustre ministro declarou essa questão pequena. Não concordo com s. ex.ª se a prorogação do praso não influe na applicação do principio que o illustre ministro propõe, é tambem indifferente para s. ex.ª que esse praso seja maior ou menor (apoiados).

; Mas se o principio do projecto não está prejudicado pelo adiamento de alguns mezes, porque não aceita s. ex.ª a minha proposta, prorogando, tanto quanto seja necessario, o praso, dentro do qual se ha de fazer o inquerito para os poderes publicos se habilitarem a formar uma opinião segura sobre o assumpto?! (Apoiados.)

Ou a modificação do praso proposto vale alguma cousa ou não vale nada; se vale alguma cousa, prejudica a, idéa do governo, e o illustre ministro não devia te-la aceitado; se não vale nada, tambem s. ex.ª não póde nem deve combater a minha proposta de adiamento. Escolha s. ex.ª d'este dilemma a proposição que lhe for mais favoravel; mas supponha que nenhuma o póde ser para a sua argumentação.

A segunda modificação, proposta pelas commissões e aceita pelo governo, foi a de reducção no imposto dos charutos. Essa reducção é importante, porque a proposta do governo traz o imposto de 2$800 réis por kilogramma, e as commissões reunidas reduziram esse imposto a 2$000 réis; calculando s. ex.ª a importação dos charutos em 100:000 kilogrammas, a differença pela modificação feita nas commissões reunidas é de 80:000$000 réis, que se hão de subtrair no saldo a favor do thesouro, saldo que apparece nos calculos do sr. ministro, e que com pesar vemos convertido em deficit.

A terceira d'essas modificações foi a de aceitar a régie, caso a nova arrematação não desse uma somma superior ao minimo marcado pelo governo. Ora sr. presidente, eis-aqui a régie aceita pelo illustre ministro, a régie contra a qual s. ex.ª protestou em frases de tão energica eloquencia, a régie que s. ex.ª não queria, a régie contra a qual se levantou na outra casa do parlamento, e contra a qual se pronunciou no seio da commissão. Se a todas, estas alterações accrescentarmos as novas disposições contidas no projecto que discutimos, e que se não encontravam na proposta original do governo, podemos affoutamente avançar a idéa de que o pensamento do governo em relação á questão sujeita tem soffrido uma completa, modificação, e que o auctor da proposta que discutimos não é já o illustre ministro, mas as commissões, embora seja s. ex.ª o editor responsavel da obra que por longanimidade do seu espirito perfilhou como sua.

Vejo que o sr. ministro acaba de sair da sala; por isso esperarei que s. ex.ª entre de novo para apresentar a s. ex.ª, como synthese do que acabo de expor o calculo sobre o resultado provavel do projecto que discutimos, approvadas as suas disposições.

De todos os factos e argumentos a que me tenho referido; deduzirá a camara como legitimo corrollario primeiro que está provado a instabilidade da opinião do governo, em segundo -logar que está provada a necessidade de que se proceda a um inquerito rigoroso sobre o assumpto; por isso que a instabilidade de opiniões de poderes publicos resulta de se não conhecer a questão que se pretende resolver. O inquerito não está só justificado pelas circumstancias, está tambem aconselhado pelos precedentes. Procedeu-se a um inquerito sobre a questão doa arrozaes, aconselha se o inquerito sobre a questão do Douro, temos procedido a maia de um inquerito para solução de questões, relativamente de muito menor importancia de que este que discutimos; porque havemos apenas de prescindir do inquerito n'esta questão? Receiamos a luz quando tudo são trevas, e quando desejámos vê-las dissipadas? Argmentem-se contra o inquerito porque é um adiamento, tanto vai recommendar a precipitação. Provem primeiro que o inquerito não é necessario. Não vejo porém, que isso se tenha provado.

(Entrou o sr. ministro da fazenda.)

O Orador: — Aproveito a presença do illustre ministro para apresentar a a. ex.ª os calculos que formei, segundo as reducções propostas pelas differentes commissões da outra casa do parlamento, com relação aos direitos que o illustre ministro apresentava na sua proposta originaria (leu).

Por este meu calculo, o saldo de 209:000$000 réis que figurava no relatorio do sr. ministro como saldo a favor do thesouro, converte-se em um deficit de 147:000$000 réis cifra redonda. Mas esse deficit é ainda maior se não aceitar mos como base de calculo os dados offerecidos pelo illustre ministro e que são evidentemente exagerados. S. ex.ª calcula por exemplo em 1.468:800 kilogrammas a importação do tabaco, e em anno nenhum a importação se elevou a essa cifra. A media dos ultimos cinco annos dá apenas 1.234:648 kilogrammas. A previsão pois do sr. conde d'Avila, ainda que aterradora, é justa. Se ao deficit que os calculos rigorosos apresentam para a diminuição de receita que necessariamente ha de provir de uma fiscalisação evidentemente muito mais franca, e muito mais difficil de exercer do que a fiscalisação actual, temos muito provavelmente um deficit com as proporções assustadoras que lhe marcou o sr. conde d'Avila.

Quem ha de cobrir esse deficit? Não será a propriedade como o illustre ministro affirmou para tranquillisar os animos dos proprietarios? Logo o veremos, se vale a pena de insistir sobre este ponto que me parece já bem expresso na disposição da lei com relação aos Açores.

