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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO DE 30 DE ABRIL DE 1867

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. CONDE DE LAVRADIO

Secretarios os digno pares

Ás duas horas e meia da tarde, estando presentes 33 dignos pares, foi declarada aberta a sessão.

Lida a acta da precedente, julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver observação em contrario.

O sr. Visconde de Gouveia: — Sr. presidente, peço a V. ex.ª que me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. ministro das obras publicas.

O sr. Presidente: — Tenho de participar á camara que as deputações, encarregadas de cumprimentar Sua Magestade El-Rei, no anniversario da outorga da carta constitucional, e apresentar á sancção regia differentes autographos de decretos das côrtes, foram recebidas pelo mesmo augusto senhor com a sua costumada benevolencia.

O sr. Silva Cabral: — Sr. presidente, mando para a mesa uma representação dos fabricantes de cerveja, representação que hoje me foi entregue por um dos seus signatarios. N'esta representação reclamam elles contra o novo imposto de consumo, pelo que respeita ao objecto da sua industria, fundando se em differentes rasões, e mostrando que o imposto que e quer agora lançar fará com que se acabe com aquella industria nascente do paiz.

Reconhecem a necessidade que ha dos impostos em geral, e estão promptos a fazer sacrificios sujeitando-se á elevação d'elles pelo que lhes diz respeito; mas o que os as susta são os varejos por ser a sua industria dependente do segredo na laboração. Eu porém devo dizer á camara, que sobre isto tratei de os esclarecer, quanto cabia em meus recursos, mostrando-lhes que se não deveriam dar as circumstancias que elles temem, porque o imposto em gera! não pesará sobre os generos que forem vendidos por grosso, e que mesmo quanto aos vendidos a retalho tinham o remedio das avenças.

Cumprindo no entanto cora o meu dever mando para a mesa a representação, e peço a V. ex.ª que lhe dê o destino conveniente.

O sr. Presidente: — Esta representação, alem da menção que d'ella se ha de fazer na acta, mandar-se-ha á respectiva commissão, e quando entrar em discussão o projecto a que ella se refere estará sobre a mesa, a fim dos dignos pares a poderem examinar.

(Entrou o sr. ministro da marinha.)

O sr. Marquez de Vallada: — Mandou para a mesa um requerimento pedindo varios esclarecimentos relativamente ás nossas colonias, e disse que chamára muito seriamente a attenção do governo, e muito especialmente a do sr. ministro da marinha, sobre objecto tão importante e momentoso. Que pedia estes esclarecimentos, porque deseja, quando os obtivesse, dirigir uma interpellação sobre o assumpto

Por esta occasião disse que as nossas colonias, na opinião de alguns, eram a esperança do nosso futuro, outros opinavam que no estado em que se acham, e estes são os mais rasoaveis, de pouco ou nada serviam; e disse o orador que, se assim continuarmos a descurar esta parte importante da monarchia, grave responsabilidade pesará sobre todos os homens que se empregam no governo do paiz.

Cuidemos pois das nossas colonias ou então subroguemos a quem as trate melhor e que nos dê com que pagarmos a nossa divida. Á questão de fazenda esta intimamente ligada com a questão colonial, e, resolvendo uma, necessaria mente havemos de resolver a outra. Entremos sinceramente n'esta empreza, e o paiz abençoará os nossos esforços.

O sr. Ministro da Marinha (Visconde da Praia Grande): Peço a palavra, sr. presidente, para responder ao illustre orador que me precedeu.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o requerimento que o digno par, o sr. marquez de Vallada, acaba de mandar para a mesa.

Leu-se na mesa o requerimento do digno par o sr. marquez de Vallada. É do teor seguinte:

REQUERIMENTO

Requeiro que, pela secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, seja enviada a esta camara uma relação de todas as propriedades cultivadas nas provincias de Angola e Moçambique, designando-se as differentes culturas.

Desejo saber qual o numero de ecclesiasticos existentes n'aquellas provincias, bem como o numero de soldados.

Camara dos pares, 30 de abril de 1867. = O par do reino, Marquez de Vallada.

Teve o competente destino.

O sr. Presidente: —Tem a palavra o sr. ministro da marinha.

O sr. Ministro da Marinha: — Sr. presidente, coméço por agradecer ao digno par, que acaba de mandar para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos a respeito das nossas colonias, as expressões benevolas que s. ex.ª me dirigiu. S. ex.ª chamou a attenção, do governo para o estado das nossas colonias, e para os melhoramentos que precisam, e_ apontou um dilemma, que é—ou o estado das nossas provincias ultramarinas melhorasse ou nos desfizéssemos d'ellas.

As nossas colonias, sr. presidente, têem merecido a attenção dos governos; não quero tornar este merecimento exclusivo para aquelle de que faço parte, porque todos os governos têem empregado os meios possiveis para o melhoramento das nossas colonias; mas é necessario não esquecer que, para que as colonias se desenvolvam e produzam os resultados que todos desejâmos, a fim de nos poderem ser uteis, é preciso o emprego de muitos capitaes, não só do estado, mas dos particulares, porque o estado só não póde tornar-se o cultivador de tão grande porção de terrenos (apoiados). Portanto são necessarias duas circumstancias— braços de colonos e capitaes. Escuso dizer á camara a difficuldade que ha em Portugal de achar quem se associe a emprezas seguras, quanto mais a emprezas arriscadas (apoia dos). Espero comtudo, sr. presidente, que, porque ha difficuldade em fecundar as riquezas d'aquelles feracissimos paizes, não tenhamos de adoptar a outra parte do dilemma que apresentou o digno par, isto é, que as deviamos vender para pagar a nossa divida.

Não obstante as difficuldades, que apenas mencionei, opporem-se ao desenvolvimento das nossas possessões africanas, nem por isso, sr. presidente, tem ellas deixado de ter consideraveis melhoramentos; e se nós as compararmos com as das outras potencias que não estão tão atrazadas como nós, como são a França e a Inglaterra, não acharemos differença tão grande entre as nossas e as d'aquelles paizes pelo que diz respeito ao seu rendimento para o thesouro da metropole, porque grande parte das despezas d'essas colonias são feitas pelas respectivas metropoles, taes como a do governo, administração da justiça, força militar de mar e terra, que todas, nas colonias francezas, são feitas pelo thesouro da mãe patria, e chamam-lhes despezas de soberania e protecção; e apesar d'estas despezas não estarem a cargo das colonias, apenas a Reunião, Martinica e Guadalupe deixam de receber subsidio para as suas despezas meramente locaes. Outro tanto acontece ás colonias inglezas em que a força militar é paga pela metropole, e que alem d'isso recebem pela maior parte subsidio. Se adoptassemos, isto é, se Portugal podesse incorrer n'essas despezas, se ao menos a força militar fosse paga pelo reino, todas as nossas colonias teriam sobras em logar de deficit, e essas sobras applicadas a melhoramentos locaes, taes como estradas, docas, caes, etc. etc. o seu estado não mereceria por certo a censura que lhe fez o digno par.

