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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

SESSÃO DE 5 DE MAIO DE 1865

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. CONDE DE CASTRO

VICE-PRESIDENTE

Secretario, o digno par Mello e Carvalho

(Assistem os srs. ministros da fazenda e do reino.)

Pelas tres horas da tarde, tendo-se verificado a presença

de 31 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente contra a qual não houve reclamação.

Mencionou-se a seguinte correspondencia:

Um officio do ministerio do reino, participando para os fins convenientes que Sua Magestade El-Rei receberá no real paço da Ajuda, ámanhã 4 do corrente, pela hora do meio dia, a deputação da camara dos dignos pares do reino.

Um officio do ministerio das obras publicas, enviando oitenta exemplares da conta da gerencia do dito ministerio relativo ao anno economico de 1863-1864, do exercicio de 1862-1863 para serem distribuidos pelos dignos pares do reino.

O sr. Rebello da Silva: — Sr. presidente, desejo offerecer algumas ponderações á camara sobre assumpto que reputo grave; o meu fim é fundamentar uma moção que hei de mandar logo para a mesa.

A camara sabe, por documentos officiaes estampados nos jornaes estrangeiros, que um attentado acaba de cobrir de luto uma grande nação alem do Atlântico, a poderosa republica dos Estados Unidos.

O sr. Conde d'Avila: — Peço a palavra por parte do governo sobre este incidente.

O Orador: — O presidente Abraham Lincoln foi assassinado no theatro quasi nos braços de sua esposa!

A prepetração de acto tão cruel causou profunda magua na America, e em todas as côrtes da Europa. Os gabinetes e os parlamentos expressaram o mais vivo sentimento por tão doloroso facto.

Pertence ás sociedades civilisadas, torna-se quasi um dever para todos os corpos politicos constituidos, o acompanharem de suas manifestações a expressão sincera do horror e profunda magua com que deploram actos e crimes tão graves (apoiados).

Por fatalidade, ou por sublime disposição e insondavel segredo da Providencia, que é lei historica mais christã, que não só na vida das nações, como na vida dos individuos, muitas vezes acontece, que vencidas as maiores alturas, consummados os destinos mais arriscados, subidos quasi os ultimos degraus das grandezas humanas, quando a estrada se aplana de repente, quando os horisontes se destoucam de véus sombrios e sorriem inundados de luz, é então que um braço invisivel se alça nas trevas, que uma força occulta e inexoravel se arma no silencio, e vibrando o punhal de Bruto, apontando o canhão de Wellington, ou offerecendo a taça invenenada dos réis da Asia, precipita das eminencias o triumphador coroado de palmas, aos pés da estatua de Pompeu como Cesar, aos pés da fortuna cansada de o seguir como Napoleão, aos pés do coloco de Roma irritada como Annibal!...

A missão dos grandes homens, dos heroes, se os torna

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quasi semi-deuses, porque recebem de cima, por um momento, a omnipotencia que revolve as sociedades e transfigura as nações, passam como as tempestades no seu carro de fogo, e vem quebrar-se, instantes depois, contra as barreiras eternas do impossivel, barreiras que nenhum transpõe, e aonde todos confessam desfeita em pó e humilhada a soberba do seu poder ephemero, que immutavel e grande só é Deus!

Fere-os a morte, ou alcança-os a ruina no apogeu, para mostrar aos principes, aos conquistadores e aos povos, que a sua hora é uma só e curta, a sua obra frágil como obra humana desde que a columna de luz, que os guiava, se apaga e lhes anoitece o caminho; as sendas novas que rasgaram, e por onde cuidavam caminhar intrépidos e seguros, precipicios que se abrem e os tragam desde que, instrumentos dos designios altíssimos, os dias do seu imperio, ou da sua empreza, foram contados e espiraram!... (Vozes: — Muito bem.)

Assim se viu, terrivel exemplo, lição admiravel (!), na catastrophe dos maiores vultos da historia. Assim nos apparecem hoje maculadas de sangue illustre de um de seus filhos mais applaudidos as paginas recentes dos annaes da poderosa republica dos Estados Unidos. O seu presidente, quando encerrado o primeiro quadriennio de um governo, em que a luta fôra a sua divisa, cáe de subito fulminado diante do seu triumpho, e de suas mãos frias e inertes escapam soltas as redeas da administração que a perseverança e a energia da sua vontade, a cooperação dos compatriotas, e a elevação e prestigio da grande idéa que symbolisava e defendia, immortalisam com o nome acclamado por milhões de vozes e de votos nos campos de batalha e nos comícios.

Reconduzido, levantado segunda vez nos escudos populares á suprema direcção dos negocios, no momento em que os ardores da contenda civil se applacavam, em que a união d'aquelle immenso corpo dilacerado promettia, restaurada, cicatrisar as feridas por onde ha tantos mezes corre em torrentes o sangue generoso dos livres, quasi nos braços da victoria, no regaço da população que mais o ama, no seio da sua côrte popular, encontra-se de repente com a morte, e a bala de um obscuro fanatico fecha e sella o livro de oiro de seus destinos, no momento em que todas as prosperidades lhe auspiciavam largos dias e festivos applausos! Não é um rei que desapparece na escuridão do tumulo, sepultando, como Henrique IV, comsigo, o futuro de vastos planos, é o chefe de um povo glorioso que deixa tantos successores, quantos são os auxiliares da sua idéa, os complices de suas nobres e bem fadadas aspirações. Não se cubriu de luto a purpura de um throno, cubriu-se de luto o coração de um grande imperio. Não morreu com elle a causa, de que era strenuo campeão, mas todos choram a sua perda pelo horror do attentado e pela occasião, e pelas esperanças nascidas de suas puras e benevolas intenções...