Em vista d'estas rasões pergunto ainda não será conveniente o inquerito? Porque se aconselha a precipitação em uma questão de tão grande importancia como esta que se discute? Não valerá a pena considerar devidamente uma fonte de receita superior á verba calculada no orçamento para o rendimento da contribuição predial? Aceitaria o illustre ministro qualquer reforma na nossa legislação tributaria pela qual o thesouro se arriscasse a perder o que mui provavelmente perde, convertido em lei o projecto que se discute? (Apoiadas.) E será opportuna a occasião para tentar uma reforma d'esta ordem.

Oh! sr. presidente, pois quando por parte do governo se declare como já n'esta sessão tem por vezes declarado que por falta de meios se não tentam as reformas administrativas que urge apresentar, é que nos arriscamos por uma reforma imprudente a comprometter seriamente os interesses do thesouro! Lembremo-nos que lutamos com um deficit enorme, e que esse deficit tem necessariamente de ser aggravado emquanto tratamos de preparar a nossa regeneração economica, porque se o orçamento do estado não tem dotação para os melhoramentos materiaes, havemos de pedi los ao credito.

Esse deficit ha de desapparecer quando recebermos o juro do dinheiro que ultimamente temos empregado na viação accelerada e na viação ordinaria, que estamos lançando á terra; mas emquanto se não derem essas circumstancias devemos ter toda a prudencia e não tentar sem grande confiança no seu resultado, reforma como esta que o governo propõe. O paiz nada perdia em que a questão que durante trinta annos de regimen constitucional se não resolvera, se resolvesse passado mais algum tempo depois de se haverem colhido todos os elementos de estudo necessarios para a resolver convenientemente. Quando somos obrigados a aggravar o imposto, devemos ser previdentes e velar rigorosamente os interesses do thesouro, não nos arriscando em emprezas temerárias. O illustre ministro que tem tanta lição do que se passa nos outros paizes, sabe perfeitamente que a Inglaterra não tem tentado a reforma em artigos importantes da sua pauta, senão quando um excesso da receio lhe dá a certeza de não comprometter com o resultado d'essas reformas o estado das suas finanças. Siga, o illustre ministro n'este ponto os conselhos salutares que. a lição pratica do que se tem passado em outros paizes lhe aconselha a seguir.

Reforme, mas conhecendo bem as condições da reforma, as circumstancias em que a tenta, e os elementos seguros em que se possa firmar calculando o seu resultado (apoiados).

Sr. presidente, limito aqui as minhas observações receiando abusar da benevolencia com que a camara me tem escutado. Expuz á camara a minha opinião sobre a questão que se debate, não tem ella de certo o peso de auctoridade para influir sobre o espirito da camara, mas tem por si a verdade das rasões em que se funda e que eu por ora não vi destruidas. Não me inspira o desejo de verificar o interesse da questão economica á consideração da conveniencia politica.

Não voto a favor da generalidade do projecto que se discute porque não julgo convenientemente estudada a questão que se pretende resolver. Oxalá que o futuro não justifique as nossas previsões!

O illustre ministro declarou hontem que o governo que se não arriscava a estes commettimentos não tentava nenhuma reforma.

Perdoe-me porém s. ex.ª, mas não concordo com a sua opinião. As reformas não se tentam a capricho, o governo reformador não é o que reforma mais, mas o que reforma melhor. A administração publica de qualquer paiz, deve caminhar no sentido do progresso e sob a influencia benefica e salutar das suas idéas, mas deve caminhar com prudencia. Eu não quero que o governo pare, o governo do estado não está symbolisavel no deus Termo da mythologia; anda, mas não salta, não vive amarrado á rotina, mas tambem não tenta vôos imprudentes animado pelo estro da utopia. O commettimento póde ser ousado; era-o para qualquer ministro, muito mais para s. ex.ª, de todos o menos habilitado para arriscar uma tal reforma.

Não digo isto porque não tenha na devida consideração as suas qualidades de homem d'estado; mas digo-o porque o ministro que era dois annos, sob a sua administração, viu elevar a divida publica n'uma somma superior a 34.000:000$000 réis, não me parece que seja é mais protegido pelas circumstancias para tentar uma reforma que póde trazer, que é provavel que traga, á receita publica um grande desfalque (muitos apoiados).

Ponho ponto nas minhas observações, reservando-me o direito de significar a minha opinião quando se tratar da discussão do projecto na especialidade. Apresentarei então as rasões justificativas do meu voto.

O sr. Xavier da Silva: — Peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida, porque ainda quando estejam inscriptos alguns doa oradores têem occasião de usar da palavra na discussão da especialidade.

A camara julgou a materia discutida.

O sr. Presidente: — Vae ler-se a proposta de adiamento do sr. Sebastião José de Carvalho.

O sr. secretario leu a.

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- O sr. S. J. de Carvalho: - Requeiro que seja nominal a votação sobre a minha proposta.

Assim se; decidiu.

O sr. Presidente: — Vae fazer-se a chamada sobre a proposta de adiamento do sr. Sebastião José de Carvalho.

- Disseram. approvo os dignos pares: Marquezes, de Alvito, de Fronteira, de Niza e de Vallada; Condes, das Alcaçovas, de Alva, d'Avila, de Azinhaga, de Fonte Nova, da. Louzã, de Paraty, da Ponte, de Rezende, de Sampaio, de Samodães, de Sobral e de Thomar; Viscondes, de Benagazil, de Fonte Arcada e de Ovar; Barões, de Ancede, das Larangeiras e de S. Pedro; Luiz de Seabra, Pereira Coutinho, Barreto Ferraz, Osorio e Sousa, Aguiar, Rebello da Silva; Fonseca Magalhães, Vaz Preto, Brito do Rio, Sebastião José de Carvalho; Condes, de Mello e de Peniche.