Eu, sr. presidente, não vim preparado para esta discussão, nem acho - agora occasião propria para tratar d'esta questão, porque é necessario dar-lhe uma grande latitude, a fim de ser tratada como convem e deve ser (apoiados). O digno par mandou para a mesa um requerimento pedindo certos esclarecimentos pela secretaria a meu cargo; uma parte d'elles será facil remette-los, porém os outros não. S. ex.ª começou por pedir uma lista das propriedades das provincias de Angola e Moçambique, e do modo como são cultivadas. E uma estatistica que não existe na secretaria, que se poderá mandar vir, mas que por certo levar muito tempo a colligir. Comtudo para satisfazer a s. ex.ª darei as ordens convenientes para as respectivas provincias.

Emquanto ao numero dos escravos é facil satisfazer o pedido do digno par, porque nós temos um registo dos escravos existentes; assim do mesmo modo a respeito dos soldados, porque tambem temos os mappas da força armada.

Tambem não acho difficil dizer a s. ex.ª quantos padres estão ahi missionando; e por esta occasião seja-me permittido acrescentar que o digno par disse muito bem affirmando que a civilisação das colonias depende em grande parte dos missionarios; e é opinião minha que valem mais, para estabelecer o nosso dominio, e segurar a obediencia ás leis em muitos logares de Africa, uns poucos de missionarios do que grandes batalhões (apoiados).

S. ex.ª, que olha para as cousas publicas com muita attenção, de certo não terá deixado escapar á sua observação que tem merecido a minha particular attenção o estado das missões nas provincias ultramarinas, e que tenho procurado dar-lhe o desenvolvimento que ellas ainda não tinham attingido, dando para esse fim desenvolvimento ao seminario de Sernache, quer augmentando-lhe o rendimento quer entregando a sua direcção ao bispo eleito de Macau, que ali tem prestado optimo serviço, que tenho muito prazer em reconhecer.

Já o anno passado houve n'aquelle seminario dezenove ordenações, e alguns missionarios ali educados já se acham nas nossas ilhas de Cabo Verde.

S. ex.ª sabe por certo que custa muito a fazer missionarios, e que de grande numero de alumnos que se admittem são poucos os que no fim de annos se descobre que têem vocação para a missão. É uma tarefa ardua, é um assumpto importante, e posso assegurar ao digno par que o não descuro. Vou ainda dar mais desenvolvimento ao seminario, augmentando a sua receita e melhorando o edificio para poder receber mais discipulos, e espero que alguma cousa se conseguirá para prover de padres e missionarios as nossas igrejas e missões do ultramar. (Entrou o sr. ministro das obras publicas.)

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente...

O sr. Presidente: — Primeiro tem a palavra o sr. visconde de Gouveia, porque esta presente o sr. ministro das obras publicas, a quem s. ex.ª quer dirigir algumas perguntas.

O sr. Marquez de Vallada: — Mas eu pedi a palavra sobre este incidente, e V. ex.ª, assim como todos os dignos pares que presidem a esta camara, costumam dar sempre a palavra em primeiro logar a quem a pede sobre o incidente que esta em discussão, e esta questão é importantissima.

O sr. Presidente: — Mas o sr. ministro respondeu immediatamente, e de mais já passou a meia hora.

O sr. Marquez de Vallada: — Mas eu tenho de fazer ainda algumas observações.

O sr. Presidente: — O digno par não póde dar mais explicações sobre um requerimento que fez e que já esta satisfeito.

O sr. Marquez de Vallada: — Mas sobre o requerimento suscitou-se discussão, e sobre essa discussão é que eu tenho que fazer mais algumas observações.

O sr. Presidente: — Torno a repetir, já passou a meia hora para se entrar na ordem do dia.

Tem a palavra, por parte da commissão de marinha, o digno par o sr. Ferrão.

O sr. Ferrão: — Sr. presidente, mando para a mesa o parecer da commissão de marinha e ultramar sobre o projecto de lei n.° 122, vindo da camara dos senhores deputados.

Leu-se na mesa e mandou-se imprimir. (Entrou o sr. ministro do reino.)

O sr. Visconde de Gouveia: — Como esta presente o sr ministro das obras publicas, aproveito a occasião de chamar a attenção de s. ex.ª para tres objectos, sobre os quaes já annunciei uma interpellação n'esta casa.

Creio que o nobre ministro estará habilitado para dar-me sobre elles as necessarias explicações. Não o estando, esperarei para occasião opportuna.

Começarei pela construcção da ponte sobre o Douro em frente da Regua. Não appareceu licitante na praça. E creio que o motivo foi comprehender-se no preço da obra a importancia provavel da portagem. Eu sei muito bem, e sabem todas as pessoas da localidade, que o calculo que no projecto do governo se fez a essas portagens era muito favoravel ao arrematante. Mas os licitantes não o sabem, querem realidades e não incertezas, e preferem um calculo seguro, embora menos vantajoso, a um lucro incerto e dependente de eventualidades.

O concurso portanto deve apresentar-se em outras bases, eliminando o valor das portagens das clausulas do contrato. E mais conveniente fôra mandar construir de prompto aquella obra por conta do estado.

Chamo tambem a attenção do sr. ministro para a importante estrada de Vizeu a Mangualde, cujos trabalhos se acham ha pouco parados. Esta estrada, que não excede 15 kilometros, é importantissima para os povos da Beira Alta, e liga com Vizeu todas as ricas povoações da serra da Estrella.

E o terceiro objecto da minha interpellação a necessidade da prompta construcção dós diversos ramaes que devem ligar o districto da Guarda, e especialmente os concelhos de Gouveia e Ceia com a estrada de Mangualde á Mealhada, e que formam a sua ligação com o caminho de ferro. Refiro-me especialmente ao ramal de Gouveia a Mangualde, que não excederá a 20 kilometros, de que já estão construidos cerca de 5 a começar da villa de Gouveia, e cujas estradas chegam á ponte do Mondego; e do ramal de Ceia a Nellas só ha a mesma estrada.

Folgarei que o nobre ministro possa dar-me sobre estes tres assumptos as explicações que desejo.

O sr. Presidente: — Devo declarar á camara que a meia hora concedida para se poder usar da palavra antes da ordem do dia já terminou, e portanto em o sr. ministro das obras publicas respondendo ao digno par, o sr. visconde de Gouveia, vamos entrar na ordem do dia.

