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nhã, que por isso como tinha pedido a palavra para uma explicação, a qual não poderá dar posto que seja mui breve, visto o grande numero de oradores que ainda estão isentos, se não se lhe conceder de usar agora da palavra, por isso pede esse favor (apoiados).

O sr. Presidente: — Creio que a camará não terá duvida (apoiados). Tem a palavra.

O Orador: — A sua explicação será o mais resumida possivel, até mesmo porque o sr. ministro a que tem de responder não se acha presente.

O sr. Ministro da justiça: — Assim que acabe a discussão em que na outra camará está empenhado o sr. ministro da fazenda, aqui virá logo.

O Orador:—Ê um pouco tarde. O sr. Ministro da Justiça: — Ás quatro horas. O Orador: — Esta explicação nada tem de offensiva para o sr. ministro, pôde portanto da-la na sua ausência; e como a camará lhe concedeu a palavra vae usar d'ella agora.

Tinha dito no seu discurso que sentia que o governo, pela imprensa ministerial, mostrasse que o seu systema de governar era revolver o passado, e não apresentar boas medidas, sustenta-las e convencer os corpos legislativos e a nação de sua conveniência: e sente que o sr. ministro da fazenda, na resposta que deu ao seu discurso, querendo tomar em consideração algumas palavras n'elle ditas, viesse auctorisa-las, pois procurou justificar um acto seu e do governo, revolvendo o passado. S. ex.* disse n'um tom realmente offensivo para elle orador, que o mesmo tinha na sua vida publica actos que não podia deixar de trazer á lembrança da camará; e para o tornar odioso apresentou as demissões dos srs. Mousinho de Albuquerque e José da Silva Carvalho.

Parecia-lhe cousa assentada entre todos não trazer mais . á discussão actos que se passaram em epochas agitadas, em que todos os partidos, governo e opposição, sem excepção de nenhum, praticaram .actos que no estado normal não praticariam; mas como assim não é, vê-se na neces-, sidade de observar em primeiro logar que essas demissões não são filhas só da sua iniciativa, mas de todo o ministério que tomou a sua responsabidade; e crê que nenhum dos que fizeram parte dos dois gabinetes que as deram, se recusará a tomar, ainda hoje, essa responsabilidade; e em segundo logar que explique á camará as duas demissões. A do sr. Mousinho de Albuquerque teve por fundamento, em 1841, a sua proposta de uma mensagem á coroa, em que esse illustre cavalheiro pedia a Sua Magestade em nome do parlamento que demittisse o ministério a quem fazia as mais graves aceusações, entre as quaes as de corrupção. Dito isto, pergunta se depois de um caso d'estes um ministério tão altamente aceusado podia continuar a dar a sua confiança a um homem que no parlamento apresentava uma mensagem d'esta natureza?

Pelo que respeita k do sr. José da Silva Carvalho, disse que ninguém mais do que elle sentiu esta demissão, e ap-pellou para o testemunho do sr. presidente. Foi ella dada n'uma occasião de convulsões politicas, em que o governo se viu na necessidade de adoptar uma medida politica de grande importância —o decreto de 1 de agosto. O primeiro corpo da magistratura, com o sr. José da Silva Carvalho á frente, oppoz-se a esta medida que o governo julgava absolutamente indispensável. Depois que a mensagem foi levada á presença de Sua Magestade, o governo tinha só dois caminhos a seguir: ou retirar-se, o que era altamente prejudicial á causa publica n'aquella occasião, ou sustentar a sua medida com um acto de força sobre o individuo que exercia um emprego de confiança do governo, eque nunca devia ser órgão d'essa mensagem. Confessa e novamente chama o testemunho do sr. presidente da camará, que elle e os seus collegas foram obrigados a praticar este acto; e que o motivo foi só este, e não por intolerância. Que n'essa occasião deu o sr. presidente da camará uma prova de que sabia ser bom amigo politico e bom amigo pessoal. Bom amigo politico, dizendo que não se podia recusar, attentas as circumstancias em que se achava o paiz e o governo, de aceitar a commissão exercida por um homem de quem era antigo amigo; bom amigo pessoal, porque só aceitou com a condição de que logo que esse amigo voltasse a ser amigo politico do governo, n'esse mesmo dia havia de pedir a sua demissão; e com effeito, elle, sr. conde, teve a satisfação de reintegrar mui brevemente aquelle illustre cavalheiro. É este um dos grandes actos de intolerância de que foi aceusado. Como disse, não esperava o orador que estes factos fossem trazidos á discussão, tendo passado dezesete e vinte annos sobre elles; e muito mais havendo actos análogos praticados em satisfação ao sr. ministro, que tão a propósito recordou aquelles.

