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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO DE 30 DE ABRIL DE 1867

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. CONDE DE LAVRADIO

Secretarios os digno pares

Ás duas horas e meia da tarde, estando presentes 33 dignos pares, foi declarada aberta a sessão.

Lida a acta da precedente, julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver observação em contrario.

O sr. Visconde de Gouveia: — Sr. presidente, peço a V. ex.ª que me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. ministro das obras publicas.

O sr. Presidente: — Tenho de participar á camara que as deputações, encarregadas de cumprimentar Sua Magestade El-Rei, no anniversario da outorga da carta constitucional, e apresentar á sancção regia differentes autographos de decretos das côrtes, foram recebidas pelo mesmo augusto senhor com a sua costumada benevolencia.

O sr. Silva Cabral: — Sr. presidente, mando para a mesa uma representação dos fabricantes de cerveja, representação que hoje me foi entregue por um dos seus signatarios. N'esta representação reclamam elles contra o novo imposto de consumo, pelo que respeita ao objecto da sua industria, fundando se em differentes rasões, e mostrando que o imposto que e quer agora lançar fará com que se acabe com aquella industria nascente do paiz.

Reconhecem a necessidade que ha dos impostos em geral, e estão promptos a fazer sacrificios sujeitando-se á elevação d'elles pelo que lhes diz respeito; mas o que os as susta são os varejos por ser a sua industria dependente do segredo na laboração. Eu porém devo dizer á camara, que sobre isto tratei de os esclarecer, quanto cabia em meus recursos, mostrando-lhes que se não deveriam dar as circumstancias que elles temem, porque o imposto em gera! não pesará sobre os generos que forem vendidos por grosso, e que mesmo quanto aos vendidos a retalho tinham o remedio das avenças.

Cumprindo no entanto cora o meu dever mando para a mesa a representação, e peço a V. ex.ª que lhe dê o destino conveniente.

O sr. Presidente: — Esta representação, alem da menção que d'ella se ha de fazer na acta, mandar-se-ha á respectiva commissão, e quando entrar em discussão o projecto a que ella se refere estará sobre a mesa, a fim dos dignos pares a poderem examinar.

(Entrou o sr. ministro da marinha.)

O sr. Marquez de Vallada: — Mandou para a mesa um requerimento pedindo varios esclarecimentos relativamente ás nossas colonias, e disse que chamára muito seriamente a attenção do governo, e muito especialmente a do sr. ministro da marinha, sobre objecto tão importante e momentoso. Que pedia estes esclarecimentos, porque deseja, quando os obtivesse, dirigir uma interpellação sobre o assumpto

Por esta occasião disse que as nossas colonias, na opinião de alguns, eram a esperança do nosso futuro, outros opinavam que no estado em que se acham, e estes são os mais rasoaveis, de pouco ou nada serviam; e disse o orador que, se assim continuarmos a descurar esta parte importante da monarchia, grave responsabilidade pesará sobre todos os homens que se empregam no governo do paiz.

Cuidemos pois das nossas colonias ou então subroguemos a quem as trate melhor e que nos dê com que pagarmos a nossa divida. Á questão de fazenda esta intimamente ligada com a questão colonial, e, resolvendo uma, necessaria mente havemos de resolver a outra. Entremos sinceramente n'esta empreza, e o paiz abençoará os nossos esforços.

O sr. Ministro da Marinha (Visconde da Praia Grande): Peço a palavra, sr. presidente, para responder ao illustre orador que me precedeu.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o requerimento que o digno par, o sr. marquez de Vallada, acaba de mandar para a mesa.

Leu-se na mesa o requerimento do digno par o sr. marquez de Vallada. É do teor seguinte:

REQUERIMENTO

Requeiro que, pela secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, seja enviada a esta camara uma relação de todas as propriedades cultivadas nas provincias de Angola e Moçambique, designando-se as differentes culturas.

Desejo saber qual o numero de ecclesiasticos existentes n'aquellas provincias, bem como o numero de soldados.

