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ria para a sua prompta e completa construcção. É preciso limitarmo-nos ao systema de centralisar quanto possivel os trabalhos, não abrangendo todas as provincias ao mesmo tempo, mas attendendo de preferencia áquellas em que a necessidade de estradas se mostre mais urgente. Já vê pois a camara quanto é difficil, havendo pouco dinheiro para a construcção das estradas, attender a todas as reclamações dos povos, e deixar de seguir um systema de estricta economia. Com os poucos recursos de que se póde dispor, se se fossem a fazer estradas por muita parte, e se desse aos trabalhos uma divisão demasiadamente larga, o resultado seria gastar se dinheiro sem que os povos podessem colher utilidade real. D'esta sorte não só tarde se concluiriam os trabalhos, mas as despezas augmentariam por causa dos reparos a que essa demora daria logar. Posso asseverar ao digno par que n'aquellas estradas em que se esta procedendo a obras, os trabalhos continuam com actividade, e a sua conclusão não se póde demorar muito tempo.

Quanto aos ramaes, para que o digno par chamou a attenção do governo, estão-se a fazer os estudos, e depois d'elles concluidos se tomará a resolução que se julgar conveniente.

O sr. Visconde de Gouveia: — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — Não posso dar a palavra ao digno par sem consultar a camara, por isso que já passa da meia hora que o regimento marca para esta especie de conversações parlamentares.

O sr. Visconde de -Gouveia: — Eram só duas palavras que eu tinha a dizer, entretanto peço a V. ex.ª que queira ter a bondade de consultar a camara.

Consultada a camara, decidiu affirmativamente.

O sr. Visconde de Gouveia: — Eu agradeço ao illustre ministro as explicações que me deu, e dou me por satisfeito quanto ao fim principal da minha interpellação, por ver que s. ex.ª concorda na necessidade d'estas obras e da sua prompta conclusão.

Farei apenas uma observação muito simples relativa á ponte sobre o Douro. E é que, feita a obra por conta do estado, ainda mesmo que exceda alguma cousa o orçamento do projecto definitivo, posso asseverar a s. ex.ª, sem receio de enganar me, que o rendimento das portagens ha de ser sufficiente para pagar o juro do capital despendido na ponte.

Não quero abusar mais da condescendencia da camara, mas não devo omittir esta observação, que é tambem a opinião das pessoas da localidade, que conhecem as circumstancias do transito e o rendimento das differentes barcas que ali existem.

O sr. Menezes Pita: — Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte representação (leu).

Peço a V. ex.ª lhe dê o mesmo destino que se tem dado a outras de igual natureza.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: — Passâmos á ordem do dia. Vae ler-se o parecer n.° 153.

O sr. Secretario: — Leu, e é do teor seguinte:

PARECER N.° 153

Senhores. — A commissão de legislação examinou com a mais detida attenção o processo correccional, que pelo districto criminal da comarca de Lisboa foi enviado a esta camara, por n'elle se acharem envolvidos os dignos pares do reino, barão de Villa Nova de Foscôa e Luiz de Castro Guimarães, na qualidade de directores da companhia do gaz d'esta cidade.

Consiste o facto, de que os dignos pares são arguidos, em terem desobedecido á intimação que, em virtude da portaria do ministerio do reino de 6 de abril de 1861, lhes fôra feita para que immediatamente suspendessem a continuação de um novo gazometro, até que pelo resultado da licença policial se mostrasse que a obra podia continuar sem risco para o serviço publico.

Verificou-se o facto da continuação da obra da construcção do novo gazometro.