Tem a palavra o sr. ministro das obras publicas. O sr. Ministro das Obras Publicas (Andrade Corvo): — Direi muito poucas palavras para responder ao digno par, o sr. visconde de Gouveia, sobre os assumptos para que chamou a attenção do governo. O objecto de que s. ex.ª se occupou em primeiro logar é d'aquelles que o governo não póde nunca esquecer, porque se refere á viação de uma provincia, a que é necessario dar todo o desenvolvimento. Emquanto ao segundo ponto direi tambem muito poucas palavras. Quando a construcção da ponte sobre o Douro foi posta a concurso, tomou-se para base o rendimento provavel da portagem sobre a ponte, acrescentando-se-lhe um certo capital que o governo punha á disposição dos contratadores. Emquanto á fixação da portagem, foi ella calculada de modo que é muito inferior ao rendimento provavel da ponte. Ora é bem certo que um objecto d'esta ordem, se não é tão pequeno que se possa esperar a concorrencia de muitos empreiteiros portuguezes, não é comtudo tão grande que possa chamar a attenção de empreiteiros estrangeiros. Parece-me pois que o mais conveniente será abrir concurso conjunctamente para a construcção das duas pontes, uma sobre o Douro e outra sobre o Tejo, o que já de certo convidará muito mais qualquer empreza. Para isso é necessario que seja aberta nova licitação para a construcção das referidas pontes, tornando-se as condições mais favoraveis para os concorrentes, a ver se assim se consegue levar a cabo obra tão importante; e no caso de não se poder ainda por esta fórma obter o fim desejado, tomará o governo conta da construcção.

Eu já disse o que é necessario fazer para conseguirmos possuir estas pontes, que reputo muito necessarias, porque hão de ligar entre si pontos importantes do paiz, que se acham separados por meio de rios, e que é preciso communicar, tanto mais que a communicação se faz hoje só por meio de barcas, o que alem do pouco commodo é bastante despendioso.

Emquanto á viação da Mealhada, e aos diversos ramaes a que o digno par se referiu, s. ex.ª sabe que essas construcções estão começadas, e que não têem continuado, porque não tem sido possivel o poder dar á construcção de todas as estradas o andamento que seria para desejar.

Sabe a camara perfeitamente que os fundos destinados para a construcção de estradas são muito limitados, e que é difficil applicar para cada uma d'ellas a somma necessa-

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ria para a sua prompta e completa construcção. É preciso limitarmo-nos ao systema de centralisar quanto possivel os trabalhos, não abrangendo todas as provincias ao mesmo tempo, mas attendendo de preferencia áquellas em que a necessidade de estradas se mostre mais urgente. Já vê pois a camara quanto é difficil, havendo pouco dinheiro para a construcção das estradas, attender a todas as reclamações dos povos, e deixar de seguir um systema de estricta economia. Com os poucos recursos de que se póde dispor, se se fossem a fazer estradas por muita parte, e se desse aos trabalhos uma divisão demasiadamente larga, o resultado seria gastar se dinheiro sem que os povos podessem colher utilidade real. D'esta sorte não só tarde se concluiriam os trabalhos, mas as despezas augmentariam por causa dos reparos a que essa demora daria logar. Posso asseverar ao digno par que n'aquellas estradas em que se esta procedendo a obras, os trabalhos continuam com actividade, e a sua conclusão não se póde demorar muito tempo.

Quanto aos ramaes, para que o digno par chamou a attenção do governo, estão-se a fazer os estudos, e depois d'elles concluidos se tomará a resolução que se julgar conveniente.

O sr. Visconde de Gouveia: — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — Não posso dar a palavra ao digno par sem consultar a camara, por isso que já passa da meia hora que o regimento marca para esta especie de conversações parlamentares.

O sr. Visconde de -Gouveia: — Eram só duas palavras que eu tinha a dizer, entretanto peço a V. ex.ª que queira ter a bondade de consultar a camara.

Consultada a camara, decidiu affirmativamente.

O sr. Visconde de Gouveia: — Eu agradeço ao illustre ministro as explicações que me deu, e dou me por satisfeito quanto ao fim principal da minha interpellação, por ver que s. ex.ª concorda na necessidade d'estas obras e da sua prompta conclusão.

Farei apenas uma observação muito simples relativa á ponte sobre o Douro. E é que, feita a obra por conta do estado, ainda mesmo que exceda alguma cousa o orçamento do projecto definitivo, posso asseverar a s. ex.ª, sem receio de enganar me, que o rendimento das portagens ha de ser sufficiente para pagar o juro do capital despendido na ponte.

Não quero abusar mais da condescendencia da camara, mas não devo omittir esta observação, que é tambem a opinião das pessoas da localidade, que conhecem as circumstancias do transito e o rendimento das differentes barcas que ali existem.

O sr. Menezes Pita: — Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte representação (leu).

Peço a V. ex.ª lhe dê o mesmo destino que se tem dado a outras de igual natureza.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: — Passâmos á ordem do dia. Vae ler-se o parecer n.° 153.

O sr. Secretario: — Leu, e é do teor seguinte:

PARECER N.° 153

Senhores. — A commissão de legislação examinou com a mais detida attenção o processo correccional, que pelo districto criminal da comarca de Lisboa foi enviado a esta camara, por n'elle se acharem envolvidos os dignos pares do reino, barão de Villa Nova de Foscôa e Luiz de Castro Guimarães, na qualidade de directores da companhia do gaz d'esta cidade.

Consiste o facto, de que os dignos pares são arguidos, em terem desobedecido á intimação que, em virtude da portaria do ministerio do reino de 6 de abril de 1861, lhes fôra feita para que immediatamente suspendessem a continuação de um novo gazometro, até que pelo resultado da licença policial se mostrasse que a obra podia continuar sem risco para o serviço publico.

Verificou-se o facto da continuação da obra da construcção do novo gazometro.

A commissão todavia,

Considerando que a execução da referida portaria importava na essencia um embargo de nova obra, que só é da competencia do poder judiciario ordenar a requerimento de parte legitima, nos casos em que a lei o permitte;

Considerando que o artigo 364.° do codigo administrativo deve concordar com os artigos 188.° e 70.° do codigo penal e com o artigo 145.° § 1.° da lei fundamental do estado;

Considerando que os estabelecimentos de gaz não são qualificados em 1.* classe como insalubres ou perigosos, mas só em 2.* classe como incommodos, e que os dignos pares, na referida qualidade, não receberam intimação alguma para a suspensão da laboração do novo gazometro, mas para a da continuação da sua construcção, acto apenas preparatorio da mesma laboração;

Considerando o que sobre taes materias se acha disposto e auctorisado nos regulamentos policiaes e de saude, e bem assim o que fôra expressamente concedido á companhia do gaz, em seus estatutos approvados por decreto do governo:

E de parecer que não ha desobediencia caracterisada crime nas leis do reino, e que portanto não tem logar proseguir-se em termos ulteriores, em conformidade com o artigo 27.° da carta.

Sala da commissão, 23 de abril de 1867. = José Bernardo da Silva Cabral, presidente = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão — Conde de Fornos de Algodres = Tem voto do digno par Alberto Antonio de Moraes Carvalho.

O sr. Presidente: — Esta em discussão.

O sr. Marquez de Vallada: — Pedia novamente a palavra.

O sr. Presidente: — Depois de discutido e votado este parecer eu darei a palavra a V. ex.ª Agora não se póde interromper o andamento d'este parecer. Portanto esta em discussão o parecer que já enunciei.

