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sabendo qual é a jurisprudencia constitucional do meu paiz. Sei de obedecer, como devo, á sua sentença, mas ficarei sabendo que os graus da minha liberdade dependem da medição que lhes fizer o governo. _

Se a associação união patriotica do Porto, que desejo ver espalhada pelo paiz inteiro, e da qual espero muito, esfriar no seu proposito quando vir que o governo recusa, como é provavel, aos seus estatutos a approvação que lhe pede, e que não me parece necessaria quando se dê a essa associação a fórma que se lhe póde dar; se eu vir isto direi então que, se os cidadãos d'este paiz não têem o direito de reunião, é porque o não merecem ter.

O sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello):

Sr. presidente, mudou de aspecto a questão. Lisonjeio-me muito com isso, o que todavia não maravilhou, porque não era de esperar outra cousa da capacidade do digno par que me precedeu..

Não é em nome dos tumultos, nem das agitações que o digno par interpella o governo e lhe pede explicações ácerca do estado do paiz.

Esses tumultos, essas agitações foram classificados pelo digno par como deviam sê-lo, e ainda de uma maneira mais vehemente e energica do que o tinha feito o governo (apoiados).

Agitação baixa e irracional, disse o digno par, e disse muito bem (apoiados).

Sr. presidente, mesmo quando se descrê dos principios fundamentaes do systema representativo, dos direitos que estão consignados na carta constitucional e que se acham estabelecidos em todas as leis, appellar para o tumulto e para a agitação, é baixo e irracional (apoiados). Justa condemnação que do alto d'esta tribuna, e por um homem tão respeitavel, foi lançada sobre os tumultuarios do Porto! (Muitos apoiados.).

Mudou de aspecto a questão, porque não se trata já de justificar o appello para a revolução das praças, mas de discutir um principio de direito publico constitucional, sobre o qual o digno par chamou a attenção da camara e do governo, e que merece ser apreciado pela sua importancia. Trata-se do direito de reunião; e não só d'este direito, mas do de associação, que é uma cousa muito distincta.

O direito de associação de que pretendiam usar alguns cidadãos da cidade do Porto, sem que julgassem indispensavel a auctorisação do governo para se constituirem nos termos e dentro dos limites das leis do estado, não lhe podia ser reconhecido pelos poderes publicos.

E de passagem, seja dito, sr. presidente, que eu sinto que O digno par, para quem tenho tido a maior consideração e muita estima, como sabe, e a quem tenho visto sempre sustentar o principio da auctoridade em nome da ordem social, viesse dizer á camara que quando o governo no uso do seu direito, no plenissimo uso da sua auctoridade...

O sr. Eugenio de Almeida: — Essa é que é a questão.

O Orador: — Já lá vamos.

E para manter a ordem publica intimasse aquelles que fazem reuniões, que deixassem de as fazer, lhes aconselharia que desobedecessem!

Disse mais o digno par: Se isso me succeder, como membro que sou de uma d'essas associações, se receber uma intimação similhante do governo, declaro desde já que desobedeço». (O sr. Eugenio de Almeida: — Apoiado.) E eu declaro, por parte do governo, que se esse facto se desse havia de proceder com o digno par da mesma sorte que a respeito de todos os outros cidadãos que se achassem na mesma associação (muitos apoiados).

Se querem levar a questão para esse terreno vamos a isso. Depois de se ter declarado que a agitação era baixa e irracional, se se quer passar para outra, que não direi que seja baixa, mas que não me parece altamente racional no interesse da causa publica...

O sr. Eugenio de Almeida: — É legitima.

O Orador: — E isso que eu quero ver demonstrado.

Se se quer fazer resistencia ás leis do paiz, á constituição, ao nosso codigo politico, que não permitte associações sem previa licença da auctoridade (apoiados), e sem que tenham estatutos approvados pelo governo (muitos apoia, dos); se se quer trazer a questão para este campo, o governo aceita a n'elle, porque não póde estar em melhor terreno. Aconselhar resistencia á lei, dizer que se lhe havia de desobedecer, não é senão querer mostrar que se é superior á lei (muitos apoiados), e que se esta acima d'ella (muitos e repetidos apoiados).

