DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 383
sumpto, removendo as difficuldades que podem sobrevir, essa lei seria votada; porque estas opposições em assumptos de interesse nacional não se tornam facciosas; facciosas foram outras que ha pouco presenciámos; e quando são facciosas então é que tem logar a dictadura. A dictadura assume-se quando ha força para a assumir por parte dos governos, e espirito faccioso por parte das opposições.
Por minha parte tenho dito quanto tinha a dizer. A camara resolva que ella deve ficar ainda para outra sessão, uma vez que parece que alguns dignos pares desejam ainda tomar, parte n'ella, ou a camara a de por terminada n'esta sessão, para mim é indifferente.
Direi apenas em conclusão que quando vier a dictadura em nome da duvida insurgir-me-hei contra a dictadura, porque o governo podia agora prevenir-se por meio de uma auctorisação, e não tinha necessidade de se collocar fóra da lei.
Discurso proferido pelo digno par conde do Casal Ribeiro, na sessão de 3 de junho, e que devia ler-se a pag. 363, col. 2.ª
O sr. Conde do Casal Ribeiro: - Desejaria que estivesse presente o sr. ministro dos negocios estrangeiros, mas poderei mesmo na sua ausencia expor o que desejo. Não tenho a dirigir ao governo uma pergunta, porque antecipadamente sei a resposta.
A questão de que ha poucos dias nos occupámos, a da bifurcação do caminho de ferro de Salamanca, está resolvida; o concurso será aberto para ambas as linhas, conforme nós desejavamos, conforme desejavam tambem e reclamavam os interesses d'aquella provincia, conforme aos compromissos anteriormente contrahidos, conforme á justiça, conforme á rasão, conforme á lealdade.
Não tenho a dirigir uma pergunta ao governo, porque sei que a questão está no essencial resolvida, mas unicamente a felicitar-me com o paiz e particularmente com a cidade do Porto por tal resultado. Não fui propheta, annunciando-o. Sómente manifestei a fundada esperança de que a questão se resolveria de uma maneira agradavel e favoravel. Não dei certezas, porque não as podia dar, porque se não devem dar, porque é imprudente dal-as quando ha negociações pendentes. Mas a expressão da minha esperança ficava áquem da minha propria convicção.
N'este momento felicito-me por que um tal resultado se obtivesse.
Não preciso nem careço repetir testemunhos. Já os dei. Não tenho a retiral-os nem a augmental-os. O empenho do actual governo foi igual ao do governo anterior em resolver favoravelmente a questão. Tenho d'isto a certeza, a convicção, os documentos.
Se temos com os interesses da provincia de Salamanca uma alliança constante, permanente, efficaz, importantissima, porque se baseia e consolida na communidade de interesses, foi principalmente devida á approvação da previdente lei votada em 1880 durante o ministerio do sr. Braamcamp. Foi n'essa lei que, assegurando-se o empenho do governo portuguez na conclusão da linha do Douro até Barca de Alva, se tornou essa conclusão dependente de um accordo com o governo de Hespanha, não sómente sobre o ponto de junção na fronteira, unica questão que anteriormente havia sido lembrada e decidida por uma commissão mixta, mas tambem sobre o traçado até Salamanca, questão essa que anteriormente havia sido com menos previdencia descurada.
Valeu de muito a alliança dos nossos interesses com os da provincia de Salamanca, firmada e consolidada por virtude d'essa lei. Mas sobretudo, mais que tudo foi devido o resultado áquella cordialidade de relações, áquella lealdade de procedimentos de que o governo hespanhol com este gabinete, com o gabinete anterior, nos está dando manifestas e constantes provas.
N'este principio dominante da nossa politica para com Hespanha eu sei que o governo actual segue a mesma linha de conducta que seguiu o governo anterior, como o governo anterior seguiu a mesma linha que havia seguido o seu antecessor, no qual os assumptos diplomaticos eram prudente e sabiamente dirigidos por um dos nossos mais distinctos homens de estado, o sr. Andrade Corvo. N'uma epocha extremamente difficil o sr. Andrade Corvo soube não sómente fazer-nos viver em relações regulares com os governos de Hespanha, afastando o perigo da revolução que ameaçava parte da fronteira; mas soube mesmo tornar perante a Europa e o mundo mais evidente, que antes, o vigor da nossa individualidade nacional. Em presença da revolução hespanhola isolada na fronteira, a Europa prestou com rasão mais fé á autonomia portugueza.
Foi um resultado util para o paiz, glorioso para elle pela sua cordura, para o sr. Corvo pelo seu fino tacto de diplomata e estadista.
Manter a cordialidade de relações sinceras entre a Hespanha e Portugal quando, tanto cá como lá, existe um governo baseado sobre o mesmo principio constitucional monarchico é facil, é natural. Não é devido a um governo, nem a um homem. Pratica-se com o representante actual, com o que foi, com o que ha de vir a ser. Não demonstra grande merito. Basta a boa vontade, a prudencia, o que se chama saber viver no mundo. Manter, porém, relações com áquella nação, como ellas se mantiveram, quando ali se hasteava a bandeira da revolução republicana chegando aos excessos de federalismo, e aos horrores de Cartagena e Alcoy; não só manter relações, mas fazer mais conseguir que Portugal n'essa occasião se apresentasse perante a Europa assegurando, mais do que nunca, a sua independencia, isto é obra de verdadeiro homem de estado. Isso é difficil; muito mais difficil que encaminhar a questão da linha de Salamanca.
Presidir aos negocios estrangeiros como o sr. Corvo n'aquella occasião soube fazer, mantendo boas relações com á Hespanha sem esquecer a Inglaterra, porque a cordialidade que deve existir com Hespanha não se oppõe ás nossas antigas e tradicionaes allianças, antes se completa com ellas, isso é ser verdadeiro diplomata.
Mostrar perante a Europa a cordura do nosso procedimento, conquistar o seu bom juizo sem ostentações de vaidade e patriotismos palavrosos que cousa alguma provam e a nada conduzem, isso revela o talento do verdadeiro estadista; são esses os que deixam de si nome assignalado na historia. (Apoiados.)
Sr. presidente, eu fiz opposição durante o seu ultimo periodo ao gabinete presidido pelo meu illustre amigo o sr. Fontes, opposicão vigorosa, da qual não me arrependo, nem renego, embora talvez fosse excessiva considerando o logar em que fallava. Se estivesse na imprensa ou na camara dos senhores deputados poderia tel-a feito mais forte ainda, e ainda com sobra de rasão. Mas quando fiz essa opposição reservei sempre os negocios externos, não só por áquella simples prudencia e bom juizo que deve levar a não fazermos nas nossas dissidencias caseiras arma de guerra de questões internacionaes, mas tambem por ser justo reconhecer que os negocios externos eram bem dirigidos.
Isto sem excepção da questão das pescarias.
E a proposito de pescarias, creio que v. exas. estarão lembrados de que na primeira vez que me levantei n'esta casa para fazer um discurso de opposição ao gabinete que precedeu a administração transacta, logo declarei que resalvava os negocios externos, e expressamente que entendia que o sr. ministro dos negocios estrangeiros tinha andado bem nas soluções dadas á questão levantada com a Hespanha ácerca de factos relativos á pesca nas costas do sul, e em geral gerindo, por maneira correcta, os assumptos que pertenciam ao seu ministerio, e conduzindo habilmente as questões internacionaes.
Foi então meu parecer que o sr. Corvo andou correcta-