O ar. Conde de Cavalleiros: — Sr. presidente, eu entendo que não póde existir á face dos principios constitucionaes consignados na carta privilegio algum que não se funde nas conveniencias publicas. Á vista d'isto estou na firme resolução de votar sempre todas as licenças que se peçam a esta casa para ter logar qualquer procedimento judicial contra os individuos d'ella que fóra d'esta casa provocaram esse procedimento. Isto é para mim irrevogavel, porque não quero sanccionar a impunidade; mas tendo em muito pouco os meus conhecimentos, e respeitando immenso as pessoas que fazem parte da commissão de legislação, e vendo n'este parecer que se não permitte a continuação do processo contra dois individuos nossos collegas, e não se permitte fundando-se a commissão em rasões que eu mesmo não sei apreciar, desejo que o illustre relator da commissão me explique este negocio, e me diga se qualquer outro cidadão existente fóra d'esta casa tiver contra si qualquer procedimento judicial ou administrativo, esse cidadão se podia livra da acção administrativa ou judicial como se livram os dois membros d'esta casa pelo parecer da commissão? Eis a desigualdade! Agora é que eu podia felicitar o meu nobre amigo o sr. visconde de Fonte Arcada por haver pugnado pelo seu projecto a respeito das incompatibilidades parlamentares. Na verdade uma lei sobre incompatibilidades seria de grande conveniencia publica; mas a grande incompatibilidade esta nas pessoas conhecerem ou não a sua posição e afastarem-se das situações que as podem comprometter. Repito, não posso approvar este parecer, e voto sempre que se dêem as licenças pedidas a esta camara, para que os tribunaes possam proceder livremente, e os cidadãos não tenham de que se queixar d'um privilegio, que se não funda em vantagem alguma publica.

O sr. Ferrão: — Sr. presidente, eu abundo exactamente nas idéas que acaba de expressar o digno par que me precedeu. Effectivamente os membros d'esta casa devem responder pelos actos que praticam em contravenção das leis, mas tambem é certo que, qualquer cidadão que estivesse nas mesmas circumstancias, não teria commettido crime no facto a que se refere o parecer que discutimos. A commissão, no seu parecer, apresenta as rasões em que se baseou para assim o demonstrar.

Eu vou dar algumas explicações mais á camara a este respeito.

A companhia de fabricação do gaz destinado para a illuminação da cidade de Lisboa foi instituida em 1846. Teve estatutos n'essa data; teve-os depois modificados, primeira e segunda vez, e em todos se encontra o decreto ou alvará regio de confirmação, assim como a disposição para construir o gazometro ou gazometros indispensaveis para o serviço publico de que a companhia se encarregou.

Os sucessivos regulamentos de saude têem todos força de lei, e são os que foram promulgados desde 1855 a 1863, e em todos vem estabelecida e reproduzida a disposição geral, que vou ter:

«A licença de conservação não exime os estabelecimentos actuaes de serem obrigados a suspender peremptoriamente a sua laboração ou a effectuar a sua remoção prompta, em casos de risco imminente, como insalubres ou perigosos, quando assim lhes seja ordenado.»

Ora aconteceu que o governo, por portaria do ministerio, do reino, de 6 de abril de 1861, mandou suspender a continuação da obra de um novo gazometro, quando em primeiro logar elle não tinha competencia para ordenar essa especie de embargo de nova obra, mas sim o poder judicial; e quando, em segundo logar, os ditos regulamentos de saude só permittiam ao governo, e em casos de risco imminente, a laboração, e não a construcção, o que é mui distincto.

N'esta situação, os dignos pares que são arguidos de desobediencia, continuaram a construcção, e desobedeceram por esse facto á intimação que lhes fôra feita administrativamente por virtude da dita portaria de 6 de abril. Ora, pergunto eu se é crime desobedecer a auctoridades incompetentes? Parece-me que não.

O codigo administrativo, no artigo 364.°, equipara ás desobediencias ás justiças as que se fizerem ás auctoridades administrativas.

Mas este artigo do codigo administrativo deve concordar, como diz a commissão em seu parecer, com o artigo 188.° do codigo penal que definiu os característicos essenciaes para que os factos de desobediencia possam ser qualificados crime.

Ainda que o codigo penal não fosse uma lei posterior ao facto de que se trata, não podia ser-lhe applicado, por isso que o artigo 70.° do mesmo codigo determinou que, sempre que a lei penal posterior qualifica diversamente, ou attenua a penalidade, é a disposição posterior, e não a anterior, a que deve ser observada.

Ora, que determina o artigo 188.° do codigo penal, sobre os elementos constitutivos da sua incriminação? Que a auctoridade seja competente, que a obediencia seja devida; logo parece evidente que o artigo do codigo administrativo, a que me referi, se deve entender inteiramente conforme com os artigos 188.° e 70.° do codigo penal, assim como com o artigo 145.° da carta constitucional, que declara que = nenhum cidadão é obrigado a fazer ou deixar de fazer cousa alguma senão em virtude da lei =.

N'estas circumstancias, em vista do artigo 27.° da mesma carta e do respectivo regimento, nada mais havia a fazer que declarar, como a commissão declarou, que não tinha logar o proseguimento do processo correccional instaurado contra os dignos pares pelo facto de que se trata.

Devo declarar que este parecer da commissão tem voto dos dignos pares os srs. Pitta e Visconde de Seabra, que não estão assignados, mas que foram concordes]; sendo portanto unanime a commissão em declarar que não havia crime," e por consequencia que não tinha logar a continuação dos termos ulteriores do processo, na conformidade dos artigos 27.° e 41.° da carta constitucional. E esta a unica rasão, a que a commissão se soccorre; podia' dar outras, que não fossem juridicas, mas politicas. A carta não as expressa; e onde a lei não distingue, não podemos nós distinguir.

Mas não havendo, para a commissão, rasão alguma politica, e parecendo-lhe de evidencia a falta de criminalidade, a commissão, composta de homens de lei, não podia, nem devia, motivar de outra fórma o seu parecer.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Sr. presidente, não tomaria a palavra se o digno par, o sr. conde de Cavalleiros, não tivesse pronunciado o meu nome, e alludido ao meu projecto de lei, que esta na commissão, e de que s. ex.ª é relator. Tinha tenção de votar silencioso o parecer em discussão, mas á vista da referencia que s. ex.ª fez ao meu nome, não posso deixar de dizer algumas palavras relativamente ao parecer.

Sr. presidente, o que se deve evitar é que os membros do parlamento sejam directores de companhias. Isto é que não lhes póde ser permittido, porque faltam, não digo á sua honra, de que não são capazes, mas ao seu decoro. Quando se têem grandes privilegios, como têem os membros do parlamento para conservar a sua independencia, não lhes deve ser permittido que por um facto proprio, alheio das suas funcções, se ponham em circumstancias de não poder nas questões relativas ás companhias de que são directores dar o seu voto.. Este é que é o caso e o verdadeiro estado da questão. E assim como eu a encaro.

Sr. presidente, espero ainda que o meu projecto de incompatibilidades ha de vir a ser lei. Taxaram-no de deficiente, porém se é, a commissão que augmente o que lhe falta; mas a verdade é que se reconhece a necessidade de uma lei similhante.

A vista das palavras do sr. relator da commissão, a quem esta commettido o meu projecto, o sr. conde de Cavalleiros, parece-me que posso esperar de o ter ao meu lado n'esta gravissima questão. Quanto a mim não hei de deixar de insistir sempre para que o meu projecto tenha seguimento.