Disseram rejeito os dignos pares: Duques, de Loulé é de Palmella; Marquez de Sabugosa; Condes, de Farrobo, de Linhares, da Ponte de Santa Maria e de Rio Maior; Viscondes, de Santo Antonio, da Borralha; de Condeixa, de Fornos, da Vargem da Ordem e de Soares Franco; Barão de Foscoa; Mello e Carvalho, Moraes Carvalho, Mello e Saldanha, Xavier da Silva, Bazilio Cabral, Caula Leitão, Rebello de Carvalho, Sequeira Pinto, Felix Pereira, Silva Ferrão, Faustino da Gama, Simões Margiochi, Moraes Pessanha, Costa Carvalho, Filippe de Soure, Ferreira Pestana, Braamcamp, Silva Cabral, Silva Costa, Pinto Basto, Ferreira Passos, Reis e Vasconcellos, Izidoro Guedes, Lourenço da Luz, Eugenio de Almeida, Baldy, Baião Matoso, Julio Gomes, Castro Guimarães, Vellez Caldeira, Miguel Osorio, Canto e Castro, Menezes Pita, Almeida e Brito, Vicente Ferrer; e Conde de Castro.

Ficando a proposta do digno par Sebastião José de Carvalho rejeitada por 51 votos - contra 35.

O sr. Presidente: — Vae votar-se a generalidade do projecto.

Disseram, approvo os dignos pares os srs.: Duques, de Loulé, e de Palmella; Marquez de Sabugosa; Condes, de Farrobo, de Linhares, da Ponte de Santa Maria, e de. Rio Maior; Viscondes, de Santo Antonio, de Condeixa, de Fornos, da Vargem da Ordem, e de Soares Franco; Barão de Foscoa; Mello e Carvalho, Moraes Carvalho Mello e Saldanha, Xavier da Silva, Bazilio Cabral, Caula Leitão, Rebello de Carvalho, Sequeira Pinto, Felix Pereira, Silva Ferrão, Faustino da Gama, Moraes Pessanha, Costa Carvalho, Silva Carvalho, Filippe de Soure, Ferreira Pestana, Braamcamp, Silva Cabral, Silva Costa, Ferreira Passos, Lourenço da Luz, Pinto Bastos, Eugenio de Almeida, Baldy, Baião Matoso, Julio Gomes, Castro Guimarães, Vellez Caldeira, Miguel Osorio, Miguel do Canto, Menezes Pitta, Almeida e Brito, Vicente Ferrer, e Conde de Castro.

Disseram rejeito os dignos pares os srs.: Marquezes, de Alvito, de Fronteira, de Niza, e de Vallada; Condes, das Alcaçovas, de Alva, d'Avila, de Fonte Nova, da Louzã, de Paraty, da Ponte, de Rezende, de Sampaio, de Samodães, do Sobral, e de Thomar, e de Azinhaga; Viscondes, de Benagazil, da Borralha, de Fonte Arcada, e de Ovar; Barões, de Ancede, das Larangeiras, de S. Pedro; Luiz de Seabra, Pereira Coutinho, Barreto Ferraz, Simões Margiochi, Osorio e Sousa, Aguiar, Reis e Vasconcellos, Izidoro Guedes, Rebello da Silva, Fonseca Magalhães, Vaz Preto, Brito do Rio, Sebastião de Carvalho, Conde de Mello e Conde Peniche.

Ficando approvada a generalidade do projecto por 48 votos contra 38.

O sr. Presidente: —Vae passar-se á especialidade do projecto.

(Vários dignos pares pediram a palavra.) O sr. Secretario: — Leu o artigo 1.° O sr. Presidente: — Tem a palavra sobre a ordem o sr. conde de Samodães.

O sr. Conde de Samodães (sobre a ordem): — Sr. presidente, pedi a palavra sobre a ordem, para mandar para a mesa uma proposta tendente a regular o methodo que entendo, roais conveniente que se deve seguir na discussão da especialidade d'este projecto.

Sr. presidente, o artigo 1.° contém duas partes: a primeira. parte estatuo que fique abolido o monopolio do tabaco; na segunda parte determina a epocha em que essa abolição começa a vigorar. Ora, este artigo está intimamente ligado com outros artigos d'este projecto que alteram essencialmente, em pontos importantes, o projecto que veiu da camara dos srs. deputados. Esses artigos que alteram o projecto fazem uma parte integrante d'elle, porque contêem disposições que dizem respeito á epocha em que» deve começada vigorar o principio da liberdade de fabrico e venda do tabaco, por consequencia não é possivel separar um artigo dos outros sem que o systema que este projecto teve em vista, e que por certo teve presente a commissão, desappareça -completamente.

Com effeito, er. presidente, se nós votarmos que a liberdade de fabrico e da venda do tabaco comece a vigorar em 1 de janeiro de 1865 em diante, sem que ao mesmo tempo votemos as disposições necessarias para se fazer a transicção, não sei como seja possivel realisar o pensamento que se tem em vista com este projecto (apoiados).

