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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO DE a DE MAIO DE 1867

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. CONDE DE LAVRADIO

Secretarios os digno pares

Marquez de Sousa Holstein

Marquez de Vallada

(Assistia o sr. ministro dos negocios estrangeiros.)

Ás duas horas e meia da tarde, sendo presentes 34 dignos pares, declarou se aberta a sessão.

Lida a acta da precedente, julgou se approvada na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Deu-se conta da seguinte

CORRESPONDENCIA

Um officio do ministerio da marinha e ultramar, remettendo, a requerimento do sr. visconde de Soares Franco, a copia do parecer dado pela commissão nomeada em portaria de 15 de outubro de 1866, relativamente á fragata D. Pedro V. em construcção no arsenal da marinha. Para a secretaria.

O sr. Marquez de Sá: — Sr. presidente, vou mandar para a mesa o seguinte requerimento (leu).

Sr. presidente, como de certo é muito conveniente que na occasião em que se discutir o parecer n.° 156 sobre o projecto de lei n.° 122, estejam estes documentos presentes á camara para os poder examinar, pedia a V. ex.ª que mandasse dar, com urgencia, o destino conveniente ao requerimento que apresento, a fim de que, chegando a occasião da discussão d'este parecer, não succeda não termos presentes os documentos que peço, que são essencialmente necessarios, e de que precisâmos para nos elucidarmos. I Leu-se na mesa o requerimento do digno par, e é do teor seguinte:

«Devendo discutir-se n'esta camara o projecto de lei re

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lativo á remissão dos fóros dos prazos da corôa, situados no estado da India, requeiro que se peça ao governo que, com urgencia remetta a esta camara copia das ordens relativas aos mesmos prazos, que foram dadas pelo governador geral do mesmo estado, conde das Antas, pelo seu successo e pelo ministro da marinha quanto ás disposições tomadas por ambas aquellas auctoridades.

Camara dos pares, em 3 de maio de 1867. = Sá da Bandeira.

O sr. Presidente: — A mesa toma em consideração o requerimento de V. ex.ª, e vae dar-lhe, com urgencia, o devido andamento.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Casal Ribeiro); — Sr. presidente, fui incumbido por Sua Magestade El-Rei, de participar a V. ex.ª e á camara que Sua Magestade a Rainha, aconselhada pelos medicos, vae fazer uma digressão ao estrangeiro. Acresce a isto que acaba de ser convidada por seu augusto pae para assistir ao casamento de seu irmão o Principe Amadeu.

Sua Magestade a Rainha ha de saír ámanhã d'esta capital em direcção a Madrid; e d'ahi se dirigirá a París, e em seguida a Florença. Acompanha-la-hão os ex.mo" srs. duque de Loulé, marquez de Sabugosa, conde de Valle de Reis, duas damas e um facultativo.;

O sr. Presidente: — A camara ouviu a communicação que acaba de fazer o sr. ministro dos negocios estrangeiros, e vem a ser que Sua Magestade El Rei o incumbira de participar á camara que Sua Magestade a Rainha sairá d'esta capital ámanhã pelas oito horas e meia da manhã.

A camara quererá que se nomeie uma grande deputação para ir comprimentar Sua Magestade antes da sua partida (muitos apoiados).

O sr. presidente constatou a camara, que resolveu affirmativamente.

O sr. Barão de Villa Nova de Foscôa: — Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação do concelho do Carregal, contra as medidas financeiras e de administração civil.;

Peço a V. ex.ª lhe dê o mesmo destino que têem tido todas as mais em identicas circumstancias.

O sr. Vaz Preto: — Peço a palavra para quando estiver presente o sr. ministro da fazenda.

O sr. Presidente: — Darei a palavra ao digno par na occasião em que se achar presente o Sr. ministro da fazenda.

(Pausa.)

O sr. Presidente: — Ninguem mais pede a palavra, vamos entrar na

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DO DEBATE SOBRE O ASSUMPTO DA INTERPELLAÇÃO DO DIGNO PAR O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA ANNUNCIADA AO SR. MINISTRO DO REINO

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Costa Lobo.

O sr. Costa Lobo: — Cedo da palavra.

O sr. Visconde de Gouveia: — Sr. presidente, não posso ficar silencioso ao ouvir apreciar de um modo pouco lisonjeiro para a cidade do Porto os acontecimentos ultimamente ali occorridos.

O digno par auctor da interpellação, o sr. visconde de Fonte Arcada, a quem consagro toda a veneração que as suas virtudes e boa fé reclamam, pareceu querer envolver a grande maioria d'aquella terra na responsabilidade das desordens e tumultos. Vim ha pouco d'ali. Prendem-me ao Porto laços de familia e sympathia. Permitta a camara que eu restabeleça a verdade dos factos, e que assevere que só um numero diminuto de individuos praticou e dirigiu aquellas desordens, pelas quaes não póde ser responsavel a grande maioria da cidade.

No Porto póde haver descontentes; podem apreciar-se mais ou menos desfavoravelmente certas medidas governativas; póde existir uma opposição organisada; podem reünir-se e associar-se differentes cidadãos já para peticionar' aos poderes publicos, já para discutirem e estudarem as questões financeiras e politicas, mas d'aqui á desordem e á, sedição vae uma distancia incommensuravel; e a opposição das praças e da pedrada forma um grupo diminutíssimo com relação ao bom senso e á cordura d'aquella leal povoação.

Folgo que viesse em abono d'esta minha opinião o meu antigo condiscípulo e sempre amigo, companheiro nas lides. litterarias dos verdes annos, e hoje collega 'n'esta camara, O digno par orgão da opposição, o sr. José Maria Eugenio. Se discordámos pela primeira vez na posição politica, não discordámos na apreciação d'este facto. O digno par qualificou de ignobeis, baixos, irracionaes e outros feios epithetos os desordeiros do Porto. E eu sem o acompanhar na responsabilidade da qualificação, aceito as consequencias. O digno par não pensaria por certo comprehender n'este estigma a grande e sensata maioria da cidade. Aquellas expressões só podiam dirigir-se a um pequeno grupo. E eu folgo que n'este ponto vá de accordo commigo opinião tão' categorica e illustrada. O Porto, sr. presidente, é uma cidade importante, que encerra com as freguezias ruraes perto de 100:000 habitantes, pela maior parte robustos, corajosos e dados ao trabalho.

Quando o Porto entendesse que era chegada a occasião da ultima rasão dos povos, viria animosamente ao campo, como tem feito em mais de cem batalhas a favor da liberdade. E não seria a guarnição actual, nem o duplo, nem o quadruplo que bastaria a conter os seus brios e a sua coragem. A facilidade com que os tumultos foram reprimidos é portanto a prova mais que sufficiente de que só uma porção restrictissima de individuos tomou parte n'elles.

Sinto porém que o digno par ao passo que mimoseou com, os nomes de irracionaes e ignobeis os desordeiros do Porto, censurasse o honrado chefe d'aquelle districto, que depois de esgotados todos os meios de tolerancia e moderação, repelliu a força com a força, e estabeleceu a ordem publica. Não comprehendo, como possa qualificar-se de irracional e miseravel a anarchia que se desmanda, e envolver-se em quasi igual estigma a auctoridade que a reprime, e que a reprime sem dureza nem excessos.

Das expressões do digno par tiro ainda outro corollario, e é que ha pelo menos duas opposições, a das praças e as dos tumultos, a que s. ex.ª não pertence e que chama baixa e ignobil, e outra legal e pacifica, inimiga d'aquelle tumultuar desordeiro, á qual ou antes a um grupo da qual o digno par pertence,* e de que hoje o vejo unico lingua e chefe n'esta casa.

O digno par fallando n'este intuito, discorreu sobre o estado do paiz. Era este o objecto da interpellação do sr. visconde de Fonte Arcada, opposicionista permanente a todos os governos, e sempre desligado da opposição, e a cuja proverbial boa fé já fiz justiça. Eu concordo tambem nas difficuldades em que se acha o paiz. Em que não posso concordar é nos corollarios que d'ahi deduz o digno par meu condiscípulo e amigo, para definir ou justificar a sua posição n'esta casa.

O estado do paiz é difficil com relação ás circumstancias financeiras. Quem o ignora? Mas estas difficuldades vem de longe. Todas as passadas administrações compartilham a responsabilidade destas circumstancias (apoiados). E o governo actual é o primeiro que ousa encara-las de face, e que emprehende combater o deficit, já iniciando reducções e economias, já augmentando o imposto.

O estado do paiz é difficil com relação á politica da Europa, aos receios de uma guerra geral, e ás tendencias das nações grandes e poderosas para absorverem as pequenas. Mas que culpa tem n'isto o actual governo? (Apoiados.) Quer o digno par faze-lo responsavel pelo que se passa lá fóra? Póde uma nação pequena como somos, suster a marcha dos grandes acontecimentos da Europa central, fazer parar as batalhas, ou torcer a politica dos poderosos imperios? O que nós podemos fazer e o que temos feito, e faça-se n'isso justiça a todos os governos, é mostrar que somos dignos da nossa autonomia e da nossa independencia. Somos um paiz livre. Talvez não haja na Europa outro onde mais se respeitem e conservem as liberdades publicas e as garantias do cidadão, onde haja mais tolerancia politica dos governos para com os partidos, e mesmo dos partidos uns para com os outros. Temos instituições livres. Caminhámos na senda do progresso, não só do progresso material, de que são prova os caminhos de ferro, e tantos outros melhoramentos, mas do moral e intellectual, como mostram o adiantamento da instrucção publica, e as reformas que a cada passo estamos fazendo em tantos ramos da governação do estado. Este amor pela liberdade e pelo progresso são tanto mais de apreciar, collocados como estamos pela natureza na extrema occidental da Europa, e encostados na grande extensão da nossa raia terrestre a uma nação maior e mais poderosa, que só nos dá exemplos de intolerancia, de retrocesso, de oppressão e de mau governo..Este é o único systema a seguir em frente de quaesquer tendencias de absorpção. Hoje trata-se alem d'isso de melhorar as condições financeiras, de organisar e instruir a força publica, e de dar mais força e regularidade á nossa diplomacia. Parece-me que são estes os meios de conjurar a tempestade que o digno par receia (apoiados).

O estado do paiz é difficil com relação á agitação que se nota n'elle. Mas é mister estudar as verdadeiras origens d'essa agitação. Onde é que as classes tributadas aceitam silenciosamente e de bom grado o augmento do imposto? Nasce sempre d'ahi um certo descontentamento, de que alguns partidos se aproveitam para excitar o paiz contra o governo. A nossa historia contemporanea nacional danos exemplos, alguns dos quaes não vão longe. Mas não é o augmento do imposto o que agita mais certos espiritos: A reforma administrativa, não pelo complexo das suas doutrinas (isso é meio pretexto para opposição), mas pela alteração da divisão territorial, concita os odios e o desgosto de milhares de individuos, que antepõem os seus interesses individuaes ao grande interesse publico. Muitos districtos são supprimidos. Grande numero de concelhos serão extinctos. E uma grande economia para o thesouro. E uma grande economia para os povos. E um grande principio de moralidade e boa administração. Mas ha interesses contrariados, muitos interesses embora individuaes e illegitimos. E é d'aqui que vem a maior agitação, tanto mais damnosa, quanto particular e interessada. Ella ha de acalmar-se com a organisação do paiz; e não vejo que tome parte n'ella a parte mais sensata e mais illustrada, com raras excepções, nem que numericamente mesmo se possa dizer imponente.

De todas, estas circumstancias anormaes concluo eu que devemos reünir-nos em volta do governo para o auxiliar a atravessar a crise (apoiados). E assim que em iguaes circumstancias o têem feito partidos muito mais fortes, opposições muito mais organisadas. E vejo com admiração que d'estas difficuldades, d'estes receios, especialmente com relação á politica da Europa, conclue o digno par que deve fazer opposição ao governo.

Não comprehendo o raciocinio. D'estas primicias tirava o digno par em outras epochas bem diversas consequencias. Não sei porque tira outras agora.

Já porém me ía alongando demasiadamente nas minhas observações, quando o meu fim foi unicamente restabelecer a verdade dos factos com relação ao Porto. Á vista do caminho que tomou a discussão, e das respostas categoricas dadas pelos nobres ministros do reino e fazenda á interpellação que se discute, não terminarei sem mandar para a mesa uma moção de ordem. E a seguinte (leu).

E agora, dirigindo-me ainda uma Vez ao digno par, mexi amigo, que denominou ignobeis e irracionaes os desordeiros do Porto, e se declarou inimigo dos tumultos das praças, permitta o digno par que eu faça votos para que as suas palavras n'esta casa estejam sempre em plena harmonia com os seus actos lá fóra.

Leu-se na mesa a proposta do digno par o sr. visconde de Gouveia e foi admittida.

Era do teor seguinte:

PROPOSTA

A camara, satisfeita com as explicações do governo, passa á ordem do dia.

Sala das sessões, 3 de maio de 1867. = Visconde de Gouveia.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o digno par o sr. visconde de Algés.

O sr. Visconde de Algés: — Creio que estava inscripto antes de mim o sr. Costa Lobo e a logica da discussão pede mesmo que assim seja, para não fallarmos seguidos os que oram no mesmo sentido.

O sr. Presidente: — O sr. Costa Lobo cedeu da palavra.

