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Mas há mais ainda; o projecto no artigo 19.° não falla em deposito mas sim era caução, e o nosso respeitavel collega o sr. Soure, já disse o que era caução, a qual póde ser de diversos modos ou consignação em deposito ou fiança. Ora esta caução, esta fiança, é feita de accordo ou com a acquiescencia dos proprios individuos a quem se expropria?

Não senhor, é na mão do governo sem o accordo da parte interessada, de modo que é o governo sem missão dos proprietarios, quem aprecia se ella é boa ou não. Nas vicissitudes da vida humana, quem não vê as mudanças da fortuna sempre caprichosa e um risco mais ou menos grande, na fiança de um homem qualquer que elle seja? Pois se essa caução de um dia para o outro se tornasse nulla, essa garantia seria uma illusão, e eis-aqui como seria executado um artigo da carta, que quer que o pagamento seja feito previamente, e note-se como o artigo da carta é completamente... desconsiderado, não sei dizer outra phrase.

Uma voz: — Pôde dizer.

O Orador: — Eu não estou censurando uma resolução da camara.

O sr. Soure: — A reticencia é o peior, é melhor dizer francamente.

O Orador: — Agradeço ao digno par a sua advertencia, mas usarei d'ella como me parecer.

O sr. Soure: — Aa reticencias não são permittidas.

O Orador: — Aqui não ha reticencias, nem ha nada que possa offender directa ou indirectamente a delicadeza da camara nem dos dignos pares, eu queria usar de uma expressão que fosse menos severa (apoiados). Não estou aqui fazendo censura nenhuma, estou tratando da materia do artigo, e peço a V. ex.ª que me faça o favor de dizer se o artigo 19.° já está votado?

O sr. Presidente: — Não está.

O Orador: — Então já se vê que estou perfeitamente na ordem, e digo mais que se eu entendesse que a camara tinha andado mal, havia do respeitar as suas decisões, mas havia de dizer a minha opinião francamente e mesmo propor a reconsideração da medida, o portanto já se vê que não fiz censuras, porque se as fizesse tinha a franqueza de o declarar.

Repito, sr. presidente, que me parece que o § 21.° do artigo 145.° da carta constitucional, não permitte de modo nenhum que nós façamos uma lei, que está diametralmente opposta a esse mesmo artigo e paragrapho; o portanto, sendo a doutrina d'este artigo constitucional, não nos é dado fazer combinações ou arranjos que no fim de tudo não são o pagamento antecipado, como determina a carta, nem ainda mesmo o deposito não no poder do governo, mas sim no deposito publico onde possa o poder judicial manda-lo levantar, e não haja difficuldades que se opponham a essa entrega, como seria no caso de impossibilidade do pagamento no thesouro, como muitas vezes se tem dado; porque n'este caso o poder do juiz passaria por assim dizer para a mão do ministro.

Eu faço toda a justiça ao nobre ministro da fazenda, estou lhe dando o meu apoio no principio da liberdade que a lei estabeleceu; mas estou tambem expondo as idéas que tenho a respeito de algumas das disposições do projecto, o repito que faço os meus cumprimentos a s. ex.ª por acabar com essa cousa chamada contrato do tabaco. E se o estou apoiando por este facto, não e senão por uma convicção intima, que julgo deve ser partilhada por todos os membros da camara de que e um grande acto de administração publica acabar com a arrematação do contrato do tabaco (apoiados). Esta entidade a que se chama contrato do tabaco, objecto que tem agglomeradas contra si muitas suspeitas, muitas invejas, muitos odios, é uma cousa verdadeiramente impopular. A calumnia levanta-se sempre para suspeitar os homens publicos nas mais eminentes posições sociaes, estes afastam-se e subtrahem-se a resolver os negocios do mesmo contrato.

Se um ministro pratica algum acto de justiça a favor do contrato, as insinuações mais perfidas suspeitam da honra do ministro; se elle ao contrario procede com injustiça, o faz violencia aos contratadores, louva-se o homem independente.