Ninguém pôde ter esquecido que houve uma epocha n'este paiz, em que o Demosthenes portuguez, deixem-n'o assim dizer, o sr. Almeida Garrett, fez um discurso violentissimo contra o governo, n'uma questão, que este declarava que não era ministerial; e que o objecto de todas as invectivas e injurias d'esse discurso foi a pessoa do sr. Antonio José d'Avila. Em satisfação de s. ex.* julgou-se então necessário dar a demissão ao auctor do discurso, não de um cargo politico que exercesse, mas dos de chronista mór do reino, e inspector geral dos theatros. S. ex.a devia lem-brar-se, antes de fallar n aquellas duas demissões, que tinham ellas motivo justificado nas circumstancias em que então se achava o governo; e que ainda havia esta que também não devia ter esquecido.

Pelo que respeita á demissão em que aqui fallou, disse que a camará havia de estar lembrada de que não se queixou do governo pelo ter demittido; e nem podia queixar-se pois reconhecia que o governo estava perfeitamente no seu direito, tanto mats^que fora elle próprio que a pedira, e por mais de uma vez. NoTnomento em que chegou ao Bio de

1 Janeiro a noticia da mudança do ministério, a cuja confiança devia a sua nomeação, escreveu o orador a pedi-la principalmente por haver sido aquelle gabinete substituído por outro a que presidia o sr. marquez de Loulé, cujos precedentes politicos o levariam talvez a ser membro da opposição parlamentar. O que porém o orador extranhou e extra-nha, foi ter-se-lhe dado a demissão depois do sr. ministro dos negócios estrangeiros e da fazenda o ter assegurado de que lh'a não dava, por isso mesmo que o novo pedido que lhe fizera, fundava-se principalmente em querer collocar o sr. ministro em posição vantajosa com relação aos periódicos que sustentam o ministério. Que o Portuguez e o Jornal do Commercio diariamente pediam a sua demissão; e disse por isso a s. ex.* que se para não desmerecer d'estes periódicos e da imprensa ministerial, o sr. ministro entendesse que devia dar-lhe a demissão, de bom grado a aceitava, podendo até s. ex.* dar por fundamento o seu pedido. Foi um acto de pura deferência e de amisade, de collega antigo e de amigo sincero, porque não obstante as iras do sr. ministro da fazenda contra o orador, ainda respeita da mesma maneira o sr. ministro, e continua a ser seu amigo; mas por isso mesmo não pôde deixar de sentir que, havendo s. ex.* declarado que não lhe dava a demissão, por isso mesmo que o Portuguez a exigia, acrescentando que este jornal fazia politica por sua conta, fosse depois achar pretexto para demitti-lo, não no seu discurso sobre as irmãs da caridade, mas na carta por elle escripta á Independência Belga, rectificando algumas inexactidões de um artigo que aquelle jornal publicou acerca d'esta questão; e explicando os factos de uma maneira muito mais suave do que tinha feito no discurso.

É esta a única explicação que tem a dar para que q publico saiba a rasão da sua exoneração, e a da resposta retrospectiva do sr. ministro. Quando disse que o governo tinha sido intolerante, não foi por ter-lhe dado a demissão, mas por a dar pelo motivo que s. ex.* sabe; pois conserva em seu poder documentos pelos quaes pôde provar que foi para satisfazer a imprensa ministerial que o governo obrou assim. Não lê taes documentos porque não quer cançar a camará, e limita-se a esta explicação.

O sr. Presidente:—Não estando presente os dignos pares conde da Taipa, e marquez de Vallada que são os dois primeiros inscriptos, tem a palavra o sr. visconde de Algés.

O sr. Visconde de Algés: — O estado muito precário de minha saúde obriga-me a uma declaração quasi igual á que fez o sr. conde de Thomar, pois também como s. cx.a terei de ir brevemente para o campo, e, se hoje me não coubesse a palavra, provavelmente não tomaria parte n'esta discussão; mas como v. ex.a m'a concede por me competir na ordem da inscripção, usarei d'ella para fazer breves e suc-cintas reflexões.