Lincoln, martyr do fecundo principio que representou no poder e na luta, é já da historia e da prosteridade. Á similhança do de Washington, cujo pensamento continuava, o seu nome será inseparável das datas memoraveis a que se liga e que exprime. Se o defensor da independencia libertou a America, Lincoln desembainha sem terpidar a espada da republica e risca e apaga, com a ponta do ferro, do codigo de um povo livre, o stygma anti-social, a blasphemia anti-humanitaria, o triste, o vergonhoso, o infamante codecillo das velhas sociedades, o sombrio e repugnante abuso da escravidão que Jesus Christo primeiro condemnou do alto da cruz proclamando a igualdade dos homens perante Deus, que dezenove seculos de civilisação educada pelo Evangelho proscrevem e rejeitam como opprobrio dos nossos tempos (apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

No momento em que elle partia os ferros a uma raça desditosa, o via em milhões de servos rehabilitados milhões de cidadãos futuros, no momento em que a voz de bronze dos canhões victoriosos de Grant annunciava a alforria da alma, da consciencia e do trabalho, em que o látego esta a caír das mãos dos flageladores, em que o ergástulo antigo vae transformar-se para o captivo em lar domestico, no momento em que tremulam scintillantes e esplendidas dos fulgores da liberdade sobre os muros rendidos de Petersburgo e Richmond as estrellas da união... abre-se o sepulchro, e o forte e o poderoso entra n'elle. No meio dos triumphos e acclamações appareceu-lhe um spectro como o de Cesar nos idos de março, e disse-lhe: viveste!

Longe de mim a apreciação e a sentença do pleito civil, que divide e ensanguenta dois povos irmãos na America. Não sou seu juiz, nem seu censor. Saúdo um principio, o da liberdade, aonde o vejo acatado e mantido; mas sei amar e estremecer tambem outro, não menos sagrado e glorioso tambem, o da independencia. Possa a virtude dos progressos do nosso seculo abraçar de novo os que a dissidencia separou, e reconciliar idéas que estão no coração, nas aspirações e nos votos de todos os animos generosos.

Nesta luta, cujas proporções, excede tudo o que temos visto e ouvido na Europa, os vencidos de hoje são dignos da grande raça de que descendem. Lee e Grant são dois gigantes que a historia ha de saudar inseparaveis. Mas a hora da paz ía soar talvez, e Lincoln desejava-a como corôa de seus trabalhos e grandioso corollario de tantos sacrificios. Depois da força a tolerancia. Depois da brava furia das batalhas o abraço e o osculo fraterno dos cidadãos!

Eram estas as intenções que manifestava, foram estes os ultimos e virtuosos desejos que formou. E é n'este momento talvez unico, em que uma grande alma é tão poderosa no bem, em que um espirito só vale legiões inteiras, como pacificador, que a mão de um sicario se ergue traiçoeira e corta o fio de propositos tão altos e tão nobres! (Apoiados.) Se a nação americana não fosse um povo encanecido nas dolorosas lides e experiencias do governo, acaso poderia alguem calcular as consequencias funestas d'este golpe repentino?!

Quem sabe se não se estenderia até aos mais longinquos estados federaes o incendio da guerra civil em toda a pompa de seus horrores? Felizmente não acontecerá assim. Ao passo que as folhas e a opinião publica condemnam justas e severas, o attentado, o avivam o seu horror ao crime funesto, sentimentos que são os de toda a Europa civilisada, prestam honroso preito ás idéas de paz e de tolerancia, como se o grande homem, que as invocava, não houvesse desapparecido da grande scena do mundo. E digo, de proposito, grande homem, porque é na realidade grande aquelle que da obscuridade profunda se eleva a maior altura estribado só nos merecimentos, como Napoleão, como Washington, como Lincoln. Que sobem ás imminencias do poder e da grandeza, não por mercê e graça do acaso de um berço, ou de uma genealogia, mas pelo prestigio de suas acções, pela nobreza que principia e acaba n'elles, e que é filha unica das suas obras (apoiados).

E mais para invejar o varão que se faz grande e famoso pelo engenho e pelos actos do que o homem que já nasceu entre brasões herdados.

Lincoln é d'esta raça privilegiada, pertence a esta aristocracia. Na infancia a pobreza retemperou-lhe a alma energica. Na juventude o trabalho ensinou-lhe o amor da liberdade e o respeito dos direitos do homem. Até aos vinte e dois annos, educado pela adversidade, com as mãos calejadas pelo honrado lavor da terra, repousava das fadigas dos campos, soletrando nas paginas da Biblia, nas lições do Evangelho, e nas folhas fugitivas do jornal, que a aurora abre e a noite dispersa, os primeiros rudimentos da instrucção, que as 'meditações solitárias amadureceram. A luz fez-se a pouco e pouco n'aquelle espirito. Despontaram e robusteceram-se as azas com que voou. A crisálida sentiu um dia o raio do sol, que a chamava á vida, rompeu o involucro, e lançou-se intrépida das trevas da clausura humildes para os espaços luminosos do seu destino. O lavrador, o jornaleiro, o pastor, deixou como Sincinato o ferro da charrua cravado no sulco meio roto da terra; e, legislador do seu estado, e depois da grande republica, veiu habilitar-se na tribuna para ser o chefe popular de muitos milhões de habitantes, o mantenedor do santo principio, inaugurado por Wilberforce. Que luta, que scenas agitadas, que serie de trabalhos hercúleos e de sacrificios incalculaveis não envolvem e representam na gloria de seus resultados esses quatro annos de guerra e governo!

Exercitos em campo, como desde antigas eras não havia memoria! Batalhas immensas, que veem nascer e ecclipsar-se o sol duas e tres vezes sem que a victoria se incline a um, ou a outro lado! Marchas, em que milhares de victimas, legiões inteiras alastram de cadaveres cada palmo de terreno conquistado! Invasões, cuja audacia e estragos fazem pequena a recordação de Atila e dos Hunos!