Ministros tem sido victimas, e demittidos por causa d'este malfadado contrato (apoiados) Suppõe-se que elle exerce muitas vezes influencias funestas; as suas liquidações e as demandas a que elles dão causa, eternisam-se Na gerencia do contrato dos doze annos, eu tive por experiencia propria conhecimento de tudo o que avanço, e de muito mais que poderia dizer á camara, e soffri as maiores torturas em ver como o contrato era accusado de grandes influencias, quando elle estava sendo victima das maiores violencias!

No parlamento e na imprensa as mais duras accusações foram feitas ácerca das indemnisações dadas ao contrato do tabaco por occasião da guerra civil de 1846 e 1847; julgou essas indemnisações o meu amigo o nobre conde d'Avila; s. ex.ª dou aos contratadores o menos que podia dar-lhe, foi, seja dito francamente, demasiado severo para com o, contrato, o apesar d'isso os partidos -serviram-se desse pretexto para insultar o governo, e o nobre conde appareceu caricaturado, fumando um charuto de 80:000$000 réis (riso geral). Pois quer a camara ouvir quaes foram os resultados da liquidação, relativa aos seis primeiros annos do contrato dos doze annos, comprehendidas todas as indemnisações e vantagens que lhe foram concedidas? Foi uma perda de 46:000$000 réis nos primeiros seis annos! Eis aqui como se fazem apreciações infundadas. Em fim bastava ver-se a agitação da camara e as resoluções que ella tomou no modo de discutir este projecto, para se conhecer que era negocio com o contrato do tabaco.

Em uma palavra é minha opinião que o monopolio do tabaco não deve mais arrematar-se, não póde, não deve existir (apoiados).

Peço á camara desculpa d’esta divagação, o meu fim é notar os inconvenientes que offerecem as provisões do projecto em referencia ao § 21.° do artigo 145.° da carta, artigo que o parlamento não póde alterar sem poderes constituintes.

Não cansarei a camara com a demonstração da inconveniencia de que o governo seja escolhido para receber o deposito ou a caução. Por circumstancias extraordinarias que se podem dar, o governo póde ver-se em carência de meios, e servir-se do deposito ou da caução que tiver no seu poder, e depois para o restituir passado o anno economico terá de recorrer ao parlamento.

Eu poderia apresentar muitos exemplos d'estes, factos que se têem dado sem offensa dos caracteres que têem estado no ministerio, mas por força de circumstancias extraordinarias que ninguem póde prever. Um só facto mencionarei.

Não vae muito longe a epocha em que entraram na pagadoria de Vizeu quantias superiores as que devia um arrematante de rendas publicas, e para este cobrar uns 6:000$000 ou 8:000$000 réis que o estado recebeu de mais, estabeleceu-se uma consignação annual de 600$000 réis; de modo que para esta restituição são precisos alguns oito ou dez annos.

Será com contingências d'esta ordem que se pretende substituir o sagrado pagamento da expropriação que a carta julga tão previligiado, que quer que seja antecipado?

Sr. presidente, vou terminar, julgo ter provado que no artigo 145.° § 21.°, que é constitucional, se prescreve a indemnisacão previa, no caso de expropriação, &• que a caução nas mãos do governo, nem é pagamento previo, nem mesmo garantia segura da expropriação; o que n'estes termos as provisões do projecto são insustentáveis.

Eu confesso, sem me fazer cargo de outras disposições, que não sei mesmo se será preciso mandar para a mesa uma moção de ordem, o que acho é que isto é uma questão previa que a camara deve apreciar para estar segura de não invadir um preceito constitucional.

O sr. Presidente: — Queira V. ex.ª mandar por escripto a sua proposta.

O sr. Izidoro Guedes: — Eu não tinha tenção de escrever, mas vou cumprir com a determinação de V. ex.ª, esperando que me concederá de novo 'a palavra, se me for necessaria, para sustentar a minha moção, sem prejuizo da minha inscripção sobre a materia, pois que agora só fallei sobre a ordem (pausa).

Leu-se na mesa a moção que é do teor seguinte:

«Proponho que a camara se pronuncie se nas disposições contidas no projecto, sobre o modo de pagamento previo das expropriações excedo os poderes que ella tem, por isso que o artigo 145.°, § 21.° é constitucional e expresso sobre o pagamento previo. = Guedes.»