Para mostrar que é incompativel com a dignidade de um membro do parlamento que os seus membros sejam directores de companhias, citarei um exemplo.

Ha um contrato celebrado com o sr. Debrousse, pelo qual se aliena para sempre nada menos do que uma grande extensão de terreno junto á cidade de Lisboa, desde a Ribeira Nova até Belem.

Este contrato esta hybernado na commissão da outra casa, talvez para depois saír mais gordo, em contrario do que acontece com os animaes que hybernam, que sáem sempre mais magros quando voltam á vida, porque no intervallo nada comem.

Ora, como poderá um membro do parlamento, que approvar este importante contrato, vir depois a ser director da companhia? Este facto, posto que posterior, não invalidará o seu voto de approvação do contrato? Assim de todos os que forem privilegiados e que precisem sancção parlamentar.

Se as leis actuam sobre os costumes (como estes sobre as mesmas leis), são precisas boas leis para que se façam bons costumes, então façamos boas leis para que ellas promovam os bons costumes. Esta é que é a verdade, este é que é o meu modo de pensar já ha muito conhecido.

Sr. presidente, não quero entrar mais n'esta discussão; se entrei n'ella, repito, foi só porque o sr. conde de Cavalleiros se referiu a mim; e declaro que muito folguei de ouvir o que s. ex.ª disse agora, que me leva a esperar que I ha de ser um estrenuo defensor do meu projecto.

O sr. Costa Lobo: — Sr. presidente, não pedi a palavra para entrar propriamente na materia de que se trata, porque não vou apreciar se os dignos pares, de que falla o parecer, são ou não culpados. Não é esse o meu fim.

Acredito o que diz o parecer da illustre commissão, isto é, acredito que não ha crime; acredito que o facto de que são accusados os dignos pares não é verdadeiramente criminoso; mas a minha questão é que nós não podemos actualmente decidir isso.

Para se dizer que um facto qualquer não constitue crime, é preciso constituir a camara em tribunal de justiça. Este é que é o fundamento da minha argumentação, e o que manda a carta constitucional. (O sr. Silva Cabral: — Peço a palavra.)

Quando o artigo 27.° da carta determina que se peça licença á camara para que possa continuar o processo, qual foi a rasão por que o fez? A rasão foi para que se conservasse em toda a sua extensão a independencia do poder parlamentar; não foi para que a camara podesse desde logo decidir se havia ou não crime, porque então a constituição da camara em tribunal de justiça era uma superfluidade, era um absurdo! A rasão foi para que os membros do parlamento tivessem a independencia garantida de modo tal, que não estivessem sujeitos aos abusos praticados pelo poder judicial, e principalmente pelo poder executivo, podendo a camara decidir que não continuassem os processos, e ficassem, por esse facto, livres de todos os incommodos que lhes podessem causar os abusos d'esses poderes. Mas fazer o que fez a illustre commissão, examinar o processo e os argumentos apresentados, e vir dizer á camara que vote, porque não ha crime, isto é o transtorno completo das funcções constitucionaes!

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Sr. presidente,.não teria pedido a palavra sobre este assumpto se não visse que o principio da carta tinha sido infringido.

Acredito plenamente, como já disse, que os dignos pares a que se refere o parecer não commetteram a desobediencia de que são accusados, mas isso deve ser decidido pela camara, quando estiver habilitada para o fazer, e não agora que nenhum de nós o esta.

Em boa fé, sr. presidente, qual de nós póde dizer que os dignos pares de que se trata não commetteram uma contravenção legal?! Nenhum de nós poderá dizer isto, porque nenhum de nós conhece o processo para o poder avaliar. O parecer da commissão devia dizer se o processo podia ou não continuar, mas declarando os motivos em que se fundava.

O que deixo dito salta aos olhos de todos, e creio que não é preciso insistir mais sobre este ponto.

Sr. presidente, a rasão por que pedi a palavra foi para estabelecer os verdadeiros principios constitucionaes sobre este ponto, porque entendo que. a camara não tem o direito de annullar a acção da justiça, que não deve deixar de ter O seu curso.

O tribunal competente n'este caso é a propria camara, não como camara, mas como corpo judicial.

Se o poder judicial quizer exercer uma injusta pressão sobre qualquer membro d'esta casa, temos o direito de dizer, como corpo judicial, que o processo não continua; mas n'esta qualidade não podemos decidir sobre a criminalidade de qualquer individuo. Isso era uma cousa impossivel, e custa-me a crer que se possa sustentar similhante doutrina.

(O orador não reviu este discurso.)

O sr. Silva Cabral: — Sr. presidente, eu sinto ter de entrar n'esta discussão, porque diante de rasões taes como aquellas que o digno par acabou de apresentar, não ha outro remedio senão, ou curvar a cabeça ao arbitrio, proscrevendo a logica, a critica e a rasão, ou reagir contra a inexperiencia, causa primaria da erronea apreciação com que se desnatura o mais simples assumpto (apoiados).

O digno par veiu estabelecer uma doutrina inteiramente contraria a tudo quanto se tem seguido, e unanimemente aceito desde que existe parlamento n'este paiz; mostrou até que não conhecia o nosso proprio regimento, porque com o que avançou nos provou até á saciedade que desconhecia as tres instancias que deve percorrer o objecto ou especie em discussão, pretendendo levantar-se em mantenedor de garantias constitucionaes que ninguem ataca.

Louvo as intenções do digno par, mas não posso de maneira nenhuma deixar de notar a sua erronea apreciação, filha, no meu modo de pensar, da precipitação com que se deu ao estudo do assumpto, em vez de reflectir n'elle, como era para esperar da sua capacidade (apoiados).

Sr. presidente, que é o que manda o nosso, regimento, que é por ora a lei d'esta casa? Que é o que elle prescreve sobre este ponto? Eu vou dize-lo ao digno par e á camara, é depois mostrarei os legitimos fundamentos com que a commissão procedeu, fundamentos justificados não só pelo regimento e pela lei, mas por todos os precedentes desde que existe a camara dos dignos pares, precedentes portanto que n'este ponto constituem a verdadeira jurisprudencia parlamentar, que não deve nem póde justificadamente ser contrariada sem graves motivos que reclamem a sua opportuna e legitima alteração (apoiados), visto que se trata da ordem do processo. Veja a camara o que manda o regimento quando a camara dos dignos pares se constitue em tribunal de justiça.

É meu dever demorar-me um pouco n'este objecto, pondo diante dos olhos da camara as suas disposiçoes, para que se possa ver o erro em que o digno par marchou. O artigo 7.° do regimento (notarei de passagem que as suas providencias são o resultado da lei de lo de fevereiro de 1849, e confeccionadas por consequencia debaixo da sua influencia, dispõe o seguinte:

«Quando algum processo for remettido á camara dos pares, em o qual se ache pronunciado algum individuo dos que pertencem á sua exclusiva jurisdicção, o presidente, dando conhecimento d'isso á camara, o enviará á commissão de legislação, para que com o seu parecer a camara possa resolver se o processo deverá ou não seguir os termos ulteriores, e se a camara deve constituir se em tribunal de justiça.»