Sr. presidente, para se fazer a transição, a illustre commissão tem em vista tres differentes disposições: a primeira, é a prorogação do actual contrato por mais dois mezes, de maio a junho; a segunda, é uma nova arrematação por seis mezes, na qual se tenha em vista as disposições, da liberdade do commercio depois de 1 de janeiro em diante a terceira é o modo como essa arrematação se ha de verificar, de maneira que o futuro contrato de seis mezes não se veja em embaraços.

Aqui ha um systema completo que não se póde de fórma nenhuma separar (apoiados). Votada uma parte, infallivelmente hão de o ser as outras. A camara póde, sem duvida, votar hoje a liberdade do commercio do fabrico e da venda do tabaco desde 1 de maio em diante, mas se votar que este systema ha de sómente vigorar de 1 de janeiro de 1865 em diante, necessariamente ha de approvar os artigos que estabelecem é methodo pelo qual se ha fazer a transição (apoiados). Por consequencia, para simplificar a discussão, para a tornar mais facil, para se poder comprehender no debate as differentes disposições d'este systema que foi ideado pelas commissões, e que não vinha na proposta originaria do governo nem no projecto da camara dos senhores deputados, torna-se necessario que a discussão abranja todos estes pontos. Eu não sei se a commissão concordará com este systema, estimaria que o seu relator se pronunciasse a este respeito (O sr. Soure: — Peço a palavra.); mas parece-me que tudo quanto for saír d'este systema que eu indico, ha de necessariamente trazer confusão na discussão (apoiados).

Portanto, sr. presidente, eu tenho a honra de mandar para a mesa uma proposta para que, conjunctamente com o artigo 1.° do projecto, se discutam todos áquelles que têem relação com o modo de fazer a transição desde o artigo 13.° até ao artigo 19.°, isto é, que os artigos que estatuem a prorogação do actual contrato e a nova arrematação, a expropriação por utilidade publica da fabrica de Xabregas, a venda dos tabacos, alem dos que têem direito de receber, por 20 por cento do seu valor, no caso que sejam necessarios para o futuro contrato, vem a ser por consequencia os artigos L°, 13.° até 19.º inclusivè; portanto mando para a mesa a minha proposta.

«Proponho que (conjunctamente com o artigo 1.°) se discutam os artigos 13.° a 19.° sendo estes votados primeiro. = Conde de Samodães.»

O sr. Presidente do Conselho (Duque de Loulé): — Peço a palavra.

O sr. Marquez de Niza: — Peço a palavra sobre a ordem.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. presidente do conselho.

O sr. Presidente do Conselho: — Não sei se V. ex.ª quer mandar lêr a proposta do sr. conde de Samodães, pois é sobre ella que eu desejo fallar.

O sr. Presidente: — Vae ler-se a proposta do sr. conde de Samodães.

O sr. Secretario:.— Leu.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que admittem á discussão a proposta do digno par o sr. conde de Samodães tenham a bondade de se levantar. Foi admittida.

O sr. Presidente do Conselho: — Disse que pedíra a palavra por lhe parecer que a proposta do digno par o sr. conde de Samodães é contraria a todas as praxes parlamentares, não só n'esta camara, mas em todos os parlamentos. A proposta de s. ex.ª tendo na opinião do chefe do ministerio a nada menos que a prender o voto dos dignos pares, porque haverá membros da camara que votem por uns artigos e rejeitem outros.

O orador tem visto muitas vezes dividir o mesmo artigo quando elle contém diversas sentenças para que o voto seja livre, mas accumular na mesma votação differentes artigos que contém materias diversas é a primeira vez que tal vê em parlamentos. E contra esta doutrina que se levanta para oppor-se a ella, e declarar que vota contra a proposta em que ella se contém.

O sr. Filippe de Soure: — Sr. presidente, eu não sei se a proposta do digno par, o sr. conde de Samodães, é muito regimental, desconfio que o não é; mas o que me parece, não por parte da commissão, porque não estou para isso auctorisado, e era difficil reunir os vinte e dois membros, que tantos foram os que assignaram o parecer para discutirem agora, e pronunciarem-se sobre este incidente que eu reputo grave (apoiados); o que me parece, digo, é que se de alguma maneira V. ex.ª poder fazer com que, sem se offender o regimento, á idéa apresentada pelo digno par, que eu ignorava que viria á discussão, possa ser votada pela camara de modo que se associem os dois pensamentos de qualquer fórma que seja, eu entendo que V. ex.ª fará um bom serviço (apoiados), ou seja por quesitos, ou seja por outros quaesquer termos tenho para mim que as duas idéas que são tão ligadas que se não podem separar (muitos apoiados). Foi, e é ainda a minha opinião de que para pouco servia marcar o praso depois do qual ha de principiar a haver a liberdade do tabaco, sem ao mesmo tempo se empregarem os meios necessarios (apoiados) de todos ficarem em igualdade de circumstancias, a fim de que a concorrencia possa estabelecer-se (apoiados). É este o ponto do qual não prescindo pela parte que me toca; a commissão póde pensar de outro modo, mas eu não posso deixar de declarar que no conjuncto de medidas que adoptou fórma um, systema que não póde ser alterado sem caír o seu pensamento (muitos apoiados). Embora juntem-se os artigos, ou não se juntem, V. ex.ª tem na sua mão o fazer dependente a idéa que se chama essencial d'aquella que se chama secundaria; eu devo dizer que a secundaria é o complemento da primeira, o principal do pensamento da commissão (muitos apoiados). A commissão não podia de maneira alguma formar um systema, ter este sido aceite pelo governo para depois o ver sophismado sem protestar contra isto.