Que exequias tremendas para o flagello da escravidão! Que lição terrivel e saudavel de um grande povo ainda rico e vigoroso de juventude ás timidas hesitações da velha Europa diante da sorte contestada de principios tambem sagrados!...

Estes foram os padrões, os marcos milliarios da sua carreira. Se a espada era em suas mãos o instrumento, a liberdade, a inspiração e a força de seus commettimentos, não lhe foi infiel. Por cima dos espinhos do seu caminho, por entre as lagrimas e o sangue de tantos holocaustos, chegou a avistar a terra promettida... Não lhe foi dado plantar n'ella em expiação a oliveira auspiciosa da concórdia. Quando ía atar o laço roto da União, quando ía infundir de novo o espirito vivo das instituições livres no corpo da patria, juntos e soldados os membros dispersos e sanguentos, quando o estandarte da republica, callados os estrépitos funebres, e consoladas as agonias do orgulho e da derrota, ía alçar-se outra vez, cubrindo de suas pregas gloriosas todos os filhos da mesma terra, purificados da macula indelevel da escravidão... O atheleta escorregou na arena e caiu, provando que era só mortal. (Muitos apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

Julgo que bastará este esboço. A camara, por indole, por dever, e por instituição não só conservadora, mas guarda fiel das tradições e dos principios, não ha de, não quer de certo deixar de se associar á manifestação que a casa electiva já votou tambem, acompanhando os gabinetes e os parlamentos esclarecidos da Europa. O silencio em presença de attentados taes não fica bem senão aos senados mudos e desherdados de sentimentos e aspirações elevadas (apoiados).

Votando esta moção, a camara dos pares associa-se á dôr de todas as nações civilisadas. O crime, que abreviou os dias ao presidente Lincoln, martyr dos grandes principios, de que mais se gloria o nosso seculo, é quasi, é na essencia o regicidio, e um paiz monarchico não póde negar-se a detesta-lo condemnando-o. Os descendentes dos homens que revelaram primeiro á Europa do seculo XVI a nova estrada que por entre a cerração de mares tormentosos e ignorados lhe abria as portas dos reinos da aurora, não hão de ser os ultimos a inclinar-se diante da campa de um grande cidadão e de um grande magistrado, que foi guia, tambem, do seu povo por meio de tempestades terriveis e que logrou conduzi-lo triumphante a devassar os ultimos reductos da cidadella da escravidão... A cada epocha e a cada povo a sua tarefa e o seu quinhão de gloria. A cada varão illustre a sua corôa de louro, ou a sua corôa civica. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem).

Hei de apresentar outra moção ainda. Não o faço hoje para não confundir os homens e as cousas.

Espero que a camara me acompanhará quando a convidar a exprimir a sua admiração e respeito por outro vulto, que, similhante ao presidente dos Estados Unidos, tudo quanto foi o deveu a si, e se não teve a missão de governar vastos estados, tomou a empreza, não menos alta e fecunda e conseguiu com ufania virtuosa, ser o mestre e a luz de poderosas potencias e de sabios estadistas, ensinando aos réis e aos ministros a politica da paz e a nova economia social do futuro. Alludo a mr. Cobdcn, um dos espiritos mais elevados, mais perseverantes e mais uteis do nosso tempo. Nobre e grande engenho, que honrou a tribuna da sua patria e a sociedade moderna, ao qual devemos homenagem igual á que prestámos, creio que por proposta minha, á gloriosa memoria de Sir Robert Peel.

Creio que a camara ha de querer registar tambem pelo seu voto este preito, que não proponho hoje, repito, para não diminuir o valor de testemunhos diversos, mas analogos. Cobden tambem lutou denodado pelas grandes idéas que fez triumphar, e o nome illustre que adquiriu foi obra e corôa de suas doutrinas e esforços. A liberdade do commercio, adoptada pela Gran-Bretanha e depois della por nações tão illustradas, diz mais ácerca dos seus trabalhos e victorias, do que longos discursos e faustosos monumentos. Os soberanos do alto do throno associaram-se á dôr da Inglaterra e ao luto da familia do grande cidadão, deplorando a sua falta como uma calamidade européa, e o imperador dos francezes, tão sóbrio de louvores vagos, como justo e prompto no elogio dos verdadeiros merecimentos, acaba de ser o órgão da posteridade diante do tumulo ainda fresco do auctor da liga. Podemos, pois, unir a nossa voz á sua n'esta apotheose de um nome que ha de ser immortal. Napoleão III é competente, como soberano e como mestre nas sciencias politicas e sociaes, para estampar o cunho do genio sobre a memoria do varão que Deus fadou como revelador de uma de suas mais altas verdades. Mais tarde fallara a historia (apoiados).

Vozes: — Muito bem, muito bem.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Conde d'Avila): — Associa-se, como par do reino, a esta nobre manifestação. Como ministro da corôa a fez, já em seu proprio nome, quando apenas havia rumores de se ter commettido o crime, já depois de ter recebido as ordens de Sua Magestade, assim que desgraçadamente nenhuma duvida restava, para mostrar quaes eram os sentimentos do governo portuguez.

O sr. Marquez de Vallada: — Poucas palavras póde acrescentar, ás eloquentes phrases que acabam de fazer-se ouvir n'esta tribuna por um dos seus mais nobres ornamentos, um dos seus particulares amigos, o sr. Rebello da Silva; mas ha occasiões e momentos em que os homens, empenhados n'uma tarefa tão nobre como é a manutenção dos grandes principios de ordem social, e principalmente aquelles que se acham alistados nas bandeiras do partido conservador, não podem ficar silenciosos; por isso entendia que faltaria a um dever se deixasse de tambem subir á tribuna para exprimir os seus sentimentos sobre tão deploravel acontecimento, e ajuntar algumas palavras ás do digno par que o precedeu.