Camara dos pares, 30 de abril de 1867. = O par do reino, Marquez de Vallada.

Teve o competente destino.

O sr. Presidente: —Tem a palavra o sr. ministro da marinha.

O sr. Ministro da Marinha: — Sr. presidente, coméço por agradecer ao digno par, que acaba de mandar para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos a respeito das nossas colonias, as expressões benevolas que s. ex.ª me dirigiu. S. ex.ª chamou a attenção, do governo para o estado das nossas colonias, e para os melhoramentos que precisam, e_ apontou um dilemma, que é—ou o estado das nossas provincias ultramarinas melhorasse ou nos desfizéssemos d'ellas.

As nossas colonias, sr. presidente, têem merecido a attenção dos governos; não quero tornar este merecimento exclusivo para aquelle de que faço parte, porque todos os governos têem empregado os meios possiveis para o melhoramento das nossas colonias; mas é necessario não esquecer que, para que as colonias se desenvolvam e produzam os resultados que todos desejâmos, a fim de nos poderem ser uteis, é preciso o emprego de muitos capitaes, não só do estado, mas dos particulares, porque o estado só não póde tornar-se o cultivador de tão grande porção de terrenos (apoiados). Portanto são necessarias duas circumstancias— braços de colonos e capitaes. Escuso dizer á camara a difficuldade que ha em Portugal de achar quem se associe a emprezas seguras, quanto mais a emprezas arriscadas (apoia dos). Espero comtudo, sr. presidente, que, porque ha difficuldade em fecundar as riquezas d'aquelles feracissimos paizes, não tenhamos de adoptar a outra parte do dilemma que apresentou o digno par, isto é, que as deviamos vender para pagar a nossa divida.

Não obstante as difficuldades, que apenas mencionei, opporem-se ao desenvolvimento das nossas possessões africanas, nem por isso, sr. presidente, tem ellas deixado de ter consideraveis melhoramentos; e se nós as compararmos com as das outras potencias que não estão tão atrazadas como nós, como são a França e a Inglaterra, não acharemos differença tão grande entre as nossas e as d'aquelles paizes pelo que diz respeito ao seu rendimento para o thesouro da metropole, porque grande parte das despezas d'essas colonias são feitas pelas respectivas metropoles, taes como a do governo, administração da justiça, força militar de mar e terra, que todas, nas colonias francezas, são feitas pelo thesouro da mãe patria, e chamam-lhes despezas de soberania e protecção; e apesar d'estas despezas não estarem a cargo das colonias, apenas a Reunião, Martinica e Guadalupe deixam de receber subsidio para as suas despezas meramente locaes. Outro tanto acontece ás colonias inglezas em que a força militar é paga pela metropole, e que alem d'isso recebem pela maior parte subsidio. Se adoptassemos, isto é, se Portugal podesse incorrer n'essas despezas, se ao menos a força militar fosse paga pelo reino, todas as nossas colonias teriam sobras em logar de deficit, e essas sobras applicadas a melhoramentos locaes, taes como estradas, docas, caes, etc. etc. o seu estado não mereceria por certo a censura que lhe fez o digno par.

Eu, sr. presidente, não vim preparado para esta discussão, nem acho - agora occasião propria para tratar d'esta questão, porque é necessario dar-lhe uma grande latitude, a fim de ser tratada como convem e deve ser (apoiados). O digno par mandou para a mesa um requerimento pedindo certos esclarecimentos pela secretaria a meu cargo; uma parte d'elles será facil remette-los, porém os outros não. S. ex.ª começou por pedir uma lista das propriedades das provincias de Angola e Moçambique, e do modo como são cultivadas. E uma estatistica que não existe na secretaria, que se poderá mandar vir, mas que por certo levar muito tempo a colligir. Comtudo para satisfazer a s. ex.ª darei as ordens convenientes para as respectivas provincias.

Emquanto ao numero dos escravos é facil satisfazer o pedido do digno par, porque nós temos um registo dos escravos existentes; assim do mesmo modo a respeito dos soldados, porque tambem temos os mappas da força armada.