Eu digo por esta occasião que me coube a honra de secundar amigos meus na commissão para fazer triumphar a modificação que o governo aceitou, e disse que adoptava (muitos apoiados). Assim eu faltaria ao meu dever nesta occasião com todas as minhas forças não propugnasse pela, execução franca e completa d'aquelle pensamento, que é indivisível (apoiados), que não póde nem deve por fórma, alguma admittir separações (apoiados). E perdôe-me o digno par que fez a proposta; é preciso completa-la. (O sr.

Marquez de Niza: — Apoiado). É desde o artigo 13.° até ao 26.° conforme a commissão expende. no seu relatorio (muitos apoiados). Ahi é que está determinado tudo que é necessario para levar á execução com acerto o pensamento da commissão em que ficou de accordo o governo. Vozes: — Muito bem.

O sr. Ministro da Fazenda (Lobo d'Avila) (sobre a ordem por parte do governo): — A idéa que emittiu o nobre presidente do conselho não foi de que se não podesse discutir cumulativamente a doutrina do artigo 1.° com a dos artigos 13.° e seguintes até 26.° Não ha duvida de que se póde discutir por grupos de artigos; na outra camara tambem se procedeu assim, reconhecendo-se que não havia n'isso inconveniente, mas não se deve alterar a ordem natural da votação, porque de contrario parece que ha algum estratagema.

(Susurro, e alguns dignos pares pedem a palavra sobre a ordem.)

Peço desculpa se a expressão não foi bem aceita, mas eu não me servi deste termo para querer fazer applicação a alguem; não digo mesmo que haja estratagema, digo que póde parecer (riso), e isto não priva de se acreditar que a idéa que se teve em vista foi com o fim de procurar a melhor ordem para a discussão (apoiados). Ninguém quer por certo coarctar a liberdade do voto aos dignos pares que pensam desta ou d'aquella fórma. O principal d'esta medida é a proclamação da liberdade de commercio, fabrico a venda do tabaco; este é o pensamento capital, e votado elle, não póde ter a mesma importancia outra qualquer questão, porque os outros pontos é que hão de ser subordinados a este e não este áquelles. O que cumpre portanto é que depois da discussão terminar se votem separadamente os artigos pela ordem natural, como é mais logico, racional e de accordo sempre com as praxes seguidas aqui e em toda a parte, até porque isto é que deixa maior liberdade de voto; e se alguns dignos pares julgarem que essa liberdade se consegue melhor por outra fórma salteando a votação dos artigos, não ha de ser o governo que faça d'isso questão, porque o seu desejo é que haja a maxima liberdade de voto. O sr. presidente do conselho insurgiu-se contra a idéa de votar os artigos em massa, porque esse systema contraria a liberdade do voto; n'este ponto julgo que a camara toda está de accordo (apoiados).

Termino pois, dizendo que se póde muito bem attender ao que quer o digno par o sr. Filippe de Soure e os que pedem outros dignos pares similhantemente, sem que a votação dos artigos deixe de seguir a ordem que for mais logica e rasoavel; entretanto a camara é que ha de resolver.

O sr. Marquez de Niza (sobre a ordem): — E para fazer um additamento á proposta do digno par, o sr. conde de Samodães, e retirar a primeira parte, se s. ex.ª concordar.

Eu creio, sr. presidente, que pela demonstração feita pelo digno par, o sr. conde de Samodães, e conforme com o que se collige da deducção das materias ou provisões do projecto, deve se concluir que a primeira cousa a tratar é das doutrinas consignadas no artigo 13.° e seguintes, não até 19.°, roas até ao 26.°, porque a ligação da materia é inquestionavel (apoiados); mas é que mesmo não póde deixar de se attender a isto, não eó pela importancia da materia, mas porque a sua approvação ou rejeição influe na indole da lei (apoiados), e tanto isto assim é, tanto póde mudar essa indole que a commissão assim o entendeu, e acaba de confirmar isto um dos membros da mesma commissão, que tambem serviu de relator, e o reconhecemos todos com essa qualidade.

Mas, sr. presidente, cousa incrivel é que o governo, que no seio da commissão não soube defender e sustentar a sua obra, que se sujeitou a toda a exprobração, e largou de mão o seu projecto para se conformar com uma substituição, agora apresenta-se aqui cheio de zelos que excedem todo o sentimento dos membros da commissão...

O sr. Presidente do Conselho: — Zelos em que?

O Orador: — Pois quem confeccionou o novo projecto e todos que subscreveram a elle não reclamam nem acham inconveniente algum no que se propõe sobre o modo de entrarmos na discussão da especialidade, e o governo que em tudo se declarou na commissão de accordo, com ella vem fazer questão do methodo que achamos mais justo seguir-se para fazer effectivo o pensamento da commissão (apoiados). Não vê o governo que fica isolado quando quer sustentar que o que convem é outra cousa differente? Não se ouviu a voz franca e leal do sr. Joaquim Filippe de Soure? Honra lhe seja (apoiados). Que foi o que elle disse com uma competencia muito superior para o caso por isso mesmo que elle teve tambem parte na confecção da substituição, sendo relator conjunctamente com o digno par Eugenio de Almeida; a pedido d’este que requereu esse auxilio invocando a necessidade do auxilio mesmo pelo seu melindroso estado de saude.