Qual é o homem amante da ordem que póde deixar de sentir immensa dôr á vista do abominavel assassinio do sr. Lincoln? O seu sepulchro vae ser um monumento triste e duradouro, que não é de certo um monumento de honra para o nosso seculo; este seculo, que se denomina das luzes, mas que nasceu e continua toldado por densas trevas que pezam mais ou menos sobre nós todos! Em poucos annos o punhal dos sicarios tem-se levantado para ferir peitos illustres; não foi só o presidente dos Estados Unidos, foi tambem o joven e cavalheiro imperador de Austria, essa rainha magnânima que se senta no throno de Hespanha, o rei de Napoles Francisco II, estes e outros mais que não recorda agora, porque não quer fazer reviver a dolorosa lembrança de tão tristes factos, todos foram feridos pelo punhal das facções com vergonha e mágua dos que amam sinceramente o bem do seu paiz e o bem dos outros paizes, porque, como disse o conde de Filemont, não querem estreitar a sua affeição aos limites de uma fronteira, mas estende-la até aos confins do mundo.

Deseja portanto que sirvam estes factos de lição aos povos, aos soberanos e aos chefes dos estados, para reconhecerem a necessidade de empregar os unicos meios adequados para obstar á repetição d'elles, e para se esforçarem a pôr em pratica esses meios, que não são os que desgraçadamente se inculcam, e mais desgraçadamente se applicam.

Estes factos todos têem precedentes na historia antiga. Um escriptor houve, que é citado muitas vezes como modelo, Paulo Sarpi, que ensinava ser mais commodo procurar desfazer-se de um tyranno, propinar-lhe veneno, do que empregando o punhal, porque essa arma dos cobardes muitas vezes produz o seu effeito, sem correrem perigo aquelles que a empregam. De qualquer dos modos, envenenados ou apunhalados, sintamos a sorte d'esses homens, victimas dos odios e das más idéas, sintamos e deploremos a morte d'esse cidadão respeitavel. Por sua parte esta o orador persuadido que nem um só dos membros d'esta casa deixará de associar-se á manifestação eloquente do sentimento de todos os homens de bem que trouxe á tribuna o digno par seu amigo (apoiados). Em assumptos d'esta ordem não ha divergencia de sentimentos, não ha nem póde haver oppositores.

Une-se pois ao voto do sr. Rebello da Silva, e espera que toda a camara o acompanhe (apoiados), porque elle foi o interprete dos sentimentos de todos os pares, mandando para a mesa a sua moção, a fim de ficarem esses generosos sentimentos na acta d'esta sessão (muitos apoiados).

O sr. Rebello da Silva: — Sr. presidente, estimei ouvir as expressões que o sr. ministro da fazenda e dos negocios estrangeiros pronunciou. Mostram ellas que o governo procedeu n'este negocio com o acerto e promptidão, que os seus deveres recommendam, e que um nobre sentimento estimula sempre (apoiados).

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Vou mandar para a mesa a moção de ordem. E assim concebida:

«A camara dos pares deplora, com a mais sincera dôr, o attentado que acaba de cobrir de lucto os filhos de uma grande nação, pela morte do presidente dos Estados Unidos da America, mr. Licoln, martyr do seu dever. = L. A. Rebello da Silva.»

O sr. Presidente: — A camara ouviu ler esta proposta, julgo não ser necessario lê-la de novo na mesa, porque não produziria, melhor effeito, que lida, pelo seu auctor (apoiados).

O sr. Rebello da Silva: — O sr. conde d’Avila tambem esta assignado.

O sr; Presidente: — Os dignos pares que se associam a esta manifestação tenham a bondade de o dar a conhecer.

Foi approvada unanimemente.

O sr. Conde d'Avila: — Peço que se lance na acta, que a votação foi unanime (apoiados).

O sr. Visconde de Gouveia: — Sr. presidente, em uma das sessões passadas, o meu digno collega o sr. conde de Samodães pediu para ser inscripto quando estivesse presente o, sr. ministro das obras publicas, para fazer algumas observações sobre a legislação dos vinhos do Douro, e sobre o estado do paiz, pedindo igualmente a palavra, por essa occasião, o sr. visconde de Villa Maior, e pedindo-a eu tambem sobre o mesmo assumpto. O sr. conde de Samodães não esta presente, e creio mesmo que não esta na capital. Não vejo tambem presente o sr. ministro das obras publicas, mas vendo no banco do governo o sr. ministro da fazenda, cavalheiro tão competente em todas as materias, e que' estará de certo habilitado para o que vou dizer, peço por isso licença para fazer algumas considerações, attendendo á urgencia do negocio, e á pouca frequencia das nossas sessões. Não me dirigirei a s. ex.ª em fórma de interpellação, nem terminarei com moção alguma; o que pretendo unicamente é chamar sobre este assumpto a attenção do governo, e principalmente do ministro competente. Há muito tempo que pende sobre o paiz do Douro uma medida que, como a espada de Dâmocles, tem sempre suspensa a attenção dos lavradores. Esta medida é o projecto de liberdade do commercio dos vinhos; tem ella sido apresentada em diversas legislaturas, por diversos ministros, e de diversos modos. O paiz ao principio revoltou-se contra toda a idéa de reforma, como contraria aos seus interesses; mas depois; conhecendo que a legislação vigente era imperfeita, manifestou tendencias para que ella fosse reformada, de maneira que não prejudicasse os seus interesses.