O sr. Visconde de Algés: — N'esse caso tambem eu cedo.

O sr. Presidente: — Segue-se o sr. marquez de Vallada, que tambem me diz que cede da palavra, e portanto o immediato é o sr. Eugenio de Almeida, que não vejo agora presente.

Vozes: —Acaba de entrar novamente na sala. O sr. Presidente: — Então tem a palavra o digno par. O sr. Eugenio de Almeida: — Cedo da palavra. O sr. Presidente: — Quem se segue é o sr. Vaz Preto Geraldes.

O sr. Vaz Preto: — Tambem cedo da palavra sôbre"o objecto da ordem do dia.

O sr. Presidente: — Esta ainda inscripto ò sr. visconde de Fonte Arcada; tem s. ex.ª a palavra.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Vejo quasi todos os dignos pares que se tinham inscripto para fallar, cederem da palavra, mas eu não posso imitar o exemplo, porque abri o debate fazendo a interpellação ao sr. ministro do reino; s. ex.ª respondeu-me fallando largamente, e eu preciso responder a s. ex.ª segundo os apontamentos que tomei do seu discurso.

Disse o sr. ministro que o paiz estava socegado, mas diz o Nacional do Porto, e foi repetido por alguns jornaes de Lisboa, que na Povoa de Lanhoso os tumultos têem augmentado e que havia grande agitação em Guimarães, aonde se esperava tropa.

A verdade é que todos reconhecem a grande agitação que têem produzido as novas medidas financeiras e administrativas, que geralmente se consideram nocivas ao paiz.

Pois centos de representações, tão repetidas, com milhares de assignaturas de tanta importancia, como ' se tem visto, muitas até de corporações, tão numerosos meetings, aqui em Lisboa e no Porto, e em mais algumas terras para requerer contra as medidas do governo, não revela isto a agitação dos espiritos, e não demonstra um queixume geral do mal que se sente e que se receia? O caso é que essa agitação patenteia-se por differentes modos, embora alguns sejam reprehensiveis, mas entretanto tudo prova a profunda agitação do paiz ou o grande descontentamento, e que esta bem longe de estar socegado como nos diz o sr. ministro.

A proclamação das auctoridades do Porto, militar e civil, bem prova a grande agitação da cidade, que a todos é manifesta. A proposito da proclamação assignada pelo sr. visconde de Leiria, par do reino, direi que este senhor esta exercendo no Porto a importante commissão de auctoridade superior militar do districto; entretanto não foi pedida licença á camara como estabelece o acto addicional no artigo 3.°, interpretando os artigos 31.° e 33.° da carta constitucional, e conforme se tem sempre praticado.' O mesmo succede com o sr. conde d'Avila, ministro em Hespanha, que tambem não foi pedido á camara.

Mas, sr. presidente, requisitou acaso o governo o sr. visconde de Leiria, ou o sr. conde d'Avila, para as commissões que estão desempenhando, e que os impossibilitam de assistirem ás sessões d'esta camara? Não posso portanto deixar de considerar este facto senão como uma irregularidade indesculpavel, que mostra o desprezo em que se têem as disposições constitucionaes.

Voltando porém ao que disse o sr. ministro do reino a respeito da proclamação, querendo mostrar que pelas palavras do ultimo periodo não se póde entender outra cousa senão o mesmo que se diz no primeiro; permitta-me s. ex.ª que lhe observe que apesar da sua interpretação e de eu ser o primeiro a reconhecer os subidos dotes intellectuaes e a sciencia de s. ex.ª, é impossivel que possa mostrar que as palavras do segundo periodo da proclamação, que dizem que = as auctoridades hão de empregar toda a força de que dispõem para cohibir os tumultos =, queiram dizer o mesmo que a do primeiro, onde apenas se diz que = as auctoridades hão de empregar os meios que a lei faculta para evitar os tumultos =. Se as palavras do segundo periodo tivessem a mesma significação que aquellas que ultimamente repeti, eram escusadas; mas ellas que estão aqui, é porque têem outra significação, e ella é sem duvida, que as auctoridades hão de empregar toda a força de que dispõem para cohibir os tumultos independentemente do que facultam as leis. Sobre este ponto porém, sr. presidente, já tive hontem occasião de apresentar as minhas considerações, e por isso abstenho-me agora de as repetir.

Sr. presidente, o sr. visconde de Chancelleiros disse no seu discurso as seguintes palavras que aqui tenho notadas: «Que agora não havia mais rasão para a inquietação do paiz, do que havia o anno passado; que o deficit ha muito tempo que era excessivo, que o paiz o tem consentido, e que não é levantando uma opposição acintosa que se póde saír d'este estado».

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Sr. presidente, se havia rasão o anno passado para haver inquietação, essa rasão tem mais que triplicado; e se o paiz consentiu que houvesse déficit o anno passado, não se segue que deva consentir este anno no modo por que se quer preencher.

Não se póde portanto estranhar que se o paiz não se agitou o anno passado, agora se agite, quando as circumstancias financeiras têem peorado muito, e quando se querem remediar por um modo a que o paiz todo resiste, principalmente vendo-se que o governo vae seguindo o mesmo caminho.

Disse tambem s. ex.ª que a opposição que se fazia ao governo era uma opposição acintosa!

Acintosas têem sido todas as opposições emquanto os governos não seguem os principios d'ellas, ou não largam as suas cadeiras. Acintosa era a opposição que eu fazia, o sr. Casal Ribeiro e muitas outras pessoas ao governo de 1846; acintoso era aquelle governo, que continuou sem alteração a sua politica, desprezando as censuras da opposição, cujo resultado foi a desordem e depois a revolução. Acintoso é o governo actual, que apesar de tantas manifestações, apesar de tantas representações assignadas contra a sua politica por milhares de cidadãos, não tem feito caso d'ellas e vae continuando o caminho encetado.

Deixemos pois de lançar o estigma sobre o modo de proceder da opposição, porque ella, como todas, segue o seu caminho de accordo com os principios que inculca.

O sr. ministro da guerra disse que havia agora muito menos rasão para o paiz se inquietar do que em outras occasiões; eu não trato agora de discutir este ponto; porém a verdade é que o paiz tem sobejas rasões de se inquietar e muito, que esta inquieto e descontente, e que busca por todos os modos, já por meio de reuniões, já por meio as meetings, já por meio de representações, obstar a que sejam approvadas as medidas apresentadas pelo governo, contra as quaes se tem altamente pronunciado. Estes é que são os factos, esta. é que é a verdade.

Sr. presidente, passando agora a responder ao sr. visconde de Gouveia, direi algumas palavras com relação ás observações apresentadas por s. ex.ª Agradeço em primeiro logar ao digno par a consideração que mostra ter por mim, asseverando a s. ex.ª que não tenho rasão alguma para deixar de o apreciar como devo e s. ex.ª merece; mas pondo de parte estes comprimentos de mutua estima, occupar-me-hei do que s. ex.ª disse com relação ao objecto que se discute.

Disse o digno par que «eu tinha dito que a cidade do Porto tinha toda tomado parte nos disturbios que lá houve, e que a facilidade com que os tumultos foram apasiguados mostrava que grande parte da cidade não tinha adherido aos disturbios». Disse tambem s. ex.ª que «as circumstancias financeiras actuaes não são só de hoje, que são antigas, e que o governo não tem a culpa. Que apresentára a reforma diplomatica e administrativa.» (Taes são as notas do discurso de s. ex.ª que eu tomei.)

Eu acho que nada haverá de mais difficil do que uma cidade toda tomar parte n'um movimento qualquer; mas quando uma grande parte dos cidadãos mais notaveis, por um lado, fazem reuniões para representarem contra as medidas que reputam prejudiciaes ao paiz, e por outro enviam aos poderes constituidos centos de representações contra essas medidas, quando isto se dá como actualmente temos visto, e quando o descontentamento se tem mostrado por outros meios, embora irregulares, não se poderá dizer que a cidade em que taes factos se dão esta desassossegada? Parece-me que sim. Pois todos estes factos não desassocegam uma cidade? De certo. Desassossegam mesmo aquelles cidadãos que não tomam parte no movimento. Pois como quer s. ex.ª que em vista dos acontecimentos se diga que a cidade do Porto não esta agitada?

Eu pronunciei as minhas palavras n'este sentido, e pelo meu discurso se poderá ver que não asseverei que todos os habitantes do Porto tomassem parte na agitação, o que era impossivel, e por maneira alguma se póde exigir n'estes assumptos a exactidão mathematica.

Disse tambem s. ex.ª que a facilidade com que foram apasiguados os motins mostrava bem o pequeno numero de pessoas que n'elles tomaram parte; eu confesso a s. ex.ª que não posso perceber como é que foram tão facilmente apasiguados os tumultos, tendo havido tantos soldados e cidadãos feridos, e tendo sido necessario intervir a espada do soldado! Apasiguados com facilidade só se poderia dizer se o tivessem sido por qualquer auctoridade policial ordinaria. Foram apasiguados com facilidade quando foi preciso empregar a espada do soldado acotiando o povo nas praças e nas ruas! Foi preciso lançar nas ruas do Porto soldados de infanteria e de cavallaria para pôr termo aos tumultos, e os tumultos acabaram-se com facilidade!!!

Sr. presidente, não me parece que isto mostre que os disturbios se acabaram com muita facilidade, e a prova esta em que houve muitos ferimentos tanto entre a tropa, como entre o povo; salvo se as palavras não significam já oque significavam até agora. Sendo assim, ainda se póde entender que os tumultos acabaram com facilidade.

O sr. visconde de Gouveia disse uma grande verdade, de que eu ha muito tempo estou persuadido, que as circumstancias financeiras do paiz não são só de hoje, são antigas. Eu tenho assistido a todas as sessões parlamentares, excepto a uma em que estive fóra do paiz por motivo de doença; alem d'isso tenho examinado ha muito o nosso estado financeiro, e cada vez mais estou persuadido que é muito assustador.

É verdade. O nosso mau estado financeiro é antigo, mas agora é que praticamente se conhece o resultado do systema que temos seguido, e todos os ministerios têem concorrido para este estado. Agora o que não procede é o que

diz o digno par, de que o gabinete actual não tem culpa d'este estado financeiro. Pois este governo não veiu a tempo de poder diminuir ou attenuar de qualquer modo essas circumstancias?

Se as circumstancias do paiz são devidas a todas as administrações, como effectivamente são, uma das primeiras obrigações do governo actual era attenuadas, diminuindo muitas despezas que se podiam dispensar, e não querer fazer tudo de repente, e não querer agora attenuar o deficit lançando tributos pesadíssimos sobre a população que menos os póde pagar.

Quanto á reforma diplomatica não sei que diminua a despeza, bem como a outra.

Sr. presidente, o curso das minhas idéas leva-me a dizer agora algumas palavras que tinham mais cabimento quando se tratasse do projecto ácerca do imposto de consumo; mas não posso resistir ao desejo de exprimi-las, ainda que depois as repita.

O sr. ministro da fazenda acabando com o antigo termo da cidade de Lisboa, e creando os concelhos de Belem e dos Olivaes, reconheceu que só um grande numero de empregados fiscaes, auxiliados pela força armada, poderia cobrar os tributos de consumo e embaraçar desvios, que a fiscalisação necessaria para este fim era muito despendiosa e vexatoria; e agora quer converter todo o paiz no antigo termo de Lisboa?

Agora vejo eu tambem que a guarda de segurança que se quer estabelecer, e que poderia ser muito util para o serviço da policia, já tem outro fim marcado, que é fazer em todo o paiz o mesmo serviço que fazia no antigo concelho de Lisboa a guarda municipal, ou a tropa quando era necessaria para coadjuvar os empregados fiscaes. Querer-se-ha lançar assim um cordão sanitario em roda de cada centro de população, ainda o mais insignificante? (Riso.)

Sr. presidente, peço perdão de me ter afastado do assumpto da discussão, mas não pude deixar de exprimir a minha opinião sobre objectos que se ligam com a questão.

O sr. ministro do reino, em uma portaria á camara municipal de Setubal, que queria fazer um emprestimo applicando alguns impostos indirectos para o seu pagamento, e note se que eram sobre o vinho e agua pé, não consentiu, e disse em uma portaria á camara que eram impostos contrarios aos principios de administração.

Agora porém os srs. ministros, tendo reconhecido os defeitos dos impostos indirectos e o gravame que causam, alem do vinho tributam a carne, o azeite, o arroz, as gorduras, etc. finalmente todos os generos mais necessarios para a alimentação do povo!

E preciso que os srs. ministros se detenham na carreira em que vão, e tratem de ver se só cegam o paiz, procurando destruir por medidas uteis o espirito de opposição que muitos dos seus actos menos pensados e nocivos têem produzido.

Sr. presidente, não queria fazer um discurso tão longo, até porque talvez me veja na precisão de tomar outra vez a palavra sobre o projecto que faz a segunda parte da ordem do dia, mas não pude eximir-me de manifestar a minha opinião sobre um assumpto de tanta gravidade.

O paiz esta agitado, e demonstra-o por meio de associações e pelas representações que tem feito ao parlamento, e que têem sido desprezadas até agora, e então cumpre que o governo tenha prudencia e saiba collocar-se na altura da sua missão e que evite as causas dos desgraçados acontecimentos que temos presenciado.

Conclui.

(Durante o discurso do digno par entraram os srs. ministros do reino e da fazenda.)

