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N.º 47

SESSÃO DE 26 DE ABRIL DE 1880

Presidencia do exmo. sr. Duque d'Avila e de Bolama

Secretarios - os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Eduardo Montufar Barreiros

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta da sessão antecedente. - Não houve correspondencia. - O digno par Vaz Preto deseja ser informado se os esclarecimentos que pedira pelo ministerio das obras publicas já tinham sido mandados para a camara. -Requerimentos do mesmo digno par. - O sr. ministro da fazenda (Barros Gomes) responde ao digno par Vaz Preto. - Ordem do dia. - Continuação da discussão na generalidade do parecer n.º 59 sobre o projecto de lei n.º 41, que altera e modifica a legislação relativa á contribuição predial. - Considerações do digno par Serpa Pimentel. - Resposta do sr. ministro da fazenda (Barros Gomes). -Discursos dos dignos pares conde de Valbom e Vaz Preto. - Resposta do sr. ministro da fazenda.

Ás duas horas e um quarto da tarde, sendo presentes 21 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão precedente julgou-se approvada na conformidade do regimento por não haver reclamação em contrario.

Não houve correspondencia.

(Assistiram á sessão os srs. ministros da fazenda, justiça e reino.)

O sr. Vaz Preto: - Eu desejava que v. exa. me dissesse se os documentos que em tempo pedi pelo ministerio das obras publicas já foram enviados a esta camara.

O sr. Secretario (visconde do Soares Franco): - Na mesa não ha documento algum. Manda-se ver á secretaria se lá estão.

O sr. Vaz Preto: - Eu chamo a attenção de v. exa., da camara e do sr. ministro da fazenda, que é o unico membro do governo que está presente, para este facto. Ha mais de um mez que pedi pelo ministerio das obras publicas documentos importantissimos relativos á concessão do caminho de ferro de Torres, que tem de ser discutida nesta camara. Esses documentos, comquanto já fossem pedidos ha bastante tempo, e dos quaes eu não posso prescindir para apreciar o projecto, ainda não vieram. Por consequencia, em vista d'este procedimento do sr. ministro das obras publicas, espero que a camara não se admire se eu pedir o adiamento d'esse projecto, quando elle aqui vier.

Alem d'estes, pedi outros documentos relativos ás gratificações que hoje são dadas por aquelle ministerio, os quaes tambem ainda não vieram.

Como tenho de tratar e ha de ser discutido aqui o bill pedido pelo sr. ministro das obras publicas, careço d'esses documentos, para poder mostrar á camara que pelo ministerio das obras publicas se estão dando gratificações muito maiores do que se davam no anno passado, e se estão praticando abusos de tal ordem, que não convem mandar á camara esses documentos.

Como quer, pois, o governo, quando vier á tela da discussão o bill de indemnidade, relevando o governo dos actos que praticou contra lei, que elle seja approvado, sem terem sido presentes os documentos a que me referi?

Eu chamo a attenção de v. exa. e da camara para estes factos, pedindo ao mesmo tempo ao governo que acabe com este systema de recusar os documentos que lhe são pedidos, e que podem dar luz ás questões.

Vou mandar para a mesa os meus requerimentos.

(Leu.)

O sr. Presidente: - Eu já mandei saber á secretaria se tinham vindo os documentos a que o digno par se referiu, e no caso de não terem vindo, mandar-se-ha fazer novo pedido.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, ha mais de tres mezes que pedi ao governo documentos, que julgo importantes, os quaes ainda não me foram remettidos. Agora peço outros sobre assumpto que tambem considero de grande importancia, porque desejo mostrar á camara como têem sido feitos certos serviços no ministerio das obras publicas. Para isso, porém, careço dos documentos que peço, e que desejo me sejam enviados antes de ser presente á camara o projecto a que elles dizem respeito, aliás terei de pedir o seu adiamento até que venham esses documentos.

Leram-se na mesa os requerimentos.

São do teor seguinte:

Requerimentos

1.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, seja enviada a esta camara uma nota das despezas de exploração das linhas ferreas do sul e sueste, das do Minho e do Douro, especificada ácerca de cada uma das linhas. = Vaz Preto.

2.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, seja enviada a esta camara copia de todos os despachos sobre assumpto relativo á administração geral das matas, proferido pelo respectivo ministro, depois da portaria de 3 de agosto de 1879, e bem assim copia dos officios ou representações da mesma administração que devem motivar esses despachos. = Vaz Preto.

3.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, se envie a esta camara copia da concessão feita a Alfredo Ribeiro e outros de um caminho de ferro por Torres Vedras, e de todos os documentos que acompanham essa concessão.

Requeiro igualmente copia do despacho do sr. Barros e Cunha, quando ministro, que prorogou aos concessionarios a referida concessão de um caminho de ferro de Lisboa para Torres Vedras. = Vaz Preto.

Consultada a camara, foram os requerimentos do digno par enviados ao governo.

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): - Pedi a palavra para declarar ao digno par que transmittirei ao meu collega das obras publicas a noticia do que se passou no seio d'esta camara, e estou convencido que s. exa. ha de dar as ordens necessarias para que sejam satisfeitos os desejos do digno par.

O governo não se tem furtado até hoje á remessa de todos os documentos que os membros das duas casas do parlamento têem julgado necessarios para apreciar os actos da sua administração. E temos levado tão longe o nosso desejo de publicidade, que por parte do meu collega do reino foi declarado na camara dos senhores deputados, que não hesitavamos, para satisfazer os desejos dos membros d'esta e da outra casa do parlamento, que quizessem conhecer certos documentos relativos á marcha administrativa do governo, fornecel-os nas nossas secretarias, quando s. exas. quizessem dar-se ao incommodo de ali os irem examinar. Isto prova o extraordinario empenho que o governo tem em querer fornecer aos corpos legislativos todos os doeu-

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mentos que se reputem necessarios para conhecer dos seus actos administrativos.

Concluindo, direi que não podia deixar passar sem este protesto as expressões do digno par, a quem asseguro que por parte do meu collega serão em breve satisfeitos os desejos de s. exa.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vamos passar á ordem e o dia, que é a continuação da discussão na generalidade do parecer n.° 59 sobre o projecto do lei n.° 49.

O sr. Serpa Pimentel: - O meu fim, pedindo a palavra, não é tanto discutir o objecto capital do projecto que está em discussão, que é a preferencia entre o systema de quota e de repartição, como simplesmente dar a rasão do meu voto. Por isso referir-me-hei a alguns dos artigos que, comquanto não sejam de grande importancia, não podem deixar, todavia, de merecer a nossa attenção.

Os artigos 2.°, 3.° e 4.° deste projecto têem por fim encorporar os impostos addicionaes á contribuição predial nesta mesma contribuição.

Estas disposições não são mais do que o complemento de outras que já votámos, encorporando outros addicionaes nos impostos a que dizem respeito.

Mas ha aqui um imposto, que não é um addicional, e cuja encorporação me parece inconveniente, porque traz com sigo diminuição provavel do receita.

A camara sabe que a contribuição predial especial, creada em 1869, foi uma excellente medida, que já deu em resultado colher-se um rendimento que subiu no ultimo anno a 74:000$000 réis.

Estabelecera-se então que os predios inscriptos de novo nas matrizes, não só os que estavam sonegados, mas os que se fossem construindo, em vez de entrarem na massa geral para a repartição do contingente respectivo a cada districto, deviam pagar á parte este imposto especial, na mesma proporção em que o pagam outros predios.