Mas, sr. presidente, o governo é que não póde reconhecer nada superior á lei, e o seu dever e a sua obrigação é fazer manter as leis, e cumpri-las (muitos apoiados) dentro dos limites que lhe marcam essas mesmas leis, que todos temos obrigação de respeitar (apoiados repetidos).

Sr. presidente, esta questão não é nova. Eu era membro do parlamento, e fazia opposição ao governo, que então estava á frente dos negocios publicos, quando n'uma occasião de crise, n'uma epocha tristemente memoravel, a paz publica foi alterada, e o governo decretou, e decretou por uma simples portaria, que a associação chamada patriotica fosse dissolvida...

O sr. Eugenio de Almeida: —Porque conspirava.

O Orador: — Por não ter estatutos.

(Interrupção do sr. Eugenio de Almeida, que se não percebeu.)

Peço ao digno par que leia a portaria do governo. Eu não posso suppor nem referir me a outros motivos se não aos que estão expressos n'aquelle documento, que diz que = a associação fosse dissolvida por não ter estatutos approvados pelo governo = (apoiados).

Uma voz: — Proclamava o regicidio.

O Orador: — Eu não sei o que a associação proclamava, o que sei, o que o governo allegou como rasão sufficiente, é

que estava fóra da lei, não tinha estatutos approvados. Eu era membro do parlamento, e fazia opposição ao governo, repito, vim para a camara e não fiz opposição a este acto, porque o achei regular (apoiados). Desconhecer a legalidade de um acto similhante é querer saír fóra das leis, é querer fazer resurgir aqui os factos que se deram com os jacobinos em França (apoiados).

Sr. presidente, isto não é uma questão de reünião, é uma questão de associação, que é cousa muito differente.

O sr. Costa Lobo: — E puramente de reunião.

O Orador: — Peço perdão. Todos nós temos o direito de fallar, mas é quando nos cabe a palavra.

O sr. Costa Lobo: —E porque V. ex.ª esta argumentando no ar.

O Orador: — Pois argumente V. ex.ª no chão quando lhe tocar a palavra (riso.) Eu argumento como entendo e como quero, em vista dos dados que se me offerecem. Repito, não é questão de direito de reunião, é questão de direito de associação. O governo deixou reunir quem se quiz reunir nas praças publicas, ou nas casas particulares. Reuniram-se todos quantos quizeram, representaram ao governo como quizeram, e disseram o que quizeram dizer.

Muito bem, perfeitamente. Agora, sr: presidente, a par d'este direito esta o direito da auctoridade, que tem obrigação de fazer cumprir as leis (apoiados).

Sr. presidente, eu sinto que na camara dos pares se levante um homem tão auctorisado e respeitavel, e venha proclamar principios subversivos da ordem publica, principios contrarios ás leis e ao principio da auctoridade, de que o digno par foi sempre um zeloso apostolo e defensor...

O sr. Eugenio de Almeida; — Eu não disse o que s. ex.ª me esta attribuindo.

O Orador: — Peço perdão. Eu não quero argumentar contra idéas que s. ex.ª não apresentou.

O sr. Eugenio de Almeida: — Eu fallei no direito de reunião pura e simplesmente; portanto o que v. ex.ª diz é fóra da questão..

O sr. Presidente: — Não posso consentir as interrupções. Os dignos pares podem fallar quando tiverem a palavra.

O Orador (proseguindo): — O governo não fez senão o mesmo que já tinha feito outro governo, e mandou dissolver a associação patriotica do Porto.

(Interrupção do sr. Eugenio de Almeida, que não se ouviu.)

Pois s. ex.ª não disse que pertencia a uma associação, de que é honrado chefe, e que não conhecia direito ao governo de ordenar que ella se não reunisse, e se o ordenasse que havia de desobedecer-lhe?...

Ora, sr. presidente, isto é que o governo não póde tolerar, isto é que o governo me consente. O governo não podia dissolver os meetings do corpo da Guarda ou da praça Nova emquanto não perturbassem a paz publica, mas podia dissolver a associação patriotica, que formulou e proclamou pela imprensa qual o seu fim e propaganda, e não tinha estatutos approvados pelo governo. Ora pergunto eu, esta associação estava legalmente constituida? Não, porque não tinha estatutos; logo não podia funccionar.

O sr. Eugenio de Almeida: — Peço a palavra.

O sr. Vaz Preto: — Peço tambem a palavra.