Tambem não acho difficil dizer a s. ex.ª quantos padres estão ahi missionando; e por esta occasião seja-me permittido acrescentar que o digno par disse muito bem affirmando que a civilisação das colonias depende em grande parte dos missionarios; e é opinião minha que valem mais, para estabelecer o nosso dominio, e segurar a obediencia ás leis em muitos logares de Africa, uns poucos de missionarios do que grandes batalhões (apoiados).

S. ex.ª, que olha para as cousas publicas com muita attenção, de certo não terá deixado escapar á sua observação que tem merecido a minha particular attenção o estado das missões nas provincias ultramarinas, e que tenho procurado dar-lhe o desenvolvimento que ellas ainda não tinham attingido, dando para esse fim desenvolvimento ao seminario de Sernache, quer augmentando-lhe o rendimento quer entregando a sua direcção ao bispo eleito de Macau, que ali tem prestado optimo serviço, que tenho muito prazer em reconhecer.

Já o anno passado houve n'aquelle seminario dezenove ordenações, e alguns missionarios ali educados já se acham nas nossas ilhas de Cabo Verde.

S. ex.ª sabe por certo que custa muito a fazer missionarios, e que de grande numero de alumnos que se admittem são poucos os que no fim de annos se descobre que têem vocação para a missão. É uma tarefa ardua, é um assumpto importante, e posso assegurar ao digno par que o não descuro. Vou ainda dar mais desenvolvimento ao seminario, augmentando a sua receita e melhorando o edificio para poder receber mais discipulos, e espero que alguma cousa se conseguirá para prover de padres e missionarios as nossas igrejas e missões do ultramar. (Entrou o sr. ministro das obras publicas.)

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente...

O sr. Presidente: — Primeiro tem a palavra o sr. visconde de Gouveia, porque esta presente o sr. ministro das obras publicas, a quem s. ex.ª quer dirigir algumas perguntas.

O sr. Marquez de Vallada: — Mas eu pedi a palavra sobre este incidente, e V. ex.ª, assim como todos os dignos pares que presidem a esta camara, costumam dar sempre a palavra em primeiro logar a quem a pede sobre o incidente que esta em discussão, e esta questão é importantissima.

O sr. Presidente: — Mas o sr. ministro respondeu immediatamente, e de mais já passou a meia hora.

O sr. Marquez de Vallada: — Mas eu tenho de fazer ainda algumas observações.

O sr. Presidente: — O digno par não póde dar mais explicações sobre um requerimento que fez e que já esta satisfeito.

O sr. Marquez de Vallada: — Mas sobre o requerimento suscitou-se discussão, e sobre essa discussão é que eu tenho que fazer mais algumas observações.

O sr. Presidente: — Torno a repetir, já passou a meia hora para se entrar na ordem do dia.

Tem a palavra, por parte da commissão de marinha, o digno par o sr. Ferrão.

O sr. Ferrão: — Sr. presidente, mando para a mesa o parecer da commissão de marinha e ultramar sobre o projecto de lei n.° 122, vindo da camara dos senhores deputados.

Leu-se na mesa e mandou-se imprimir. (Entrou o sr. ministro do reino.)

O sr. Visconde de Gouveia: — Como esta presente o sr ministro das obras publicas, aproveito a occasião de chamar a attenção de s. ex.ª para tres objectos, sobre os quaes já annunciei uma interpellação n'esta casa.

Creio que o nobre ministro estará habilitado para dar-me sobre elles as necessarias explicações. Não o estando, esperarei para occasião opportuna.

Começarei pela construcção da ponte sobre o Douro em frente da Regua. Não appareceu licitante na praça. E creio que o motivo foi comprehender-se no preço da obra a importancia provavel da portagem. Eu sei muito bem, e sabem todas as pessoas da localidade, que o calculo que no projecto do governo se fez a essas portagens era muito favoravel ao arrematante. Mas os licitantes não o sabem, querem realidades e não incertezas, e preferem um calculo seguro, embora menos vantajoso, a um lucro incerto e dependente de eventualidades.