Se, por exemplo, o contingente de um districto era de 200:000$000 réis antes d'aquella lei; os predios novamente inscriptos na matriz faziam augmentar aquella verca de toda a importancia que estes tinham que pagar.

Este imposto, alem de estar já hoje na cifra de 14:000$000 réis, tem a inapreciavel vantagem de ir crescendo todos os annos. Assim vemos que no ante-penultimo anno rendeu 53:000$000 réis, no penultimo 67:000$000 réis e no ultimo 74:000$000 réis, conforme indiquei.

Nas circumstancias actuaes do thesouro, não me parece absolutamente para desprezar uma receita que todos os annos offerece um augmento medio de 10:000$000 réis.

A este respeito direi ao illustre ministro da fazenda que se lembre do que aqui disse ha poucos dias, quando se tratava do imposto sobre o carvão que nos nossos portos é fornecido aos barcos a vapor. S. exa. para sustentar esse imposto, que ora combatido porque importava um certo vexame para a navegação, que podia contribuir para a afastar dos nossos portos, e porque, podendo trazer esse grande inconveniente, se calculava que poderia render, quando muito 10:000$000 réis, disse que dos muitos poucos se faz muito, e que não estavamos em circumstancias de desprezar esta pequena receita.

Não vejo, pois, o motivo pelo qual devamos prescindir de uma receita que augmenta, em termo medio, 10:000$000 réis em cada anno.

Não vale a pena de sacrificar esta receita, embora pequena e temporaria, até que a repartição se transforme completamente na quota, á symetria da nova lei.

Eis-aqui a rasão por que eu n'este ponto não concordo com o projecto.

Os artigos que se seguem referem-se principalmente á transformação da contribuição predial, substituindo o systema de quota ao de repartição.

Eu não entrarei n'este assumpto, sr. presidente. Como v. exa. sabe, dos economistas uns são partidarios do systema de repartição, outros do de quota.

Eu confesso que não sou mais partidario do systema de quota do que do de repartição; ambos es systemas são bons, com boas matrizes; se as matrizes podessem ser perfeitas de maneira que cada um pagasse na proporção dos seus rendimentos, qualquer dos systemas daria bom resultado.

Em theoria, suppondo que as matrizes são perfeitas, ambos os systemas são excellentes.

No estado actual das matrizes o systema da quota seria muito peior e mais sujeito do que o de repartição. (Apoiados.)

Mas o meu illustre amigo, o sr. Mathias de Carvalho, que, seja dito de passagem, provou que onze annos do vida diplomatica não foram bastantes para o distrahir dos estudos economicos e financeiros, provando tambem que muita rasão teve a commissão de fazenda em o escolher para relatar o projecto, porque n'esse trabalho mostrou s. exa. quanto estava senhor da materia, e que a havia estudado como aquelles que melhor a têem estudado...

O sr. Mathias de Carvalho: - Agradeço ao digno par.

O Orador: - Mas disse s. exa. que com as matrizes perfeitas o imposto de quota, na sua opinião, era preferivel ao de repartição.

Não discutindo este ponto, e dando de barato que assim seja, a questão toda é se as matrizes depois de reformadas ficarão perfeitas, ou pelo menos em tal grau do perfeição que o imposto da quota seja mais justo que a da repartição.

Isso pura mim é que é problematico e muito problematico.

Sobretudo os meus receios, receios tambem já manifestados pelo meu illustre amigo o sr. Fontes Pereira de Mello, e depois pelo sr. conde de Valbom, é que com esta lei se vá prejudicar consideravelmente o aperfeiçoamento das matrizes na sua revisão, porque se vae dar com ella não só ao contribuinte, mas ao districto um incentivo para a fraude, interessando-os em que as matrizes não sejam exactas. Todos sabem que ha districtos que pagam muito menos do que deviam pagar, e quando se forem aperfeiçoar as matrizes, e d'esse aperfeiçoamento resultar duplicar o rendimento collectavel, embora seja justo fazer pagar a esses districtos o que devem pagar, se elles virem que no futuro vão pagar o dobro pelo systema de quota, é evidente que hão de mostrar grande repugnancia a que nas matrizes se inscreva o verdadeiro rendimento predial, porque d'ahi lhe ha de resultar um grande onus.

A minha opinião seria que fossemos melhorando as matrizes com o systema actual de imposto, para evitar as resistencias que hão de sobrevir na execução da medida de que nos occupâmos, não só da parte dos individuos, mas tambem dos districtos, porque torno a dizer, não será indifferente para alguns terem de passar a pagar o dobro do que pagam agora de contribuição predial, e isto de um anno para o outro, pois não poderá deixar de assim acontecer, como já disse, com relação aos districtos. Isto é no caso de as matrizes serem revistas, e ficarem no grau de perfeição precisa; mas se não o forem, então o systema de quota será mais injusto que o de repartição.

Em ambos os casos a lei é má, porque n'um vae crear grandes resistencias, e n'outro a desigualdade no imposto será ainda maior do que actualmente.

Eu faro justiça inteira ás intenções do illustre ministro da fazenda. S. exa. está convencido que por este modo, transformando successivamente o systema de repartição no da quota, nós chegaremos a augmentar, tambem successivamente, o rendimento collectavel, e logo que chegarmos a attingir a verba de 31.000:000$000 réis, se estabelecerá a quota e o imposto augmentará depois successivamente sem ser preciso a discussão nas duas casas do parlamento.

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O projecto de s. exa. é engenhoso, mas permitta-me que lhe diga tambem que é demasiado transparente, vê-se o que está debaixo d'elle; e o que está debaixo d'elle é o incentivo á fraude e a repugnancia ao aperfeiçoamento das matrizes; e esse aperfeiçoamento é o nosso desideratum. (Apoiados.)

Parece que por parte dos dignos pares que defendem o imposto de quota, ha a prevenção de que com o systema de repartição tem o inconveniente de deixar o imposto estacionario; ora, eu creio que a pratica tem provado o contrario, e até o digno par o sr. Matinas de Carvalho nos disse que o rendimento actual é o dobro do que era em 1852, não nos devemos importar se o resultado que elle produz provém do principal se dos addicionaes, o que é certo é que o thesouro, apesar do systema de repartição, recebe hoje do imposto predial quasi o dobro do que recebia, quando elle foi estabelecido.

Ha um ponto, sr. presidente, onde me parece que na discussão das duas casas do parlamento se tem exagerado. É na apreciação do que se passou, quando em 1862 o sr. conde de Valbom pediu o augmento dos 85:000$000 réis. A grande repugnancia não foi ao pedido deste augmento, foi á forma; aquelles 85:000$000 réis era o que se calculava que deveria resultar da reforma das matrizes.

Na fórma de distribuir este augmento dividiram-se as opiniões em dois grupos, uns, querendo que aquelles réis 85:000$000 fossem distribuidos pelos districtos na mesma proporcionalidade do augmento de rendimento collectavel que em cada um d'elles se dava, e outros pretendendo que esta massa de 85:000$000 réis fosse distribuida por todos os districtos na proporção do que já pagava cada um. Esta é que foi a questão na camara dos senhores deputados. Portanto não se diga que em 1864 as camaras fizeram questão de votar ao governo 85:000$000 réis de imposto.

Os oradores que fallaram contra a proposta do governo e da commissão, não impugnavam o imposto, mas a forma; e então, claro está, que não se póde admittir esta prova de que com o systema de repartição não é possivel augmentar o imposto sem ter de encontrar a resistencia das camaras legislativas.