O sr. Soure e o sr. Ferrer: — Pedem ao mesmo tempo a palavra cobre a ordem.

O sr. Silva Carvalho: — Pede pela mesma fórma.

O sr. Rebello da Silva: — Igualmente.

O sr. Xavier da Silva: —.Para um requerimento.

O sr. Presidente: — A primeira cousa que tenho a fazer é ver se a camara admitte a proposta á discussão (apoiados).

Foi admittida.

O sr. S. J. de Carvalho: — Pode a palavra sobre a ordem, dizendo que já a tinha pedido quando a proposta se estava lendo na mesa.

O sr. Vaz Preto: — Pede a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: — Para requerimento está primeiro o digno par o sr. Xavier da Silva.

O sr. Vaz Preto: — Eu queria unicamente pedir a V. ex. que tivesse a bondade do mandar lêr o parecer que hoje deram as tres commissões sobre as emendas que lhe foram remettidas pois não estava aqui quando se leu.

O sr. Secretario leu.

O sr. Vaz Preto: — Deu-se por satisfeito.

O sr. Presidente: — Eu devo dizer que depois de admittida a questão previa caducaram as palavras que se tinham pedido antes (apoiados).

Agora tem para um requerimento o digno par o sr. Xavier da Silva.

O sr. Xavier da Silva: — Requeiro a V. ex.ª consulte a camara se quer que a proposta do sr. Guedes se discuta conjunctamente (Vozes;—Não póde ser), e que finda a discussão se vote primeiro que tudo. A camara resolverá depois de V. ex.ª propor.

O sr. Presidente: — O digno par não póde insistir no seu requerimento porque é do regimento que a questão previa tome o logar da questão principal (apoiados).

O sr Xavier da Silva: — V. ex.ª hade-me permittir o dizer que com quanto eu não seja antigo n'esta casa tenho já visto fazer-se o que proponho, isto é, discutir conjunctamente e votar depois a questão previa antes que se vote a principal. Faça porém a camara o que entender, mas vote-se o meu requerimento.

Entregue á votação foi rejeitado.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ferrer.

O sr. Ferrer: — Sr. Presidente, a minha situação é especial. Proclamado n'esta casa professor de direito publico, e vindo-se accusar aqui de inconstitucional um artigo proposto pela commissão sobre expropriações, a camara hade reconhecer que eu necessito tomar a palavra para mostrar que o não é; porque se o fosse, ou eu desconhecia a verdadeira intelligencia da carta, e era ignorante da materia, o que de certo me não fazia muita honra ou tinha entendido a carta como a entendeu o illustre auctor da proposta, e tinha sido injusto em subscrever ao parecer: este dilema, por qualquer dos lados, era para mim pouco lisongeiro. É por isso que eu preciso, n'este caso, dizer o que entendo a este respeito.

Serei breve como costumo; até porque n'este caso, poucas palavras são precisas para responder ao digno par.

E verdade que o § 21.° do artigo 145.° da carta, diz que para a expropriação ter logar, precederá indemnisação prévia; mas o digno par, apesar de saber lêr tambem como diz, não quiz lêr o resto do § 21.° «A lei marcará os casos em que terá logar esta unica excepção e dará as regras para se determinar a expropriação ».

Sr. presidente, todos sabem que os artigos d'uma constituição, são apenas as condições essenciaes, os principios fundamentaes da organisação politica do governo d'uma sociedade; são como brevissimas theses e não uma exposição ampla, como se deve apresentar nas respectivas leis regulamentares. Assim diz a carta, por exemplo, que o poder executivo concederá cartas de naturalisação, e não diz mais nada.

A vista da generalidade d'estes artigos da carta poderá todo o estrangeiro ser naturalisado? Não. Fez-se uma lei regulamentar para a naturalisação; e n'essa lei estabeleceram-se os requisitos para poder ella ter logar.

Que se fez n'esta lei regulamentar? Desenvolveu-se o grande pensamento, isto é, a base que está no artigo da carta; o n'esse desenvolvimento apresentaram-se condições e requisitos que restringiram e modificaram aquelle principio fundamental.

O que acabo de dizer com relação á lei regulamentar das naturalizações, tem-se feito em todas as leis regulamentares da carta que são muitas. E esta a doutrina dos publicistas. As rasões não são agora para aqui.