O Orador: — Sr. presidente, eu creio que o deficit é grande...

O sr. Eugenio de Almeida:'— Grande.' E medonho.

O Orador: — O deficit é grande, é mesmo medonho, disse o digno par, mas parece que o meio de diminuir o deficit ou extingui-lo, o remedio heroico são os cáusticos votantes, as agitações e tumultos nas ruas e as pedradas. E eu creio pelo contrario que o deficit não se póde matar assim, não se mata ás pedradas (muitos apoiados); se se quer extingui-lo, hão de empregar-se medidas pacificas e prudentes: esse é que é o meio. Eu posso dizer isto. O digno par conhece-me ha muito tempo, e sabe quaes são as minhas opiniões a este respeito; sabe que muitas vezes contribui com o meu pequeno contingente, assim como os meus amigos politicos, para suffocar disturbios politicos, mas nunca contribui para os excitar; porque, eu entendia que desde que tinha um logar no parlamento devia respeitar e conservar o meu posto de honra, e n'isso nunca hesitei, ainda mesmo que não tivesse uma cadeira no parlamento. Por tanto o digno par sabe que as minhas opiniões politicas são estas, e que sempre censurei nos outros o procedimento contrario. O que convem é que, não só o governo, mas todos os homens intelligentes do paiz, empreguem todos os meios legaes para melhorar a situação d'elle.

Ora, se o deficit é grande, repito, não creio que seja este o meio de o extinguir; e o digno par no fundo do seu coração ha de julgar que eu tenho rasão em dizer que não se podem d'esta maneira aplanar as difficuldades financeiras; e que se acaso nós não fizermos sacrificios, havemos de nos achar mal. Eu creio que é com a regularisação das despezas e organisando bem os serviços, tanto no que toca aos nossos negocios internos, como nos externos, que havemos de melhorar; creio que assim é que se ha de conseguir, senão a extincção do deficit, pelo menos a sua attenuação em escala mui grande, e de maneira a mostrar tanto a nacionaes como a estrangeiros que nós procurámos governar-nos de modo que nos achâmos habilitados a satisfazer todos os encargos e obrigações, e conseguir melhorar a situação do paiz dentro e fóra d'elle.

Tendo feito este pequeno discurso talvez que eu não respondesse a tudo quanto aqui se tem dito, porque não estava presente quando se tratou de outros pontos a que de certo já respondeu o meu illustre collega do reino. Sinto pois não me poder explicar de uma maneira tão clara e positiva como desejava ácerca de objectos, sobre os quaes eu tenho ha muito as idéas mais fixas que se póde imaginar.

(O orador não reviu o seu discurso.)

O sr Visconde de Chancelleiros: — Sr. presidente, vou usar da palavra aproveitando o pouco tempo que me resta, porque é provavel que eu não possa vir á sessão de ámanhã, e desejo portanto deixar significado o meu voto com relação á questão que incidentemente se levantou n'esta casa por iniciativa do digno par, o sr. visconde de Fonte Arcada. Pedi a palavra, sr. presidente, sob a impressão (que não qualificarei de funesta) e surpreza que me causou a proclamação dos principios e idéas que todos acabâmos de ouvir ao digno par que me precedeu.

Sr. presidente, eu tive a honra de fazer opposição ao lado de s. ex.ª, e proclamávamos a nossa opposição, não só no' seio do parlamento, mas tambem n'aquellas reuniões que todos os cidadãos têem direito de fazer. No entanto as nossas doutrinas (como ainda hoje são as minhas) não eram. aquellas que o digno par acaba aqui de proclamar. Então se ex.ª, em mais de uma occasião, apresentou-se como apostolo do culto que se deve prestar á auctoridade, e proclamou muito bem o quanto era necessario dar-lhe força e prestigio, reprovando altamente que ao governo se fizesse opposição pelos meios que agora se empregam: então s. ex.ª reprovava com toda a força dos seus grandes recursos intellectuaes, que se empregassem esses meios para combater O governo, levando a opposição para as praças publicas, promovendo-se assim a desordem e a anarchia, e substituindo a opposição legal á illegal, illegitima e revolucionaria. Então, como disse, estava eu ao lado de s. ex.ª,.de quem aprendi e abracei esta doutrina, e muitas outras que tenho tambem aprendido de s. ex.ª; mas por isso mesmo não esperava agora ouvir do digno par uma doutrina tão diametralmente contraria áquella.