Já o sr. Carlos Bento disse que em 1861 foi este imposto augmentado com 40 por cento, e em 1869 foi ainda augmentado com mais 20 por cento. Por consequencia, repito, o systema de repartição não póde ser accusado de impedir o augmento de receita d'este imposto. Nem as camaras têem recusado votar este augmento, quando as circumstancias financeiras o aconselhem.

Sr. presidente, torno a dizer que não tomo partido pelo systema de quota nem pelo de repartição, mas o que desejo, como de certo tambem deseja a camara e o governo, é que tenhamos boas matrizes, porque sem esta base não é possivel tirar bom resultado de nenhum dos systemas.

O que eu receio é que, estabelecido o systema de quota, o governo se veja em grande difficuldade para conseguir o aperfeiçoamento das matrizes.

O sr. ministro da fazenda receia que se continuar o systema de repartição, e depois de feita a revisão das matrizes, reconhecendo-se que alguns districtos pagam muito menos do que devem, não seja possivel estabelecer uma justa distribuição, pela resistencia que hão de oppor aquelles que tiverem de pagar muito mais do que hoje pagam, emquanto que pelo systema do projecto,- se vae passando successivamente para o systema de quota, isto é, da justa proporcionalidade do imposto com o rendimento collectavel. Mas eu direi que pelo systema do projecto, para cada districto haverá tambem a passagem respectiva de um para outro systema, que alguns districtos, de um anno para outro, passarão a pagar talvez o dobro do que hoje pagam, e nesse caso apparecerão as mesmas repugnancias invenciveis que o sr. ministro receia.

Eu duvido muito que o governo não se veja, n'essa occasião, obrigado a propor a revogação d'esta lei.

É uma cousa grave obrigar um districto, de um para outro anno, a pagar o dobro do que pagava, embora seja com justiça. O facto economico de fazer pagar um districto o dobro do que pagava até uma dada epocha, ha de dar-se necessariamente, porque ha districtos que pagam hoje metade do que deviam pagar em relação a outros. Isto é uma questão grave.

Esta transformação repentina tem graves inconvenientes economicos, e de tal ordem, que me parece que o governo ha de hesitar em applicar a lei; isto, dado o caso de que as matrizes sejam feitas como o devem ser; porque se o não forem, torna-se mais injusto o imposto da quota do que o de repartição, e o sr. ministro actual, ou qualquer outro que se sente n'aquellas cadeiras, ha de necessariamente propor a reforma d'esta lei.

São estas, em geral, as observações que tenho a fazer ao projecto em discussão, e que me levam a não o poder votar, comquanto veja que n'elle ha artigos de menor importancia, que são inoffensivos, e outros que julgo convenientes e uteis, como por exemplo o que estabelece as regras para a revisão das matrizes.

Quanto ás isenções a que o projecto se refere, estou de accordo a este respeito. As minhas duvidas são, como já disse, sobre os artigos que estabelecem a mudança da contribuição de repartição em contribuição de quota.

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): - Sr. presidente, procurei seguir com toda a attenção o digno par que acaba de fallar, quando expoz á camara as duvidas que lhe suscitava este projecto do governo. Pela minha parte diligenciarei, pois, responder a s. exa., sustentando o projecto e expondo as rasões que o governo teve para propor esta modificação no imposto predial, que reputo importante, e que ha de prestar grandes beneficios ao thesouro e ao contribuinte.

Declarou s. exa. que lhe repugnava em particular que o governo, quando precisa estabelecer impostos, alguns dos quaes não são muito acceitaveis aos olhos da sciencia economica, mas de que as circumstancias do thesouro nos obrigaram a lançar mito, fosse por este projecto prescindir dos recursos que fornece a contribuição especial. Direi ao digno par que foi esse um dos assumptos em que muito pensei ao redigir o respectivo artigo da proposta, entendendo por fim que não convinha, por uma receita insignificante embora progressiva, e que não poderia elevar-se a muito mais de 7:000$000 réis por anno, ir sacrificar o pensamento capital da mesma proposta, a que, talvez mal, eu ligava e figo uma importancia financeira muito grande. A doutrina do artigo 7.° foi um dos pontos que mais trabalho nos deu a mim e ao illustre funccionario a quem confiei a redacção da proposta. Por esse artigo se estabelece uma serie de compensações graduaes e successivas em virtude das quaes reputo possivel a transformação para o systema de quota e sem as quaes eu imaginaria que similhante transformação iria revolucionar o paiz. Na redacção d'esse artigo teve de attender-se por um lado á fixação em 10 por cento do contingente total a distribuir annualmente; por outro, á base fixa da tabella que se adoptava para effectuar essa distribuição; e por outro, finalmente, ás rectificações successivas nos contingentes districtaes subordinados ao principio de que em nenhum districto, cujas matrizes tivessem sido revistas, o imposto ficasse inferior a 10 por cento.

D'estes tres elementos derivaram difficuldades reaes para se conseguir por meio do jogo de todos elles a passagem para o systema de quota, não de um modo repentino e brusco, mas gradual, a fim de que o povo se fosse habituando á transição, evitando-se assim resistencias naturaes que tornassem impossivel a applicação da lei.

N'estas condições julgou-se mais conveniente manter o principio fundamental do projecto, visto que a introducção

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de um quarto elemento, como o digno par acabou de indicar, e tinha tambem proposto já no seio da commissão de fazenda, transtornava completamente esse principio. Tratando de preparar a transição para o systema da quota, que tão largo resultado financeiro assegura para o futuro, não só eu mas os meus collegas julgámos, repito, muito vantajoso manter o principio fundamental do projecto," embora houvéssemos de sacrificar para já algum augmento de receita.

Deus me livre de entrar agora na discussão, das vantagens comparadas do systema de repartição ou do systema de quota; porém não posso deixar de me referir ás considerações que ácerca da elasticidade da contribuição predial foram expostas pelo digno par.

Tem-se com effeito duplicado a importancia d'essa contribuição por meio do lançamento de pesados addicionaes.. Primeiramente propoz o sr. conde do Casal Ribeiro 20 por cento sobre esse imposto, percentagem cujo producto devia ser applicado á viação; depois o sr. Fontes Pereira de Mello pediu, em vez d'esses 20, 40 por cento addicionaes; e ainda mais tarde, por proposta apresentada pelo sr. conde de Samodões, se lançaram novamente, sob a designação de contribuição extraordinaria, novos 20 por cento, que elevara ao todo o addicional a 60 por cento.

Só nos momentos difficeis, quando realmente as circumstancias do thesouro eram tão apuradas, que influiam no animo de todos, é que se conseguia estabelecer a contribuição addicional, e só então é que ella foi pedida. Ora, pergunto eu: chama-se a isto promover o augmento natural, espontaneo, successivo da receita publica?. Parece-me que não.

Emquanto que,, abandonada a idéa da matriz se conservar invariavel, antes, pelo contrario, dispondo as cousas para que ella vá todos os annos acompanhando, o desenvolvimento da propriedade, aperfeiçoando-se unicamente nos termos indicados por esta lei, os recursos para o thesouro hão de infallivelmente augmentar, o que será por certo mais efficaz 4o que o systema existente d'estes addicionaes que só se pedem em circumstancias extremas.