Segundo esta doutrina não podemos fazer uma lei, que tiro o seu a seu dono sem indemnisação; mas podemos dar as regras, segundo as quaes, essa indemnisação se ha de verificar. Deduz-se isto dos principios que acabo de expor, e o que e mais, da propria letra da carta nas palavras que já li textualmente das regras para a indemnisação.

E que estamos nós a fazer aqui com esta discussão! Estamos a fazer uma lei regulamentar, dando as regras sobre o modo de verificar a expropriação de que se trata. A camara está pois dentro dos limites constitucionaes, e não se póde com verdade dizer, que o artigo estabelecendo a caução na mão do governo é inconstitucional, e muito mais depois da commissão ter resolvido substituir a caução, termo generico, pelo deposito.

Alterado o artigo como disse, substituindo caução por deposito, não sei como o digno par propoz o sustenta a sua questão previa.

E na verdade a lei geral regulamentar sobre expropriações está feita: é a lei de 23 de julho de 1850, a qual no artigo 50.° diz claramente que póde ter logar o deposito provisorio havendo urgencia da expropriação o passando, feito este, o dominio da cousa para o governo, continuando depois o processo da indemnisação até que a final se verifique effectivamente com a entrega do valor da cousa. A rasão d'esta disposição da lei citada é porque o processo da expropriação póde levar muito tempo; e a expropriação ser urgente e não poder esperar.

Dá-se uma garantia de pagamento ao dono da cousa expropriada; o governo toma posse, o continua o processo da expropriação. Se o valor provisoriamente depositado é maior, o governo levanta o excesso, só é menor, paga o resto. É d'este modo se realisa a indemnisação, consignada na carta, salvaguardando o bem publico, fundamento da expropriação, o o interesse individual, fundamento da indemnisação. Limito a isto as minhas respostas ás observações do illustre auctor da questão previa; porque, vindo prompto para sustentar a constitucionalidade das expropriações, vejo que o digno par abandona já essa questão, limitando a sua questão previa ao modo da indemnisação provia.

Sr. presidente, resta sómente dizer que, estando nós a fazer uma lei regulamentar do § 21.° do artigo 145.° da carta, relativa á indemnisação de que falla a questão previa, a podemos fazer. Estas leis regulamentares são da competencia das côrtes ordinarias. As leis d'esta natureza todas têem sido feitas por côrtes ordinarias. Os poderes constituintes sómente são necessarios quando se trata de revogar ou alterar algum artigo constitucional da carta, caso em que não estamos.

Concluo, sr. presidente, que ainda que o § 21.° do artigo 145.° da carta não fallasse em lei regulamentar, nós podiamos fazer esta do que estamos tratando. O artigo 37.° da carta não falla de lei regulamentar. Estabelece a herança do pariato. E todavia fez-se uma lei que restringiu muito o principio hereditário; e ninguem chamou a essa lei inconstitucional, porque foi regulamentar do artigo 39.°, e as côrtes que a fizeram eram côrtes ordinarias.

Ao digno par que nos disse que sabia lêr o § 21.° do artigo 145.°, e que lhe bastava saber lêr, peço que lhe não escapem as palavras da última parte. E depois de as lêr, appello para a sua consciencia, para a qual tantas vezes appellou, e espero que ha de retirar a sua questão previa.

O sr. Filippe da Soure: — O digno par que me precedeu já respondeu, melhor do que eu o poderia fazer, ás reflexões que se apresentaram sobre esta materia, por isso pouco terei a acrescentar.

Sr. presidente, o digno par que ha pouco mandou para a mesa a sua moção previa, combate como inconstitucional este parecer. Creio que s. ex.ª se equivocou. Eu peço perdão ao digno par; mas queira s. ex.ª reparar que o deposito não se faz nas mãos do governo, mas sim onde se fazem todos os outros depositos. Quando se verifica a caução é que a commissão propunha que este se prestasse nas mãos do governo, porque este então não é parte. A transacção é unicamente entre os contratadores que acabaram e os que entram.

Interrupção do sr. José Izidoro Guedes, que se não ouviu. Então para que fallou o digno par em deposito?