O concurso portanto deve apresentar-se em outras bases, eliminando o valor das portagens das clausulas do contrato. E mais conveniente fôra mandar construir de prompto aquella obra por conta do estado.

Chamo tambem a attenção do sr. ministro para a importante estrada de Vizeu a Mangualde, cujos trabalhos se acham ha pouco parados. Esta estrada, que não excede 15 kilometros, é importantissima para os povos da Beira Alta, e liga com Vizeu todas as ricas povoações da serra da Estrella.

E o terceiro objecto da minha interpellação a necessidade da prompta construcção dós diversos ramaes que devem ligar o districto da Guarda, e especialmente os concelhos de Gouveia e Ceia com a estrada de Mangualde á Mealhada, e que formam a sua ligação com o caminho de ferro. Refiro-me especialmente ao ramal de Gouveia a Mangualde, que não excederá a 20 kilometros, de que já estão construidos cerca de 5 a começar da villa de Gouveia, e cujas estradas chegam á ponte do Mondego; e do ramal de Ceia a Nellas só ha a mesma estrada.

Folgarei que o nobre ministro possa dar-me sobre estes tres assumptos as explicações que desejo.

O sr. Presidente: — Devo declarar á camara que a meia hora concedida para se poder usar da palavra antes da ordem do dia já terminou, e portanto em o sr. ministro das obras publicas respondendo ao digno par, o sr. visconde de Gouveia, vamos entrar na ordem do dia.

Tem a palavra o sr. ministro das obras publicas. O sr. Ministro das Obras Publicas (Andrade Corvo): — Direi muito poucas palavras para responder ao digno par, o sr. visconde de Gouveia, sobre os assumptos para que chamou a attenção do governo. O objecto de que s. ex.ª se occupou em primeiro logar é d'aquelles que o governo não póde nunca esquecer, porque se refere á viação de uma provincia, a que é necessario dar todo o desenvolvimento. Emquanto ao segundo ponto direi tambem muito poucas palavras. Quando a construcção da ponte sobre o Douro foi posta a concurso, tomou-se para base o rendimento provavel da portagem sobre a ponte, acrescentando-se-lhe um certo capital que o governo punha á disposição dos contratadores. Emquanto á fixação da portagem, foi ella calculada de modo que é muito inferior ao rendimento provavel da ponte. Ora é bem certo que um objecto d'esta ordem, se não é tão pequeno que se possa esperar a concorrencia de muitos empreiteiros portuguezes, não é comtudo tão grande que possa chamar a attenção de empreiteiros estrangeiros. Parece-me pois que o mais conveniente será abrir concurso conjunctamente para a construcção das duas pontes, uma sobre o Douro e outra sobre o Tejo, o que já de certo convidará muito mais qualquer empreza. Para isso é necessario que seja aberta nova licitação para a construcção das referidas pontes, tornando-se as condições mais favoraveis para os concorrentes, a ver se assim se consegue levar a cabo obra tão importante; e no caso de não se poder ainda por esta fórma obter o fim desejado, tomará o governo conta da construcção.

Eu já disse o que é necessario fazer para conseguirmos possuir estas pontes, que reputo muito necessarias, porque hão de ligar entre si pontos importantes do paiz, que se acham separados por meio de rios, e que é preciso communicar, tanto mais que a communicação se faz hoje só por meio de barcas, o que alem do pouco commodo é bastante despendioso.

Emquanto á viação da Mealhada, e aos diversos ramaes a que o digno par se referiu, s. ex.ª sabe que essas construcções estão começadas, e que não têem continuado, porque não tem sido possivel o poder dar á construcção de todas as estradas o andamento que seria para desejar.

Sabe a camara perfeitamente que os fundos destinados para a construcção de estradas são muito limitados, e que é difficil applicar para cada uma d'ellas a somma necessa-