Ora, nem o sr. conde de Valbom, nem é sr. relator da. commissão, a quem n'este momento folgo de prestar homenagem por mais uma manifestação do seu talento, de que a camara toda foi testemunha, nem eu proprio nos achamos compenetrados de que a unica excepção que se deu á inalterabilidade religiosamente observada dos contingentes na modestissima importancia de 84:000$000 réis que o sr. conde de Valbom lhes acrescentou em 1864 fosse bastante para dar á contribuição predial a importancia que ella deveria ter, se acompanhasse regularmente o desenvolvimento da materia collectavel no paiz.

Disse o digno par, o sr. Serpa Pimentel, que receiava que por esta transformação no systema do imposto se levantassem graves resistencias, por parte de alguns, districtos que teriam de passar a pagar muito mais de contribuição predial. Mas, admittindo estas resistencias, como principio impeditivo para proceder, então teriamos de abandonar todos os systemas que tendessem a melhorar o lançamento e cobrança das contribuições; e muito mais haveria a receiar quando se propozesse alguma nova contribuição.

Ora, a prendermo-nos com estas considerações, nunca nos seria permittido podermos esperar obter do imposto aquillo que elle deve render, com melhor distribuição, isto é, proporcionando mais perfeitamente o sacrificio ás posses do contribuinte, com allivio relativo deste e lucro consideravel do thesouro.

Devo acrescentar que tendo ouvido insistir, tanto, quando estava elaborando as minhas propostas, em que este governo não procurava tirar das contribuições existentes, iodo o partido possivel, nem diligenciava desfazer essas grandes Injustiças na sua distribuição, contra as quaes todos: clamâmos, porquanto ha districtos que se vêem onerados com imposto na proporção 25 e 10 por cento da importancia total da contribuição predial em todo o paiz, e n'esta parte refiro-me particularmente ao districto de Lisboa e ao do Porto, que paga menos do que o de Lisboa, mas que satisfaz ainda assim mais de 9 por cento d'essa importancia total; a maior parte dos outros o que pagam é representado por uma percentagem insignificante desse contingente total; n'estas condições, julguei que correspondia a esses votos da opinião, procurando apresentar um trabalho consciencioso que tendesse quanto possivel a acabar, sem grande abalo, com essas injustiças e desigualdades que o systema actual tem conservado na divisão do imposto predial, mostrando d'esta fórma ao contribuinte, a quem ía pedir novos sacrificios, o empenho do governo em corrigir o mais que podesse ser todas essas injustiças e desigualdades, e estabelecendo para esse fim na minha proposta a doutrina que me pareceu a mais salutar.

Formulei assim uma serie de disposições que nos conduziram ao melhoramento desejado na distribuição do imposto predial, aperfeiçoando a sua base, isto é, as matrizes, e substituindo finalmente, por uma transição muito calculada e gradual, o systema de repartição pelo de quota. Entendi que por este modo não só se alcançava um beneficio para o thesouro, mas tambem para o contribuinte, porque a par do augmento da receita proveniente d'esta fonte tributaria se realisava um melhoramento sensivel na distribuição do imposto.

É innegavel que pelo systema que proponho, alguns districtos hão de vir a pagar mais, mas por outro lado, serão alliviados com justiça os que actualmente estão muito sobrecarregados, a fim de que todos paguem proporcionalmente, e se obtenha o que os economistas chamam perequação, quer dizer á possivel equidade na distribuição do tributo. E este o pensamento fundamental da minha proposta, o seu fim principal é fazer com que essa equidade seja um facto real, com o qual se ligue o facto fiscal e economico do augmento da receita publica; subordinado todavia este intuito fiscal e economico ao pensamento de justiça e equidade. E para que a transição do systema actual para o que proponho se possa fazer com as menores resistencias possiveis da parte d'aquelles districtos, que hoje pagam menos do que deviam pagar, estabeleço pelo artigo 7.º um systema de compensações successivas e graduaes que vá alterando, proporcionalmente os contingentes em ordem a harmonisal-os com a importancia da riqueza collectavel desses districtos, e a chegar á decima do rendimento, derivada de uma base legitima, qual é a de uma matriz rectificada.

Referiu-se o sr. Serpa á desnecessidade de alguns dos artigos d'esta lei, por conterem materia que é das attribuições do poder executivo. Até certo ponto assim póde julgar-se, e na verdade seria de todo escusada n'esta parte da proposta, se se conservasse o actual systema de repartição. É sabido que a revisão das matrizes se tem feito conforme as circumstancias o têem permittido, já por meio de inspecção directa, como determina o decreto de 1874, já pelas declarações unicamente dos louvados chamados a informar as repartições de fazenda sobre o rendimento collectavel de cada propriedade, formulando-se de cada vez as regras especiaes que deviam presidir a essa revisão.

E não admira que assim se procedesse; existindo o systema de contribuição de repartição, que pressupõe a possibilidade de obter elementos de informação compensadores que até certo ponto podessem rectificar o que houvesse de menos exacto nas. matrizes. Desde, porem, que se adopte o systema de contribuição de quota, as matrizes tomam por esse facto uma importancia, essencial, porque é sobre ellas unica e exclusivamente que se baseia a exacta determinação da quota parte do imposto que compete fazer a cada contribuinte. N'estas condições não póde ser indifferente a maneira por que se procede á revisão das matrizes, nem deve ficar ao arbitrio do executivo a escolha dos meios para obter esse resultado; e é pelo contrario indispensavel

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perceitual-o por lei, de modo que dê todas as garantias de se alcançar uma base segura para que a distribuição do imposto seja feita com a maxima equidade.

Sr. presidente, creio que o assumpto tem sido sufficientemente debatido, o eu não cansarei mais a attenção da camara, reservando-me para responder a quaesquer outras observações que os dignos pares entendam dever fazer a proposito de outras disposições do projecto.

O sr. Conde de Valbom: - Acha a questão que se debate altamente importante sob o ponto de vista da justiça distributiva e do augmento do rendimento do thesouro.

Não põe duvida em votar tudo quanto seja relativo a aperfeiçoamento e á melhor organisação das matrizes; o que não approva, porém, é a transformação proposta, porque lhe parece que deve difficultar essa organisação.

Depois de varias considerações, remata por dizer, que não dá o seu voto ao systema de quota, porque o reputa desnecessario e até prejudicial.

(O discurso ao digno par será publicado na integra guando s. exa. o devolver.)

O sr. Presidente: - Vae ler-se uma mensagem vinda da camara dos senhores deputados.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição de lei que tem por fim reformar a contabilidade publica.

Á commissão de fazenda.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, esperava que o sr. ministro da fazenda se levantasse para responder ao discurso do sr. conde de Valbom, cheio de conhecimentos profundos e de judiciosas reflexões, e proprio de quem estuda e examina vivamente as questões de fazenda.

Não succedeu assim, a minha expectativa foi completamente illudida, porque o sr. ministro respondeu a esse brilhante discurso que a camara acaba de ouvir, com o mais profundo silencio!

Parece que ao governo a discussão, a luz e a publicidade o incommodam!

Deixando registado este facto, que tem bastante significação, farei algumas considerações apenas para fundamentar o meu voto.

Não quero entrar em uma discussão que tem sido tão debatida pelos homens competentes e conhecedores da especialidade, muito versados em questões financeiras, e alguns dos quaes têem por vezes gerido a pasta da fazenda; limitar-me-hei, portanto, a justificar o meu voto contra o projecto.

Sr. presidente, em principio, em theoria, eu sou pelo systema da quota; na pratica sel-o-hei tambem quando as matrizes estiverem feitas o mais equitativamente possivel.