Que disse? Disse que o methodo era realmente o que se propunha pela especialidade do caso, nem podia ser outro para se não transtornar o pensamento da commissão, e que assim se devia caminhar harmonisando isto do melhor modo que fosse possivel com as disposições regimentaes. Como é então que o governo acode com estes desejos de manifestar maior zêlo de paternidade do que aquelle que tem os proprios paes! (Riso.) Pois o nobre presidente do conselho estranha que se queiram discutir estes artigos conjunctamente.

O sr. Presidente do Conselho: — Não é sobre a discussão que recaem as minhas observações.

O Orador_ Nós queremos mesmo que o governo encaminhe a discussão debaixo d'este ponto de vista, que está inteiramente conforme com o que se venceu com o seu accordo no seio da commissão (apoiados). Não se percebe em que possa haver aqui a mais pequena duvida, pêlo menos não a devia haver nem era de esperar que apparecesse.

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O sr. Presidente do Conselho: — Fallo do modo de votar os artigos e não do modo de os discutir.

O Orador: — Pois na discussão nós esperámos mesmo que o governo nos encaminhe...

O Sr. S. J. de Carvalho: — Não diz nada.

O Orador: — Depois é claro que se ha de votar artigo por artigo desde o 13.° até ao 26.° e voltar-se depois para o começo do projecto (apoiados).

O ar. Conde de Thomar: — A questão de que se trata é da mais alta importancia; convem por isso que haja a tranquillidade de espirito de uma e outra parte.

Não leva a mal que dos bancos dos srs. ministros saísse a supposição de que na proposta apresentada pelo digno par o sr. conde de Samodães, e apoiada por tantos membros d'esta camara, podia haver algum estratagema, pois que effectivamente n'este e em todos os parlamentos se admittem os estratagemas, e não é portanto estranhavel que o houvesse n'esta occasião da parte da opposição, se quer para destruir um outro estratagema, que consta queria empregar-se por parte do governo (apoiados). A opposição por consequencia de que trata é de se prevenir (apoiados repetidos). Não ha duvida de que vencida a opposição na questão da opportunidade deve ter agora esta prevenção (apoiados).

Todos os dignos pares que pertenceram á commissão estarão lembrados de que o orador declarou que, comquanto não estivesse disposto a votar pela opportunidade, não teria entretanto duvida alguma era votar pelo principio da liberdade, não conforme vinha no projecto, mas como tinha sido desenvolvido pelas tres commissões reunidas. Portanto o seu voto ao artigo 1.° depende da adopção das provisões que se inseriram no projecto elaborado pelas commissões d'esta camara, que melhora consideravelmente este systema; essas provisões adoptou-as tambem o governo, compromettendo-se por esse facto a vir sustenta-las e votar por ellas n'esta camara; pois do contrario não teria talvez dez votos a favor da sua proposta (muitos apoiados). Conseguintemente, para tirar todo o equivoco, dirige directamente ao governo a seguinte pergunta: está elle decidido a sustentar aqui na discussão e votar, pelos, ministros que são pares, o projecto que aceitou no seio da commissão? (Apoiados.) Esta é que é a grande questão...

O sr. S. de A. e Brito: — Está.

O Orador: — O digno par responde pelos srs. ministros?

O sr. S. de A. e Brito: — Eu não..

O Orador: — Faz esta pergunta porque o seu desejo é que os srs. ministros declarem francamente se estão hoje aqui nas mesmas idéas em que estavam na commissão, aceitando as provisões por ella propostas; rasão pela qual ella deu a sua acquiescencia ao principio da liberdade, prestando lhe o seu voto, que aliàs seria negativo (apoiados). Pelo menos, se estas provisões não forem adoptadas agora pelo governo, fica na persuasão de que muitos dignos pares que votaram pela generalidade do projecto hão de recusar o seu voto ao artigo 1.°

É preciso pois que a opposição applique realmente um estratagema a outro estratagema, e que exija dos srs. ministros a declaração franca se estão ou não dispostos a sustentar com o seu voto aquellas provisões que aceitaram na commissão, as quaes influiram no animo dos dignos pares para poderem votar o principio da liberdade.

O sr. Presidente do Conselho: — Pedi novamente a palavra, porque desejo que as minhas expressões sejam apreciadas no sentido que ellas devem ter, e não n'aquelle que eu vejo que os dignos pares lhe tem dado.

Eu não disse que me oppunha a que a discussão fosse por grupos de artigos, mas simplesmente o que eu disse que me oppunha, era que a votação fosse em artigos agglomerados. Também de maneira nenhuma disse que me oppunha a que uns artigos se votassem primeiro que outros.

Não sei que possa haver estratagema em querer assegurar a cada um a liberdade do seu voto; porque contendo os artigos de que se trata duas ou mais sentenças, podia acontecer que fosse assim approvado por aquelles que quereriam rejeitar alguma d'essas sentenças; portanto o que proponho é que a votação seja artigo pôr artigo. Esta é a praxe seguida em toda a parte, não admitte estratagema nenhum, e tem unicamente por fim assegurar a cada um a liberdade do seu voto.

Emquanto á pergunta que o digno fiar me faz, declaro que hei de votar pelo projecto da commissão tal qual está.

