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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 529

culdades intellectuaes, só a instrucção litteraria dá o alimento condigno.

Não me assusta por fórma alguma a influencia malefica que as letras possam ter na sociedade: os desvios não dão as definições dos objectos, nem os abusos constituem lei.

Se na epocha actual, em que a sciencia tem reivindicado os seus fóros, e que em graus proporcionados se tem diffundido até ás ultimas classes, têem apparecido factos que em verdade contristam; e o progresso da instrucção, na opinião de alguns espiritos, é arguido como causa d'esses factos, que têem enlutado a sociedade, eu não subscrevo essa opinião. Pelo contrario, ao progresso da instrucção attribuo eu terem-se dado passos agigantados na disposição do melhoramento fundamental da sociedade.

Se vamos ao exame dos factos, vimos que os acontecimentos que cobriram de luto e sangue uma nação muito illustrada, não foram consequencia da illustração d'essa nação, (Apoiados) nem podiam ser: as letras não favorecem o sophisma, dispõe á prudencia, não ao delirio; insinuam a elevação do espirito, não a degradação dos costumes.

A diffusão da instrucção popular civilisa, não embrutece as classes desfavorecidas na sociedade. As estatisticas criminaes registam infelizmente muitos crimes na epocha actual, a despeito da instrucção que se diffunde: no tempo transacto, quando ainda não existiam esses documentos estatisticos, ou eram informes e deficientes, nem por isso a noticia de crimes, então commettidos, nos tem chegado mais escassa d'elles. Que horror, se eu aqui os apontasse!

Se temos a lamentar essas guerras destruidoras, esses factos de anarchia, que em nossos dias têem opprimido e desgraçado as nações, lembremo-nos tambem dos que succederam no tempo do obscurantismo; lembremo-nos dos horrores da Jacquerie no seculo XIII, e dos d'aquella guerra caracteristica da falta de instrucção, e que geralmente é conhecida na historia pelo nome de bellum rusticorum, guerra dos rusticos, dos ignorantes.

Quarenta mil homens se levantaram então no centro da Bohemia; e devastaram este paiz e a Moravia praticando as mais nefandas atrocidades.

Foram assombrosas as scenas de devastação que se deram nas cidades de Praga e de Aust; era então o seculo XV.

Não quero com esta referencia attenuar de modo algum a apreciação dos horrores que ha pouco presenciámos n'uma nação quasi nossa vizinha; mas é certo que aquelles, de que acabo de fazer memoria commettidos á sombra do obscurantismo, sobrepujaram muito os da communa de Paris. Aquelles, alem de não haverem sido menos descomedidos em indecencias, menos ferozes em atrocidades, menos devastadores em ruinas, alem de revelarem não menos profundo caracter de degradação, prolongaram-se por dez annos, em capricho da rusticidade; estes outros, não menos lamentaveis, mas acontecidos no seculo das luzes, duraram dois mezes; alem de outras quaesquer causas, não se poderá negar, que o estado de instrucção actualmente diffundido em todas as classes da sociedade repelliu com nausea e horror as scenas do novo vandalismo.

Não podiam progredir por mais tempo, porque mesmo os espiritos, que imbuidos estavam pelas más leituras, tambem liam (porque sabiam ler), os repellentes resultados da aberração do espirito, da adulteração das idéas, do abuso das faculdades.

Nem posso, portanto, em vista dos factos, coarctar auxilio de qualidade alguma em favor d'esta instituição maravilhosa, d'esta instituição santa, qual é a do ensino popular.

Não só as cousas propriamente ditas da igreja são santas, tambem o são todas as instituições que se dirigem a aperfeiçoar na moralidade e na sciencia o ente humano: pelos dotes da intelligencia é que elle tem a imagem de Deus; dar meios para seu desenvolvimento, e justa direcção, é santo empenho: a igreja dá aos homens assim devidamente formados o titulo de gens sancta.

Sempre foi intuito da religião christã auxiliar a instrucção.

Um digno par, a quem me ligam antigas relações de respeito herdadas de familia pela mutua amisade havida entre nossos paes, invocou a influencia dos bispos e dos parochos em favor da execução d'este projecto.

Concordo perfeitamente com esta idéa, nem póde ser de outro modo, salvo querendo o clero degenerar do seu caracter.

Sr. presidente, v. exa. sabe muito melhor do que eu, pela elevação das suas luzes e conhecimentos, que nas epochas em que os homens, que davam a lei aos povos, caprichavam, não (como diz elegantemente um dos nossos chronistas classicos, descrevendo as proezas do condestavel), em dar com a espada os melhores aparos ás suas pennas; mas, por assim dizer, em destruirem e cortarem com a espada todos os vinculos das letras e das sciencias; sabe v. exa., repito, que n'esses tempos se ufanavam de não saber escrever os grandes, os barões, os guerreiros e até os principes.

A igreja só se empenhava então, já nos humildes circulos das parochias, já nos elevados monumentos de retiro que os conventos dos beneditinos n'essas epochas representavam como grandes fócos de sciencia, já nas assembléas conciliares das dioceses e das provincias; só a igreja, repito, tomava então a seu cargo espontaneamente a salvaguarda das letras e das sciencias, e conquistava para ellas os espiritos, emquanto o resto da sociedade se contentava de conquistar terra, e por vezes de tambem a assolar.

O parocho ensinava os miseraveis filhos dos seus pobres parochianos quando ainda não havia instrucção legislada nos paizes (Apoiados.); nos mosteiros eram recebidos os mancebos oblatos, destinados á instrucção, independentemente da profissão monastica; e d'ahi nasceram os grandes homens que conservaram a sciencia e as letras, que eram como banidas dos outros centros sociaes; nos concilios provinciaes, ou diocesanos, a igreja se reunia em pessoa de seus prelados e ministros, e consignava decretos obrigatorios de instrucção, digo obrigatorios para os individuos sujeitos directamente á sua alçada disciplinar, os ministros ecclesiasticos.

De certo que se podermos imaginar um periodo, em que as letras fossem de todo banidas d'entre a sociedade dos homens, e no centro d'ella representarmos a existencia de um ministro da igreja, ahi n'elle as letras se encontrariam conservadas.

Pois bem; é por isto que o interesse mesmo da lei, que já foi votada na generalidade, e cujas especialidades estamos discutindo, me levou a propor a eliminação d'estas palavras a que me referi na minha limitada proposta. Esta eliminação é unicamente para evitar aos parochos as consequencias desagradaveis e a occasião desconveniente de se indisporem com os seus parochianos, occasião que nunca deve ser promovida: embora elles tomassem d'ahi motivo para fazer exhortações saudaveis, não seriam ellas n'essa occasião bem acceitas d'aquelles, a quem mais cumpriria que aproveitassem.

Os parochos, estando lançados no papel e affixados na porta da igreja os nomes dos parochianos, que em menoscabo de seus deveres houverem recalcitrado á intimação da lei, têem opportunidade á hora da missa conventual, (que é só destinada ás preces e piedosas instrucções, e não a pregões humilhantes); têem opportunidade, repito, de exhor-tal-os para que, pela immediata e honrosa observancia legal, e no desempenho de seus paternaes deveres, façam que os seus nomes hajam de ser riscados de um catalogo, que os não honra, e que a ninguem edifica nem satisfaz.

Parece-me que n'estes termos, e por todas estas rasões de conveniencia, deve ser adoptada a minha substituição. Te-