O sr. Presidente: — Como não ha mais nenhum digno par inscripto, vou pôr á votação a moção do sr. visconde de Gouveia.

O sr. Conde de Fonte Nova: — Requeiro que a votação seja nominal.

Assim se resolveu.

Feita a chamada.

Disseram approvo os dignos pares: Conde de Lavradio, Marquez de Fronteira, Marquez de Pombal, Marquez de Sousa Holstein, Marquez de Vallada, Marquez de Vianna, Conde da Azinhaga, Conde de Campanhã, Conde de Castro, Conde de Cavalleiros, Conde do Farrobo, Conde de Fonte Nova, Conde de Fornos, Conde da Louzã, Conde de Paraty, Conde da Ponte, Conde da Ponte de Santa Maria, Conde de Thomar, Visconde de Algés, Visconde de Chancelleiros, Visconde de Condeixa, Visconde de Gouveia, Visconde de Monforte, Visconde de Ovar, Visconde de Seabra, Visconde da Silva Carvalho, Visconde de Soares Franco, D. Antonio José de Mello, Macedo Pereira Coutinho, Rebello de Carvalho, Pereira Magalhães, Ferrão, Silva Cabral, Pinto Basto, José Lourenço da Luz, Baldy, Rebello da Silva, Fonseca Magalhães, Vaz Preto, Fernandes Thomás, Almeida e Brito e Ferrer.

Disseram rejeito os dignos pares: Marquez de Niza, Conde de Alva, Conde do Sobral, Visconde de Fonte Arcada, Mello e Carvalho, Eugenio de Almeida e Pitta. Ficando assim approvada a moção por 42 votos contra 7. O sr. Marquez de Sá da Bandeira declarou que não votava.

O sr. Presidente mandou ter a lista da deputação para comprimentar Sua Magestade a Rainha á saída da capital.

Esta deputação foi composta dos ex.mos srs. presidente d'esta camara, secretarios Marquezes de Sousa Holstein e de Vallada, e dos dignos pares Condes da Azinhaga, de Cavalleiros, de Campanhã, do Farrobo, de Fonte Nova, de Fornos, de Linhares, da Louzã, de Mesquitella e de Peniche.

O sr. Vaz Preto: —Sr. presidente, em algumas das sessões do anno passado fiz eu varios requerimentos para que fossem remettidos a esta camara pela secretaria da fazenda e respectiva repartição, quaesquer documentos que ali existissem a respeito do contrato que em certa epocha o governo de Portugal tinha feito, com relação á fabrica real da Covilhã, que esta no poder de um estranho, pertencendo aos bens nacionaes. Esses documentos nunca vieram, e apesar das instancias repetidas da minha parte, jamais foram remettidos á camara, para que eu podesse interpellar o governo. Visto s. ex.ª os não ter enviado até hoje, naturalmente porque os não possuia, despenso-os para o meu fim, porquanto são do dominio do publico, attenta a sua publicação n'um jornal da provincia. Para as perguntas pois que eu tenho de fazer ao governo não careço d'elles, e estimarei muito que o sr. ministro da fazenda me possa responder desde já. O que eu desejava saber era se o sr. ministro da fazenda ou o governo, se este objecto correr por outra repartição, está resolvido a empregar os meios ao seu alcance para ultimar este negocio, que é importantissimo, que é do dominio do publico, e por consequencia devia-o ser do de s. ex.ª; mas como até este momento nenhumas medidas me consta que fossem tomadas, supponho que o sr. ministro tudo ignora, e por isso vou dar-lhe alguns esclarecimentos. Este é um dos objectos importantes e urgente a sua resolução, porque se trata de uma fabrica extraviada que pertence á fazenda nacional e que tem um valor de perto de 200:000$000 réis. Quando o paiz esta sobresaltado, e em grande agitação pelos novos e pesados sacrificios que d'elle vão exigir, e que são necessarios para conservação da sua autonomia e boa administração, compete aos governos não só esclarece-lo sobre este ponto, mas mostrar e justificar a necessidade do novo imposto, fazendo ver que se fizeram todas as economias e reformas convenientes ao serviço publico, mas ao mesmo tempo que a fazenda publica e os bens que lhe pertencem andam bem administrados e nas mãos dos legitimos senhores.

Sr. presidente, este objecto que não tem sido resolvido até hoje, e cuja falta recáe sobre todos os ministerios que desde aquella epocha não tem reivindicado esta parte da fazenda nacional, tem uma resolução facil e prompta, a qual consiste em fazer executar a sentença que o annulla.

Como prometti dar esclarecimentos, acrescentarei que existe uma sentença que o annulla, baseada em rasões firmes e incontestaveis, que são as seguintes: annulla o contrato, porque foi feito por um poder incompetente, pois foi feito pela junta de commercio, devendo ser pelo conselho de fazenda; annulla o contrato, porque não pagou a respectiva siza; annulla o contrato, porque foi assignado por um procurador que se não achava auctorisado com a respectiva procuração; annulla o contrato por lesão enorme; annulla o contrato por ser considerado compra e venda, quando o não podia ser, e tanto que o comprador recebeu 24:000$000 réis, em logar de os entregar; e finalmente, porque o actual possuidor tinha obrigação de fornecer o exercito, a marinha e a casa real, de fardamentos, abatendo uns tantos por cento (a fabrica tem constantemente trabalhado) e até hoje nem uma só das condições foi cumprida.

Este objecto, repito, é muito urgente na actualidade e importante pela sua natureza, é preciso pois que seja tratado o mais breve possivel. Eu não irrogo a menor censura ao actual sr. ministro da fazenda pela irregularidade que tem havido em todo este negocio; longe de mim tal pensamento, pois a responsabilidade pertence a muitos ministros e ministerios; este negocio data de muito tempo e talvez não corresse, como ou creio, pela repartição de s. ex-a O meu fim, instando com o actual sr. ministro da fazenda e governo, é fazer-lhe ver a este respeito o que elle não sabia nem conhecia, e dar-lhe por esta fórma a occasião e os elementos de restituir á fazenda nacional uma parte que tem andado alienada indevidamente.

Eu sei que o nobre ministro já tentou resolver este negocio em 1859, quando ministro do reino, tanto que ordenou ao administrador do concelho que tomasse conta da fabrica em nome do governo; mas sei tambem que em seguida se suspendeu a execução.

Sobre este ponto especialmente desejava uma explicação, assim como desejava que o sr. ministro declarasse quaes são as suas intenções e o que esta resolvido a fazer. Aguardo a resposta do sr. ministro. O sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Sr. presidente, não tratarei agora de responder ás perguntas que acabam de me ser dirigidas pelo digno par, o sr. Vaz Preto, ácerca da fabrica da Covilhã, porque me não acho convenientemente habilitado para o poder fazer.

Direi apenas a b. ex.ª que tenho idéa de que em tempo se fallou muito n'este objecto; e, a dizer a verdade, não sei a rasão por que os documentos, a que o digno par alludiu, não foram já remettidos á camara.

O que devo declarar desde já é que esses documentos hão de ser aqui mandados o mais breve possivel, e então me habilitarei a dar mais amplas explicações a respeito d'este assumpto.

É por emquanto o que posso dizer. O sr. Vaz Preto: — Eu já declarei, quando ha pouco tomei a palavra, que não tinha em vista irrogar a menor censura ao sr. ministro da fazenda, porque a responsabilidade I recae sobre muitos ministros e ministerios, até mesmo estou convencido de que os documentos que peço não se acham na repartição a cargo de s. ex.ª, porque o contrato não foi feito pela repartição do nobre ministro; o fim que tenho em vista é chamar a attenção do governo sobre este objecto, por isso que os documentos já se acham publicados na Estrella da Beira, e por consequencia não ha necessidade que o sr. ministro os mande á camara, mas sim que resolva á vista d'elles.

O que eu entendo é que, visto o contrato estar annulla

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do, como ha pouco demonstrei, o que ha a fazer é o governo tomar posse da fabrica, mandando executar a sentença, porque não póde nem deve, um edificio que de direito pertence á fazenda nacional, continuar ha tanto tempo extraviado d'ella. O valor de si já é grande, e se se exigirem perdas e damnos não sei onde isso chegará!

Eu não tenho mais nada a dizer, depois das explicações do sr. ministro, senão que espero que s. ex.ª cumprirá o seu dever.

O sr. Marquez de Pombal: — Sr. presidente, pedi a palavra unicamente para dizer a V. ex.ª e á camara que o sr. conde de Rio Maior me encarregou de participar que por incommodo de saude não tem podido assistir a algumas sessões d'esta casa.

O sr. Presidente: — Vae ler-se, para entrar em discussão, o parecer n.° 151.

O sr. Secretario leu-o, e é do teor seguinte:

PARECER n.° 151

Senhores. — Foi presente ás commissões reunidas de agricultura, commercio e industria e de legislação o projecto de lei n.° 141, vindo da camara dos senhores deputados, sobre sociedades anonymas, da iniciativa do governo.

Longa e mui reflectida foi a discussão d'este projecto no seio das ditas commissões reunidas em muitas sessões, como a importancia do objecto reclamava do seu zêlo.

Terminado que foi o exame pelas commissões, desejaram estas ouvir sobre o seu resultado os ministros da corôa, signatarios da proposta na camara dos senhores deputados. Foram ouvidos, e de uma nova discussão reciproca, conseguiram as commissões a concordancia unanime sobre as emendas, suppressões e additamentos que ora têem a honra de offerecer á illustrada deliberação da camara dos dignos pares.

Estas alterações em nada offendem o pensamento essencial do projecto, e são unicamente propostas pelas commissões ao exame d'esta camara, no intuito de mais confirmar e robustecer a realidade pratica d'esse pensamento, emancipando as sociedades anonymas da tutela preventiva e repressiva do ministerio das obras publicas, commercio e industria, assim na constituição como na dissolução das mesmas sociedades, sem comtudo as commissões deixarem de reconhecer o direito de suprema inspecção do governo, exercida sobre estas sociedades, por intervenção do ministerio publico, perante os competentes tribunaes de commercio, quando ellas se não submetterem ou se não conformarem com as disposiçoes da nova lei.

Muitas d'estas alterações são de redacção, mas entre ellas ha outras de maior importancia, que, ou se justificam por si mesmas, ou sobre as quaes os membros das commissões se reservam dar á camara dos dignos pares durante a discussão as explicações que lhes forem exigidas.

As vossas commissões foram unanimes em seu voto, como são agora em seu parecer, e não se propõem nem a encarecer as vantagens e utilidade publica das sociedades anonymas, nem a exagerar os seus inconvenientes.

Nem aquellas nem estes foram objecto de especial discussão, mormente em presença dos luminosos relatorios feitos pelo governo e pelas commissões da camara dos senhores deputados, que as commissões reunidas offerecem á consideração dos dignos pares.

Sobre a opportunidade e conveniencia do projecto tambem as commissões reunidas não levantaram duvida alguma.

As disposiçoes do codigo de commercio portuguez relativas a companhias de identica natureza, eram mais que deficientes sobre a materia; auctorisavam uma, exorbitante e arbitraria interferencia administrativa sobre a constituição e permanencia das sociedades anonymas, ao que era de urgencia providenciar de modo que não dependessem do governo, nem quanto á organisação de seus estatutos, nem quanto á existencia juridica de sua administração.

Em harmonia com estas idéas, e no sentido de não offender direitos especialmente constituidos; de chamar todas as sociedades anonymas, assim estrangeiras como portuguezas, ao estado normal, estabelecido pela nova lei, e prevenir expressamente que todas ficam sujeitas ás consequencias legaes de privilegios que os poderes publicos julgarem conveniente estabelecer ou conceder, redigiram em conformidade os penúltimos artigos do projecto.

Com as alterações pois que as commissões reunidas apresentam, e a que se referem, entendem que o referido projecto é digno de ser approvado por esta camara.

Sala da commissão, em 20 de abril de 1867. = Marquez de Niza, presidente = Marquez de Ficalho = Conde do Sobral = Conde de Peniche = José Bernardo da Silva Cabral =Conde de Fornos de Algodres = Alberto Antonio de Moraes Carvalho = Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão = Luiz Augusto Rebello da Silva = Marquez de Alvito.

projecto de lei n.° 141 DAS SOCIEDADES ANONYMAS

SECÇÃO I

Da natureza e designação das sociedades anonymas

Artigo 1.° São sociedades anonymas as associações de capitaes, nas quaes todos os associados limitam a sua responsabilidade a montante das suas subscripções, qualquer que seja o objecto ou fim da sociedade.

§ 1.° Taes sociedades não são designadas por firma alguma social ou pelo nome de

qualquer dos associados, mas são sempre qualificadas, ou por uma denominação particular ou pela indicação clara do seu objecto ou fim.

§ 2.º A designação d'estas sociedades deve ser formulada por modo que ellas inteiramente se distingam umas das outras.

§ 3.° Qualquer sociedade anonyma que adoptar uma denominação ou designação identica á de outra já existente, ou por tal fórma similhante que possa induzir a erro, fica sujeita ás perdas e damnos que d'este facto resultarem, e será obrigada a mudar a sua denominação ou designação logo que qualquer interessado o reclame.

§ 4.° No ministerio das obras publicas, commercio e industria haverá um registo especial onde todas as sociedades anonymas deverão fazer inscrever a sua denominação logo que se achem definitivamente constituidas nos termos d'esta lei.