O sr. Conde de Thomar: — Isso é franco. D'essa maneira fica o negocio claro (apoiados—susurro).

Vozes: — Deu a hora.

O sr. S. J. de Carvalho: — Peço a palavra para antes de fechar a sessão.

O sr. Marquez de Niza: — Para um requerimento.

O sr. Presidente: — Tem primeiro a palavra o digno par o sr. Osorio, para um requerimento.

O sr. Osorio Cabral: — Eu peço perdão á camara de a interromper n'esta discussão, mas é unicamente para mandar para a mesa um requerimento em que peço varios esclarecimentos pelo ministerio da marinha.

REQUERIMENTO

Requeiro que pelo ministerio da marinha sejam enviados a esta camara, com urgencia:

1. ° Officio do commissario inglez em Loanda, datado de 8 de janeiro de 1862, dirigido ao seu governo, ácerca de transportes de libertos e homens livres;

2. ° Nota do governo inglez ao seu representante em Lisboa, dirigida ao governo de Sua Magestade Fidelissima, referindo se a este officio.

Sala das sessões, 25 de abril de 1864. = Miguel Osorio Cabral e Castro.

Peço a V. ex.ª que lhe dê o destino conveniente.

O sr. Presidente: — Manda-se expedir. Agora tem a palavra o digno par o sr. Vaz Preto.

O sr. Vaz Preto: — Peço a V. ex.ª consulte a camara, se quer prorogar a sessão até que se vote a proposta do digno par o sr. conde de Samodães (apoiados—susurro).

Consultada a camara, assim o decidiu.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Sebastião José de Carvalho.

O sr. S. J. de Carvalho: — Sr. presidente, muito folguei de ouvir a resposta que o sr. presidente do conselho acaba de dar, declarando que vota por todas as disposições consignadas no projecto de lei, que tendem a realisar praticamente o pensamento da commissão. Estimo que o nobre presidente do conselho respondesse com tanta facilidade á pergunta que acabava de lhe ser" dirigida, e estimo tanto mais quanto via durante o debate da generalidade uma certa reluctancia da parte do sr. ministro da fazenda, em declarar aqui a sua opinião, reluctancia contra a qual protesto, pretendendo quebrar o silencio de 8. ex.ª

O sr. Ministro da Fazenda: — Eu não podia emittir opinião, porque não tenho voto n'esta camara.

O Orador: — Não tem voto, mas tem opinião, que é a opinião do governo. O sr. ministro interrogado por mim duas vezes successivas sobre se considerava como questão ministerial as disposições do projecto, recuou pretendendo com uma evasiva illudir a pergunta! Não respondeu nada, e a opposição tinha direito a suppor que, por accordo do governo, se queria empregar o estratagema de fazer vingar o principio da liberdade do tabaco, desprezando as disposições da commissão, sem as quaes o que ficava de pé era a proposta do governo (apoiados).

Sr. presidente, depois da formal declaração do sr. presidente do conselho, o nobre ministro da fazenda, não com o seu voto, mas com a sua opinião, era obrigado a apresentar-se perante esta camara, dizendo: «O governo faz questão politica do projecto tal qual se acha, como complemento do principio votado na generalidade, e se assim não for approvado largamos estas cadeiras». Isto é o que pede a dignidade do governo que 8. ex.ª representa, e para a qual já estou cansado de appellar constantemente.

Espero pois que o illustre ministro, encerrando o debate, se apressará a declarar que sustenta as idéas que acaba de defender o sr. presidente do conselho, e se nada disser tomo nota do seu silencio, que aliàs se torna muito significativo não só para mim mas para toda a camara...

(Pausa.)

O sr. ministro não pede a palavra?... (Pausa.)

Então peço-a eu novamente.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. conde de Samodães.

O sr. Conde de Samodães: — Pedi a palavra sobre a ordem para dizer que concordo com o que disse o digno par o sr. marquez de Niza, e que adopto o additamento que foi apresentado pelo digno par o sr. Soure, na qualidade do relator da commissão, isto é, para que tambem se discutam, simultaneamente com os artigos 13.° até 19.°, os outros que seguem de 19.° até 26.°. Eu não os tinha incluido na minha proposta por não serem tão importantes como aquelles outros; esta é que foi a rasão unica, pois como bem se vê no relatorio do parecer, lá se acham designados todos estes artigos como fazendo parte integrante do systema adoptado pela commissão. Parece-me que depois da declaração explicita que fez o sr. presidente do conselho, a questão está resolvida.

O sr. Soure: — Apoiado.

O Orador: — A commissão é de opinião que se discutam simultaneamente, o governo está de accordo, como foi proferido pela bôca do sr. presidente do conselho, portanto agora a questão toda está unicamente sobre o modo de votar. Nós podemos tratar d'isso no fim, mas tambem podemos dizer desde já qual é a ordem chronologica da votação.

A questão do monopolio acabou desde que se votou a generalidade do projecto; agora, até quando dura ainda o monopolio provisorio, ou desde quando a liberdade principia, é o ponto a decidir, porque com esta circumstancia é que estão ligados todos os outros artigos; portanto estes artigos é que devem ter a preferencia na votação, depois de votada a idéa geral da abolição do monopolio, para a homologar, isto é, reduzir a termos na lei, fica abolido o monopolio do tabaco desde tal ou tal epocha. Agora depois d'isto é que tem logar o votarem se todas as differentes circumstancias que a commissão propõe para se fazer a transacção. É n'este sentido que eu vou fazer uma proposta em substituição daquella que primeiramente tinha mandado para a mesa. _

O sr. Marquez de Niza: — Peço a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: — Primeiro ha de ler-se a proposta.