Se alguém ha que esteja persuadido de que vae longa esta discussão não partilho eu essa opinião; pelo contrario entendo que em assumptos de tão alta importância e transcendência como este não é perdido, mas empregado em proveito do paiz, o tempo que se gasta em esclarecer a matéria. Se porém alguma cousa ha que possa escurecer o brilho d'esta discussão será o meu discurso, porque o limitado contingente do meu talento colloca-me em grande distancia dos altos voos da capacidade e saber dos illustres oradores que me precederam. Certo d'esta circumstancia, e para ver se pela novidade de methodo poderei atrahir alguma attenção e captar a benevolência dos meus nobres collegas, procurarei desviar-me da senda que outros têem trilhado, e encarar o assumpto por diversa maneira.

Antes porém de começar as minhas observações, cum-preme fazer uma solemne declaração. Ouvi dizer a um dos primeiros illustres oradores que tomaram parte nesta discussão, que a questão acerca das irmãs da caridade era uma arma politica que se pretendia manejar contra o governo. Pela minha parte, e appello para a historia da minha vida parlamentar, que é já longa, não costumo mover-me por tal incentivo; não sei nem quero saber se ha n'isto o manejo de alguma arma politica, o que sei com intima persuasão é que se trata de um objecto muito importante, e que por isso mesmo que o é, e pelas circumstancias de que se acha revestido, não deve servir de arma politica (apoiados), não é d'aquelles que sem inconveniente se podem converter em meio de opposição, e tenho por menos acertado o emprega-lo como instrumento para tal fim contra qualquer governo (apoiados), confundindo-se as vantagens que d'elle possam resultar com o desejo de derribar um ministério, qualquer que elle seja. Considero pois o meio de opposição nada importante para o comparar aos resultados que pôde produzir a boa resolução de um assumpto importante, qual é este que tende a dotar o paiz de grandes benefícios. Portanto, ao oceupar-me d'esta questão não levo em vista favorecer, nem guerrear o governo, mas sim expor francamente o meu modo de a ver e considerar.

O thema d'este debate foi uma interpellação vocal e instantânea, sem se guardarem as formalidades usadas, que o sr. conde de Thomar dirigiu ao sr. presidente do conselho em 23 do passado, por ver publicado no Diário ãe Lisboa d'esse dia o decreto de 22 com referencia ás irmãs da caridade. O sr. conde de Thomar achou n'aquelle decreto uma exorbitância das attribuições do poder executivo, que invadira as do legislativo, e censurou por isso o governo; e o sr. presidente do conselho respondeu adduzindo os argumentos que lhe pareceram convenientes para mostrar que o governo estava no seu direito publicando o referido decreto. O sr. conde de Thomar não se deu por satisfeito com a resposta do sr. presidente do conselho, e continuou a sustentar pque o decreto era attentatorio do poder legislativo.

A vista do que, e pois que não ha proposta nenhuma sobre a mesa, parece-me que a camará só tem a examinar qual das duas opiniões deve prevalecer, se a do sr. presi-

dente do conselho na sua negativa, se a do sr. conde de Thomar na affirmativa; e para que isto se possa verificar com pleno conhecimento de causa julgo opportuno fazer uma resenha, ainda que rápida, do que se tinha passado antes de apparecer o decreto de 22 de junho.

Todos sabem que o governo, depois das graves questões suscitadas na imprensa e fora d'ella sobre este assumpto, resolveu-se a publicar, pelo ministério do reino, a portaria de 5 de março deste anno, em que ordenara que se intimassem as irmãs da caridade, congregadas no hospício de Santa Martha, para abrirem mão d aquelle estabelecimento e dos bens que lhe pertencessem, devendo executar-se esta ordem dentro de quarenta dias; que este praso igualmente se entendera que devia ser contado do dia em que se verificasse a intimação, posto que na portaria nada se dissesse sobre este ponto. Fez-se a intimação, e houve polemica pelos jornaes questionando-se quando Analisava o praso dos quarenta dias. O negocio porém foi objecto de geral attenção, porque logo se soube que houvera repugnância por parte das irmãs da caridade, até que appareceu no Diário ãe Lisboa outra portaria, datada de 22 de março, que recaiu sobre uma representação do governador civil de Lisboa, dando parte de que as irmãs da caridade do hospicio de Santa Martha, a superiora Cherton e a visitadora Maria Levi, tendo sido intimadas para darem cumprimento á portaria de 5 de março, resistiram formalmente, e protestaram contra aquelle acto; protesto que não quizera admittir a auctoridade administrativa; e ordenou-se pela dita portaria de 22 de março que fossem intimadas as pessoas que ãiri-gissem aquelle estabelecimento para darem cumprimento á primeira portaria de 5 de março, fazendo-lhes saber que a sua negativa as exporia a um processo criminal como desobedientes ás ordens da auctoridade publica, e no caso de não acquiescerem levantar-se o respectivo auto, que seria remettido ao procurador régio para proceder segundo as leis.