Eis o primeiro passo ou instancia em que a camara, ainda na esphera de suas funcções legislativas, aprecia e decide se deve ou não passar-se ao exercicio das funcções judiciarias, a que se refere o artigo 41.° § 1.° da carta constitucional quando diz:

«E da attribuição exclusiva da camara dos pares conhecer dos delictos individuaes commettidos, da familia real, ¡ministros d'estado, conselheiros d'estado e pares, e dos delictos dos deputados durante o periodo da legislatura.»

Á vista pois de disposições tão claras, tão terminantes, e ao mesmo tempo tão harmonicas, pergunto eu — será á camara a quem pertence resolver a especie, na altura em que ¡é offerecida á sua apreciação, ou á mesma camara com o tribunal de justiça, segundo disse o digno par? A consciencia da camara, em harmonia com a sua illustração, não póde deixar de se pronunciar no sentido opposto á nova e absurda jurisprudencia do digno par, que por si mesmo ha de conhecer a excentricidade das suas idéas applicadas a um objecto, que não póde deixar de ser considerado n'uma esphera positiva, determinada e concreta (apoiados).

A camara por altas rasões politicas ou de conveniencia publica póde decidir que o processo não continue, mas esta decisão tomada dentro, da esphera legislativa não importa declarar o processo extincto na esphera criminal, aonde prevalece outra ordem de idéas; á commissão nem pela idéa lhe passou confundir tão diversas especies, e portanto não

podia, a não ser, como é, a sua conclusão tão explícita para a continuação do processo, ter o pensamento de se pronunciar pela extincção do processo na segunda hypothese.

O sr. Costa Lobo: — Não disse isso.

O Orador: — Sr. presidente, tinha uma resposta frisante a dar a esta interrupção, mas não a quero dar, porque quero conservar a seriedade do debate.

Sr. presidente, o parecer de que nos estamos occupando é a primeira phase ou instancia preparatoria para todos os processos crimes, similhantes áquelle de que nos estamos occupando: desconhecer estas idéas trivialissimas, e querer levantar o arbitrio ou uma innovação abstrusa na marcha regular das idéas, não me parece proprio da elevada intelligencia do digno par, que a final, depois de alguma reflexão, ha de certamente conhecer o erro em que caíu.

Ha uma segunda instancia ou formalidade a satisfazer n'esta ordem de processos, e qual é ella? E aquella que, depois da camara declarar que se constitua em tribunal de justiça, manda effectuar o artigo 9.° do precitado regulamento, dispondo que = a camara nomeará por escrutinio um dos seus membros para relator, o qual relatará o processo em sessão publica do tribunal, e findo o relatorio os juizes passarão a votar em conferencia particular sobre a procedencia ou improcedencia da pronuncia, observando-se o que em respeito a estes actos nos tribunaes de justiça se acha decretado nas leis =.

Então é que começam as funcções judiciarias, absolutamente independentes das funcções legislativas, e, na sua respectiva esphera, com plena liberdade para julgar se sim ou não deve a pronuncia proceder, e quando a pronuncia proceda vem a necessidade do processo plenario, tudo sabiamente previsto nos artigos 10.°, 11° e 12.°—artigo (12.°) que marca e determina a ultima phase, e a mais importante do processo, até á sentença definitiva, tudo previsto nos artigos 13.° e seguintes. E não é só o regimento que o diz, é tambem a lei de 15 de fevereiro de 1849, que no seu artigo 4.°, pela sua referencia á legislação especial do paiz, applicavel ao supremo tribunal de justiça, para o julgamento dos crimes e erros de officio, manifestamente se coaduna com as disposiçoes do regulamento, para as quaes serviu de norma a mesma lei (apoiados).

Emquanto pois não só o pensamento, mas a phraseologia do parecer da commissão, estão em inteira conformidade com a carta, com o, regulamento, com a lei e com a jurisprudencia parlamentar, vê-se ao reverso que a theoria do digno par esta em completa desharmonia com todas estas fontes ou normas para uma justa e legitima decisão.

Já se vê portanto que a argumentação do digno par cáe toda por terra, e que os escrupulos que se apresentam não têem rasão, de ser. Mas agora, passando d'esta questão de fórma ao objecto considerado em si, eu acrescentarei mais algumas reflexões.

Este negocio, sr. presidente, foi mandado á commissão de legislação em virtude do regimento e da lei; a incumbencia á commissão era justamente para dizer se sim ou não tinha logar o constituir-se a camara em tribunal de justiça; a commissão entendeu que não; e porque o entendeu assim? Porque não ha facto criminoso, materia unica que póde provocar a transformação da camara em tribunal de justiça.

O sr. Costa Lobo: — O tribunal é o que deve decidir; a camara antes do se constituir em tribunal não decide se ha ou não crime para que o processo haja de continuar. Isto não é compativel com as funcções legislativas, ha de ser' em tribunal (apoiados).

O sr. Presidente: — Não posso consentir as interrupções. V. ex.ª responderá depois, para o que está inscripto, mas por emquanto não tem a palavra.

O Orador: — Sr. presidente, este processo veiu aqui em' virtude do artigo 27.° da carta, e este artigo manifestamente contraria todas as idéas do digno par a este respeito; pois o que é que diz o artigo citado? Eis-aqui as suas textuaes palavras:

«Se algum par ou deputado for pronunciado, o juiz, suspendendo todo o ulterior procedimento, dará conta -á sua respectiva camara, a qual decidirá se o processo deva continuar, e o membro ser ou não suspenso no exercicio das suas funcções. »

Póde haver cousa mais evidente do que o pensamento d'este artigo? Não diz elle expressamente que = a camara' é que ha de decidir se o processo deve continuar? = Se houvesse crime poder-se-ía dizer que a negativa para a sua continuação era ou injusta, ou inconveniente, ou irreflectida; mas desde que não se apresenta facto criminoso a commissão devia dar o seu parecer conforme a lei, e a camara tem toda a competencia para a decisão que entender melhor, segundo mesmo o artigo da carta, que não póde admittir duvidas na sua interpretação (apoiados). Pois acamara devia constituir-se em tribunal tendo a consciencia de que não havia materia propria da sua competencia? Similhante apparato para tal fim seria quasi uma insensatez, ou pelo menos uma contradicção do facto com a idéa. Vejam se os primeiros artigos do codigo penal, e conhecer-se-ha então melhor ainda a nenhuma rasão que havia para vir aqui apresentar-se similhante argumentação como aquella que a camara tem ouvido, tratando-se de combater o parecer da commissão de legislação, que foi exarado tendo em attenção tudo quanto se devia pensar sobre a natureza do objecto e circumstancias que n'elle se davam (apoiados).

