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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO DE 5 DE JULHO DE 18g1

presidência 1)0 ex."10 sr. visconde de laborim vice-presidente

,-, , . ¦,. lConde de Mello

becretarios: os dignos pares|Condo dg peniche

(Presente o sr. ministro da justiça.)

Sendo duas horas e meia da tarde, achando-se reunido numero legal, declarou o sr. presidente aberta a sessão.

Lida a acta da antecedente, julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Não houve correspondência.

O sr. Marquez de Vallada:—Aproveito a presença do sr. ministro da justiça, não para fazer uma pergunta, mas para mandar para a mesa um requerimento, ou para melhor dizer renovar um que apresentei achando-se, creio, no ministério da justiça o sr. Mártens Ferrão. Não tem nada este requerimento com a questão das irmãs da caridade.

Preciso do mappa da criminalidade desde o anno de 1826 para cá. O sr. ministro da justiça comprehenderá que tendo eu de oceupar-me do importante negocio das prisões, tanto mais que tenho a honra de fazer parte da commissão encarregada de propor ao governo o projecto da reforma das cadeias, preciso de documentos que me sirvam de auxilio a estes trabalhos. Não sei o motivo porque estes documentos não vieram quando os pedi no tempo em que o sr. Ferrão estava no ministério. Provavelmente foi por serem pedidos nos últimos dias da existência do ministério de que s. ex.a fazia parte, e então não pôde remet-te-los.

Sr. presidente, tenho também a requerer, que, pelo ministério do reino, sejam enviados a esta camará os documentos que o governo teve em vista para mandar fazer as pesquizas, que effectivamente se fizeram, na oílicina typo-graphica conhecida pela denominação de typographia universal. Estes documentos hão de ser provavelmente informações do governador civil interino que servia n'essaoccasião: hoje creio que se acha nomeado o effectivo. Desejo taes documentos para me habilitar a fallar com conhecimento de causa sobro o objecto em questão. Julgo também conveniente que esses documentos venham para a mesa, para que possam ser examinados devidamente com a circums-pecção que pede um negocio grave como este.

Terceiro requerimento. Este creio que também o fiz ha tempos, não durante o ministério passado, mas durante o outro, presidido também pelo sr. marquez de Loulé, e de que fazia parte o sr. Antonio José d'Avila. Desejo que sejam enviados a esta camará pelo ministério dos negócios da fazenda, os documentos ou quaesquer peças officiaes sobre o importante negocio do contrabando na alfandega do Porto.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — É caso novo?

O Orador: — Nada. Ha muito tempo que succedeu. Houve uma porta falsa por onde entrava o contrabando, etc. E caso muito conhecido, e a respeito do qual é necessário que se esclareça toda a verdade.

Sr. presidente, ha muitos negócios a tratar, não é só o das irmãs da^ caridade que ha de salvar o paiz, quer ellas fiquem, quer ellas saiam. Mais tarde, e em occasião que eu repute competente, pedirei explicações ao sr. ministro da justiça sobre o negocio da moeda falsa, negocio de que ha muito se não falia. Desde que saiu o outro ministério creio que acabaram os moedeiros falsos, se acabaram quero dar os parabéns a quem se devam dar. E como desejo dar,os parabéns a quem de direito.competirem, por isso em tempo opportuno pedirei sobre este assumpto explicações categóricas aos srs. ministros da justiça e do reino.

Pedirei igualmente explicações ao governo sobre a apprehensão de certos individuos, e manejos praticados por parte dos protectores d'esses individuos, a fim de que elles fossem soltos. Este negocio é tanto mais complicado, quanta ó a gravidade de que se acha revestido; desejo só enuncia-lo, e em tempo competente pedirei explicações como disse, e farei as considerações convenientes.

O sr. Visconde de Fonte Arcada:—E o deposito?

O Orador:—Lá iremos, eu não sou insofrido.

Depois de feitas estas reflexões, de passagem prevenirei o sr. ministro da justiça que tenciono oceupar-me da questão de beneficência publica. O sr. ministro é muito lido, deve estar ao facto, e sei que o está, d'esta grande questão, ainda não sujeita ao parlamento portuguez. Quando tratar de tal assumpto, oceupar-me-hei talvez simultaneamente, pois estão ligados por muito estreitas relações, da

questão da liberdade e de caridade, e de que um dos seus capitulos ou ramos comprehende de certo a questão do ensino. Estas questões têem sido tratadas juntamente, e não surprehenderei de certo o sr. ministro, nem a camará, se eu para melhor caminho da discussão e dos argumentos, os trate também juntamente.

