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SESSÃO N.° 48 DE 6 DE ABRIL DE 1907 517

para quem temos sentimentos de muitissimo respeito e estima.

Não será muito difficil demonstrar e justificar completamente que o Governo teve razões ponderosas que o levaram a apresentarão Parlamento o projecto que se discute, traduzindo n'elle o que o Governo entende que deve ser a intervenção do Estado em um dos mais graves e agudos problemas da nossa economia nacional.

Começou o Digno Par por descrever a crise vinicola.

Infelizmente ella está tanto no espirito, na memoria e no sentimento, não só de, todos os representantes da nação, mas de todos, os cidadãos que se interessam pelos negocios publicos, que S. Exa. bem podia dispensar-se de fazer essa larga descripção.

Todos conhecem a enfermidade nos seus symptomas, to dos a reconhecem nos seus effeitos, muitissimos a sentem nos seus resultados; mas isso não é o sufficiente para que se lhe encontre remedio efficaz, porque julgo que a doença não tem cura radical. (Apoiados).

A crise vinicola não é um facto isolado que somente se dá em Portugal; é um soffrimento que ao mesmo tempo invade todos os paizes, por effeito da concorrencia de outras bebidas, por effeito da acção de propaganda das sociedades de temperança; por effeito dos conselhos da medicina; por effeito de mil variadas solicitações das modernas exigencias da civilização que obrigam as familias a encurtar umas despesas para satisfazer outras. (Apoiados).

O commercio dos vinhos está decadente não só no nosso paiz como em todas as nações.

Todos os paizes procuram criar para os seus productos uma situação de favor e combatem a concorrencia dos que possam ferir-lhes os interesses nacionaes.

É um facto averiguado que o consumo do vinho desce ou, pelo menos, estaciona em todas as nações, mas a producção d'elle cresce n'uma progressão notavel, quer pela adaptação á cultura vinicola de terrenos mais ferteis, quer pelo apparecimento de novas regiões vinicolas, como o Rio Grande do Sul, que já produz uma quantidade importante de vinho.

Entre nós ha terrenos que nada produziam, nenhum valor tinham, mas que, pela actividade e esforço de um homem, que tem sido um trabalhador incansavel e assim tem feito frutificar a sua fortuna, já hoje dão producções importantes que fazem d'esse homem a honra e gloria da viticultura do paiz.. (Apoiados).

Este facto, se por um lado tem aggravado a crise vinicola, constitue, em todo o caso, um grande augmento de riqueza nacional.

Todavia a situação do mercado é cada vez mais difficil. A concorrencia commercial é cada vez mais activa, mais áspera, mais dura e mais resistente.

É este o primeiro elemento causador da crise.

O commercio francez e inglez - este o mais antigo e o mais habil - fizeram a reputação dos grandes vinhos Bordeaux, Bourgogne, Champagne, Porto e Madeira.

O commercio italiano e o hespanhol acreditaram os vinhos do Xerez e Marsala, e mais modernamente o Chianti.

E a lucta commercial, que a principio era principalmente de qualidade e pouco ou nada de preço, é hoje exclusivamente de preço, sendo a Hespanha o paiz que produz o vinho mais barato do mundo, seguindo-se a Italia n'um movimento assustador de decadencia, visto não poder concorrer em barateza, o que occasionará uma crise pavorosa para a agricultura italiana.

É, como já disse, a Hespanha o paiz que produz o vinho de pasto mais barato do mundo, porquanto uma pipa, embora de pouco mais de 400 litros, custa, posta a bordo, em Barcelona, 7$000 réis.

A necessidade da concorrencia obrigou á diminuição dos preços e ás imitações bem como á fraude, que não constitue uso só no nosso paiz, mas em toda a parte.

Quem se der ao trabalho de lêr os Annaes das sessões que ultimamente se teem realizado em França verá que no Parlamento Francez houve debates em que tornaram parte oradores cujas considerações são iguaes ás que ultimamente se teem produzido no Parlamento Portuguez.

Houve ali as mesmas imprecações, as mesmas censuras, as mesmas arguições e accusações contra os falsificadores, attribuindo-lhes todas as difficuldades com que luctam a viticultura e o commercio francez.

Mas se tal facto tem grande importancia em todos os paizes, sendo portanto um facto essencial e substancial para prejuizo do commercio, não pode negar-se que a fraude é a principal causa deleteria ou ruinosa da agricultura. (Apoiados).

Ainda não ha muito tempo um illustre congressista estrangeiro dizia syntheticamante: «o commercio é a fraude».

E isto, que parece uma heresia, tem seu tanto ou quanto de verdade, bastando citar que hoje já não ha sedas, que são actualmente fabricadas de productos diversos, não possuindo nada de seda.

O producto animal - seda - substituido pela cellulose e outras substancias vegetaes.

São os mercados, os consumidores, que exigem productos baratos com a apparencia dos productos de elevado preço.

Não é possivel luctar contra a corrente, que arrasta o commercio de todos os paizes.

O Sr. Conde de Bertiandos: - Mas as sedas fabricadas com cellulose não fazem mal á saude.

O Orador: - Assim é. Mas se todos os venenos que entram no organismo humano, desde o que se aspira até o que se engole, prejudicassem o homem, já não existia ninguem.

O Sr. Conde de Bertiandos: - Se assim é, viva a fraude! (Risos).

O Orador: - É verdade que a falsificação ou a fraude não pode permittir-se nem autorizar-se, mas não é menos verdade que nem sempre a falsificação faz mal á saude.

Foi muito falado na Allemanha um processo instaurado contra uma casa commercial por ter carregado 273 vagons com cascos de vinho, que não eram acompanhados sequer da declaração de haverem atravessado qualquer propriedade vinicola.

Instaurado o referido processo, só se apurou que haviam sido consumidos, para tal carregamento, 60:000 hectolitros de agua e determinadas porções de tanino, acido tartarico e outras substancias.

Mas este processo deu logar a largos commentarios, porque se disse que tal vinho preparado com taes mixordias era muito procurado, devido á sua elevada graduação alcoolica.

Não é portanto só em Portugal que se fazem falsificações.

Entretanto a repressão é indispensavel pelas razões moraes que á determinam.

As falsificações devem ser reprimidas pela mesma norma por que é reprimido o jogo, embora se saiba que a repressão não acaba com elle.

É difficil, se não impossivel, extinguir a fraude, visto que ella se faz desde as adegas até ás casas dos taberneiros.

Já disse que á consideravel restricção do consumo succede o alargamento da plantação.

Tem-se procurado, não as castas de qualidade, mas as castas de producção; podendo affirmar-se como uma lei segura pelo que respeita ao assumpto em debate: «A quantidade está na razão inversa da qualidade».

O Sr. José de Azevedo Castello Franco:- Se V. Exa. continua a falar assim, a Junta do Sul não lhe perdoa.