E comquanto não concordasse com a liberdade plena do commercio, concordou todavia em que era necessario uma medida salvadora que acudisse ao estado deploravel em que se acha aquelle paiz. Hoje as circumstancias são mais graves. Hoje o paiz orphão dos grandes melhoramentos materiaes, que a sua posição especial reclama, definha-se na penuria. E vogando geralmente a convicção de que n'esta legislatura se decidiria o seu destino e se fixaria por uma vez a legislação vinhateira, as transacções commerciaes suspenderam se á espera d'isso. Nem o negociante quer arriscar-se á compra na incerteza do futuro, nem o lavrador póde vender o seu producto na mesma incerteza. Se os governos fossem fortes, um e outro podiam fazer, o seu calculo pela proposta que o ministro apresentasse. Mas, a fraqueza e alternativa dos gabinetes vem ainda augmentar a incerteza e o panico. E o resultado é a completa estagnação.

Já se vê que isto é um estado calamitoso, que não póde cessar senão pela adopção de uma definitiva medida e promptas providencias. E é tal este estado que as pessoas interessadas preferem uma lei, ainda mesmo imperfeita, á crise e estagnação em que se acham as cousas. Os governos podiam ter feito muito a bem daquelle paiz, sem mesmo lhe terem dado uma lei definitiva, porque eu, sr. presidente, entendo que a prosperidade de um paiz agricola depende menos das medidas legislativas do que de certos melhoramentos que trazem sempre comsigo a prosperidade e desenvolvimento dos paizes a que são applicados; E esta verdade muito mais sensivel se torna em um para como-o Douro.

O Douro não tem estradas nem via alguma de communicação, para o seu producto vinicola, alem do rio; mas que é uma via de communicação imperfeitissima, pelas escabrosidades do seu leito, perigos da navegação, despendio dos equipamentos; e absoluta paralisação em certas epochas e estações. Têem-se votado estradas para aquelle paiz, mas infelizmente esses melhoramentos têem sido tão mal encaminhados que não têem produzido effeito algum. Não ha uma estrada perfeita entre o Douro e o Porto, a que existe é deploravel e cheia de precipicios. É mister subir tres leguas em vehiculos puxados a bois, por uma das maiores alturas da serra do Marão. E até uns miseraveis parapeitos ou guardas de alvenaria, indispensaveis para que os passageiros não caiam no abysmo daquellas immensas profundidades têem sido regateadas de maneira apezar da facilidade e barateza da construcção que ha tres ou quatro annos ainda não se acham concluidos; e o transito, especialmente na occasião das descidas é de um risco inconcebivel para quem não conhece aquella serra, e aquelle lanço de estradas E note-se que é de todas as estradas do paiz: a de mais movimento de passageiros especialmente em certas epochas a estrada marginal tem caminhado tambem com um vagar e lentidão admiraveis.

Têem-se levantado questões de expropriações, e essas têem servido de pretexto para se não fazerem obras que estavam começadas ha muito tempo, e que em pouco se concluiriam se se fizesse o esforço (necessário, para. isso; muitas dessas obras têem sido imperfeitas, e tanto que grande parte da estrada marginal é submergida pelas cheias porque não foi construida ao abrigo dellas, como devera.

Mais de espaço me occuparei d'este objecto, porque já tenho na minha mão os documentos vindos da secretaria das obras publicas, para poder fazer uma interpellação em fórma; mas não posso deixar de fazer desde já algumas referencias a estas obras.

As estradas que ligam os differentes pontos d'este paiz têem sido todas feitas com muito vagar. A da Regua a Villa Real, que não terá mais de 20 kilometros, esteve em construcção mais de doze annos, e soffreu na sua ligação com a Regua taes desvios que se alongou mais de 4 kilometros por íngremes ladeiras, fazendo do traçado obvio, facil e curto que a natureza lhe havia creado, e que o habil director das obras publicas, innocente em todas estas monstruosidades, havia primeiramente indicado.

A estrada do Salgueiral á Regua que não tem certamente 1 kilometro de extensão, esteve a construir-se durante muitos annos. Quinze engenheiros deram o seu parecer sobre os diversos interessados alvitres da sua directriz. Gastou-se muito dinheiro com a expropriação. E sabe a camara o resultado de tantos annos de trabalho e locubrações? Deixou-se um angulo muito imperfeito logo á saída da Regua; metteu-se a estrada por um terreno alagadiço, e sem solidez, deixou-se a parte mais despendiosa inferior ao nivel das aguas das grandes cheias; e mandando-se construir os paredões de um modo differente e menos compacto do que o indicado pelo intelligente director do districto. Mas desabaram nos primeiros invernos, e tiveram de ser reconstruídos com mais solidez, despendendo-se muitos contos de réis.

E que direi da morosidade e imperfeição com que se faz a pequena estrada da Regua ao Corgo e que não excede a 1 kilometro? E que direi da estrada de Trancoso á foz do Varosa que devia terminar em dois, annos e não se acabou em cinco!

A grande ponte sobre o Douro em frente da Regua que deve ligar as duas provincias de Traz os Montes e Beira, e para a qual convergem tantas e tão importantes estradas, essa ponte tantas vezes promettida, nem ao menos esta começada. Fizeram-se os estudos. Foram remettidos para a secretaria das obras publicas e lá jazem sepultados. È note a camara que comquanto o orçamento exceda a 100:000$000 réis, cifra esta que não é excessiva em face dos incalculaveis beneficios e riqueza publica que d'esta obra devem auferir-se, note a camara que esta ponte podia construir-se sem sacrificio do thesouro, porque o rendimento das barcas de passagem naquellas immediações, é tão avultado, e o transito deveria crescer tanto logo que houvesse a ponte, que o rendimento d'esta devia produzir o juro d'aquelle dinheiro sem receio de errar.

Mas a obra é de tal necossidade e vantagem que eu entendo que o governo deveria fazer construir a ponte, livre de todo o imposto. E os 100:000$000 réis não seriam improductivos.