Quando a perequação existir votarei pelo systema da quota, porque, por esta fórma, o contribuinte pagará em conformidade do seu rendimento, e saberá o que lho compete pagar, o que não succede com o systema de repartição, que paga segundo a conta do empregado fiscal.

Emquanto, porém, as matrizes não estiverem feitas e organisadas de modo que possa haver, pelo menos, justiça relativa, o systema de quota parece-me mais vexatorio, porque sendo falsa, falsissima a base, os resultados hão de ser injustos e pouco lisonjeiros para o contribuinte.

Portanto, já se vê que a questão toda está na organisação das matrizes.

As matrizes são a base fundamental para ambos os systemas, comtudo com o systema de repartição póde ser corrigida nos districtos e nos concelhos a imperfeição, das matrizes na occasião dá distribuição do contingente.

Sr. presidente, receio muito dos homens theoricos, dos homens que attendem sómente aos livros, sem conhecer o meio em que a doutrina d'esses livros deve ser applicada.

As theorias em absoluto, sem conhecimento profundo da sociedade e dos factos que acompanham o seu desenvolvimento, são mais prejudiciaes na sua applicação do que na imaginação d'aquelles que vivem nas regiões aereas.

O sr. ministro da fazenda pecca um pouco neste sentido.

Eu desejaria que s. exa. em logar de estudar os livros e os systemas que se usam lá fóra, e de se impregnar só n'um ideal ficticio, descesse das regiões olympicas, e baixasse a este nosso pequeno e pobre Portugal, e aqui no estudo e exame dos factos de todos os dias, nas reclamações devidas á experiencia, e observação, moldasse os seus projectos com relação ás necessidades e conveniencias do paiz, e deixasse o que se passa nos outros paizes, que muitas vezes não tem applicação alguma.

Se s. exa. estudasse o que se tem passado no paiz, e conhecesse as causas de certas resistencias, saberia o que fez o sr. Braamcamp em 1869, que procurando substituir o systema de repartição pelo de quota, encontrou difficuldades de tal ordem, que impediram que fosse levado a effeito um projecto seu, tendente a estabelecer o systema da quota.

S. exa. saberia tambem que, n'essa epocha, o sr. Braamcamp tinha nomeado uma commissão extra-parlamentar, a que presidia, e da qual faziam parte os srs. Serpa Pimentel, Santos Silva e Fradesso da Silveira, e outros, com o intento de estudar estes assumptos.

Eu tambem tive a honra de pertencer a essa commissão, e ali, quando se discutiram os dois systemas, todos foram de opinião que, sem matrizes aperfeiçoadas, o systema de quota era nefasto.

Foi por isso que o sr. Braamcamp mandou primeiro fazer os arrolamentos, serviço difficilimo e importante de que encarregou o sr. Fradesso.

Sr. presidente, nas discussões que houve nessa commissão se mostrou á evidencia que o systema de quota só se poderia admittir, se se aperfeiçoassem as matrizes, e foi então que o sr. Fradesso da Silveira propoz que se fizesse o arrolamento geral das propriedades.

O sr. Fradesso, encarregado d'este serviço, tratou de ver se o levava a effeito.

Escolheu o pessoal, que não foi o mais proprio, nem o mais competente.

N'essa occasião, choveram de todos os lados as queixas, as reclamações, e por fira o paiz levantou-se contra os arrolamentos, e tinha rasão, porque as pessoas que iam fazer a inspecção eram nomeadas mais para satisfazer certos fins politicos do que para conhecerem o serviço de que estavam encarregadas.

A maior parte do pessoal era completamente ignorante do assumpto, e aquelles que o não eram, attendiam mais ás conveniencias politicas.

Daqui resultou toda a qualidade de vexame, e as desigualdades tornaram-se mais sensiveis. Os interessados queixavam-se em altas vozes, o povo fazia côro com elles, pois fal-o sempre quando se trata de .gritar contra o imposto, o ministerio cedeu e fraquejou, e a medida do sr. Braamcamp, deixada ao desamparo, não produziu resultado.

Estude pois o sr. ministro com criterio, o que se passou n'aquella epocha, para não cair nas mesmas faltas e nos mesmos erros.

Se s. exa. conhecesse bem estes factos, se os examinasse devidamente, de. certo, reconheceria que a primeira cousa a fazer era organisar convenientemente as matrizes, em logar de estar a preceituar para d'aqui a seis annos, como se os seus successores estivessem obrigados a sustentar as suas utopias.

Se s. exa. deixasse a theoria pela pratica, pelo que é exequivel, s. exa. teria ouvido sobre o assumpto os delegados do thesouro e os escrivães de fazenda que fossem mais competentes, pela pratica que têem d'estes negocios,

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e com elles estudaria o modo de chegar ao fim desejado - de resolver este importante problema.

O sr. ministro deve-se convencer que as sciencias politicas são sciencias de observação, mas que essa observação se faz no passado, porque as experiencias, quando se trata da felicidade e bem estar de milhares de pessoas, não se podem fazer senão com muita cautela e prudencia, e por isso devemos ir buscar na historia, n'esse deposito inesgotavel de experiencias, de factos e de observações, lição para não cair nos erros dos outros.

Parecia-me que o governo com a lição do passado devia ser mais prudente, e que era melhor ir pouco a pouco, e só procurar o que fosse exequivel; parecia-me que o sr. ministro da fazenda tinha feito muito melhor se viesse a camara trazer um projecto apenas para encorporar os addicionaes no principal da contribuição, e pedisse ao mesmo tempo auctorisação para reformar as matrizes, debaixo de certas bases, chamando homens práticos e competentes, para com elles discutir, e ver o modo possivel de se obter o almejado intento.

Não procedeu assim s. exa.

Com o prurido de legislar apresentou um projecto do sua imaginação eme ninguem entende, onde se embrulham os dois systemas de quota e repartição, e onde se complicam os serviços por tal fórma, que os empregados encarregados d'elles ver-se-hão num labyrintho inextrincavel.

Por isso muito bem disse o sr. Carlos Bento, e com bastante espirito, que o projecto não dava nada, que não dava senão a excepção do artigo 15.°, que é o favor de isentar de contribuição as casas que forem construidas e que renderem menos de 50$000 réis.

A defeza do sr. Carlos Bento, a sua observação a favor de um projecto, que o sr. ministro da fazenda considera tão importante, foi esta apenas.

Ora, quando o sr. Carlos Bento diz isto, estou convencido que o projecto, devaneio de imaginação do sr. ministro, é inutil, e que não dará o resultado que o sr. ministro da fazenda espera alcançar, o que prova que o ler muito confunde ás vezes, o que vale mais o bom senso, o exame serio dos factos e o conhecimento das cousas, que a leitura dos livros, onde muitas vezes as theorias pelo absoluto são inapplicaveis.

Uma das cousas que tem feito muito mal ao nosso paiz é nós querermos, em logar de aperfeiçoar as nossas instituições, governar-nos pelo que vemos lá fóra, sem procurar conhecer qual é a indole do paiz e só os seus habitardes estão preparados para essas innovações.

O espirito de imitação, a tendencia para macaquear o que se faz no estrangeiro tem-nos feito muito mal. Eu prefiro o aperfeiçoamento das instituições antigas e nacionaes á importação de innovações para as quaes o paiz não está preparado.