§ 5.° Os fundadores de qualquer sociedade anonyma, antes de adoptarem uma denominação social, deverão verificar, por certidão authentica, que nenhuma outra se acha registada com denominação identica, ou por tal fórma similhante, que possa induzir a erro.

§ 6.° Logo que a presente lei esteja em vigor, far-se-ha, no ministerio das obras publicas, commercio e industria, um registo especial da denominação das sociedades anonymas actualmente existentes.

secção II

Da constituïção das sociedades anonymas

Artigo 2.° As sociedades anonymas constituem se pela simples vontade dos associados, sem dependencia de previa auctorisação administrativa e approvação de seus estatutos, e regulam-se pelos preceitos d'esta lei.

§ unico. Da disposição d'este artigo exceptuam-se as sociedades que tiverem por fim adquirir bens immoveis para os conservar no seu dominio e posse por mais de dez annos. A constituição d'estas sociedades fica sujeita á especial auctorisação dos poderes executivo ou legislativo, segundo as leis vigentes.

Artigo 3.° Nenhuma sociedade anonyma póde constituir-se sem que:

1.° O numero dos associados seja pelo menos de dez;

2.º O capital social esteja integralmente subscripto;

3.° Cinco por cento, pelo menos, d'este capital, consistindo em dinheiro, esteja pago por todos os subscriptores, proporcionalmente ás suas subscripções.

§ 1.° Quando o contrato social determine que a emissão do capital se faça por series, a subscripção integral da primeira serie será sufficiente para a constituição da sociedade.

§ 2.° No caso previsto no § antecedente, a emissão da segunda serie não terá logar sem que o capital da primeira esteja pago na proporção de

75 por cento do seu valor nominal, e a mesma regra se observará nas seguintes emissões.

§ 3.° Da disposição do § antecedente exceptuam-se as sociedades anonymas de seguros, e todas aquellas cujo capital não for destinado, immediata e directamente, para a realisação do seu objecto ou fim, mas servir unicamente de garantia subsidiaria das operações sociaes.

Artigo 4.° Os estatutos das sociedades anonymas são sempre outorgados em escriptura publica, e formam o contrato da sociedade.

§ 1.° N'esta escriptura os outorgantes declararão expressamente que estão cumpridas todas as disposiçoes exigidas pelo artigo 3.°, sendo pessoal e solidariamente responsaveis pela veracidade d'estas declarações.

§ 2.° Não poderá lavrar-se a escriptura publica, a que se refere este artigo, sem que os outorgantes apresentem documento comprovativo de estarem pagos os direitos de sêllo que a lei de 26 de abril de 1861 e regulamento de 10 de dezembro do mesmo anno exigem pela approvação e confirmação dos estatutos das sociedades e companhias, ou os que forem determinados pelas leis. «

§ 3.° Nenhuma sociedade anonyma póde dar começo ás suas operações sem a publicarão dos seus estatutos, nos termos do artigo 35.° Artigo 5.º Os estatutos indicarão sempre expressamente:

1.° A denominação ou designação social, precedida ou seguida das seguintes palavras: Sociedade anonyma, responsabilidade limitada;

2.° O objecto ou fim da sociedade;

3.° Sua duração; 4.° A sua séde ou domicilio legal;

5.° A indicação do capital social;

6.° A organisação da administração;

7.° O modo de constituir as assembléas geraes ordinarias e extraordinarias;

8.° O modo de proceder á liquidação, no caso de dissolução.

§ unico. Quando na composição do capital social entrarem valores que não sejam dinheiro, ou quando se estipularem vantagens especiaes a favor de alguns dos associados, menção expressa será feita nos estatutos, indicando-se a avaliação em dinheiro das vantagens estipuladas e do que assim for trazido para o fundo social, e ficando responsaveis pela effectividade taes valores, e sujeitos a responderem por quaesquer prejuizos provenientes de dólo ou fraude todos os que para a sociedade os tiverem trazido.

secção in Das acções e da sua transmissão

Artigo 6.° O capital das sociedades anonymas, constituido em dinheiro ou em valores de qualquer natureza, é sempre representado e dividido em acções de um valor igual, podendo comtudo o mesmo titulo representar mais de uma acção.

§ 1.° As acções são sempre nominativas emquanto o seu valor nominal não estiver integralmente pago.

Alterações feitas ao projecto de lei n.º 141

Artigo 1.° Sociedades anonymas são aquellas em que os associados limitam a sua responsabilidade ao capital com que cada um subscreve.

§ 1.º Estas sociedades são qualificadas por uma denominação particular ou pela indicação clara do seu objecto e fim.

§ 3.° No ministerio das obras publicas, commercio e industria haverá um registo especial onde todas as sociedades anonymas deverão fazer inscrever a sua denominação logo que se achem definitivamente constituidas nos termos d'esta lei.

§ 4.° Os fundadores de qualquer sociedade anonyma, antes de adoptarem uma denominação social, deverão verificar, por certidão authentica, que nenhuma outra se acha registada com denominação identica, ou por tal fórma similhante que possa induzir a erro.

§ 5.° Qualquer sociedade anonyma que adoptar uma denominação ou designação identica á de outra já existente, ou por tal fórma similhante que possa induzir a erro, fica sujeita ás perdas e damnos que d'este facto resultarem, e será obrigada a mudar a sua denominação ou designação logo que qualquer interessado o reclame.

3.° Cinco por cento, pelo menos, d'este capital, consistindo em dinheiro, esteja pago por todos os subscriptores, proporcionalmente ás suas subscripções, e a importancia total correspondente esteja depositada em banco nacional legalmente auctorisado.

§ 1.° Quando o contrato social determine que a emissão do capital se faça por series, a subscripção integral da primeira serie e o pagamento e deposito conforme ao n.° 3.° d'este artigo será sufficiente para a constituição da sociedade.

§ 2.° No caso previsto no § antecedente, a divisão do capital por series não excederá a cinco, e a emissão da segunda serie não terá logar sem que o capital da primeira esteja pago na proporção de 75 por cento do seu valor nominal, e a mesma regra se observára nas seguintes emissões.

Artigo 4.°

Os estatutos das sociedades anonymas são sempre outorgados em escriptura publica e regulam o contrato da sociedade.

§ unico. Não poderá lavrar-se escriptura publica sem que os outorgantes apresentem:

1.° A certidão negativa exigida no § 1.° do artigo 1.° d'esta lei;

2.º O conhecimento ou certificado do deposito determinado no n.° 1.° do artigo antecedente;

3.° Documento comprovativo de estarem pagos os direitos fiscaes estabelecidos por lei.

Artigo 5.° Nenhuma sociedade anonyma póde dar começo ás suas operações sem a publicação dos seus estatutos, nos termos do artigo 35.° Artigo 6.° Os estatutos expressarão:

3.° A sua duração;

Este artigo passa a ser o artigo 7.º

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§ 2.° Depois do integral pagamento das acções, os interessados podem exigir que se lhes passem titulos ao portador, quando nos estatutos não houver expressa estipulação em contrario.

Artigo 7.°

Os accionistas de uma sociedade anonyma não respondem por perdas, alem do montante das suas acções, mas são responsaveis pelo pagamento integral d'aquellas por elles subscriptas ou possuidas, e é nulla toda a clausula ou estipulação contraria.

§ unico. O facto da subscripção importa aceitação plena do contrato social. Artigo 8.°

A propriedade das acções nominativas transmitte-se por todos os modos de cessão admittidos em direito, com sujeição ás clausulas especiaes, que os interessados estipularem nos estatutos. A propriedade das acções ao portador transmitte-se pela simples tradição do titulo.

§ unico. Quando as acções, antes do seu integral pagamento, forem transmittidas sem previa approvação da administração da sociedade, e o novo possuidor do titulo deixar de effectuar os respectivos pagamentos, fica subsistindo a responsabilidade do accionista que assim as tiver transmittido, com recurso contra qualquer cessionário que tiver deixado de effectuar os pagamentos a que era obrigado.

Artigo 9.° As acções não são negociaveis senão depois da constituição di sociedade, e tendo-se realisado o pagamento de 10 por cento do seu valor nominal.

Artigo 10.°

Na séde da sociedade haverá um registo especial de todos os accionistas, contendo:

1.° Os nomes dos primeiros subscriptores do capital social, e co numero de acções por cada um subscriptas;

2.° As transferencias ou transmissões de acções, com a declaração da approvação dada pela administração, quando esta tiver tido logar para os effeitos do § unico do artigo 8.°;

3.° Os pagamentos das prestações;

4.° A conversão das acções nominativas para titulos ao portador, quando tiver tido logar.

Artigo 11.° Toda a acção é indivisível em referencia á sociedade. Quando um d'estes titulos pertencer a diversas pessoas, a sociedade suspenderá o exercicio dos direitos que a taes titulos são inherentes, emquanto não houver pessoa designada como proprietario, excepto em referencia ao pagamento dos dividendos. secção IV

Da administração e do conselho fiscal

Artigo 12.°

As sociedades anonymas são administradas por mandatarios temporarios, revogáveis, retribuidos ou gratuitos, escolhidos de entre os associados.

§ 1.° Estes mandatarios representam a sociedade em todos os actos judiciaes e extra judiciaes.

§ 2.° As attribuições dos mandatarios, qualquer que seja a sua denominação, são sempre indicadas nos estatutos e regulamentos especiaes.

Artigo 13.°

Os mandatarios, cujo numero é fixado nos estatutos, são eleitos pela assembléa geral dos associados por tempo certo e determinado, entendendo-se porém que o mandato é sempre revogável, quando a assembléa geral o julgue conveniente.

§ 1.° Os estatutos determinarão se, findo o praso do mandato, poderá ter logar a reeleição total ou parcial, e, não o determinando, entende se que a reeleição é prohibida.

§ 2° O modo de supprir as faltas temporarias ou permanentes de qualquer dos mandatarios será indicado nos estatutos.

Artigo 14.°

Os fundadores de qualquer sociedade, anonyma pódem designar nos estatutos os mandatarios para a primeira administração da sociedade, a qual não durará mais de seis annos, sem prejuizo do principio da revogabilidade prescripto no artigo 13.°

Artigo 15.°

Os mandatarios das sociedades anonymas só respondem pela execução do mandato conferido e aceito, e não e terem obrigação alguma pessoal ou solidaria em relação ás, operações da sociedade.

São porém pessoal ou solidariamente responsaveis, conforme as regras de direito commum, para com a sociedade e para com terceiros, pela falta de execução do seu mandato, violação dos estatutos e preceitos d'esta lei.

Artigo 16.°

Todo o mandatario de qualquer sociedade anonyma, que deixar de ser accionista, deve immediatamente resignar o seu mandato, e se o não fizer e continuar a gerir, é pessoalmente responsavel por todos os actos por elle praticados, e por todas as convenções feitas em nome da sociedade.

Artigo 17.° Os mandatarios de qualquer sociedade anonyma não podem fazer por conta da sociedade operações alheias ao seu objecto ou fim, sendo os factos contrarios a este preceito considerados violação expressa de mandato.

Artigo 18.° E expressamente prohibido aos mandatarios d'estas sociedades negociar por conta propria, directa ou indirectamente, com a sociedade, cuja gerencia lhes estiver confiada, salvos os casos de especial auctorisação, concedida expressamente em assembléa geral.

Artigo 19.°

As operações de qualquer sociedade anonyma, que deponderem de conhecimentos technicos e especiaes, ou a administração quotidiana dos negocios sociaes, podem ser confiadas a um ou mais gerentes, quer sejam accionistas ou não da mesma sociedade, devendo a sua nomeação, ex neração e attribuições ser expressamente reguladas pelos estatutos.

§ unico. A responsabilidade d'estes gerentes, em referencia aos seus mandantes, é determinada pelas regras de direito, que regulam o contrato de mandato.

Artigo 20.°

Em todas as sociedades anonymas haverá sempre um conselho fiscal, composto pelo menos de tres membros associados, eleitos pela assembléa geral nos periodos marcados nos estatutos, e podendo ser pela assembléa exonerados. § unico. Os estatutos indicarão o modo de supprir o impedimento temporario ou permanente dos membros do conselho fiscal.

Artigo 21.°

Incumbe ao conselho fiscal:

1.° Examinar sempre que o julgue conveniente a escripturação da sociedade.

2.° Convocar a assembléa geral quando o julgar necessario, exigindo-se n'este caso o voto unanime do conselho, quando for composto de tres membros e dois terços dos votos, quando a elle pertencer um maior numero de associados;

3.° Assistir, com voto unicamente consultivo, ás sessões da direcção, sempre que o julgue conveniente:

4.° Fiscalisar a administração da sociedade;

5.° Dar parecer sobre o balanço, inventario e relatorio, a que se refere o artigo 31.°

Artigo 22.°

As funcções dos membros do conselho fiscal são gratuitas ou renumeradas, conforme for determinado pelos estatutos.

§ unico. O cargo de membro do conselho fiscal é incompativel com qualquer outro da sociedade.

Artigo 23.°

A responsabilidade dos membros do conselho fiscal regula se pelas regras do contrato de mandato.

Artigo 24.°

Os membros do conselho fiscal ocorrem a consultores estranhos á sociedade quando por maioria o julguem necessario como meio de informação, sendo as despezas feitas com Cotas consultas pagas pela sociedade.