Fallou-se muito no caminho de ferro do Porto á Regua, e eu creio -que até houve propostas e varios estudos; porém tudo isto tem caminhado vagarosamente, e eu não vejo uma vontade definitiva de que se conclua aquelle melhoramento que é o unico que póde salvar o paiz.

O caminho de ferro que ligasse o paiz do Douro ao Porto seria um melhoramento de tal ordem que porta aquelle paiz ao abrigo de todas as calamidades, e mesmo daquellas que proviessem da sua legislação vinhateira. Sei que se fizeram alguns estudos provisorios, mas foram imperfeitos e incompletos, porque só se estudou o traçado marginal quando é conhecido por todas as pessoas competentes que um caminho de ferro que fosse pelo interior, do paiz era muito mais barato e mais facil, aproveitando-se assim os grandes valles e ligando-se importantissimos centros de população e um paiz rico e fertil.

Ora ha uma parte de estudos, que comprehende o lanço entre a Regua e a margem do Tamega, que creio ser o terceiro, que é commum a todos os traçados e projectos que se fizerem. Aquelle lanço é um ponto forçado para o caminho de ferro; ou se adopte o traçado marginal; ou o traçado pelo interior nos outros dois lanços, ou se considere como ramal de qualquer caminho de ferro que ligue o Porto com a Hespanha por aquella provincia. Não ha por isso motivo para que se não tenham feito os estudos definitivos d'aquelle lanço, aliàs o mais importante o difficil, e aquelle cuja construcção deve ser mais morosa, pelos grandes córtes de pedra e pontes e viaductos de que carecer: É uma incuria, é um despreza por aquelle desgraçado paiz, que não tem explicação nem desculpa.

O caminho de ferro primeiro que tudo, e depois a ponte em frente da Régua as estradas, seria por certo o meio mais adequado de resolver a crise do Douro. E difficil a legislação, sobre o commercio. A efficacia, e actividade dos mercados não se decretam. A genuidade dos productos não se legisla. As operações de credito e de commercio não se fixam nas leis. Ellas desenvolvem-se e fructificam pelo grandes melhoramentos materiaes, pelas estradas, pelos, caminhos de ferro, pelas pontes pelos canaes, por tudo o que augmenta e desenvolve a riqueza publica, e facilita o movimento e o progresso.

E por isso que eu chamo particularmente a attenção do governo sobre este objecto. E desejo saber não só quaes as suas idéas sobre a medida legislativa que hade resolver a questão do Douro, mas principalmente sobre o importantissimo melhoramento do caminho de ferro.

O sr. Ministro da Fazenda: — O governo, como declarou logo que se apresentou ante o parlamento, está na intenção de attender muito particularmente ao objecto sobre que o orador chamou principalmente a sua attenção e n'esse sentido entende promover a discussão do projecto de lei para regular o commercio dos vinhos pelo que, respeitai as estradas sobre que o mesmo orador fez diversas considerações, deu o sr. Ministro algumas informações geraes que patenteavam o interesse do governo n'esta questão.

O sr. Visconde de Gouveia: — Eu ouvi com satisfação a explicação dada pelo nobre ministro, porque vejo que o gabinete toma a peito este negocio (O sr. Conde d'Avila: — Apoiado.) e deseja que se discuta quanto antes alguma medida util a tal respeito.

E devo aqui declarar que quando fallei na inefficacia, das medidas legislativas, não me referi a má vontade, ou incompetencia de nenhum dos governos que as têem proposto, mas sim á difficuldade da materia.

É porém por isto mesmo que eu mais desejo que se acabe quanto antes um estado precario, de duvida e incerteza, e se passe para um estado definitivo. E se novos embaraços apparecerem, mais facilmente se proverá de remedio.

Emquanto aos melhoramentos de transito vejo tambem com satisfação, que o nobre ministro concorda no pensamento de um caminho de ferro do Porto á Regua, e prefere sempre aquelle que mais nos approxime do reino vizinho; e digo que ouvi isto com muito prazer, porque me parece realmente ser este o meio que melhor conduz ao fim que devemos ter em vista,.ligando-se, pois, o Porto com uma das provincias de Hespanha por Traz os Montes, e fazendo-se um ramal que conduza á Regua; parece-me, que se preenche o mesmo fim que com o caminho directo da cidade do Porto á Regua (apoiados), o que seria mais trabalhoso e mais despendioso, a ponto mesmo que poderia ser difficil haver empreza que entrasse n'esse commettimento, quando por outro lado me parece poder-se contar, que feito o caminho do outro modo conforme acabei de indicar, não deixarão de apparecer companhias que d'elle se encarreguem.

Estimando ter ouvido a opinião do nobre ministro, tenho todavia pouca confiança na prompta realisação d'este grande melhoramento, por motivos que são obvios; e portanto limito-me agora ao que deixo dito (apoiados).

O -sr. Marquez de. Vallada: — Não quer demorar a discussão de parecer dado para ordem do dia, sobre a admissão do filho do fallecido par do reino, o sr. Larcher. E para annunciar uma interpellação que nada tem com a politica; não é acto de opposição, nem de apoio ao governo. Mas precisa antes mandar para a mesa um requerimento a pedir varios documentos, pois se trata de um negocio do dominio do publico. Todos sabem que o sr. general Passos se queixou do general Afflalo, por este o ter desafiado, e que em consequencia d'isto, parece que ha de ser cumprida a lei, indo responder este general a um conselho de guerra, como já aconteceu com outro caso dado entre o mesmo general Passos e o sr. Verissimo Alvares da Silva. Ainda bem, disse o orador, que eu não sou militar, e que não tenho portanto de me dirigir ao illustre general Passos, porque s. ex.ª é a unica pessoa privilegiada, que ha n'este paiz; em sendo negocio com s. ex.ª hão de cumprir-se as leis, ha de se fazer respeitar a disciplina, ha de fazer a prisão, e o conselho de guerra; mas com quaesquer outros, não é assim. O que o orador estranhai a desigualdade que tem observado. Quando se ataca o general Passos ainda que seja por uma carta dirigida a elle, o resultado é logo conselho de guerra, prisão, etc...; mas com outros já não é a mesmo.