Previno mais o sr. ministro, que terei de oceupar-me da questão da reforma das cadeias. A este respeito ha todos os annos, quando se trata da discussão do orçamento, um episodio, que se me affigura uma demanda entre partes: de um lado o governo como réu, do outro o marquez de Vallada e o sr. Ferrão, como auctor. O sr. Ferrão pede sempre a palavra e renova todos os annos as suas observações sobre o melhoramento das cadeias: o governo diz que se está no fim da sessão, e que espera tratar este negocio com aquelle ardor que é próprio dos srs. ministros. Em seguida peço eu a palavra, e faço as minhas observações no sentido das do sr. Ferrão. Fecha-sè depois a sessão, torna-se a abrir de ahi a tempo, e as prisões ficam sempre na mesma. Ainda ha pouco tempo, quando se tratou de passagem da reforma das cadeias, se mostrou o quanto convinha que o espirito religioso penetrasse aquelles umbraes.

Julgo que é já tempo de tratarmos d'estas questões, de nos oceuparmos de questões serias, e deixarmo-nos das de capricho, que não nos trazem senão mal, e que fazem tanto damno ao paiz, sem que nada d'ellas se utilise.

Deveras desejo que entremos no verdadeiro caminho da reforma, para que o povo seja felicitado, o espirito publico sc reanime, e a nação seja regenerada.'

Vou formular os requerimentos para mandar para a mesa.

O sr. Conde do Bomjim:—Pedi a palavra para rogar a v. ex.a que proponha á camará se convém no que vou requerer. Havendo negócios importantes a tratar na commissão de marinha e ultramar, e faltando alguns membros n'esta commissão, por se acharem impossibilitados, succe-dendo muitas vezes não haver numero sufficiente, eu pedia á camará que concordasse com o que muitas vezes se tem feito em idênticas circumstancias, e é pedir a v. ex.a que nomeie para a commissão o sr. marquez de Ficalho, que tem conhecimento dos negócios do ultramar, e o sr. José da Costa Pinto Basto, que não está por ora encarregado de outra commissão, e mesmo porque é formado em direito e na commissão não temos ninguém" formado n'esta faculdade.

O meu requerimento deve ser atlendido pela camará, portanto peço a v. ev.a que o ponha á votação.

O-sr. Presidente:—A camará ouviu o requerimento que acaba de fazer o digno par o sr. conde do Bomfim: vou po-lo á votação.

Foi approvado.

ORDEM DO DIA

continuação da discussão relativamente ao decreto sobre as irmãs da caridade

* O sr. Ferrão:—Sr. presidente, grande foi talvez o meu arrojo em haver pedido a v. ex.a a palavra para tomar parte n'esta discussão. Quando ella começou não tencionava resolver-me em similhante objecto, porque pensei se reduziria aos estreitos limites de uma interpellação; como porém tem assumido as alturas de uma importante discussão, eu, sr. presidente, como membro da commissão ecclesiastica, e na ausência de quasi todos os prelados do reino, entendo cumprir um dever especial fazendo algumas considerações.

Felizmente está hoje presente um successor de outro prelado, que nas cortes constituintes de 1822 tomou parte nas discussões da mesma matéria; s. ex.a me corrigirá, pois, ou approvará com o seu silencio as proposições que eu apresentar; os principios que eu possa adoptar, na certeza do que se eu errar não é de certo por vontade própria, nem por falta de diligencia que tenha empregado para não proferir desacertos em cousas religiosas.

Em todo o caso submetto me ao juizo de todos aquelles que receberam missão de Jesus Christo, para ensinar as verdadeiras doutrinas do Evangelho, e para ligar e desligar sobre a terra, ao juizo da igreja, e portanto sujeito-ine não só á critica do illustre prelado que se acha presente, mas especialmente ao d'aquelle a cuja jurisdicção estou immediatamente ligado, como ovelha do seu rebanho.

Sr. presidente, disse eu que tinha assumido esta interpellação as alturas de uma discussão importante. Repito a phrase, e agora acrescento que entendo não ser perdido o tempo que nella se gaitar, pois que será de grande utilidade para a futura questão das irmãs da caridade, para a mais fácil discussão e prompta adopção da proposta de lei que o governo deverá ter renovado a estas horas na outra casa do parlamento.

Ficam assim desde já consignadas as idéas expendidas n'esta occasião, e feliz me deverei considerar se as minhas poderem ser apresentadas com aquella clareza e simplicidade que tenho sempre esforçado dar ás minhas palavras.

Sr. presidente, a questão é muito importante, porque n'ella se acha envolvida uma corporação que tem por seu objecto e fim especial uma das mais sublimes virtudes, não só aos olhos da moral universal, mas aos olho3 da moral evangélica, no seu maior grau de perfeição: não é a da caridade philantropia, nem mesmo a da caridade christã, daquella que nos manda amar o próximo como a nós mesmos; é mais alguma cousa. E' a caridade pelo amor de Deus, é a perfeição na caridade, o fim'de todas as religiões; e quando eu digo religiões, a camará sabe que fallo de todas as corporações religiosas.

Disse um escriptor moderno, que a caridade se não confundia com a philantropia, que ambas formam na moral dois pólos oppostos; tendo esta os seus motivos na terra e a outra no céu.

Mas somente a caridade exercida pela dedicação resultante dos votos religiosos pôde tomar o caracter de perse-