SESSÃO N.° 48 DE 25 DE AGOSTO DE 1908 7
verno, de entre os academicos de merito ou effectivos, sobre proposta da Academia".
O actual director não foi proposto pela Academia, por consequencia a Academia não tem responsabilidade na sua nomeação.
É caso para estranhar que seja a proposito d'este funccionario que a Academia tenha de reclamar sobre materia legislativa, como vou mostrar á Camara.
O Governo transacto annunciou a reforma do Conselho Superior de Instrucção Publica, a proposta veio publicada nos jornaes e por elles a Academia tomou conhecimento das suas disposições.
Na proposta, a secção especial de bei Ias artes era composta de varios vogaes eleitos, entre os quaes figuram um pela Academia de Lisboa e um pela Academia do Porto. Seguiam-se mais vogaes eleitos e terminava por transcrever o seguinte:
"O director do Museu Nacional de Bellas Artes".
A Academia pareceu-lhe que não estava bem. Reuniu, discutiu e resolveu dirigir uma representação ao Governo.
Nessa representação allegava que, tendo o Governo adoptado o principio de elegibilidade, lhe parecia que não deveria ser imposta a natividade a um dos seus membros, ficando melhor que a, cada uma das academias fosse concedido o direito de eleger dois membros.
O chefe do Governo, Sr. Conselheiro João Franco, recebeu com muita attenção a commissão da Academia, que lhe foi pessoalmente entregar a representação, tendo palavras que mostravam os bons desejos de attender ao que a Academia representava.
De facto a Academia foi attendida.
No decreto de 19 de agosto, concede-se ás academias de Lisboa e Porto a faculdade de eleger cada uma dois membros para vogaes da secção especial de bellas artes.
Mas, Sr. Presidente, note-se bem, a alinea que diz respeito ao director do museu lá ficou.
Agora é facil ver como o desequilibrio do jury foi propositadamente feito em proveito da maioria da politica da Sociedade Nacional.
Nos corredores d'esta camara uma voz amiga segredou-me que não me oppuzesse ao projecto, por que lhe tinham dito que deveria ser eu o presidente do jury.
Sr. Presidente: esta insinuação seria uma armadilha traiçoeira armada á minha supposta vaidade. V. Exa. e a Camara sentem bem em que falsa posição o presidente de um jury assim constituido se acharia.
Até aqui, pela desconsideração; agora passo a provar a aggressão.
Dá-se aggressão quando se invadem direitos e attribuições.
Ora, o decreto de 18 de dezembro de 1902, diz o seguinte:
Artigo 171.° No Museu Nacional de Bellas Artes são expostas:
a) As obras de arte nacionaes ou estrangeiras, de incontestavel merecimento, que forem adquiridas para o Estado pelo rendimento de 70 contos de réis, legados pelo Visconde de Valmor, e quaesquer outras verbas para esse fim destinadas.
§ 2.° As propostas para acquisição de obras de arte para o Museu Nacional, nos termos da alinea a) d'este artigo, só poderão ser feitas pelos membros da Academia.
Se estas são as disposições legaes que regem a acquisição de obras de arte para o Museu Nacional, está provada a intenção de aggredir á Academia nas suas attribuições, desde o momento em que de outra corporação se conferem essas mesmas attribuições.
A censura é evidente por ser um corollario de precedente principio.
Assim pois, se a Academia é substituida no seu mandato por outra corporação é porque se entende que elanão cumpre convenientemente o seu dever.
Sr. Presidente: cumpri o meu dever de informar a Camara demonstrando os principios que enunciei, resta-me dizer o seguinte:
Como é que a Academia corresponde á Sociedade Nacional?
Sabe V. Exa. e a Camara como é?!
Esperando com dinheiro na mão que as obras dos seus associados voltem do Brasil, para as adquirir para o museu.
É bem justiçado o resentimento que as minhas palavras traduzem na defesa da Academia.
A minha proposta em substituição é a seguinte:
"Proponho que o § 1.° do artigo 5.° da proposição de lei n.° 27 seja substituido pelo seguinte:
§ 1.° A escolha d'estas obras caberá á commissão executiva da Academia de Bellas Artes".
Sr. Presidente: sinto não ver presente o Digno Par do Reino D. João de Alarcão relator d'este projecto.
Sua Exa., por quem eu tenho sincera sympathia e a quem presto homenagem devido aos seus elevados dotes de espirito e provada competencia juridica, por certo defenderia o projecto com argumentos que se oppusessem ás minhas considerações.
Suppondo que S. Exa. dizia que a minha argumentação caia pela base por que elle affirmava que tanto da parte do Governo, que apresenta o projecto, como no Parlamento, não havia a minima intenção de desconsiderar, aggredir e censurar a Academia; que onde a lei não distingue ninguem pode distinguir portanto que o projecto em nada alterava as attribuições da Academia.
Eu teria a dizer a S. Exa. que se elle enveredasse por esta vereda iriamos cair num abysmo que nos conduzia ao chaos.
Então cairiamos nos conflictos, como vou mostrar á Camara.
Não se pode negar que na aquisição de obras de arte para o museu da Academia representa o Estado.
Portanto o § o.° do artigo 5.° que preceitua que o Estado terá a preferencia na compra de um quadro ou outro objecto de arte cujo valor pelo respectivo catalogo exceda o valor de 500$000 réis, dá evidentemente á Academia o direito nesta preferencia, e é de incontestavel vantagem para as. requisições para o museu.
Não julgue V. Exa. e a Camara que fantasio hypotheses para tirar effeitos. Posso referir casos de factos passados como o seguinte:
Um artista com quem a Academia estava contratando a acquisição de uma obra digna de figurar no museu preferiu vende Ia a um particular; e assim perdeu-se a occasião de adquirir uma obra de arte de valor incontestavel.
Outro caso de conflicto:
A unica verba no orçamento destinada a acquisição de obras de arte para o museu é a do rendimento do legado Valmor. Esta verba é da exclusiva administração da Academia. Como pode a commissão nomeada pelo § 1.° do artigo 5.° do projecto dispor, de quantia superior a 500$000 réis, verba paga pela Sociedade Nacional, quando resolva adquirir uma obra de maior preço e recorra á disposição do § 3.° do mesmo artigo?
Não o poderá fazer sem a intervenção da Academia; portanto ahi temos dois jurys ambos a representar o Estado, um que julga até 500$000 réis e outro d'ahi para cima.
É evidentemente um conflicto.
Ainda mais: adquirida a obra a quem é entregue ?
Por lei tem de ser entregue á Academia.
O que tem a fazer a Academia em frente d'essa obra? Tem por dever julgá-la.
E sabe V. Exa. o que pode acontecer? Se a Academia entende que a obra não é digna de ser exposta; não a expõe e manda-a para o archivo.
Tambem não é uma hypothese; ha precedentes neste caso.