Decorreu muito tempo depois da publicação d'esta portaria, durante o qual a imprensa por um e outro lado se occupou do assuin, to, segundo as idéas que diversamente defendia; e foi n'este estado de cousas que appareceu o decreto de 22 do mez passado, que deu causa a este debate, e que o sr. conde de Thomar qualificou na sua iniciativa de attentatorio do poder legislativo, e também no decurso de suas observações de attentatorio do poder judiciário em quanto invadia as attribuições deste poder independente.

Sr. presidente, o quê me parece inconcusso é que quem ler o extenso relatório d'aquelle decreto, não espera achar em conclusão o decreto .pelo modo como está concebido; pelo contrario, devia esperar medidas fortes e violentas, e de tão dura execução, pelo menos, como eram as que se continham naquellas portarias, que não poderam ser executadas! Pela minha parte não posso descobrir a rasão d'esta repugnância entre a exposição dos motivos e a parte decreto ri a !

O decreto estabeleceu no artigo 1.° que é dissolvida a corporação das irmãs da caridade fundada pelo decreto (lei) de 14 de abril de 1819, não podendo mais ser considerada como entidade juridica. O que era natural, e a todas as luzes evidentes, em presença do que refere o relatório, era dizer-se no artigo 1.° que o estabelecimento das irmãs da caridade, creado pelo decreto dc 14 de abril de 1819, e extincto por effeito do decreto de 9 de agosto de 1833, era agora dissolvido; porque o governo quando pronuncia esta dissolução não usa de um arbitrio, nem de um direito facultativo, mas desempenha um dever qual é o de fazer com que tenha execução a lei. Se as irmãs da caridade existiam em virtude de uma lei, que lhes tinha dado a entidade juridica, não podiam perde-la nem deixar de existir com essa condição senão em virtude de outra lei; e pois que o governo entende que o decreto dc' 9 de agosto de 1833 extinguiu aquella corporação, quando a declara dissolvida, pôde alguém dizer que cumpre um dever, porém não, que adopta um arbitrio. Mas não foi isso o que se fez; não se diz no decreto, posto que se ache no relatório que o precede, que aquella corporação já estava extincta, circumstancia que reputo essencial e indispensável para o governo poder pronunciar a dissolução, e determinar que as auctoridades competentes procedam em conformidade com ella dentro da orbita das suas attribuições. Nem se diga que n'esta parte o relatório suppre o decreto, porque a matéria principal deve sempre ser expressa no documento que estatue as prescripções que têem de se executar.

É isto o que principalmente tenho a observar com algum reparo quanto ao 1.° artigo do decreto, e não posso occul-tar por esta occasião o desejo que tenho de preencher uma lacuna ou de esclarecer um ponto duvidoso quanto aos verdadeiros motivos, pelos quaes não. foi cumprida a portaria de 22 de março. No intervallo d aquella data á do decreto de 22 de junho correram diversas versões sobre o não cumprimento da portaria; diziam uns que as auctoridades que no judicial tinham de propor as competentes acções não acharam legaes as diligencias da auctoridade administrativa, ou a ordem que para isso recebera; affirmavam outros que se duvidava da procedência da comminação e instauração do processo criminal, ordenado pela portaria de 22 de março. N'este estado de incerteza appareceu o decreto de 22 de junho, que não esclarecendo a duvida confirmou comtudo a revogação dos preceitos da portaria; e o sr. ministro da justiça, de quem ha muito reconheço e respeito a capacidade, pretendeu no seu bem elaborado discurso, ou antes dissertação, dar o motivo d'este acontecimento e a causa da existência do decreto. Disse s. ex.a que o procurador régio expozera algumas duvidas sobre o assumpto, com as quaes não concordara, sendo ouvido, o procurador geral da coroa; que o governo procedera então a uma conferencia com os empregados superiores do ministério pu-