Artigo 25.°

As assembleias geraes, quando o julgam necessario, nomeiam comissões especiaes de inquerito para o exame dos actos da administração.

SECÇÃO V

Das assembléas geraes Artigo 26.°

A assembléa geral dos accionistas sei á convocada uma vez pelo menos em cada anno, na epocha fixada pelos estatutos, que indicarão igualmente como e quando terá logar a reunião das assembléas extraordinarias.

§ 1.° Para execução das disposiçoes d'este artigo, os estatutos devem sempre expressamente indicar:

1.° A epocha e o modo das convocações da assembléa geral, que serão sempre feitas com a maior publicidade possivel por annuncios nos jornaes e caimãs, dirigidas a todos os possuidores de acções nominativas, quo tiverem direito a tomar parte nas deliberações;

2.° O modo ai constituir as assembléas geraes, determinando-se expressamente que ninguem terá voto n'estas, sem que com a antecedencia que os mesmos estatuías designarem tenha feito constar nos registos da sociedade a acquisição das competentes acções;

3.° Numero de votos que póde ter cada accionista em relação ao numero de acções que possuir;

4.° A consignação do direito que assiste aos accionistas ausentes de se fazerem representar por meio de manciados

Artigo 8.º Os accionistas de uma sociedade anonyma não respondem por perdas alem da importancia nominal das suas acções, mas são responsaveis pelo pagamento integral das que subscreveram ou possuirem, e é nulla toda a clausula ou estipulação, contraria

Este artigo passa a ser o artigo 9.°

Este artigo passa a ser o artigo 10.°

Este artigo passa a ser o artigo 11.°

Este artigo passa a ser o artigo 12.°

Este artigo passa a ser o artigo 13.°

Este artigo passa a ser o artigo 14.°

Este artigo passa a ser o artigo 15.°

Este artigo passa a ser o artigo 16.°

Este artigo passa a ser o artigo 17.°

Este artigo passa a ser o artigo 18.°

Este artigo passa a ser o artigo 19.°

Artigo 20.° As operações de qualquer sociedade anonyma, que dependerem de conhecimentos technicos e especiaes, ou a administração quotidiana dos negocios sociaes, podem ser confiadas a um ou mais gerentes, quer sejam accionistas ou não da mesma sociedade, devendo a sua nomeação, exoneração e attribuições ser reguladas pelos estatutos.

Artigo 21.° Em todas as sociedades anonymas haverá um conselho fiscal, composto pelo menos de tres membros associados, eleitos pela assembléa geral nos periodos marcados nos estatutos, e podendo ser pela assembléa exonerados.

Este artigo passa a ser o artigo 22.°

Este artigo passa a ser o artigo 23.°

Este artigo passa a ser o artigo 24.°

Artigo 24.° eliminado.

1.° A epocha e o modo das convocações da assembléa geral, que serão feitas com a maior publicidade possivel, por annuncios nos jornaes e cartas dirigidas a todos os possuidores de acções nominativas, que tiverem direito a tomar parte nas deliberações;

2.º O modo de constituir as assembléas geraes, determinando-se que ninguem terá voto n'estas, sem que com a antecedencia que os mesmos estatutos designarem tenha feito constar nos registos da sociedade a acquisição das competentes acções;

3.° O numero de votos que póde ter cada accionista em relação ao numero de acções que possuir.

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datarios especiaes, determinando se estes pódem ou não ser individuos estranhos á sociedade, e se qualquer procurador póde representar mais de um accionista; -

5.° O numero de votos e o quantum do capital representado para que qualquer deliberação seja valida.

§ 2.° Quando uma assembléa geral, regularmente convocada, segundo as regras prescriptas nos estatutos, não possa funccionar por falta de numero de accionistas, ou por falta de sufficiente representação de capital, os interessados serão immediatamente convocados para uma nova reunião que terá logar n'um praso nunca inferior a quinze dias, nem superior a trinta, considerando-se como validas as deliberações tomadas n'esta segunda reunião, qualquer que seja o numero dos accionistas presentes e o quantum do capital representado.

Artigo 27.°

Os estatutos indicarão o modo especial de constituir as assembléas geraes em que houver de se deliberar:

1.º Sobre augmento de capital;

2.° Sobre qualquer modificação dos estatutos;

3.° Sobre a prorogação da sociedade alem do praso que for indicado nos estatutos;

4.° Sobre a dissolução e liquidação da sociedade.

Artigo 28.°

As deliberações da assembléa geral são tomadas por maioria de votos, salvos os casos em que a lei ou os estatutos expressamente determinem o contrario.

Artigo 29.°

Quando n'uma saciedade anonyma haja accionistas residentes em um paiz estrangeiro, que representem pelo menos 25 por cento do capital subscripto, nos estatutos se consignará o direito de poderem esses accionistas reunir-se em conferencia com os fins seguintes:

1.° Para o exame e discussão do relatorio e contas annuaes apresentadas pela administração, e do parecer sobre estes documentos emittido pelo conselho fiscal;

2.° Para de entre si nomearem um ou mais accionistas que venham á séde da sociedade representa-los na assembléa geral ordinaria em que for discutido aquelle parecer.

§ 1.° Os accionistas escolhidos em virtude do n.° 2.° d'este artigo são admittidos na assembléa geral, apresentando a acta de conferencia devidamente legalisada, contendo:

1.° Indicação nominal dos accionistas que se reuniram;

2.° Declaração expressa de que tiveram conhecimento dos documentos a que se refere o n.° l.º d'este artigo;

3.° Indicação expressados representante s nomeados e dos poderes que lhes foram conferidos.

§ 2.° Estes representantes têem na assembléa geral tantos votos quantos pelos estatutos pertençam aos accionistas committente?.

§ 3.° Para levar a effeito o disposto n'este artigo, seus n.ºs e §§, os accionistas residentes em paiz estrangeiro a que se refere a primeira parte d'este artigo, nomearão d'entre si um que da administração central receba os exemplares do relatorio, contas e parecer, proceda á sua distribuição, convoque a conferencia e se corresponda com o presidente da administração.

§ 4.° A administração central logo que o relatorio e documentos a que se refere este artigo tenham sido examinados pelo conselho fiscal, é obrigada a remetter uma copia delles ao accionista que tenha sido nomeado nos termos e para os fins expressos no § antecedente.

§ 5.° As disposições anteriores não prejudicam o direito que pelos estatutos tenham os accionistas de que se trata de virem pessoalmente tomar parte nos trabalhos a assembleia geral ou de mandarem procurador especial que os represente, quando não tenham querido aproveitar-se das concessões d'este artigo e seus §§.

§ 6.° Quando se dê o caso previsto e regulado n'este artigo, o praso entre a apresentação do parecer do conselho fiscal e a sua discussão a que se refere o artigo 31.° será fixado por fórma que possam inteiramente ser cumpridas as disposições d'esta lei, modificando-se n'este caso, por modo conveniente, o preceito do referido artigo.

§ 7.° Salvo o caso a que este artigo se refere, os accionistas residentes em paiz estrangeiro são sempre equiparados em tudo e para todos os effeitos aos accionistas nacionaes ou que residam em Portugal.

SECÇÃO VI

Dos inventarios, balanços e contas, fundo de reserva e dividendos

Artigo 30.°

Em todos os semestres os mandatarios das sociedades anonymas apresentára ao conselho fiscal um resumo do balanço do activo e passivo da sociedade.

Artigo 31.°

No fim de cada anno os mandatarios apresentarão ao conselho fiscal o inventario desenvolvido do activo e passivo da sociedade, indicando o valor dos bens moveis e immoveis, e dando conta de todos os contratos e compromissos executados ou em execução. Este inventario será acompanhado de um balanço ou conta corrente de perdas e ganhos, e de um relatorio da situação commercial financeira e economica da sociedade.

§ 1.° A apresentação dos documentos a que se refere este artigo deve ser feita com antecedencia pelo menos de um mez, do dia que nos estatutos estiver fixado para a reünião ordinaria da assembléa geral, para os fins indicados no § 4.° d'este artigo.

§ 2.° O balanço ou conta corrente, com o parecer do conselho fiscal será enviado a cada um dos accionistas portadores de titulos nominativos quinze dias antes do praso fixado para a reunião da assembléa geral.

§ 3.° Pelo mesmo espaço de tempo de quinze dias estarão patentes todos os documentos a que se referem os artigos antecedentes, bem como a lista geral dos accionistas (que nos termos dos estatuir s deverem constituir a assembléa geral), no escriptorio da sociedade, para poderem ser examinados por todos os accionistas.

4.° Findo este praso os mesmos documentos serão

submettidos á deliberação da assembléa geral.

Artigo 32.°

A approvação dada pela assembléa geral ao balanço e contas da gerencia da administração liberta os mandatarios, administradores e membros do conselho fiscal da sua responsabilidade para com a sociedade, salvo o caso de reserva em contrario feita na mesma assembléa geral, ou provando-se que nos inventarios e balanços houve omissões ou indicações falsas, com o fim de dissimular a verdadeira situação da sociedade.

Artigo 33.°

Dos lucros liquidos da sociedade uma parte, que os estatutos indicarão sempre, é destinada para a formação de um fundo de reserva, e a obrigação de separar em cada anno, para este fim, uma parte dos lucros liquidos só deixa de existir quando o fundo de reserva represente a decima parte do capital social.

Artigo 34.°

É expressamente prohibido que nos estatutos se estipulem juros certos e determinado á para os accionistas, os quaes unicamente têem direito á parte proporcional que lhes caiba nos lucros liquidos que effectivamente resultem das operações da sociedade, comprovados pelos balanços.

A distribuïção de dividendos ficticios é considerada violação de mandato por parte dos mandatarios que a tiverem consentido.

§ unico. Podem comtudo os estatutos, por excepção á disposição anterior, quando a sociedade careça immobilisar grandes capitaes em construcções, conceder aos accionistas, unicamente durante o praso de taes construcções, um juro certo e determinado sobre o valor dos capitaes por elles subscriptos e effectivamente pagos.

SECÇÃO VII

Publicações obrigatorias e declarações que devem conter os documentos que emanarem das sociedades anonymas

Artigo 35.°

Logo que a sociedade esteja constituida nos termos dos artigos 3.° e 4.°, os seus estatutos serão registados, de teor e não por extracto, no registo publico do commercio, e publicados igualmente, por conta da sociedade, no diario official do governo, e pelo mesmo modo serão registadas e publicadas quaesquer alterações que n'elles se façam.

§ 1.° No caso de dissolução da sociedade, os seus mandatarios farão logo averbar no registo publico do commercio, e publicar no diario official, a nota do acto da dissolução.

§2.° Todos estes documentos estarão publicos no escriptorio da sociedade, para quem os quizer examinar.

Artigo 36.°

Os balanços do activo e passivo das sociedades anonymas, a que se refere o artigo 31.°, depois de apresentados e discutidos em assembléa geral, serão publicados com os relatorios da administração e parecer do conselho fiscal no diario official do governo por conta da sociedade.

§ unico. Uma copia dos balanços e inventarios, bem como da lista geral dos accionistas, com indicação dos pagamentos feitos por conta das acções e dos que ha direito a exigir, será deposição.

§ 2.° Quando uma assembléa geral, regularmente convocada, segundo as regras prescriptas nos estatutos, não possa funccionar por falta de numero de accionistas, ou por falta de sufficiente representação de capital, os interessados serão immediatamente convocados para uma nova' reunião, que terá logar dentro de trinta dias, mas não antes de quinze, nem superior a trinca, considerando-se como validas as deliberações tomadas n'esta segunda reunião, qualquer que seja o numero dos accionistas presentes e o quantum do capital representado.

Artigo 28.° As deliberações da assembléa geral são tomadas por maioria de votos, salvos os casos em que a lei ou os estatutos determinem o contrario.

Artigo 29.° Quando n'uma sociedade anonyma haja accionistas residentes em paiz estrangeiro, que representem pelo menos 25 por cento do capital subscripto, nos estatutos se consignará o direito de poderem esses accionistas reünir-se em conferencia com os fins seguintes:

2.° Declaração de que tiveram conhecimento dos documentos a que se refere o n.° 1.° d'este artigo;

3.° Indicação dos representantes nomeados e dos poderes que lhes foram conferidos.

Artigo 30.° Em todos os semestres os mandatarios das sociedades anonymas apresentarão ao conselho fiscal um resumo do balanço do activo e passivo da sociedade.

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tada nos cartorios dos tribunaes commerciaes de 1.ª instancia da séde da sociedade, onde qualquer individuo poderá requerer certidão se o julgar conveniente.

Artigo 37.°

Todos os documentos de qualquer natureza que emanarem das sociedades anonymas, e todas as publicações que no seu interesse forem feitas, devem sempre mencionar a denominação da sociedade, precedida ou seguida das seguintes palavras: Sociedade anonyma, responsabilidade limitada, e a importancia do capital, segundo as indicações do ultimo balanço approvado.

SECÇÃO VIII

Da emissão de obrigações

Artigo 38.º

As sociedades anonymas, que nos seus estatutos estipulem emissão de obrigações ao portador amortisaveis por sorteio, unicamente podem emittir taes titulos fiduciarios, com as seguintes condições:

1.ª Estando definitivamente constituidas;

2.ª Representando a emissão uma somma nominal, que nunca exceda o capital social effectivamente pago;

3.ª Sendo todos os titulos do mesmo typo, e não se concedendo a nenhum vantagens especiaes;

4.ª Fixando-se sempre, para amortisação e juros do capital assim mutuado, uma somma annual certa e constante por todo o tempo da duração do emprestimo.