O sr. Conde de Samodães: — Mando para a mesa a proposta, concedida n'estes termos (leu).

«Proponho que se discutam simultaneamente os artigos 1.°, e 13.° a 26.° e que na votação tenham preferencia os artigos pela sua ordem de 13.° a 26.°= Conde de Samodães. » *

(Continuando). Eu entendo que tanto mais se deve usar esse systema, quanto os preceitos consignados nos artigos 13.° e 26.° formam uma questão especial, uma questão que se porventura não fosse admittida, não podia ter logar o preceito do projecto, para que a liberdade do tabaco possa começar em 1 de janeiro de 1865. Se os artigos 13.° e 26.° forem rejeitados fica prejudicada a parte relativa ao praso.

Foi lida na mesa a proposta e admittida.

O sr. Marquez de Niza: — Pedi a palavra para um requerimento; a fim de propor que sejam lançadas na acta as palavras do sr. presidente do conselho, que com tanta franqueza, cavalheirismo e lealdade respondeu ás preguntas sobre que nós estavamos anciosos de ouvir uma res posta, tantas vezes pedida inutilmente durante a discussão que ha pouco se encerrou (apoiados).

O sr. Ministro da Fazenda: — Peço a palavra por parte do governo.

O sr. Presidente: — Tem V. ex.ª a palavra.

O sr. Ministro da Fazenda: — Sr. presidente, as minhas idéas estão completamente de accordo com as do sr. presidente do conselho (O sr. Presidente do Conselho: — Apoiado); mas hontem repeti n'esta camara que o governo não collocava esta questão no terreno politico, porque entendia que ella não podia convenientemente resolver se n'esse terreno; e então, como não sou membro d'esta camara, não quiz emittir a minha opinião de modo que desse a esta questão um caracter politico. Tive reserva, porque entendo o systema constitucional d'esta fórma; foi por este motivo que não manifestei o meu pensamento, e não porque quizesse armar estratagemas, pois que a minha opinião está de accordo com a do sr. presidente do conselho e com o projecto das commissões (O sr. Presidente do Conselho: — Apoiado). Porém, logo que vi um digno par intimar-me para eu collocar a questão em um terreno politico, entendi que devia reservar me.

Eis aqui está o motivo.

Agora se a camara quer discutir os artigos juntos ou separados, se quer vota los em globo ou cada um de per si, isso para mim é indifferente; mas o que me parece melhor para a liberdade do voto é o mesmo que disse o sr. presidente do conselho; e com referencia ao artigo 1.° julgo melhor que se vote a primeira parte, e que emquanto ao praso se reserve para quando se votarem os artigos 13.° a 26.°

Parece-me que este é tambem o espirito da proposta do digno par, o sr. conde de Samodães, mas qualquer que seja a fórma da discussão ou da votação, nós aceitamo-la, porque temos a coragem das nossas opiniões.

O sr. Presidente: — Como nenhum digno par se acha inscripto sobre a proposta do sr. conde de Samodães, vou consultar a camara sobre a sua approvação.

A camara approvou a.

O sr. Presidente: — A seguinte sessão é ámanhã, e a ordem do dia a discussão do parecer sobre a abolição do monopolio do tabaco na em especialidade, na fórma da proposta do sr. conde de Samodães.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e meia da tarde.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão do dia 25 de abril de 1864

Ex.mod srs.: Conde de Castro; Duques, de Loulé, de Palmella; Marquezes, de Alvito, de Fronteira, de Niza, de Vallada, de Sabugosa; Condes, das Alcaçovas, de Alva, d'Avila, da Azinhaga, do Farrobo, de Fonte Nova, de Linhares, da Lousã, de Mello, de Paraty, de Peniche, da Ponte, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, de Rezende, de Sampaio, de Samodães, do Sobral, de Thomar; Viscondes, de Santo Antonio, da Borralha, de Benagazil, de Condeixa, de Fonte Arcada, de Fornos de Algodres, de Ovar, da Vargem da Ordem, de Soares Franco; Barões, de Ancede, das Larangeiras, de S. Pedro, de Foscoa; Mello e Carvalho, Moraes Carvalho, Mello e Saldanha, Augusto Xavier da Silva, Seabra, Pereira Coutinho, Teixeira de Queiroz, Barreto Ferraz, Caula Leitão, Custodio Rebello de Carvalho, Sequeira Pinto, Felix Pereira de Magalhães, Ferrão, Faustino da Gama, Margiochi, Pessanha, Osorio e Sousa, João da Costa Carvalho, João da Silva Carvalho, Aguiar, Soure, Pestana, Braamcamp, Silva Cabral, Pinto Basto, José Feliciano da Silva Costa, Passos, Reis e Vasconcellos, Izidoro Guedes, José Lourenço da Luz, Baldy, Eugenio de Almeida, Matoso, Silva Sanches, Rebello da Silva, Luiz de Castro Guimarães, Fonseca Magalhães, Vellez Caldeira, Vaz Preto, Miguel Osorio, Miguel do Canto, Brito do Rio, Menezes Pita, Sebastião de Almeida o Brito, Sebastião José de Carvalho e Vicente Ferrer Neto Paiva.

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