Eu conterão que desejava antes que não se tivesse introduzido entre nós o systema de repartição estabelecido em 1852, e que tratassemos da aperfeiçoar o systema que então tinhamos, que era da quota, tirando-se-lhe defeitos que n'elle existiam, e os attritos e vexames que elle podesse conter. Eu prefiro as instituições á portugueza ás afrancezadas. É difficil acostumar o paiz a qualquer innovação; emquanto áquelle systema já estava acclimado, e a elle já o contribuinte eslava acostumado. Era pois mais facil aperfeiçoar o systema que tinhamos, do que estabelecer outro novo, que podia ser muito bom para a França e Inglaterra, onde estava implantado, e que são paizes muito differentes do nosso.

Sr. presidente, esta propensão que ha entre nós para imitar tudo o que se faz lá fóra, tem prejudicado bastante este paiz, e tem-lhe custado muitos milhões. Nós temos por este espirito do macaquear, abandonado instituições optimas, e que têem sido aproveitadas por outras nações. Por exemplo, n'outros tempos nós tinhamos a organisação do exercito a mais perfeita, e tanto que a Prussia tirou um grande partido d'ella para organisar o seu exercito! Emquanto que a Prussia, nação guerreira e militar, procedia assim, nós abandonamlo-a, e punhamol-a de parte para imitarmos a França. O resultado foi que nós hoje não temos exercito e a França, que imitámos, foi completamente batida e derrotada pela Prussia.

Continuando as minhas modestas reflexões, e sem animo partidario, permitta-me o sr. ministro da fazenda que lhe de um conselho. Eu entendia que s. exa. fazia melhor se em logar de querer reformar tudo, apresentando no parlamento propostas sobre propostas, se limitasse a fazer cumprir as leis que temos; do seu cumprimento á risca resultaria certamente entrarem no thesouro milhares e milhares de contos em debito. N'este sentido não vejo que s. exa. tomasse providencia alguma, nem tão pouco que aqui fosse discutido um só projecto! O que vejo é pedir novos impostos e aggravar os existentes.

Ora, se o governo quer seguir este caminho tem obrigação rigorosa: 1.°, de manter a mais stricta economia; 2.°, de fazer arrecadar nos cofres publicos as contribuições em divida, não usando de contemplações para ninguem; 3.º, de apresentar ao poder legislativo quaesquer medidas que sejam de reconhecida efficacia para o conseguimento do fim que todos devemos ter em vista - melhorar as finanças.

Posto isto, desejava que o sr. ministro da fazenda me dissesse quantos mil contos de contribuições atrazadas estão por cobrar, e quaes as providencias que tenciona tomar para fazer entrar no thesouro essa divida; e desejaria tambem que o sr. ministro da fazenda me dissesse em quanto calcula por anno a despeza com o serviço da reforma das matrizes.

S. exa. deve saber, pouco mais ou menos, a quantia que para isso julga necessaria e indispensavel; portanto, poderá, creio eu, responder-me e fazer conhecer á camara a sua opinião a este respeito.

Sr. presidente, a materia esta sufficientemente esclarecida; todos reconhecem a desvantagem da mudança do systema de repartição para o systema de quota emquanto as matrizes não estiverem reformadas e aperfeiçoadas.

Sr. presidente, já que adoptámos o systema do repartição, e que está acclimado entre nós, deixemol-o estar.

Pela minha parte direi que o systema em vigor não é tão mau que não exista ha numerosos annos em Franca e em Inglaterra.

Em França, apesar das differentes revoluções que ali se deram, este systema continuou sempre até agora, e até na occasião em que a França teve de pagar á Prussia a enormissima contribuição de guerra.

Se a França e Inglaterra, duas das principaes nações da Europa pelo seu saber, illustração e riqueza, o conservam, é porque lhe encontram alguma cousa e boa.

Pois a França e Inglaterra, que têem economistas distinctissimos, homens politico de primeira plana, financeiros praticos e da maior illustração, conservam este systema ha tantos annos?

É que estes dois paizes entendem que as innovações são perigosas, e que o melhor é aperfeiçoar as instituições a que o paiz já está habituado, e que as theorias, posto que em absoluto tenham rasão de ser, na pratica é necessario primeiro accommodal-as ao meio em que vão ser implantadas.

A Inglaterra, apesar das grandes despezas que teve a fazer por causa das complicações da questão do Oriente, do que gastou com a guerra da Zululandia e com a do Afganistan, e apesar do estudo da economia politica ser ali cultivado com todo o esmero e cuidado, conserva ainda o mesmo systema, porque pela experiencia reconhece que os resultados que elle dá são proficuos, emquanto se o substituir por outro serão incertos e duvidosos.

Sr. presidente, a França, apoiar das difficilimas complicações em que se tem visto, apesar de ter de recorrer ao

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imposto, em larga escala, para se libertar das humilhações estrangeiras, apesar da sciencia economica, administrativa e financeira ser ali perfeitamente cultivada, tambem não alterou o seu systema de imposto, e lá tem ainda a contribuição de repartição! E porque procedem assim os homens politicos a quem estão confiados os destinos destas duas nações? É porque elles entendem que é extremamente perigoso sujeitar o paiz a experiencias audaciosas, e que a responsabilidade é enormissima quando com essas experiencias se póde atacar a propriedade e o bem estar de uma nação.

Sr. presidente, tendo motivado o meu voto, concluirei, aconselhando ao sr. ministro prudencia, persistencia e moderação.

O sr. Fontes Pereira de Mello: - Não approva a generalidade do projecto, posto que concorde com algumas das suas disposições, porque entende que a transformação do systema de repartição pelo de quota, póde trazer graves perigos. Julga que o projecto ou não é cousa alguma, ou é um grande perigo.

Se não é cousa alguma, para que trazei-o ao parlamento? Se se trata, porém, de reformar ás matrizes, de se chegar por esse processo á verdade dos factos, que nesse caso lhe cumpre, declara francamente que nenhum governo terá força para executar esse projecto.

Acredita no zêlo, na intelligencia e nos conhecimentos dos seus successores e antecessores na pasta da fazenda, mas o que não acredita é que tenham mais zêlo e mais vontade que elle, orador.

Trabalhando oito annos, como ministro da fazenda, não logrou conseguir o que a outros ministros se afigura facil e realisavel.

Acha que andam em erro os que querem ir buscar á propriedade os meios de equilibrar o orçamento. Não póde condescender com a opinião, se é que a opinião leva o governo a querer este projecto.

Nota que a transformação mais ou menos immediata para o systema da quota com a inspecção directa, é mal vista pelo paiz; com a medição de todas as propriedades, a apreciação de todos os seus rendimentos e a deducção de todos os encargos, é que ha de fazer apparecer os perigos.

(O discurso do digno par será publicado quando s. exa. o devolverá)

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): - Sr. presidente, quando eu vi o digno par, o sr. Fontes Pereira de Mello, cuja influencia no nosso paiz é tão grande, cuja voz eloquente é sempre escutada por esta assembléá com tanta attenção e respeito, levantar-se da sua cadeira e deixar como que irromper com tanto enthusiasmo a voz da consciencia, temi ver operar uma grande transformação na atmosphera politica d'esta casa, pouco antes trio desanimada, e aquecendo de repente a ponto da que todos os animos pareciam deixar-se arrastar pela voz eloquente de s. exa., que n'esse momento era de. certo movido por uma convicção profunda, que o levava a consignar solemnemente a declaração formal do seu voto e a rejeição terminante de um projecto que reputava não só inconveniente, mas inconstitucional.

