DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 497
do; eu creio que sendo a commissão de guerra a unica competente sobre a materia, e reconhecendo a necessidade d'ella tratar d'este assumpto, não haverá duvida em que ella seja ouvida antecipadamente; é até isso mais natural, pois que as indicações d'esta commissão nada podem, no meu entender, influir na questão principal, não podem senão limitar-se a dar conselhos sobre o traçado, que ainda não está determinado.
Eu não quero suppor por modo algum que o requerimento do digno par, o sr. conde de Castro, tenha outro fim senão o manter o systema adoptado n'esta casa de se estudarem as questões conjunctamente nas differentes commissões, systema mais prompto e mais efficaz.
Se, porventura, a proposta importasse a suspeita de que a commissão de guerra podia demorar a resolução dos negocios, a camara não a acceitaria, porque as commissões são incapazes de faltar ao cumprimento dos seus deveres; portanto tal suspeita, que de maneira nenhuma passou pelo espirito do meu amigo, não 6 acceitavel.
Não direi mais nada, visto que me reputo incompetente para tratar do assumpto, e peço licença para me retirar.
O sr. Conde de Castro: - Causa-me estranheza ver a opposição que se levanta contra o meu requerimento. Eu não quero que a commissão de guerra deixe de ser ouvida, o que desejo é que não se alterem as praxes constantemente seguidas n'esta camara, porque não vejo motivo para se fazer uma excepção.
Não me recordo que, em relação aos contratos dos caminhos de ferro de norte e leste, e da Beira Alta, em que a questão estratégica era tambem importante, se mandasse ouvir especialmente a commissão de guerra, e sim reunida com as outras commissões.
Posso, porém, mencionar, por exemplo, os seguintes factos que têem inteira paridade com o caso de que se trata. Relativamente á reforma dos serviços dos correios e telegraphos, foi o projecto remettido a umas poucas de commissões. Ninguem dirá que este assumpto não seja especialmente da competencia da commissão de obras publicas, e no entretanto foi tambem remettido ás de fazenda e legislação, mas todas reunidas. O projecto que faz algumas alterações no codigo de justiça militar, que é tambem um assumpto que pertence á commissão de guerra, foi igualmente enviado ás de marinha e legislação, que deverão funccionar reunidas. Então para que se pretende fazer agora uma excepção?...
Não acredito que na proposta do sr. Camara Leme esteja envolvido um pensamento dilatorio, não supponho que a opposição queira demorar o andamento do projecto, mas sinto que se levantasse esta impugnação ao meu requerimento, porque ella tende a afastar a camara das praticas seguidas até hoje.
O sr. Visconde de S. Januario: - Desejo dizer algumas palavras em abono do requerimento apresentado pelo sr. conde de Castro, e como me parece que estão inscriptos outros dignos pares que o impugnam, peço a v. exa. que me reserve a palavra para depois de s. exas. terem fallado.
O sr. Visconde de Seabra: - Sr. presidente, levanto-me de uma grave doença, e sinto, pela primeira vez que venho a esta casa, ter de discordar da opinião do meu amigo o sr. conde de Castro.
O negocio de que se vae tratar é importantissimo. (Apoiados.)
Desde o momento em que um membro d'esta camara pede esclarecimentos sobre um ponto tão importante, que prende com a defeza do paiz e a sua independencia, e requer que o projecto vá á commissão de guerra para estudar esta questão nas suas relações directas e indirectas com aquelle ponto, não está nas praticas desta casa deixar de acceder a propostas d'esta natureza.
Nunca vi aqui rejeitar qualquer requerimento tendente a reunir os esclarecimentos necessarios para que os membros d'esta casa possam firmar a sua opinião em bases solidas. Quando esses requerimentos se dirigem a um fim sacratissimo, a uma competencia exclusiva, entendo em minha consciencia que rejeital-o seria dizer eu não quero esclarecer-me n'esta materia; Desde que se diz que é necessario ouvir mais commissões, porque não se hão de ouvir?-
A rasão que me obriga a apoiar a moção do sr. Camara Leme, obriga-me tambem a dizer - se quereis mais esclarecimentos, pedi-os; não vos podem ser negados, pelo mesmo principio.
Dizer-se que este requerimento, que se fez primeiramente no sentido de uma especialidade separada e distincta, seja confundido com outros pareceres ou esclarecimentos que não têem relação com o assumpto, não têem significação, não têem nenhuma rasão de ser.
Reunir objectos de diversa natureza é embaralhar a questão. (Apoiados.)
A commissão de guerra decide dos negocios da guerra; a de fazenda dos da fazenda; e a das obras publicas dos negocios relativos ás obras publicas. Estas duas ultimas commissões não têem que argumentar, que discutir com a commissão de guerra, porque não são competentes.
E tanto isto é verdade, que esta camara, quando trata de se constituir, elege as suas commissões, concedendo a cada uma d'ellas uma competencia particular. Querer confundir esta competencia é querer ou que as commissões tratem de apresentar um parecer monstruoso, ou querer que as suas maiorias supplantem as minorias.
Rejeito, pois, a proposta do sr. conde de Castro, não só por pretender conglobar e reunir tudo, mas porque nada aproveita quanto aos esclarecimentos que possam desejar-se e ser pedidos.
(O orador não reviu este discurso.)
O sr. Visconde de S. Januario: - Sr. presidente, eu creio que todos estamos de accordo na idéa. Se ha divergencia é apenas na fórma de a realisar.
A opinião apresentada pelo digno par, o sr. Camara Leme, é apoiada na proposta do sr. conde de Castro, que pretende que sejam ouvidas as commissões de guerra, fazenda e obras publicas.
Eu cinjo-me a esse pensamento, e creio que e pensamento do governo é o mesmo. Convem que sobre este projecto de caminho de ferro, assim como em todos aquelles sobre que esta camara tem de ser ouvida, se derrame toda a luz das siencias militares.
Seguindo-se esse precedente, não teriamos a lamentar os erros crassos que, debaixo do ponto de vista militar, se encontram em quasi todos os traçados de caminhos de ferro do nosso paiz. Convem que as regras relativas á defeza nacional, como pensamento estrategico, nas questões de caminhos de ferro sejam estudadas e se tratem devidamente.
É certo que um caminho de ferro que se faz para uma exploração economica não póde ser nunca um caminho de ferro exclusivamente militar.
As companhias que emprehendem a construcção de caminhos de ferro consideram principalmente a questão emquanto aos dividendos, e procuram augmental-os explorando as zonas mais importantes do paiz em beneficio do desenvolvimento economico da linha que contratam, o que tambem não quer dizer que não se possam applicar a esses caminhos,, em devidos termos, as condições relativas á defeza do paiz.
Portanto, tambem sou da opinião manifestada com algum desenvolvimento na proposta do digno par o sr. Camara Leme. Creio que todos estamos de accordo com essa opinião, a divergencia que existe é simplesmente na fórma.
Eu cinjo-me de preferencia á proposta do sr. conde de Castro, para que seja ouvida a commissão de guerra, conjunctamente com as de fazenda e obras publicas, porque