A commissão todavia,

Considerando que a execução da referida portaria importava na essencia um embargo de nova obra, que só é da competencia do poder judiciario ordenar a requerimento de parte legitima, nos casos em que a lei o permitte;

Considerando que o artigo 364.° do codigo administrativo deve concordar com os artigos 188.° e 70.° do codigo penal e com o artigo 145.° § 1.° da lei fundamental do estado;

Considerando que os estabelecimentos de gaz não são qualificados em 1.* classe como insalubres ou perigosos, mas só em 2.* classe como incommodos, e que os dignos pares, na referida qualidade, não receberam intimação alguma para a suspensão da laboração do novo gazometro, mas para a da continuação da sua construcção, acto apenas preparatorio da mesma laboração;

Considerando o que sobre taes materias se acha disposto e auctorisado nos regulamentos policiaes e de saude, e bem assim o que fôra expressamente concedido á companhia do gaz, em seus estatutos approvados por decreto do governo:

E de parecer que não ha desobediencia caracterisada crime nas leis do reino, e que portanto não tem logar proseguir-se em termos ulteriores, em conformidade com o artigo 27.° da carta.

Sala da commissão, 23 de abril de 1867. = José Bernardo da Silva Cabral, presidente = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão — Conde de Fornos de Algodres = Tem voto do digno par Alberto Antonio de Moraes Carvalho.

O sr. Presidente: — Esta em discussão.

O sr. Marquez de Vallada: — Pedia novamente a palavra.

O sr. Presidente: — Depois de discutido e votado este parecer eu darei a palavra a V. ex.ª Agora não se póde interromper o andamento d'este parecer. Portanto esta em discussão o parecer que já enunciei.

O ar. Conde de Cavalleiros: — Sr. presidente, eu entendo que não póde existir á face dos principios constitucionaes consignados na carta privilegio algum que não se funde nas conveniencias publicas. Á vista d'isto estou na firme resolução de votar sempre todas as licenças que se peçam a esta casa para ter logar qualquer procedimento judicial contra os individuos d'ella que fóra d'esta casa provocaram esse procedimento. Isto é para mim irrevogavel, porque não quero sanccionar a impunidade; mas tendo em muito pouco os meus conhecimentos, e respeitando immenso as pessoas que fazem parte da commissão de legislação, e vendo n'este parecer que se não permitte a continuação do processo contra dois individuos nossos collegas, e não se permitte fundando-se a commissão em rasões que eu mesmo não sei apreciar, desejo que o illustre relator da commissão me explique este negocio, e me diga se qualquer outro cidadão existente fóra d'esta casa tiver contra si qualquer procedimento judicial ou administrativo, esse cidadão se podia livra da acção administrativa ou judicial como se livram os dois membros d'esta casa pelo parecer da commissão? Eis a desigualdade! Agora é que eu podia felicitar o meu nobre amigo o sr. visconde de Fonte Arcada por haver pugnado pelo seu projecto a respeito das incompatibilidades parlamentares. Na verdade uma lei sobre incompatibilidades seria de grande conveniencia publica; mas a grande incompatibilidade esta nas pessoas conhecerem ou não a sua posição e afastarem-se das situações que as podem comprometter. Repito, não posso approvar este parecer, e voto sempre que se dêem as licenças pedidas a esta camara, para que os tribunaes possam proceder livremente, e os cidadãos não tenham de que se queixar d'um privilegio, que se não funda em vantagem alguma publica.

O sr. Ferrão: — Sr. presidente, eu abundo exactamente nas idéas que acaba de expressar o digno par que me precedeu. Effectivamente os membros d'esta casa devem responder pelos actos que praticam em contravenção das leis, mas tambem é certo que, qualquer cidadão que estivesse nas mesmas circumstancias, não teria commettido crime no facto a que se refere o parecer que discutimos. A commissão, no seu parecer, apresenta as rasões em que se baseou para assim o demonstrar.

Eu vou dar algumas explicações mais á camara a este respeito.

A companhia de fabricação do gaz destinado para a illuminação da cidade de Lisboa foi instituida em 1846. Teve estatutos n'essa data; teve-os depois modificados, primeira e segunda vez, e em todos se encontra o decreto ou alvará regio de confirmação, assim como a disposição para construir o gazometro ou gazometros indispensaveis para o serviço publico de que a companhia se encarregou.