E esse escrupulo era tamanho que nem bastou para o dominar o respeito que ao digno par declarou merecer-lhe a opinião auctorisada de um eminente jurisconsulto e distincto membro d'esta casa, que todos nós considerâmos e respeitâmos em extremo, (Apoiados.} pelas suas altas qualidades de intelligencia, vastos conhecimentos, seriedade de caracter e profundeza de convicções: refiro-me, inutil o dizel-o, ao sr. Mártens Ferrão. (Apoiados.)

Ouvindo asseverar ao digno par do modo mais terminante que era firme a sua convicção, não obstante ser outra a opinião de um homem que é considerado com rasão mestre em direito publico, declaro a v. exa. e á camara que eu, homem novo, reconhecendo amplamente a fraqueza das minhas faculdades, cheguei a, assustar-me e pensei por um momento de natural incerteza sobre se a camara, arrastada pela voz inspirada do digno par, não acabaria por julgar em sua saboderia que neste projecto o governo havia sido menos bem inspirado e que a sua apresentação representava de facto um insulto á constituição do estado.

Porem o correr de tão apaixonada oração depressa me socegou, porque vi que s. exa. não apresentava argumento algum que podesse modificar o meu modo de pensar a tal respeito, e parecesse de natureza a influir no animo da camara.

Sr. presidente, fallou-se em menosprezo da constituição! Onde está a inconstitucionalidade d'este projecto? Pois v. exa., sr. presidente, que respeita como aquelles que mais respeitam a constituição do estado, poderia acaso apoiar um governo que formulasse propostas que por alguem podessem com fundamento taxar-se de inconstitucionaes?

Duvida constitucional poderia havel-a, mas sómente no que respeitasse á votação annual do imposto: mas a tal respeito fiz já declarações categoricas na outra casa do parlamento, e como prova do meu respeito pelos escrupulos com que devem ser mantidas as disposições constitucionaes, concordei na introducção na minha proposta de uma clausula no sentido de tornar bem claro o pensamento do governo no assumpto.

Nem creio mesmo que houvesse governo que viesse propor ao parlamento a abdicação de uma das suas prerogativas essenciaes, cerceando-lhe o direito de votar annualmente as contribuições directas, nem parlamento que sanccionasse um tal attentado.

Mas disse eu, que no momento em que ouvi uma voz tão auctorisada, uma opinião tão respeitada dentro e fora desta casa, como é a do sr. Fontes, estadista illustre que todos consideram, afiançar era plena sessão da camara dos dignos pares que o projecto de lei que se discute era inconstitucional, temi que esta asserção, de cujo fundamento aliás eu duvidava podesse influir no animo d'esta camara; mas depois ao ouvir os argumentos, já por mais de uma vez apresentados, e por mais de uma vez rebatidos em que tal opinião se firmava, soceguei o meu espirito, confiado na bondade da minha causa, e em que a camara havia de fazer d'ella apreciação imparcial; e forte com essa confiança, seguro das minhas convicções, e auctorisado até com os proprios precedentes dos meus illustres adversarios, entendi, se bem que reconhecesse a fraqueza dos meus recursos intellectuaes, que podia n'este ponto acceitar a lucta, embora tivesse em minha frente um homem tão distincto, um tribuno tão eminente como o digno par o sr. Fontes.

Tenho bem presente no meu espirito as opiniões da s. exa. consignadas no seu relatorio de 1872, a que já me tenho referido por mais de uma vez, documento que estudo sempre, como estudo todos os trabalhos de tão eminente estadista que me podem servir de guia nos actos da minha vida publica.

Acceitando e partilhando essas opiniões do digno par a quem alludo, eu na minha proposta que hoje se discute, não fiz senão o que s. exa. já praticara quando substituiu em uma das nossas contribuições o processo de repartição pelo da quota.

Pois em verdade o que fez o digno par quando em 1872 veiu propor ao parlamento a transformação da contribuição pessoal?

Porventura essa contribuição deixa de ser uma contribuição directa, e transformando-a s. exa. n'uma contribuição de quota, entendeu-se acaso que ferira por esse facto a carta constitucional?

Propondo hoje uma transformação similhante para outra contribuição directa, acabando com o imposto de repartição, tal qual s. exa. não hesitou em transformar em tempo o imposto pessoal, será isto offender a carta?

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Mas, sr. presidente, como póde e deve interpretar-se! esta expressão de repartir o imposto?

Será unicamente repartil-o em contingentes por districtos, e depois por concelhos, determinando mais ou menos arbitrariamente o que a cada um deva pertencer, ou será antes e mais rasoavelmente definir o modo, estabelecer os preceitos, segundo os quaes a distribuição ou repartição haja de fazer-se individualmente, definindo-se o modo e a quota que compete pagar cada contribuinte?

Isto é que me parece dever ser a interpretação logica da carta, que não falla em contribuição predial, mas sim em contribuição directa, e admittida a interpretação do sr. Fontes Pereira de Mello, viveremos fóra da carta, mantendo como hoje estão as contribuições industrial e de renda das casas.

A parte politica, essencial, verdadeiramente constitucional, e que ninguem póde pensar era alterar, é a votação annual do imposto, por meio da qual se dá ao governo os recursos necessarios para elle poder governar, e cuja negação importa a impossibilidade de se manter no poder contra a vontade das duas camaras.

O digno par o sr. Vaz Preto fez-me a honra de me dirigir algumas phrases, em que fazendo justiça aos meus bons desejos, aos esforços que eu empregava para acertar, acrescentava que só era para lamentar a ignorancia que eu revelava com relação a certos factos passados no nosso paiz; direi comtudo a s. exa. que, por muito pouco que eu saiba, não devo nem posso ignorar o que se passou ainda ha pouco tempo, em 1869, quando se tentou igual mudança do systema do imposto, passando do de repartição para o de quota; e é exactamente a historia e o pleno conhecimento d'esses factos o que levou ao meu espirito a convicção de que era impossivel, por absoluta carencia do pessoal habilitado e de meios, obter simultaneamente no paiz inteiro matrizes aperfeiçoadas, passando sem transição no praso de um anno para o systema de quota, por isso pedi seis asnos, o que não impede ainda que sendo indispensavel se peça ao parlamento a prorogação d'esse praso, para se poder dar plena execução a esta lei: foi o conhecimento d'esses factos, de 1869, foi o estudo que tenho feito das cousas do meu paiz, foram esses abundantissimos esclarecimentos que aponto no meu relatorio, e que devem ser conhecidos de todos os dignos pares, foi a opinião de muitos homens competentes que me levaram a formular este projecto.

Se eu desconhecesse muitos d'esses factos, como, com grande surpreza minha me parece que o digno par o sr. Fontes os desconhecia, poderia talvez ter hesitado diante dessa difficuldade que ao digno par pareceu insuperavel da inspecção directa.

Mas, sr. presidente, poderá porventura ignorar o sr. Fontes Pereira do Mello que no gabinete presidido por s. exa., o seu collega da fazenda, o sr. Serpa Pimentel, publicou em 1874 um decreto mandando proceder á revisão das matrizes, e determinando que para base d'essa revisão se procedesse a inspecções directas dos predios?.. . De que recursos dispunha então o governo?. .. Que meios lhe estavam votados?. .. Não tinha outros mais dos que eu estabeleço no meu projecto, não tinha outros alem dos que desde o decreto de 1852, referendado por s. exa., têem sido postos á disposição do governo para a successiva revisão das matrizes.