Artigo 39.°

As sociedades anonymas, que pelos seus estatutos sejam auctorisadas a emittir obrigações ao portador, publicarão mensalmente no diario official os balancetes, contendo o resumo do seu activo e passivo.

SECÇÃO IX

Da dissolução das sociedades anonymas

Artigo 40.°

As sociedades anonymas dissolvem-se:

1.° Findo o praso marcado nos estatutos para a sua duração;

2.° Quando na falta de praso determinado nos estatutos, a assembléa geral, convocada e reunida pela fórma especial que para este caso os estatutos marquem, assim o deliberar;

3.° Quando a sociedade por mais de seis mezes tenha existido com um numero de accionistas inferior a dez, e qualquer interessado requeira a dissolução.

Artigo 41.°

Os credores de uma sociedade anonyma podem requerer a sua dissolução, provando que posteriormente á epocha dos seus contratos metade do capital social esta perdido; mas a sociedade póde oppor-se á dissolução sempre que dê as necessarias garantias de pagamento aos seus credores.

Artigo 42.°

Logo que as perdas da sociedade montem a metade do capital social, os administradores são obrigados a convocar uma assembléa geral de todos os accionistas, para deliberar sobre a conveniencia da continuação da sociedade com o capital assim reduzido, ou com o capital augmentado por novas subscripções.

§ unico. Se a perda for de tres quartos do capital, para que a dissolução tenha logar, é sufficiente que a deliberação da assembléa geral seja tomada pela quarta parte dos votos n'ella apresentados. Artigo 43.° As sociedades anonymas podem ser declaradas em estado de fallencia, nos termos do codigo commercial, e a estas fallencias são applicaveis as disposições do mesmo codigo, que estejam em harmonia com a indole e natureza d'estas sociedades.

SECÇÃO X

Da liquidação

Artigo 44.°

As sociedades anonymas, depois da sua dissolução, continuam a ter existencia juridica, unicamente para os effeitos da sua liquidação.

§ unico. Todos os documentos que emanem das sociedades depois de começar a sua liquidação, devem sempre mencionar a denominação da sociedade, precedida ou seguida das seguintes palavras: Sociedade anonyma em liquidação, responsabilidade limitada.

Artigo 45.°

Quando nos estatutos não tenha sido indicado o modo de proceder á liquidação, como se determina no n.° 8.° do artigo 5.°, a assembléa geral regulará esse modo, e nomeará os liquidatarios.

§ 1.° Quando os liquidatarios não sejam nomeados pela assembléa geral, os mandatarios administradores são os liquidatarios.

§ 2.° Havendo credores, estes têem sempre o direito de nomear d'entre si uma commissão que represente os seus interesses junto aos liquidatarios, e acompanhe todos os actos da liquidação, sem prejuizo de recurso para os tribunaes, sempre que o tenham por conveniente e conforme a direito.

Artigo 46.°

Os liquidatarios são mandatarios especiaes, e como taes unicamente têem poderes para a liquidação do activo e passivo da sociedade, exercendo o seu mandato, na conformidade das estipulações dos estatutos e deliberações da assembléa geral.

§ 1.° Na falta de estipulações dos estatutos e de deliberações especiaes da assembléa geral, proceder-se-ha á liquidação, segundo as regras prescriptas pelos principios de direito commercial.

§ 2.°- A responsabilidade dos liquidatarios regula se pelas regras do mandato.

secção XI Acções e prescripções Artigo 47.° Todo o accionista póde individualmente intentar qualquer acção contra a gerencia da sociedade pelos factos de que a julgue responsavel, e quando um numero de accionistas que representem, pelo menos, a vigesima parte do capital social queiram intentar uma acção collectiva, pódem delegar os seus poderes em um ou mais mandatarios. Artigo 48.° Todas as acções para verificar a responsabilidade civil

em que tenham incorrido os fundadores ou os mandatarios de uma sociedade anonyma, ou sejam intentadas por terceiros, ou pelos associados, ou pela sociedade, prescrevem no praso de cinco annos a contar da data do acto que for fundamento da acção.

§ 1.° Igualmente prescrevem todas as acções contra os liquidatarios, no praso de cinco annos a contar do encerramento e publicação da liquidação.

§ 2.° As acções que os accionistas de uma sociedade anonyma queiram individualmente intentar contra os mandatarios ou liquidatarios, no caso em que a assembléa geral tiver approvado os actos da gerencia ou liquidação, prescrevem no fim de seis mezes, a contar da approvação, sem reserva, dada pela assembléa geral.

SECÇÃO XII

Nullidades e disposiçoes penaes

Artigo 49.°

São nullos todos os contratos de sociedades anonymas, que tenham sido feitos com violação dos artigos 3.° e 4.° d'esta lei, e toda a negociação de acções feita em contravenção do artigo 9.º

§ unico. A nullidade nunca poderá ser allegada contra terceiros, ficando para com estes pessoal e solidariamente responsaveis todos os que tenham violado as disposiçoes dos citados artigos.

Artigo 50.°

Todas as sociedades anonymas, que nos seus actos ou deliberações deixem de cumprir os preceitos d'esta lei e as clausulas dos seus estatutos, perdem a prerogativa da responsabilidade limitada, e todos aquelles que tomarem parte em taes actos ou deliberações, ficam pelos seus effeitos solidariamente responsaveis.

Artigo 51.°

Serão punidos com uma multa de 50$000 a 500$000 réis todos aquelles que se apresentarem e votarem n'uma assembléa geral como proprietarios de acções que lhes não pertençam, e todos os que tenham emprestado as suas acções para falsificarem a constituição de uma assembléa geral.

Artigo 52.°

Serão punidos, nos termos do artigo 451.º do codigo penal, todos aquelles que, simulando a existencia de uma sociedade anonyma, subscripção de acções, pagamentos por conta, ou usando de outros meios fraudulentos, tentem adquirir ou effectivamente adquiram subscripções verdadeiras, entrega de dinheiro, titulos, ou outros quaesquer bens ou valores.

§ unico. Do mesmo modo serão punidos todos aquelles que falsificarem os inventarios ou balanços, ou deixarem de os fazer para simularem ou distribuirem dividendos de lucros que não existam, ou para outro qualquer fim.

SECÇÃO XIII

Das sociedades anonymas estrangeiras

Artigo 53.°

As sociedades anonymas e todas as associações de identica natureza, legalmente estabelecidas ou domiciliadas em paiz estrangeiro, não pódem ter existencia juridica em Portugal, nem intentar operações, quer directamente, quer por intervenção de

Artigo 37.°

Todos os documentos de qualquer natureza que emanarem das sociedades anonymas, e todas as publicações que no seu interesse forem feitas, devem mencionar a denominação da sociedade, precedida ou seguida das seguintes palavras: Sociedade anonyma, responsabilidade limitada, e a importancia do capital, segundo as indicações do ultimo balanço approvado.

4.ª Fixando-se, para amortisação e juros do capital assim mutuado, uma somma annual certa e constante por todo o tempo da duração do emprestimo.

2.° Quando a assembléa geral, convocada e reunida pela fórma especial que para este caso os estatutos marquem, assim o deliberar;

Artigo 43.°

As sociedades anonymas, quando sem justa e legitima causa houver cessação de pagamentos, podem ser declaradas em estado de fallencia, a requerimento de um ou mais credores.

§ 1.º A liquidação do activo e passivo d'estas sociedades no estado de fallencia será feita nos termos da secção X d'esta lei, com a excepção de que os liquidatarios serão nomeados em numero igual pelas mesmas sociedades e pelos credores.

§ 2.° A concordata, contrata de união e moratoria, serão applicadas as disposições do codigo de commercio.

§ unico. Todos os documentos, que emanem das sociedades depois de começar a sua liquidação, devem mencionar a denominação da sociedade, precedida ou seguida das seguintes palavras: Sociedade anonyma em liquidação, responsabilidade limitada.

§ 2.° Havendo credores poderão nomear d'entre si uma commissão que represente os seus interesses junto aos liquidatarios, e acompanhe todos os actos da liquidação, sem prejuizo de recurso para os tribunaes, sempre que o tenham por conveniente e conforme a direito.

Artigo 47.°

Todo o accionista póde individual ou collectivamente intentar qualquer acção contra a gerencia da sociedade pelos factos de que a julgue responsavel.

Artigo 48.°

Todas as acções para verificar a responsabilidade civil

em que tenham incorrido os fundadores ou os mandatarios de uma sociedade anonyma, ou sejam intentadas por terceiros, ou pelos associados, ou pela sociedade, prescrevem no praso de cinco annos a contar da data da publicação ou da noticia que for fundamento da acção.

§ 2.° As acções que os accionistas de uma sociedade anonyma queiram intentar contra os mandatarios ou liquidatarios, no caso em que a assembléa geral tiver approvado os actos da gerencia ou liquidação, prescrevem no fim de seis mezes, a contar da approvação, sem reserva, dada pela assembléa geral.

Artigo 53.°

As sociedades anonymas, legalmente estabelecidas ou domiciliadas em paiz estrangeiro, não podem ter existencia juridica em Portugal, nem intentar operações, quer directamente, quer por intervenção de successões ou mandatarios, senão provando:

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succursaes ou mandatarios, senão provando:

l.° Que estão funccionando no seu respectivo paiz, constituidas conforme as leis proprias e especiaes _ d'esse paiz, e em plena actividade de negocios;

2.° Que o seu fim ou objecto não é contrario aos interesses publicos;

§ 1.° As sociedades a que se refere este artigo são obrigadas igualmente:

1.º A declarar por acto expresso que tenha a mesma validade que os seus estatutos, que se sujeitam ás leis e tribunaes portuguezes em todas as questões intentados em Portugal, em que forem auctores ou réus, assim como a todos os actos que as leis civis, commerciaes, administrativas ou fiscaes regulam;

2.° A declarar igualmente que todos e quaesquer individuos encarregados pelas ditas sociedades da gerencia em Portugal, têem, como mandatarios, a natureza de legitimos representantes d'essas sociedades, para todos os actos judiciaes e extra-judiciaes, para o que serão investidos expressamente dos mesmos poderes e attribuições dos directores, gerentes ou administradores d'essas sociedades;

3.° A escreverem as respectivas apolices e seus contratos na lingua portugueza, assim como as declarações que possam alterar algumas das condições dos mesmos contratos, quando essas sociedades se dedicarem a operações de seguros maritimos, terrestres ou de vidas.

§ 2.° A verificação do cumprimento das condições exigidas n'este artigo é feita no ministerio das obras publicas, commercio e industria, e nenhuma dás sociedades a que elle se refere póde funccionar em Portugal sem esta previa verificação.

Artigo 54.°

As sociedades a que se refere o artigo antecedente, depois de devidamente auctorisadas, ficam sujeitas, na proporção das operações que effectuem em Portugal, a todos os impostos e contribuições a que forem obrigadas as sociedades portuguezas de identica natureza, e ao cumprimento de todas as condições de publicidade, a que tambem pela presente lei ficam sujeitas as sociedades portuguezas.

Artigo 55.°

As disposiçoes dos dois artigos antecedentes são applicaveis ás sociedades anonymas estrangeiras que directamente, ou por intervenção de succursal ou mandatarios, estão actualmente funccionando em Portugal.

§ unico. Estas sociedades são obrigadas a cumprir, no praso de tres mezes, a contar da publicação da presente lei, os preceitos dos artigos antecedentes, sob pena de lhes ser retirada a auctorisação que anteriormente lhes fôra dada.

Artigo 56.

Das disposiçoes dos artigos anteriores ficam exceptuadas as sociedades ou companhias estrangeiras de navegação, que tenham agencias nos portos d'este reino e seus dominios para a expedição dos negocios relativos ao serviço dos seus navios nos pontos de escala.

SECÇÃO XIV

Disposições especiaes

Artigo 57.°

As sociedades anonymas portuguezas actualmente existentes, e que tenham sido legalmente auctorisadas, continuam a reger-se durante o praso da sua duração, pelos seus estatutos, e nos termos das disposições da presente lei em tudo o que não for contrario aos mesmos estatutos.

§ unico. Se porém qualquer d'estas sociedades quizer proceder á reforma dos seus estatutos, pode-lo-ha fazer, sujeitando-se em sua nova organisação ao disposto nos artigos da presente lei.

Artigo 58.°

Fica revogada a legislação em contrario.

1.º A declarar por acto que tenha a mesma validade que os seus estatutos, que se sujeitam ás leis e tribunaes portuguezes em todas as questões derivadas de transacções ou operações effectuadas em Portugal, em que forem autores ou réus, assim como a todos os actos que as leis civis, commerciaes, administrativas ou fiscaes regulam;

§ 3.° As mesmas sociedades são obrigadas a cessar todas as operações que forem contrarias a qualquer privilegio que os poderes publicos julgarem conveniente estabelecer ou conceder seis mezes depois d'esse estabelecimento ou concessão.

§ unico. Estas sociedades são obrigadas a regularisar o seu exercicio em Portugal, reformando e publicando os seus estatutos ou regulamentos, em conformidade com os preceitos dos artigos d'esta secção dentro de seis mezes a contar da publicação d'esta lei, sob pena de cessar ipso jure a sua legitimidade juridica em Portugal para todos os effeitos legaes.