Intimaram-se os directores da companhia do gaz para que não continuassem com a construcção de um projectado gazometro, esta intimação foi feita a dois cidadãos, pares ou não pares, pouco deve considerar-se para o caso como mui sensatamente disse, o digno par, o sr. conde de Cavalleiros, porque a apreciação do facto para a sua imputabilidade não depende dó objecto adjectivo (apoiados): esses cidadãos responderam que segundo a lei não eram obrigados a suspender a obra, porque não se dava o caso previsto nas leis. e regulamentos de saude, e não era applicavel ás circumstancias da obra a portaria que mandava suspender a obra, portaria expedida do ministerio do reino em data de 6 de abril de 1861.

Peço aqui a attenção da camara, porque a questão ventilada assim o exige, com particularidade n'este ponto.

Sr. presidente, a quem quer que não deseje estabelecer uma doutrina a seu talante, marchando pela senda de um arbitrio cego, em vez de amoldar-se ás disposições das leis do paiz, ha de conhecer que a commissão commetteria um redondo e indesculpavel descuido se viesse apresentar á camara parecer diverso do que apresentou (apoiados).

A commissão compulsou, como era dever seu, os differentes regulamentos sanitarios: o primeiro de 27 de agosto de 1855, e os dois subsequentes de 3 de outubro de 1860 e de 21 de outubro de 1863; meditou na disposição do artigo 15.° § 2.° do regulamento de 3 de outubro, analysou os artigos 30.° e 31.° do regulamento de 21 de outubro, leu e reflectiu nos estatutos da companhia do gaz nas suas tres edições (pelas successivas reformas) desde 1846 até 1861, aonde vem sempre consignada a faculdade para fazer as obras necessarias para o desenvolvimento da sua industria; e chegou depois de um detido exame á convicção profunda, irrefutável e legal: 1.°, que a portaria que mandou suspender a obra começada era arbitraria, porque [a obra começada estava fóra das attribuições da administração civil, debaixo do ponto de vista de saude, visto que se tratava então só de profundar uma cova; e que quando se desse prejuizo de terceiro era só por embargo judiciario que deveria ter logar a suspensão da obra; 2.°, que todos os precitados regulamentos exigindo, para constituir a intervenção administrativa, a condição da laboração dos estabelecimentos, na presente hypothese não só não havia essa laboração, mas a edificação estava distante; e a administração civil é incompetente para intervir nos direitos exercidos em virtude do direito de propriedade, direito que só póde ser limitado pela providencia da lei (apoiados); 3.°, que em consequencia e sem necessidade de recorrer a outros argumentos, era visivel que sendo indispensavel para se dar o crime ou delicto de desobediencia, na fórma do artigo 188.° do codigo penal, que quem ordenou tenha competencia para ordenar, e que portanto a obediencia seja devida tanto objectiva como subjectivamente, faltando manifestamente estes requisitos na especie sujeita, a consequencia não podia ser senão a que a commissão deduziu de fundamentos tão irrefragaveis; 4.°, que ainda quando não fôssem ou houvesse rasões tão convincentes, bastava comparar a disposição do artigo 30.° do regulamento de 21 de outubro de 1863 com o artigo 70.º do codigo penal, para se conhecer que o processo estava irremediavelmente extincto e morto pela propria disposição da lei, pois que para a hypothese em que a lei posterior ou diminua a pena, ou elida a criminalidade do facto, se manda observar a lei posterior, embora o facto seja praticado sob a influencia de uma lei mais dura ou quanto a pena ou quanto a criminalidade do facto (apoiados).

Se o regulamento de 21 de outubro de 1863 tinha extinguido a necessidade de renovação da licença para os estabelecimentos fundados anteriormente a 27 de agosto de 1855; se as mesmas fabricas de gaz desde 1860 eram comprehendidas na 2.ª classe, e por consequencia, quanto á sua suspensão, inteiramente fóra do alcance das attribuições administrativas; se o codigo penal no citado artigo é tão explicito a extinguir a moralidade criminal do acto, qual, pergunto francamente á camara, deveria ser o seu juizo se a commissão viesse improvisar theorias que repugnam com a lei, com a logica e com a verdadeira hermeneutica? (Apoiados.)

Assim fundamentado e esclarecido o parecer da commissão, prevenidas mesmo quaesquer objecções em contrario pela enunciação de idéas que não pódem ter reparo serio, entendo eu e entendeu a commissão que, dando o parecer que se discute, cumpriu o dever de que a camara a incumbiu (apoiados).

O sr. Costa Lobo: — Sr. presidente, dizem os poetas que é sempre terrivel a colera da leoa quando lhe robam os filhos; assim tambem se descrevo a colera de Achilles e de outros; mas todas estas coleras são como choros de creanças quando se comparam com a colera do digno par que acaba de fallar! Confesso que fiquei aterrado com as palavras do digno par, de cujo echo as abobadas d'esta casa ainda retumbam! Isto para fulminar a minha ignorancia!!

Sr. presidente, V. ex.ª é testemunha, e a camara toda o sabe, que tenho sempre acatado o respeito devido ao logar que occupo... (Apoiados.) Pelo que estou grato a V. ex.ª em particular, e igualmente a cada um dos meus collegas. Nunca proferi aqui uma unica palavra que podesse sequer parecer offensiva a qualquer dos dignos pares (apoiados repetidos).

Ainda ha pouco fallei, mas foi apenas sobre a questão de doutrina, sem me dirigir a pessoa alguma; mas quando o digno par do alto da sua elevada sciencia entende que todos se devem curvar ao peso das suas rasões, é força dizer-lhe que s. ex.ª se engana se entende que tem direito a dar aqui as leis.

Pois, sr. presidente, uma vez que o digno par transcendeu os limites que eu nunca transpuz, não lhe responderei mais do que com o rifão popular: «Presumpção cada um toma a que quer». (O sr. Silva Cabral: — Esta claro.)

Sr. presidente, a argumentação do digno par, entrando nos fundamentos das reflexões que fiz á camara, laborava em completa confusão, e assim triumphou declarando que eu tinha dito que a camara não podia suspender o processo. A camara tem direito mesmo a annullar o processo. A ques-

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tão é a das circumstancias em que o póde fazer. Declarei que a carta não era explicita a este respeito; mas que, segundo o espirito da mesma carta, e segundo os principios da jurisprudencia e da rasão, a carta não podia dar á camara, funccionando como corpo legislativo, o direito de annullar um processo senão quando houvesse abuso de auctoridade. Não disse as palavras a que o digno par alludiu; disse sim que a camara não tinha direito de annullar senão quando constituida em tribunal de justiça. Ainda mais, todos os artigos da refutação do digno par, que não vem para o caso, provam antes a meu favor, porque não ataquei o parecer da commissão, e foi por entender que não deviamos vir aqui dizer se ha ou não crime que eu fallei. O sr. Ferrão: — Peço a palavra.

O Orador: — Mas dizermos que ha ou não ha crime estando a camara constituida em tribunal de justiça, isso ninguem rebate. Diz o artigo 7.° do regulamento respectivo (leu).

Eu não ataquei esta prerogativa da camara.

Diz mais o artigo 16.° que dá á camara o direito de pronunciar, e os ulteriores dão-lhe o de julgar. Eu não nego isso. A garantia que dá o regimento, o que n'elle está consignado, não admitte duvida. A duvida é da applicação dos principios e da doutrina.