Os sucessivos regulamentos de saude têem todos força de lei, e são os que foram promulgados desde 1855 a 1863, e em todos vem estabelecida e reproduzida a disposição geral, que vou ter:

«A licença de conservação não exime os estabelecimentos actuaes de serem obrigados a suspender peremptoriamente a sua laboração ou a effectuar a sua remoção prompta, em casos de risco imminente, como insalubres ou perigosos, quando assim lhes seja ordenado.»

Ora aconteceu que o governo, por portaria do ministerio, do reino, de 6 de abril de 1861, mandou suspender a continuação da obra de um novo gazometro, quando em primeiro logar elle não tinha competencia para ordenar essa especie de embargo de nova obra, mas sim o poder judicial; e quando, em segundo logar, os ditos regulamentos de saude só permittiam ao governo, e em casos de risco imminente, a laboração, e não a construcção, o que é mui distincto.

N'esta situação, os dignos pares que são arguidos de desobediencia, continuaram a construcção, e desobedeceram por esse facto á intimação que lhes fôra feita administrativamente por virtude da dita portaria de 6 de abril. Ora, pergunto eu se é crime desobedecer a auctoridades incompetentes? Parece-me que não.

O codigo administrativo, no artigo 364.°, equipara ás desobediencias ás justiças as que se fizerem ás auctoridades administrativas.

Mas este artigo do codigo administrativo deve concordar, como diz a commissão em seu parecer, com o artigo 188.° do codigo penal que definiu os característicos essenciaes para que os factos de desobediencia possam ser qualificados crime.

Ainda que o codigo penal não fosse uma lei posterior ao facto de que se trata, não podia ser-lhe applicado, por isso que o artigo 70.° do mesmo codigo determinou que, sempre que a lei penal posterior qualifica diversamente, ou attenua a penalidade, é a disposição posterior, e não a anterior, a que deve ser observada.

Ora, que determina o artigo 188.° do codigo penal, sobre os elementos constitutivos da sua incriminação? Que a auctoridade seja competente, que a obediencia seja devida; logo parece evidente que o artigo do codigo administrativo, a que me referi, se deve entender inteiramente conforme com os artigos 188.° e 70.° do codigo penal, assim como com o artigo 145.° da carta constitucional, que declara que = nenhum cidadão é obrigado a fazer ou deixar de fazer cousa alguma senão em virtude da lei =.

N'estas circumstancias, em vista do artigo 27.° da mesma carta e do respectivo regimento, nada mais havia a fazer que declarar, como a commissão declarou, que não tinha logar o proseguimento do processo correccional instaurado contra os dignos pares pelo facto de que se trata.

Devo declarar que este parecer da commissão tem voto dos dignos pares os srs. Pitta e Visconde de Seabra, que não estão assignados, mas que foram concordes]; sendo portanto unanime a commissão em declarar que não havia crime," e por consequencia que não tinha logar a continuação dos termos ulteriores do processo, na conformidade dos artigos 27.° e 41.° da carta constitucional. E esta a unica rasão, a que a commissão se soccorre; podia' dar outras, que não fossem juridicas, mas politicas. A carta não as expressa; e onde a lei não distingue, não podemos nós distinguir.

Mas não havendo, para a commissão, rasão alguma politica, e parecendo-lhe de evidencia a falta de criminalidade, a commissão, composta de homens de lei, não podia, nem devia, motivar de outra fórma o seu parecer.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Sr. presidente, não tomaria a palavra se o digno par, o sr. conde de Cavalleiros, não tivesse pronunciado o meu nome, e alludido ao meu projecto de lei, que esta na commissão, e de que s. ex.ª é relator. Tinha tenção de votar silencioso o parecer em discussão, mas á vista da referencia que s. ex.ª fez ao meu nome, não posso deixar de dizer algumas palavras relativamente ao parecer.