E s. exa., o sr. Serpa, procedeu com esses meios á inspecção directa em quatro districtos, e conseguiu um melhoramento effectivo nas matrizes, que redundou num augmento collectavel de 200:000$000 réis e 800:000$000 réis em cada um d'elles. Tudo isto sem se votarem meios extraordinarios, e segundo parece sem que o proprio sr. Fontes, o chefe do gabinete, tivesse conhecimento do facto.

A impossibilidade absoluta que s. exa. pretendeu encontrar para a execução d'este projecto, não tem portanto rasão de ser, e o que lh'o prova é precisamente e procedimento de um seu collega no ministerio.

Sr. presidente, não pretendo ir mais longo que o meu antecessor. No trabalho por elle emprehendido, ha muito que aprender, ha muito que aproveitar, colhe-se ali lição importantissima, porque, para certos districtos até se formularam instrucções muito minuciosas adaptadas ás condições e grau de illustração do paiz.

Aproveitando os trabalhos realisados em tempo de s. exa., e modificando-os de accordo com a lição da experiencia, é o ponto de vista particular em que o governo se collocou, procurei dar-lhes a força de preceitos legaes no projecto, e espero que hei de obter no resto do paiz, pelo menos, o mesmo resultado que se alcançou nos quatro districtos do sul.

Intercalada com as considerações sobre o projecto, dirigiu o digno par ao governo accusações de intransigencia, acrescentando que só o via ceder, não perante a força dos argumentos, mas sim perante pressão estranha. Não me admira que isto aconteça, a paixão politica impelle involuntariamente para a contradicção.

Depois de haver sido arguido como reaccionario parecia sel-o como radical. Accusado a principio pelos dignos pares de nimiamente condescendente, a ponto de deixar transformar os meus projectos, e de abdicar das minhas opiniões, hoje lança-se-me em rosto uma contemporisação prudente, com uma opinião talvez pouco justificada, mas sincera, que a classe commercial acaba de perfilhar de modo mais ostensivo. A esse respeito deixo aos dignos pares apreciar o meu procedimento conforme entenderem, mas lembrarei o que tenho dito, e repito ainda, isto é, que emquanto entender que a minha presença no ministerio póde ser um elemento util para se alcançar um beneficio importante para o paiz, com o augmento da receita publica, hei de conservar-me aqui, porque não me domina outro pensamento que não seja o de concorrer para melhorar o nosso estado financeiro, para auxiliar os meus collegas no empenho de assegurar os grandes interesses que andam ligados á manutenção do nosso credito publico.

No momento, porém, em que tenha a convicção de que não posso concorrer para se conseguir esse resultado, declaro a v. exa. e á camara que nem mais um instante permanecerei num logar que nunca ambicionei. Os factos mostrarão a verdade do que estou dizendo, nem eu estava durante oito annos retirado de toda a ingerencia nas cousas publicas, envolvido na mais completa obscuridade, para ter agora a triste ambição de occupar um logar que concita contra mina as malquerenças hoje dos contribuintes, ámanhã dos funccionarios.

Não é, creia-o o digno par, o pensamento de uma ambição mesquinha e injustificada, que me retem n'estas cadeiras, e se nem todos me fazem a justiça de o acreditar, o tempo provará que outros motivos houve para eu ter as condescendencias e ao mesmo tempo as intransigencias de que sou accusado e que hoje se combatem com tamanha acrimonia. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu podia talvez n'este momento fazer a v. exa. e á camara a leitura de alguns documentos que tenho presentes, e que provam do modo mais cabal a conveniencia e possibilidade de uma revisão das matrizes bastante aperfeiçoada.

«No districto de Portalegre, diz-se num desses documentos, portanto, como que recomeçaram os trabalhos. No de Boja esporo que poderão estar concluidos para a repartição da contribuição do anno corrente. Nos de Evora e Faro, podem reputar-se concluidos, ainda que neste ultimo não está ainda terminado o processo das reclamações sobre as novas matrizes, em consequencia de revisões a que foi necessario proceder quanto ao serviço do concelho do Lisboa.»

Ora, sr. proficiente, disse-se aqui que em epocha alguma se conseguiria a revisão das matrizes sobre a base da ins-

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pecção directa, sem levantar uma enorme resistencia em todo o paiz, e ainda que era inutil pensar em modificar de um modo essencial a distribuição pelos districtos. Mas quando eu vejo manter uma accusação permanente contra todos as governos, por não empenharem as necessarias diligencias para alcançar uma mais equitativa repartição do imposto, e com ella o unico meio de o fazer subir, conseguindo-se um melhoramento sensivel para a fazenda publica; quando por outro lado se vê o que dá a contribuição directa, e o que hoje se tira das contribuições indirectas, que vão sobrecarregar principalmente as classes pobres, parece-me justo que se envidem esforços para alliviar um tanto essas classes populares, indo buscar á propriedade, com uma equidade maior na distribuição, um recurso valioso para augmentar as rendas do thesouro publico. (Apoiados.)

Quando se vê diariamente pela expropriação, pelos emprestimos realisados pelo banco hypothecario, pelos contratos de venda, que a matriz está muito abaixo da verdade, que não accusa o valor real da propriedade, não será justo tentar alliviar no futuro o contribuinte pobre, o consumidor, e procurar na propriedade um augmento notavel de receita?

Ora este projecto parece-me satisfazer a estas indicações da opinião publica de todo o paia, e foi por isso geralmente bem recebido.

É necessario, é indispensavel que haja justiça, e que em materia de imposto se mantenha o grande principio da igualdade perante a lei. (Apoiados.)

É isto que tem em vista o meu projecto. Tenho confiança que isso se conseguirá quando levada á execução a lei que discutimos; tal é, pelo menos, a convicção que me anima hoje, e me animou ao apresental-o.

Solicitando para elle a vossa approvação, creio defender os bons principios em materia de imposto, e prestar homenagem a um sentimento digno e elevado, o amor pela justiça. (Apoiados.)

O sr. Presidente: - Está a dar a hora. A primeira sessão será ámanhã, 27 do corrente, continuando a mesma ordem do dia.

Está levantada a sessão.

Eram quasi cinco horas da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 20 de abril de 1880

Exmos. srs.: Duque d'Avila e de Bolama; João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens; Duques, de Loulé, de Palmella; Marquezes, de Fronteira, de Vallada; Condes, de Avilez, de Bertiandos, de Cabral, de Castro, de Linhares, de Podentes, da Ribeira Grande, de Valbom; Bispo eleito do Algarve; Viscondes, de Alves de Sá, de Borges de Castro, de S. Januario, de Ovar, de Soares Franco, do Seisal, de Valmór, de Bivar; Barão de Ancede; Quaresma, Barros e Sá, D. Antonio de Mello, Sousa Pinto, Couto Monteiro, Fontes Pereira de Mello, Rodrigues Sampaio, Serpa Pimentel, Coutinho de Macedo, Cau da Costa, Xavier da Silva, Palmeirim, Carlos Bento, Eugenio de Almeida, Montufar Barreiros, Fortunato Barreiros, Margiochi, Andrade Corvo, Mendonça Cortez, Mamede, Braamcamp, Castro, Reis e Vasconcellos, Raposo do Amaral, Mello e Gouveia, Costa Cardoso, Mexia Salema, Luiz de Campos, Daun e Lorena, Camara Leme, Ornellas, Seixas, Vaz Preto, Franzini, Mathias de Carvalho, Canto e Castro, Placido de Abreu, Calheiros, Thomás de Carvalho, Ferreira Novaes, Sequeira Pinto, Costa Lobo, Barjona de Freitas, Miguel Osorio.

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