Ora o general Afflalo diz, que o general Passos o obrigara a pedir a sua reforma, e desafiou-o; pois por isto foi mandado metter em conselho de guerra, segundo dizem os jornaes. Por outra parte parece que houve um desafio (estamos no tempo d'elles). Segundo consta, pelos jornaes, desafiaram esse dois membros do parlamento, e um que acabava de saír do ministerio, e parece que se quer deixar passar isto desapercebido; pois ò que consta é apenas, que pelo ministerio do reino se dirigiu um officio ao da guerra, para que este desse todas as providencias, a fim de evitar que tivessem logar, estes desafios, que são o do sr. Mathias de Carvalho, ex-ministro, com o sr. Santanna e Vasconcellos; bem como o do sr. Sá Carneiro com o sr. Joaquim Thomás Lobo d’Avila. Estes quatro desafios, originados dos dois primeiros fazem-lhe lembrar o que aconteceu no tempo do Senhor D. João V; Rei de Portugal, quando teve logar, um desafio no espaço, que deu logar, a doze desafios, e outro em Hespanha em que um fidalgo desafiado, veiu a Lisboa, e dirigindo-se a Almeirim, onde estava a côrte, verificou-se ali mesmo o combate, e este tomou taes proporções que já estavam em campo, do um lado quinze ou dezeseis combatentes, e do outro lado um numero igual.

O orador observa, que é certo não ter, a camara nada com os actos da vida particular, mas tem tudo com os actos da vida publica; portanto pede, elle orador, que sejam aqui enviados os documentos que vae designar, e quando elles aqui chegarem, ha de fazer a sua interpellação e chamar a attenção do governo, e de tres dignos, pares que pugnam muito pelo cumprimento das leis, que são o sr. Silva Cabral, o sr. Moraes Carvalho, o sr. Ferrer; para que todos tres lhe expliquem o sentido das leis a este respeito; bem como a respeito da igualdade dos direitos segundo, a carta constitucional; pois quer que se mantenham os principios e se acatem as leis, e que seja a liberdade igual; os direitos iguaes e as garantias as mesmas. Tambem sente que não esteja presente o sr. general Passos para fallar na presença de S. ex.ª, que lhe respondeu uma vez allegando os seus grandes serviços, e dizendo que nunca, elle orador, seria capaz de prestar alguns, queria mostrar a s. ex.ª o que são serviços e o que são desserviços e como é que se deve manter a responsabilidade de certos actos, sem de modo algum se recusar ao cumprimento d'esse dever..

Vae redigir o requerimento, esperando os documentos que o nobre ministro com a sua costumada benevolencia lhe annunciaque hão devir, desejando que o satisfaçam até porque S. ex.ª lhe faz o favor de o tratar com certa distincção.

O sr. Conde d'Avila.: — E dever não é favor.

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O Orador: — E a honra de ser seu amigo.

O sr. Conde d’Avila: — Honra não.

O Orador: — Ao que corresponde com o respeito devido a tão elevada capacidade.

O sr. Conde d'Avila: — Respeito á idade é que póde ser.

O sr. S. J. de Carvalho (sobre a ordem): — E para mandar para a mesa uma representação da santa casa da misericordia da villa de Óbidos, contra o projecto de lei da desamortisação. Peço que se junte ás outras que têem sido recebidas, para serem consideradas era occasião opportuna.

O sr. Presidente: — Emquanto o digno par escreve a sua proposta ou requerimento, vae ler-se o parecer que entra em ordem do dia.

Leu-se na mesa o

PARECER N.° 8

Senhores. — A commissão designada para interpor o parecer sobre o memorial em que o sr. Jayme Larcher pretende lhe seja julgado o direito de succeder na dignidade de par do reino ao sr. Joaquim Larcher, examinou escrupulosamente os documentos com que veiu instruido o dito memorial, e reconheceu que se acha nos termos da lei de 11 de abril de 1845, por ter satisfeito a todas as condições que esta exige para tomar assento na camara como successor de seu fallecido pae o digno par Joaquim Larcher.

Sala da commissão, em 2 de maio de 1865. = Diogo Antonio Correia de Sequeira Pinto = Joaquim Antonio de Aguiar — Vicente Ferrer Neto Paiva — Conde de Castro — José Bernardo da Silva Cabral — João de Almeida Moraes Pessanha.

O Sr. Presidente: — Esta em discussão. Se ninguem pede a palavra, vae votar-se.

O sr. Conde d'Avila: — Emquanto se distribuem as espheras, pedia eu a V. ex.mo que me desse a palavra.. O sr. Presidente: — Sim, senhor.

O sr. Ministro da Fazenda: — Não haverá duvida em dar os esclarecimentos que pedir o sr. marquez. S. ex.ª deplora que em paizes civilisados, homens cultos entreguem ao azar das armas em combates singulares a resolução de questões que as leis e tribunaes estão ahi para resolver; e associa-se de todo o coração aos que censuram o emprego de um modo de desaffronta, que é um insulto ás leis, á moralidade e ao bom senso.

O sr. Presidente: — Vae proceder-se á chamada para a votação do parecer.

Concluida a votação disse

O sr. Presidente: — Esta approvado o parecer n.° 8 por vinte e duas espheras brancas, que correspondem a um numero igual de votos, portanto a votação foi unanime. Quando o digno par se apresentar, será admittida a prestar juramento e a tomar o assento que lhe compete.