Artigo 57.º

As sociedades anonymas portuguezas actualmente existentes, e as que tenham sido auctorisadas por lei especial, continuam a reger-se durante o praso da sua duração pelos seus estatutos em tudo o que não for contrario ás disposições da presente lei.

§ 1.° Se porém qualquer d'estas sociedades quizer proceder á reforma de seus estatutos, pode-lo-ha fazer sujeitando-se em sua nova organisação ao disposto nos artigos da presente lei.

§ 2.° Às sociedades anonymas portuguezas ficam sujeitas á disposição do § 3.° do artigo 53.° d'esta lei.

Artigo 58.°

O governo não poderá, por acto administrativo, fazer cessar o exercicio de qualquer sociedade anonyma legalmente constituida antes ou depois da publicação d'esta lei.

§ unico. Poderá comtudo promover nos tribunaes de commercio competentes, por intervenção do ministerio publico, a dissolução das sociedades que funccionarem ou se estabelecerem em contravenção das disposições d'esta lei.

Artigo 59.° Fica revogada a legislação em contrario.

Entrou em discussão na generalidade e foi approvado sem que sobre elle se fizessem reflexões algumas.

O sr. Presidente: — Passâmos á especialidade.

O sr. secretario leu o artigo 1.º e successivamente todos os outros até ao artigo 31.°, sendo todos approvados sem discussão.

O sr. Fernandes Thomás: — Sr. presidente, como ha algum susurro na sala, não me é possivel ouvir em que altura se acha a discussão d'este projecto, e por isso pedia a V. ex.ª me desse a palavra quando se tratar dos artigos 40.° e 41.°

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Tambem eu peço a V. ex.ª que me dê a palavra para quando se tratar do artigo 58.°

O sr. Presidente: — Como ninguem mais se acha inscripto senão os dignos pares que acabam de pedir a palavra, e como ss. ex.a> só têem de fallar sobre os artigos 40.°, 41.° e 58.°, não havendo mais ninguem, segundo me parece, que impugne os outros artigos do projecto, depois d'estes (apoiados.) talvez fosse conveniente, para o bom andamento da discussão, que se deixasse de votar sobre estes tres artigos, que se continuasse a votar o projecto até ao fim, e depois se tratasse d'elles e se desse a palavra aos dignos pares que pretendem fallar (muitos apoiados).

Portanto foi votado o projecto em todos os seus artigos excepto os 40°, 41.° e 58.°

Artigo 40.°:

O sr. Fernandes Thomás: — Sr. presidente, pedi a palavra, porque a materia d'este artigo me suscita algumas duvidas, que no entanto é possivel que procedem de eu ser pouco competente n'este assumpto, e por isso espero que algum dos illustres membros da commissão me esclareça a tal respeito. E certo que o principio fundamental d'este projecto é bom, porque tende a emancipar as associações de capitaes sou sociedades anonymas da ingerencia do governo, desembaraçando-as de todas as peias e obstaculos a fim de facilmente se constituirem e de poderem livremente funccionar. Estou completamente de accordo com este principio.

Mas, sr. presidente, n'este projecto, ao mesmo tempo que vejo que se tomam todas as medidas e cautelas, no momento em que se fundam estas sociedades para que sejam instituições serias e graves, não podendo nenhuma constituir-se sem certo "numero de socios, sem que esteja subscripto todo o capital d'ellas, e ainda mais, sem que, pelo menos, 5 por cento d'este capital esteja pago por todos os subscriptores proporcionalmente ás suas subscripções; ao mesmo tempo, digo, que vejo tomar todas estas cautelas e seguranças para que as sociedades de que se trata sejam uma cousa séria e não uma illusão, e dêem todas as garantias possiveis, pois só assim poderão prosperar, vejo tambem que não se tomam iguaes precauções emquanto á sua gerencia e administração. Parece-me por conseguinte que a doutrina d'este artigo não condiz logica e racionalmente com o que no principio do projecto se estabelece para a formação d'estas sociedades.

Vejo no artigo 42.° que, tendo qualquer sociedade perdido metade do capital social, os administradores são obrigados a convocar a assembléa geral para resolver se ha de continuar a sociedade com o capital assim reduzido, ou reforçado por novas subscripções. Quer dizer que a sociedade póde continuar com metade do capital subscripto, depois de ter perdido a outra metade quando simplesmente a assembléa geral assim o decidir. Mas ainda ha mais. O mesmo artigo 42.°, no seu §, suppõe que a sociedade possa perder tres quartos do seu capital e continuar ainda a funccionar, pois diz (leu).

A vista d'isto, pergunto, se para a formação de taes sociedades são necessarios tantos requisitos, tantas cautelas e seguranças como os que marca o artigo 3 °, não deverão exigir-se as mesmas seguranças quando a sociedade chegue a perder metade ou tres quartos do seu capital, e quizer ainda assim continuar? Por certo que sim. Portanto, pareceme que este artigo não combina com os primeiros que tratam da fundação d'estas sociedades. Pareceme, repito, que taes requisitos e cautelas se deviam estabelecer n'este caso para a continuação d'estas associações. E n'isto não haveria interferencia illegitima dq governo; mas a salutar interferencia dos poderes publicos, que deve ter a seu cargo salvaguardar os interesses dos accionistas, e os do publico em geral para que não seja illudido e burlado.

Talvez estas duvidas não procedam, pois reconheço, como disse, que não sou muito conhecedor do assumpto. Desejava pois que a commissão me esclarecesse sobre isto, porque confesso que não sei a rasão por que se estabelecem tantas difficuldades para a fundação d'estas sociedades, ao passo que se dá toda a facilidade para a sua continuação depois de terem perdido metade e mesmo tres partes do seu capital, e de não terem assim os recursos necessarios para que d'elles possa provir beneficio e interesse para a communidade. Não seria mais conveniente que logo que ellas chegassem a este estado de perdas fossem obrigadas a liquidar?

O sr. Ferrão: — Parece-me, sr. presidente, que a materia dos artigos 41.° e 42.° não destroe nem offende de modo algum o principio essencial do projecto, que é fazer com que a estas instituições de credito se dêem todas as garantias de liberdade, sem prejuizo das que são devidas á sociedade e aos credores que em taes estabelecimentos tenham compromettido os seus capitaes.

E n'este intuito que o artigo 41.° deu aos credores das sociedades anonymas o direito de requerer a dissolução quando ellas tenham perdido metade do seu capital; mas ao mesmo tempo limitou esse direito sempre que essa perda não for um facto superveniente, porque se for um facto anterior ás obrigações contrahidas para com esse credor, não é justo que elle venha contravir a confiança que lhe mereceu a companhia, apesar da menos prospera situação em que se achava quando com ella contratou.

Ainda no caso da perda ser facto posterior, limitou as consequencias prejudiciaes do direito que consignou, concedendo ás sociedades anonymas o direito de opposição, se prestarem aos seus credores garantias de pagamento.

Podem ellas não ter de momento valores realisados, mas te-los de carteira, te-los no seu activo, no seu credito, na confiança que inspirar o objecto da sua empreza, e então, salvaguardados os interesses dos credores, era não só de justiça, mas de interesse publico, que a lei protegesse as mesmas sociedades.

Os poderes do estado devem salvaguardar, como disse o digno par, os capitaes que o publico confia d'estas companhias; mas estes capitaes, ou são obtidos pela subscripção e constituem o fundo social, ou são obtidos por emprestimo ou deposito, e é na conciliação de interesses de accionistas e de credor que consiste a resolução do legislador no artigo 41.°, de que se trata.

E é preciso notar que nenhum capital se fixa na lei para a formação de qualquer sociedade d'esta natureza. Nenhum se podia fixar á priori, e por isso nenhum se póde fixar para que ella possa continuar a sua gerencia. Por isso ella póde perder metade ou mais do seu capital, e comtudo ter semeado para colher mais tarde; ter soffrido grandes revezes, lutar com grandes difficuldades, sem1 perder o seu credito, as suas esperanças, nem a confiança nos resultados uteis da sua exploração.

O artigo 42.° do projecto é redigido sob a influencia das mesmas idéas, dos mesmos principios.

E aos accionistas, reunidos em assembléa geral, que compete deliberar, se no caso do fundo social reduzido a metade pelas perdas, é ou não conveniente a continuação da sociedade, ou se deve restabelecer-se o capital primitivo, por meio de novas subscripções.

O § unico d'este artigo 42.º toma uma providencia de mais rigor, quando as perdas são tão consideraveis que vão a 3/i do fundo social; pois que n'esse caso, presumindo justa causa para a dissolução, dá valor preponderante á quarta parte dos accionistas apresentados que reclamam a mesma dissolução.

Tão enormes perdas a par da desanimação no proprio seio da assembléa geral, não podem fundamentar a esperança de rehabilitação; e em taes circumstancias a dissolução e consequente liquidação deviam ser auctorisadas, embora a maioria da assembléa deliberasse em sentido contrario.

São estas as explicações que posso dar ao digno par, e que no entender das commissões reunidas, justificaram plenamente a adopção e approvação dos artigos 41.° e 42.°

O sr. Presidente: — Como mais nenhum digno par pede a palavra, vou pôr á votação o artigo 40.°

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Posto á votação o artigo 40.º, foi approvado, bem como o artigo 41°

Passou-se á discussão do artigo 58.°

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — E sobre este artigo 58.° que tenho a fazer algumas observações.

O fundamento do parecer para a approvação do projecto de lei em referencia ás sociedades anonymas é a necessidade de emancipar estas sociedades da tutela preventiva e repressiva do ministerio das obras publicas, commercio e industria, assim na constituição como na dissolução das mesmas sociedades, contendo o projecto o artigo 58.°, o qual muito coarcta o poder do governo sobre as ditas sociedades anonymas, apesar de lhe permittir poder intentar uma acção judicial contra as sociedades que não preencham as disposições da lei.

A auctoridade pois do governo fica muito mais limitada do que está actualmente, porque o governo, ouvidos os seus conselheiros, podia dissolver qualquer sociedade, como aconteceu com a companhia das aguas e a companhia união mercantil.

É pois de absoluta necessidade declarar expressamente, revogado o alvará de 5 de janeiro de 1757, que, permittindo aos juizes serem accionistas de differentes companhias, e concedendo igual permissão a todos os empregados publicos, ainda os de maior preeminencia, estabelece que nenhum dos ditos juizes ou officiaes de justiça, fazenda ou guerra, possa ser dado por suspeito nas causas e dependencias civeis ou crimes respectivas ás mesmas companhias ou a cada um dos seus interessados com pretexto de que têem acções n'ellas. A carta constitucional, estabelecendo a independencia dos differentes poderes, e admittindo o julgamento de juizes e jurados, fez uma alteração radical no modo de existir e de funccionar do poder judicial. Ainda independentemente da revogação expressa, é evidente que a disposição do alvará de 5 de janeiro de 1757 não podia ser applicada aos jurados, juizes só de facto, entidade que não existia em Portugal no tempo da publicação do referido alvará. Sei que alguns jurados têem sido recusados em causas commerciaes, em consequencia de terem acções nas companhias d'onde são as causas, e esta recusa não tem sido admittida pelos juizes, por ser, segundo elles dizem, contraria á lei, que não póde ser senão o alvará.

Alem d'isto, o facto é que hoje a cada passo se veem os juizes de direito de 1.ª e 2.ª instancia, conselheiros do tribunal supremo de justiça, accionistas dos diversos bancos e companhias, a julgarem causas d'essas mesmas companhias e bancos, em cujo vencimento elles têem interesse directo, membros do poder judicial, do legislativo e do poder executivo e dos tribunaes administrativos, a serem não só accionistas, mas directores, presidentes e governadores de taes estabelecimentos, exercendo cumulativamente funcções tão oppostas.

Sr. presidente, em vista das considerações que acabo de fazer, entendo que este alvará deve ser revogado, e por isso é de absoluta necessidade inserir n'esta lei os artigos que vou mandar para a mesa, pelos quaes, ficando livre a todos estes empregados judiciaes, administrativos e membros do poder legislativo e executivo o serem accionistas de quaesquer campanhias, lhes fica comtudo prohibido de poderem jamais accumular as funcções de directores, presidentes, governadores e secretarios, isto é, a gerencia superior das sociedades anonymas com os cargos de membros do poder judicial, do executivo, do legislativo e dos tribunaes administrativos, não podendo julgar nos processos relativos ás sociedades de que forem accionistas, revogando assim expressamente o dito alvará de 5 de janeiro de 1757, e toda a mais legislação.

É por isso que depois do artigo 58.° e seu § do projecto colloquei os artigos 59.°, 60.° e 61.°, ficando o artigo 59.° do projecto sendo o artigo 61.° do meu additamento.

Segundo o meu modo de ver, o governo fica muito pouco armado em virtude do que dispõe o artigo 58.° e seu §, porque, precisando intentar contra qualquer companhia uma acção, póde vir a dar-se a circumstancia de vir a ser julgada por directores da mesma companhia contra quem o governo intentar a acção, visto que o alvará de 5 de janeiro prohibe que os juizes possam ser dados por suspeitos nas causas das companhias em que forem interessados; e portanto julgo que é convenientíssimo o meu additamento, que peço seja remettido á commissão (leu).