Acamara sabe perfeitamente que, se apresentei estas considerações, foi porque entendo que estes são os principios da constituïção; mas sou 9 primeiro a reconhecer que elles têem sido infringidos. Foi portanto por esta rasão que me vi obrigado a tomar a palavra, porque julgo absolutamente necessario que se cumpram as disposições da lei.

Sr. presidente, julgar é apreciar os factos; mas nós, sem fazer nada d'isso, sem os apreciar, sem tomarmos devidamente conhecimento d'elles, dizemos que achâmos que os dignos pares estão innocentes! Tinha eu pois rasão quando disse que isto era infringir os verdadeiros principios o estar o corpo legislativo a fazer o que não é da sua competencia, o que não tem direito a fazer.

Portanto, sr. presidente, concluo dizendo que o digno par respondeu a proposições que eu não tinha avançado. Não fiz mais agora do que repetir o que então disse; mas como se não respondeu ás minhas observações, entendo que ellas ficam prevalecendo.

(O orador não reviu este discurso.)

O sr. Ferrão: — Sr. presidente, o digno par não contestou a esta camara o direito que tem, conforme o disposto na carta constitucional, de decidir se um processo instaurado a qualquer membro da camara deve ou não continuar; era escusado recorrer ao regimento para avançar esta proposição, porque a carta diz bem claramente que a camara dos pares póde decidir se o processo deve ou não continuar, e se o membro da camara, a quem é instaurado, deve ou não ser suspenso do exercicio das suas funcções.

O digno par não negou portanto esta attribuição á camara; o que esta, segundo disse, é resolvido a combater o fundamento que a commissão adoptou no seu parecer, porque não acha legitimo esse fundamento, pois que não reconhece a competencia da camara para conhecer da criminalidade ou não criminalidade, e só quando se constituir em tribunal de justiça.

Mas se é certo que cada uma das camaras tem como attribuição politica o poder resolver se os processos instaurados contra os seus membros devem proseguir ou deixar de proseguir, e que, se assim não fosse, nada seria mais facil do que afastar das camaras qualquer dos seus membros, a pretexto de crime, meio de que aliás poderia um governo lançar máo por conveniencias ou despeitos ministeriaes; é certo tambem que no caso de que se trata, comquanto se não desse similhante motivo, houve comtudo excesso, como disse o digno par, da parte do governo, que ultrapassou as suas attribuições contra gerentes de uma companhia legitimamente auctorisada, mandando lhes suspender uma obra começada, quando isto pertencia ao poder judicial.

Não podia portanto o governo fazer o que fez, e a commissão, tendo em vista estas circumstancias; tendo examinado, como devia, o processo, entendeu que, segundo a letra e espirito da carta constitucional, esse processo não devia progredir.

Não ha annullação de processo, tambem não ha denegação de licença para continuar o andamento d'elle.

Ha precisamente o que esta consignado na carta e no respectivo regimento d'esta camara. Não annulla o processo, nem póde annullar, porque isto tem uma significação juridica de outro alcance; tambem não nega licença para continuar o processo; outra é a formula constitucional, outra é a decisão.

Como camara, e não tribunal de justiça, só temos a resolver se o processo ha de ou não seguir os tramites ulteriores, ainda que a consequencia natural da negativa seja sobreestar-se no processo, e não haver decisão sobre elle.

De nada mais se trata do que de manter uma garantia de independencia dos membros d'esta camara, como é da doa membros da outra camara.

Lá estão affectos agora processos da mesma natureza para a commissão dar o seu parecer, e resolver se devem ou não continuar esses processos.

Para se tomar esta resolução não é preciso que esta camara se constitua em tribunal de justiça.

Cumpre abstrahir a camara dos pares, uma das do corpo legislativo, da camara dos pares constituida em tribunal de justiça: é preciso não confundir estas duas entidades distinctas. A carta não exige, no artigo 27.°, que, para decidir se deve, continuar um processo, em que se ache envolvido algum dos membros d'esta casa, a camara se constitua, em tribunal de mestiça. A camara póde mesmo ter rasões politicas e não juridicas para o processo não seguir mas todas pódem influir na sua deliberação: e é por isso que os processos são remettidos á commissão de legislação, a quem são presentes, alem de outras circumstancias, todas as que acompanham taes processos, e a podem habilitar a apreciar se houve ou não crime.

O digno par sustenta que a camara só em tribunal de justiça é que podia proferir este julgamento, mas é preciso attender que isto, na hypothese, não póde ter logar.

A convocação do tribunal de justiça seria um acto inutil desde que a camara, que é composta dos mesmos dignos pares que hão de constituir o tribunal, reconhecer que não ha criminalidade. A sua resolução pois não póde ser senão a negativa e exclusiva do seguimento de qualquer processo.

A commissão portanto não podia dar outro parecer, nem vir a diversa conclusão; porque a carta marca-lhe este caminho, e emquanto houver carta não se póde seguir outro.

O sr. Presidente: — Vae proceder-se á votação por espheras.

(Pausa, durante a qual se distribuiram as espheras e se procedeu á votação.)

O sr. Presidente: — Entraram na urna 26 espheras, 15 approvando o parecer e 10 rejeitando. Portanto fica approvado o parecer por 5 votos de maioria.

O sr. visconde de Fonte Arcada pediu a palavra para um requerimento urgente, mas eu não lh'a posso dar sem consultar a camara.

Consultada a camara, decidiu affirmativamente.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Eu desejava que o sr. ministro do reino me desse algumas informações a respeito do estado em que se acha o paiz; mas a hora esta muito adiantada, e eu não tenho duvida nenhuma, se o sr. ministro concordar, em reservar para ámanhã este negocio (apoiados).

O sr. Conde de Cavalleiros: — Lembrava a V. ex.ª que ámanhã é dia de recepção no paço.

O sr. Presidente: — Amanhã não é dia de grande gala, por consequencia póde haver sessão. A primeira parte da ordem do dia será o parecer n.° 152, que é negocio de muito interesse, e por isso não se deve demorar; a segunda parte será a interpellação do sr. Visconde de Fonte Arcada; e a terceira o parecer n.° 151.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão de 30 de abril de 1867

Os ex.mos srs.: Condes, de Lavradio e de Castro; Duque de Loulé; Marquezes, de Fronteira, de Niza, de Sousa e de Vallada; Condes, das Alcaçovas, de Cavalleiros, de Farrobo, de Fonte Nova, de Fornos, de Peniche, da Ponte e de Sobral; Viscondes, d'Algés, de Benagazil, de Chancelleiros, de Fonte Arcada, de Gouveia, de Seabra e de Soares Franco; D. Antonio José de Mello, Costa Lobo, Pereira de Magalhães, Silva Ferrão, Braamcamp, Silva Cabral, Pinto Basto, Reis e Vasconcellos, Eugenio d'Almeida, Rebello da Silva, Preto Geraldes, Canto e Castro, Menezes Pitta, Fernandes Thomás e Ferrer.

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