O sr. Marquez de Vallada: — O requerimento que manda para a mesa tem só por fim pedir esclarecimentos. Parece-lhe que não foi bem entendido. Não quer fazer a analyse de actos da vida de ninguem (não é esse o seu costume), nem trata de. avaliar se os desafios são ou não convenientes; declara que precisa d'estes documentos para depois fazer uma interpellação, declarando que não póde ser exceptuado o general Passos d'entre toda a gente. É preciso que O procedimento que houver com um militar, em relação ao general Passos, seja igual ao que houver com qualquer outro militar. Se é conveniente ou não que se dêem estes desforços, não entra n'isso, mas ha muito quem sustente que são necessarios. Emquanto á imprensa ha muitos individuos que tomam desforço mandando publicar artigos que não assignára para evitarem a responsabilidade d’elles; mas para esses lá estão os tribunaes. Não vem aqui justificar quaesquer actos do desforço particular; esses actos da vida particular são só para Deus e para os homens que os praticam; mas os da vida publica são do dominio publico. Precisa pois ver estes documentos, e depois, em relação á elles, é que hei de fazer a minha interpellação.

O sr. ministro da fazenda, conde d’Avila, respondeu muito bem; como homem experimentado hão se oppoz ao seu pedido, e pensa que ninguem se opporá.

O seu requerimento é o seguinte: (Leu e mandou para a mesa).

O sr. Ministro da Fazenda: — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — Vae ler-se na mesa(leu-se). Tem agora apalavra o sr. ministro.

O sr. Ministro da Fazenda: — Julgou dever dar um testemunho aos serviços do sr. general Passos, mencionando especialmente os que fez, pela sua cordura, affabilidade, moderação e espirito de rectidão, em Braga, depois da revolta que acabava de ter logar, conseguindo acalmar as paixões e conter aquelles que poderiam querer passar por vencedores, ao mesmo tempo que protegia aquelles que poderiam querer-se fazer passar por vencidos.

O sr. Marquez de Vallada: — Poucas palavras dirá, pois crê ter estabelecido bem a sua these. É necessario que não haja differença a favor do general Passos, embora seja carregado de serviços desejo, com o qual s. ex.ª se não daria por offendido, porque declarou n'esta camara que os officiaes podiam apreciar a conducta dos seus chefes. O orador combateu esta doutrina (O sr. Ministro da Fazenda: — Tambem eu), porque deseja que o exercito seja disciplinado, e entende com um homem de grande talento, o conde Balbo, que um paiz verdadeiramente civilisado é aquelle que tem na devida conta o seu exercito e a influencia que o mesmo deve ter e por consequencia não podia querer que triumphasse esse principio que destroe a disciplina e portanto, a influencia do exercito; mas s. ex.ª é que não podia logicamente oppor-se ao seu proprio principio com relação ao general Afflalo, que apreciou de um certo modo a conducta do seu chefe. Repete o orador que foi o primeiro a levantar a sua voz n’esta casa, quando o digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho suscitou a questão que obrigou o sr. Passos a saír do ministerio, e não o fez por duvidar «que s. ex.ª esteja carregado de serviços, mas porque não tem duas logicas; e é por isso que não reconhece agora em. s. ex.ª direito para exigir preito e homenagem em relação a si, quando não quer prestar esse preito e homenagem aos outros. A carta constitucional esta acima de tudo, porque é o grande principio da igualdade perante a lei. Esta opinião não é de hoje, já a tem ha muito tempo; e fallando ha poucos dias com um illustre membro d'esta casa, manifestou-a claramente.

Manda portanto o seu requerimento para a mesa, e depois tratará do assumpto para que o faz.

«Requeiro que pelas secretarias d'estado dos negocios do reino e da guerra seja enviada a esta camara copia da correspondencia que lá deve existir relativamente á carta dirigida pelo general Afflalo ao general Passos, e aos desafios entre estes dois militares e aos dos srs. Lobo d'Avila, Petit, Sant'Anna e Vasconcellos o Mathias de Carvalho.

«Camara dos pares, em 5 de maio de 1865. = Marquez de Vallada.»

O sr. Presidente: — Já não ha numero na sala para decidir o requerimento do digno par.

O sr. Marquez de Vallada: — -Quando for occasião.

O sr. Presidente: — Tem o sr. visconde de Gouveia a palavra.

O sr. Visconde de Gouveia: -Era unicamente para apresentar uma moção de ordem. Ficará para outra sessão.

O sr. Presidente: — A primeira sessão será na terça feira, porque não ha objecto algum sobre a mesa para a camara tratar, e a ordem do dia são pareceres de commissões.

Está levantada a sessão. Eram quasi cinco horas.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão de 5 de maio de 1865

Ex.mos srs. Conde de Castro.

Marquez de Ficalho.

Marquez de Fronteira.

Marquez de Vallada.

Conde de Alva

Conde d'Avila.

Conde de Avilez.

Conde de Bretiandos.

Conde de Thomar.

Visconde de Benagazil.

Visconde de Fornos de Algodres.

Visconde de Gouveia.

Visconde de Ribamar.

Visconde da Vargem da Ordem.

Barão de S. Pedro.

Barão de Villa Nova de Foscôa.

Pereira Coutinho.

Sousa Azevedo.

Rebello de Carvalho.

Sequeira Pinto.

Simões Margiochi.

Osorio e Sousa.

Silva Carvalho.

Pinto Basto.

Reis e Vasconcellos.

Julio Gomes da Silva Sanches.

Rebello da Silva.

Vellez Caldeira Castello Branco.

Vaz Preto Geraldes.

Sebastião José de Carvalho.

Vicente Ferrer Neto Paiva.

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