Tendo pois s. ex.ª sustentado aquella boa doutrina, que tanto me agradou; e com a qual me conformo, senti hoje muito ouvir da bôca do digno par principios tão oppostos áquelle! Senti deveras, repito (O sr. Eugenio de Almeida offerece rapé ao orador), e agradecendo ao digno par a mimosa offerta que me faz e que eu tomo, ma? a que me não posso acostumar; continuo dizendo que muito senti ouvir hoje aquelles principios proclamados por um homem, cuja auctoridade de palavra, é tão grande como respeitada pelos eminentes dotes que em s. ex.ª todos reconhecem. Senti deveras que s. ex.ª viesse agora aqui proclamar idéas que, não só não sustentava em outro tempo, mas que até severamente combatia..

Pretende o digno par dar uma grande importancia a esses tumultos, que a final pouco ou nada significam. Diz-se que ha um sobresalto no paiz, que o paiz levanta-se assombrado pela monstruosidade do deficit... Oh! sr. presidente, pois agora é que o paiz se sobresalta e se assombra' com essa, monstruosidade do deficit? Pois o paiz não sabia já ha muito que existia esse deficit? Então sabia que era preciso de algum modo fazer-lhe face recorrendo aos impostos? De certo que havia de sabe-lo. Não podia ignora-lo sem ter de suppor-se que elle era indifferente a si mesmo, e isso não abona muito nem ao menos o valor das representações.

Se o paiz se agita hoje, se essa agitação se manifesta até em representações que não têem sido solicitadas pela commissão a que o digno par pertence; se isso assim é hoje, porque o não era hontem? Pois quando todos desejâmos attenuar o deficit, quando isto se consegue de algum modo pelo augmento do imposto, achâmos sobresaltadas as localidades, que se não sobressaltaram com os frequentes appellos ao credito, que tornavam, necessarios os impostos por se lhes pedirem esses impostos, que não são mais do que um encargo obrigado, como o reconhecem todas as opiniões financeiras?

O sr. Costa Lobo: — Faz se opposição ao desperdicio.

O Orador: — O digno par é dos mais novos que aqui se assenta. Eu já tive tambem a mesma opinião de que o digno par se acha animado. Eu sustentei, e sustento hoje, as mesmas idéas que possuia então; mas o que tenho de mais * é o convencimento, filho do trato da vida publica; e elle diz-me que isso não é systema, que não é levantando acintosamente uma opposição, que não é agrupando em volta do governo difficuldades, que se póde esperar a satisfactoria resolução de uma crise como aquella que estamos presenciando.

Sr. presidente, eu tenho a honra de ser relator da commissão de fazenda no projecto de lei, contra o qual penso se levanta a maioria, e tive occasião de dizer o que disse agora, que o maior dos impostos para nós é o deficit. E não sei mesmo, se fosse possivel transferir o digno par d'esta cadeira para aquellas onde se assenta quem gere a pasta da fazenda (e isto em mim não é mais do que um voto sincero que faço); se fôsse possivel, repito, transferir o digno par do logar que occupa, para aquelle que acabo de indicar, receio muito que s. ex.ª, por mais tratos que désse á sua poderosa imaginação, por muito que procurasse os meios de satisfazer ás necessidades vitaes do nosso paiz, sem recorrer ao augmento, do imposto, que não encontraria de certo nenhum outro. E preciso, sr. presidente, que se equilibre a receita com a despeza, que se trate muito seriamente de amortisar o deficit, que se dêem os cortes necessarios nas despezas publicas.

O sr. Eugenio de Almeida: — Essa é que é a questão.

O Orador: — Estes principios, sr. presidente, tenho eu aqui sustentado sempre. Ditos pela minha bôca, podem não produzir tanta sensação como pronunciados por a de outrem; são principios que alegram os homens de todos os partidos; mas eu, que me tenho levantado contra mais de um governo; eu que por vezes tenho mandado para a mesa moções de ordem contrarias a diversos membros do gabinete, quando se trata da questão do orçamento, tenho-me conservado mudo, porque entendo que é um trabalho inglorio o de propor, mesmo sem consciencia, como muitas vezes succede, reducções na despeza publica.

(Interrupção que não se ouviu).