São estes os artigos que entendo devera ser addicionados ao projecto.

Uma voz: — Isso é um novo projecto de lei.

O Orador: — Isto não é novo projecto de lei; mas como eu, sr. presidente, tenho aqui por tantas vezes tratado da questão das incompatibilidades, questão que ainda não pude ver resolvida, por, isso, sempre que se apresente qualquer disposição que com ella se ligue, hei de apresentar a minha opinião e manifestar as minhas idéas; independente porém d'este facto, eu entendo de summa conveniencia o addicionamento d'estes artigos que apresento, e que desenvolvem o projecto. Se a commissão adoptar o principio, poderá desenvolve-lo como julgar conveniente. O facto é, sr. presidente, que se não se fizer o que indiquei com relação ao alvará de 5 de janeiro de 1757, os juizes não podem ser dados por suspeitos pelo governo; logo, o que é preciso, é que o governo tenha toda a certeza em que as acções que intentar contra as companhias sejam julgadas por juizes que não estejam ligados por algum interesse a essas companhias; isto é que esta de accordo com os bons principios de justiça.

Sr. presidente, alem de outros pontos, de que não tratarei, vejo eu no regulamento do conselho d'estado de 5 de janeiro de 1850 o seguinte:

«Os conselheiros d'estado não poderão deliberar nos recursos que subirem das decisões em que tiverem alguma intervenção, e bem assim n'aquelles em que forem partes elles proprios, e seus parentes consanguineos ou affins, até o 4.° grau por direito canonico; os seus creados, domesticos, tutelados ou curatelados, algum estabelecimento, sociedade ou corporação de que forem administradores ou directores, e sómente por estas causas podem ser recusados pelas partes.» (Artigo 88.° do decreto regulamentar sobre o conselho d'estado administrativo.)

Ora, sr. presidente, esta é que é a verdadeira doutrina, contida não só aqui, mas em muitos outros documentos analogos, em que se diz, por exemplo, que os juizes não podem julgar das causas dos seus parentes, que os membros das camaras municipaes não podem ser irmãos e affins.

Ha muito tempo, sr. presidente, que tenho em vista apresentar um projecto de lei sobre este ponto, e este calhamasso (riso) (O orador apresentou um caderno de papel escripto.) contém um extenso relatorio sobre este objecto, do qual extrai as considerações que acabo de apresentar á camara.

Sr. presidente, no tempo em que foi publicado o alvará a que me tenho referido, o poder judicial estava sujeito ao podér absoluto, e quando qualquer juiz julgava de um modo injusto ou prevaricava, procedia-se contra elle; mas agora, Sr. presidente, os juizes, segundo o que dispõe a carta constitucional, constituem o poder judicial independente, o qual não esta nem deve estar sujeito a influencia do governo. Actualmente o poder judicial é independente, e com toda a justiça o deve ser; e digo com toda a justiça, porque o meu desejo é que tenha não só as garantias que a carta lhe confere, mas todas aquellas que possam revesti-lo de toda á independencia que deve ter, e a que tem jus para poder exercer livremente o seu augusto mister, que é um verdadeiro sacerdocio, pois que tem de julgar da honra e da vida do cidadão; mas para isso é necessario que individualmente sejam independentes.

Sr. presidente, peço perdão de ter sido tão longo; mas o negocio é muito serio e da maior importancia, e não póde consentir-se que as causas e questões, quer do governo quer do cidadão, possam ser julgadas por pessoas interessadas no julgamento. Isto é reconhecidamente contra o direito, que se deriva do sentimento do justo, impresso pela máo do Creador na alma do homem, revelado pela rasão e applicado ás transacções dos homens.

Concluo pois, mandando para a mesa o meu additamento para ser remettido á commissão.

Leu-se na mesa e era do teor seguinte:

ADDITAMENTO

Artigo 58.° O governo não poderá, por acto administrativo, fazer cessar o exercicio a qualquer sociedade anonyma legalmente constituida, antes ou depois da publicação d'esta lei.

§ unico. Poderá comtudo promover nos tribunaes de commercio competentes, por intervenção do ministerio publico, a dissolução das sociedades que funccionem ou se estabeleçam em contravenção das disposições d'esta lei.

Artigo 59.° Os membros do poder judicial e dos tribunaes administrativos, os do poder legislativo e os do poder executivo não podem ser directores ou governadores, nem secretarios de quaesquer sociedades anonymas portuguezas ou estrangeiras, que tenham do governo portuguez privilegio ou que com o dito governo tenham contrato ou sejam subsidiadas pelo mesmo governo.

Artigo 60.° Todos os accionistas de qualquer sociedade anonyma não podem ser juizes, nem jurados, nem julgar administrativa ou judicialmente as causas ou questões da sociedade anonyma em que forem interessados.

Artigo 61.° Fica assim derogado o alvará de 5 de janeiro de 1757 e toda a mais legislação em contrario aos precedentes artigos.

Sala das côrtes, 3 de maio de 1867. = Visconde de Fonte Arcada.

O sr. Ferrão (sobre a ordem): — Sr. presidente, a materia contida na proposta do digno par é de gravissima importancia; é preciso reconhecer esta verdade, e assim fazer justiça ás intenções do digno par. Mas não póde ter logar n'este projecto, porque não tratando nós aqui senão de uma especie de sociedades de commercio, a proposta de s. ex.ª não comprehende mais do que esta, quando pela mesma ou mais forte rasão deve ser extensiva a proposta do digno par a todas as emprezas commerciaes.

Em segundo logar, porque a questão é mais complexa em si mesma, pois que prende com a das incompatibilidades de certas funcções com as de outras publicas, administrativas, judiciaes ou parlamentares, que convirá resolver por meio de uma proposta de lei especial.

No estado actual da legislação, e segundo, o codigo de commercio, é prohibido o exercicio de commercio por incompatibilidade de funcções a diversas pessoas, comprehendidos os magistrados e juizes nos logares da sua auctoridade ou jurisdicção.

Esta prohibição era ainda mais absoluta antes do codigo "commercial, e comtudo subsiste por excepção o alvará de 1757, que por motivos mui ponderosos permittiu, não só que os juizes, e muitos outros funccionarios, podessem ser accionistas de companhias, mas que prohibiu, que com tal fundamento so lhes podesse oppor suspeição.

Terão hoje cessado as circumstancias especiaes em que foi promulgado aquelle alvará?

Eis uma questão preliminar que deve ser resolvida, e que o póde ser, por um projecto que comprehendesse todas as incompatibilidades, assim como todas as causas de legitima suspeição..

Acresce que n'este logar, e por occasião de se discutir um projecto sobre sociedades anonymas, o ensejo é o menos adequado para se tratar da materia.

As sociedades anonymas, por isso. que não têem nome, podem representar os seus capitaes, não só por acções nominativas, mas mais tarde por acções ao portador. Se são nominativas, ficam transmissiveis por simples endosso em branco: guardam-se na gaveta, e assim, permanecendo incognitas, escapam a qualquer disposição prohibitiva.

Se são ao portador, a palavra o diz, não tem um proprietario propriamente dito, mas simplesmente um detentor, sem permanencia alguma, e que de mão em máo as póde adquirir, sem acto algum exterior de manifestação; e debalde se tentaria vedar, a quem quer que fosse, a acquisição, por qualquer modo, gratuita ou onerosa.

Portanto, sr. presidente, póde o digno par ter muitas e muito boas rasões para demonstrar os fundamentos da sua intima convicção.

Mas esta materia não póde entrar n'esta discussão, mas sim na de outro projecto de lei, para o qual o digno par tem colhido os elementos necessarios, e que póde, querendo usar da sua iniciativa, propor á deliberação da camara, para seguir os tramites ordinarios.

Vozes: — Votos, votos.

O sr. Presidente: — O dignos par, o sr. visconde de Fonte Arcada, insiste no seu additamento?

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Fico muito satisfeito que o digno par, tão consummado jurisconsulto como é, diga que a materia é de importancia. S. ex.ª não nega que seja necessaria uma providencia, mas diz que deve ser objecto de uma lei, comprehendendo mais outras incompatibilidades.

Sr. presidente, n'esta occasião o digno par, o sr. Ferrão, satisfaz-me muito, porque mostra que eu não venho aqui com projectos de pouca importancia. Mas não me parece que o meu additamento não seja proprio de ser consignado no logar em que o apresentei; porque, qual é o meu additamento? E estabelecer a independencia dos julgadores para que o governo tenha a certeza de que são decididos os negocios do estado por pessoas inteiramente independentes de interesses particulares. O caso é que ainda se faz obra pelo alvará de 5 de janeiro de 1757, segundo me consta, e parece-me que não estou enganado.

Sr. presidente, eu desejava ao menos que V. ex.ª mandasse ter o meu additamento, para ser inserido na publicação d'esta sessão, e parece-me que V. ex.ª não póde deixar de pôr á votação da camara todas as propostas que se apresentam para serem approvadas ou rejeitadas.

Eu sei, sr. presidente, quanto é difficil fazer qualquer projecto de lei contra o interesse de muita gente, mas não me importam os interesses particulares.

Eu bem sei que tinha todo o direito de apresentar um projecto de lei, como disse o sr. Ferrão, mas tambem entendo que o meu additamento não é deslocado no projecto, e admira-me que o digno par, membro da commissão e pessoa de tanta capacidade, reconhecendo que elle é de muita importancia, se recuse a aceita-lo! Aproveitar da minha proposta o que ella tivesse de importante e aceitavel, era a conclusão que se devia esperar, depois do digno par approvar o principio. Verdade é que eu já vi o exemplo de ir um projecto ou proposta a uma commissão, e dizer esta no seu parecer, que fosse o digno par proponente convidado a fazer o projecto definitivo, que a commissão devia formular em virtude da mesma proposta, uma vez que reconheceu tambem que ella era importante, e vinha a proposito providenciar sobre o objecto. Então para que servem as commissões? (Vozes: — Votos, votos.)

Eu peço a, V. ex.ª que mande ter os artigos e que os submetta á votação da camara, desejando que esta decida que vão para. a commissão.

Leu-se na mesa, na forma que pedia o digno par o sr. visconde de Fonte Arcada.

Por não ser admittido á discussão não teve logar a votação.

Votou-se o artigo 58.° do projecto em discussão. Ficou approvado e bem assim logo em seguida a mesma redacção.

O sr. Presidente: — A hora esta a dar, falta menos de cinco minutos; a continuação da ordem do dia não póde ficar para ámanhã porque o sr. ministro da fazenda declara que não póde assistir; por consequencia a sessão deve ficar para segunda feira, sendo a ordem do dia o que se seguia para hoje, e na primeira parte a questão sobre o requerimento do successor do digno par o sr. Xavier de Silva.

O sr. Visconde de Chancelleiros: — Para um requerimento antes de V. ex.ª fechar a sessão.

O sr. Presidente: — Tem a palavra para um requerimento, o digno par o sr. visconde de Chancelleiros.

O sr. Visconde de Chancelleiros: — Pedia que o objecto que V. ex.ª designa para ordem do dia na primeira parte, fosse tratado ámanhã, porque não depende da presença do governo, e assim economisa-se tempo, pois que se este negocio fica para primeira parte da ordem do dia da segunda feira, o resultado provavelmente será occupar todo o tempo esse objecto, sem que se chegue á segunda parte da ordem do dia.

Assim parecia-me mais conveniente que aproveitássemos o dia de ámanhã para nos occuparmos privativamente d'este parecer, cuja discussão esta suspensa ha tanto tempo (apoiados).

O sr. Presidente: — A vista da reflexão feita peto digna par, sou obrigado a dar sessão para ámanhã, visto não ser dia santificado nem de grande gala, e procederem as observações feitas, mas parece-me conveniente que fique designada a hora para um pouco mais tarde, isto é, ás tres horas em vez, de ser ás duas como é costume (apoiados).

Haverá portanto sessão ámanhã, sendo a ordem do dia a discussão dó parecer adiado relativamente á pretensão do successor do fallecido par o. sr. Xavier da Silva. Está levantada a sessão. Eram cinco horas da tarde.

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Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão de 3 maio de 1867

Os ex.mos srs.: Condes, de Lavradio e de Castro; Marquezes, de Fronteira, de Niza, de Pombal, de Sá da Bandeira, de Sousa, de Vallada e de Vianna; Condes, das Alcaçovas, de Alva, de Azinhaga, de Cavalleiros, de Campanhã, do Farrobo, de Fonte Nova, de Fornos, da Louzã, de Paraty, da Ponte, da Ponte de Santa Maria, do Sobral e de Thomar; Viscondes, de Algés, de Benagazil, de Chancelleiros, de Condeixa, de Fonte Arcada, de Gouveia, de Monforte, de Seabra, da Silva Carvalho e de Soares Franco; Barão de Villa Nova de Foscôa; Mello e Carvalho, D. Antonio José de Mello, Pereira Coutinho, Costa Lobo, Rebello de Carvalho, Pereira de Magalhães, Silva Ferrão, Silva Cabral, Pinto Basto, Reis e Vasconcellos, Lourenço da Luz, Baldy, Eugenio de Almeida, Casal Ribeiro, Rebello da Silva, Castro Guimarães, Fonseca Magalhães, Preto Geraldes, Canto e Castro, Menezes Pita, Fernandes Thomás, Almeida e Brito e Ferrer.

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