Sr. presidente, o que se deve evitar é que os membros do parlamento sejam directores de companhias. Isto é que não lhes póde ser permittido, porque faltam, não digo á sua honra, de que não são capazes, mas ao seu decoro. Quando se têem grandes privilegios, como têem os membros do parlamento para conservar a sua independencia, não lhes deve ser permittido que por um facto proprio, alheio das suas funcções, se ponham em circumstancias de não poder nas questões relativas ás companhias de que são directores dar o seu voto.. Este é que é o caso e o verdadeiro estado da questão. E assim como eu a encaro.

Sr. presidente, espero ainda que o meu projecto de incompatibilidades ha de vir a ser lei. Taxaram-no de deficiente, porém se é, a commissão que augmente o que lhe falta; mas a verdade é que se reconhece a necessidade de uma lei similhante.

A vista das palavras do sr. relator da commissão, a quem esta commettido o meu projecto, o sr. conde de Cavalleiros, parece-me que posso esperar de o ter ao meu lado n'esta gravissima questão. Quanto a mim não hei de deixar de insistir sempre para que o meu projecto tenha seguimento.

Para mostrar que é incompativel com a dignidade de um membro do parlamento que os seus membros sejam directores de companhias, citarei um exemplo.

Ha um contrato celebrado com o sr. Debrousse, pelo qual se aliena para sempre nada menos do que uma grande extensão de terreno junto á cidade de Lisboa, desde a Ribeira Nova até Belem.

Este contrato esta hybernado na commissão da outra casa, talvez para depois saír mais gordo, em contrario do que acontece com os animaes que hybernam, que sáem sempre mais magros quando voltam á vida, porque no intervallo nada comem.

Ora, como poderá um membro do parlamento, que approvar este importante contrato, vir depois a ser director da companhia? Este facto, posto que posterior, não invalidará o seu voto de approvação do contrato? Assim de todos os que forem privilegiados e que precisem sancção parlamentar.

Se as leis actuam sobre os costumes (como estes sobre as mesmas leis), são precisas boas leis para que se façam bons costumes, então façamos boas leis para que ellas promovam os bons costumes. Esta é que é a verdade, este é que é o meu modo de pensar já ha muito conhecido.

Sr. presidente, não quero entrar mais n'esta discussão; se entrei n'ella, repito, foi só porque o sr. conde de Cavalleiros se referiu a mim; e declaro que muito folguei de ouvir o que s. ex.ª disse agora, que me leva a esperar que I ha de ser um estrenuo defensor do meu projecto.

O sr. Costa Lobo: — Sr. presidente, não pedi a palavra para entrar propriamente na materia de que se trata, porque não vou apreciar se os dignos pares, de que falla o parecer, são ou não culpados. Não é esse o meu fim.

Acredito o que diz o parecer da illustre commissão, isto é, acredito que não ha crime; acredito que o facto de que são accusados os dignos pares não é verdadeiramente criminoso; mas a minha questão é que nós não podemos actualmente decidir isso.

Para se dizer que um facto qualquer não constitue crime, é preciso constituir a camara em tribunal de justiça. Este é que é o fundamento da minha argumentação, e o que manda a carta constitucional. (O sr. Silva Cabral: — Peço a palavra.)

Quando o artigo 27.° da carta determina que se peça licença á camara para que possa continuar o processo, qual foi a rasão por que o fez? A rasão foi para que se conservasse em toda a sua extensão a independencia do poder parlamentar; não foi para que a camara podesse desde logo decidir se havia ou não crime, porque então a constituição da camara em tribunal de justiça era uma superfluidade, era um absurdo! A rasão foi para que os membros do parlamento tivessem a independencia garantida de modo tal, que não estivessem sujeitos aos abusos praticados pelo poder judicial, e principalmente pelo poder executivo, podendo a camara decidir que não continuassem os processos, e ficassem, por esse facto, livres de todos os incommodos que lhes podessem causar os abusos d'esses poderes. Mas fazer o que fez a illustre commissão, examinar o processo e os argumentos apresentados, e vir dizer á camara que vote, porque não ha crime, isto é o transtorno completo das funcções constitucionaes!