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24 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

essa iniciativa se quis associar o talento excepcional do grande escultor Teixeira Lopes, prestando-se a dirigir e executar os trabalhos artisticos da construcção do mausoleu, cuja maquette já, em prova photographica, conhecida do publico, é um trabalho admiravel de impressiva e dolorosa composição.

Não pode ser indifferente ao Parlamento a iniciativa dos artistas dramaticos portugueses, pelo que ella em si representa, e pelo sentimento de generosa solidariedade que traduz. A todos aquelles que dirigem a sociedade portuguesa, cujos symptomas de dissolução moral são tão evidentes, qualquer esforço que signifique o espirito de união collectiva numa classe, seja ella qual for; não pode deixar de ser objecto de incitamento e applauso, mormente quando esse esforço tenha a recommendá-lo um motivo de elevação moral, tal como este que ditou a piedosa ideia dos artistas dramaticos portugueses.

Passou já o tempo em que á profissão de actor se ligava um ridiculo preconceito de desprestigio social. Hoje o actor é bem, pelo seu trabalho, muitas vezes obscuro e inglorio, mas em que sempre tanto é necessario pôr de esgotante e febril emoção, o collaborador assiduo e poderoso de toda a obra de arte que, por intermedio do theatro, se destine a impressionar multidões. Numa sociedade culta a sua profissão tem a dignidade artistica que, quando nobremente comprehendida e exercida, não pode deixar de a impor á mais alta consideração social.

Mas essa classe em Portugal é, em regra, pobre.

Vivendo ainda, em geral, uma vida bohemia, de quasi miseria, forçado, num trabalho cuja intensidade o publico, que só exteriormente o conhece, não avalia, a uma fadiga continua, de verão e de inverno, pela provincia, pelo Brasil, explorando á vez todos os generos, todos os publicos, todos os palcos, o actor português só excepcionalmente, pelo favor da fortuna, adquire, como Taborda, uma velhice calma e satisfeita, digno remate de uma vida de satisfeitos e calmos triunfos. Não me refiro, é claro, aos actores societarios do Theatro Normal, que, pela lei organica do theatro, teem direito á reforma. Esses, em reduzidissimo numero, são para o caso uma limitadissima excepção.

A verdade é que o actor português tem, em regra, quando impossibilitado, deante de si, a perspectiva da miseria- da miseria em que vergonhosa e deploravelmente morreu, por exemplo, ainda recentemente, essa velhinha que foi o encanto do seu tempo, e que se chamou Emilia Candida. A morte na miseria - é o enterro por subscrição. E esses trabalhadores, de tão efemera gloria e que a idade tão depressa inutiliza para o palco, depois de terem conhecido as admirações e as lisonjas, descem ao coval anonymo sem as consolações que os outros, de mais humilde destino, nas suas horas extremas conhecem, e que elles, os obreiros da Ficção, consumiram precocemente numa vida de exhaustivas e insatisfeitas aspirações.

No cemiterio dos Prazeres, os dois jazigos que ali existem de actores estão no mais completo abandono. Num d'elles, o jazigo dos artistas do Theatro de D. Maria II, mandado levantar por Francisco Palha, envoltos em lama, vêem-se a descoberto, no mais completo desprezo, os ossos, entre muitos outros, dos que em vida se chamaram Delfina, Manuela Rey e Theodorico.

A tal situação procuram agora os artistas dramaticos portugueses pôr cobro, construindo o mausuleu no principio d'estas linhas referido. Contam para isso já com a coadjuvação da Camara Municipal de Lisboa, que lhes fez cedencia gratuita do terreno necessario para o jazigo no cemiterio oriental.

Mas isso não basta. De todos os auxilios carece a tentativa dos actores. As despesas de construcção do monumento são feitas por subscrição - e, por isso, porque a classe é pobre e presta á sociedade, ao seu desenvolvimento intellectual e educação moral, serviços valiosos, porque a ideia que inspira a sua iniciativa traduz numa forma de piedoso desinteresse um espirito de solidariedade collectiva, digno de applauso, parece-nos que mal não fica ao Estado concorrer para essa obra, auxiliando-a com a isenção do pagamento de contribuição do registo no terreno cedido pela camara municipal, para o levantamento do mausuleu.

Por todas as razões expostas e porque o facto tem precedentes conhecidos, permitiam-nos apresentar o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É concedida a isenção do pagamento de contribuição de registo no terreno cedido pela Camara Municipal de Lisboa, no cemiterio do bairro oriental, para construcção do um jazigo destinado aos artistas dramaticos portugueses.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da Camara dos Deputados, em 3 de agosto de 1908.- Augusto de Castro = João Carlos de Mello Barreto = Eduardo Schwalbach Lucçi.

O Sr. Eduardo Villaça: - Mando para a mesa o parecer sobre o projecto de lei que diz respeito ao credito de 1:248 contos de réis para pagamento das dividas da provincia de Angola e districto autónomo de Timor.

Foi a imprimir.

O Sr. Presidente: - Como a hora está muito adeantada, dou por findos os trabalhos de hoje. A proximo sessão é na segunda feira, 31, e a ordem do dia é a continuação da que estava dada para hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 4 horas e 20 minutos da tarde.

Dignos Pares presentes na sessão de 29 de agosto de 1908

Exmos. Srs.: Antonio de Azevedo Castello Branco; Marquezes: de Avila o de Bolama, de Pombal, de Sousa Holstein; Condes: das Alcaçovas, de Arnoso, do Bomfim, do Cartaxo, de Lagoaça, de Sabugosa; Visconde de Monte-São; Pereira de Miranda, Eduardo Villaça, Campos Henriques, Carlos Palmeirim, Carlos du Bocage, Fernando Larcher, Mattozo Santos, Veiga Beirão, Dias Costa, Simões Margiochi, Baptista de Andrade, Gama Barros, Joaquim Telles de Vasconcellos, Vasconcellos Gusmão, Julio de Vilhena, Pedro de Araujo, Sebastião Dantas Baracho e Wenceslau de Lima.

O Redactor,

FELIX ALVES PEREIRA.

Rectificação

Na sessão n.° 47. de 24 de agosto, não se mencionou, por esquecimento, a votação que recaiu na moção do Digno Par Sebastião Baracho em relação ao projecto que autoriza a construcção de um monumento dedicado á memoria do Marquez de Pombal. Essa moção foi approvada, em votação ordinaria, tendo-a rejeitado os Dignos Pares Patriarcha de Lisboa e Bispo do Porto.