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1812

que alem dos contratos que referi não houve outro desde que a liberdade se estabeleceu definitivamente em Portugal, salvo o contrato de outros doze annos dado na cidade do Porto no meio da guerra civil, por um serviço patriotico.

Mas porque os contratadores de ha vinte annos tinham o privilegio da expropriação ou do embargo dos tabacos, segue-se d'ahi que os contratadores actuaes hão de ser expropriados da sua propriedade?

Eu não sei realmente como veiu arrastado á discussão um precedente condemnado, que não prova cousa alguma a favor do projecto actual, e se prova alguma cousa é contra os argumentos dos oradores que o aceitaram. Mas a boa vontade e a necessidade de achar rasões para sustentar a malfadada doutrina do projecto leva longe, e os dignos pares soccorrerem-se a todas as cousas que lhes parecem poder auxilia-los no seu empenho da salvação do projecto; e todavia se o projecto subsistir, elle ha de deixar sempre nefasta recordação.

O embargo dos tabacos nos tempos antigos foi reforçado com exemplos do dia de hoje, e diz-se — os contratadores actuaes compraram ao estado o direito de embargar cavalgaduras; e como compraram este direito que o estado lhes vendeu, isso dá direito ao mesmo estado para agora lhes expropriar os generos, machinas, etc... Eu pela minha parte não admitto o principio, nem o parallelo é exacto, mas quando mesmo admittisse um e outro, nunca poderia admittir a conclusão que repugna a toda a idéa de justiça.

O estado considera o contrato do tabaco como a especial feição de um tributo (apoiados), para que o seu preço seja mais elevado concede aos contratadores alguns privilegios que inclue no preço da arrematação, e entre outros concede-lhe o direito de embargo para transporte dos generos ou dinheiros do mesmo contrato, o direito de usarem de armas de fogo, de não pagarem contribuições pelos lucros do seu contrato, e muitos outros. Mas poderá dizer-se que o embargo transitorio de uma cavalgadura é o mesmo que a expropriação de uma propriedade? Ainda ha pouco um infeliz caiu moribundo no meio da rua, a policia apenou quatro homens que o conduziram ao hospital; poderá dizer-se que se fez a expropriação destes quatro homens? Para se ver a differença entre o embargo e a expropriação basta só ver que um é a privação do uso temporário da propriedade, e o outro a privação completa do uso e da propriedade.

Mas quando mesmo assim não fosse segue-se que os contratadores que não fizeram as condições hão de ser responsaveis pelas durezas das suas disposições? Se ellas são más para que as estabelece o governo? Em todo o caso os contratadores não têem n'isso a menor responsabilidade, nem merecem por isso a menor punição, nem aqui tratamos de uma lei penal.

Quem faz esses embargos é o governo; os contratadores são os exactores da fazenda publica; é assim que elles não podem deixar de ser considerados. Os empregados no contrato não são senão empregados publicos; são porventura empregados no serviço particular dos contratadores? Não, senhor, são uns recebedores, outros fiscaes dos direitos da fazenda, e seja-me aqui licito dar um testemunho publico e honroso para os empregados do contrato, com quem servi doze annos, e dos quaes tive quantas provas se podem ter de zêlo, de lealdade e de dedicação pelos interesses do contrato; e será de justiça e de boa rasão considerar esses empregados, não como o estão no projecto, mas na sua posição actual, como empregados publicos que o são (apoiados).

O argumento dos precedentes e o do privilegio que têem os contratadores, ou antes o estado, dos embargos, de modo algum póde provar a favor do projecto, e é contra as disposições da carta, a qual, reconhecendo que a expropriação é um acto violento, quer por isso que a indemnisação seja previa, para que o cidadão não seja privado do uso da sua propriedade ou do seu equivalente.

Digo o mesmo a respeito da expropriação das machinas que a commissão quer tambem expropriar, quando lhe bastava o uso temporário. Mas esta questão das machinas já está resolvida, e fallei n'ella só por incidente.

Julgo que a illustre commissão, apesar de partilhar os principios que combato, não quererá que as disposições do seu projecto vão alem do que é absolutamente necessario aos fins que teve em vista, e que ha de querer restringir a expropriação ao que for preciso para as necessidades do futuro contrato. Se é necessario fazer violencias, se se insiste n'isso, façam-se as menos possiveis e as que sejam menos odiosas (apoiados).

Sr. presidente, quem está ao facto d'este negocio sabe quaes são os generos de tabacos necessarios para os provimentos do futuro contrato, e sabe que a unica falta que podem sentir os futuros contratadores é de rapé: quanto ás outras qualidades de tabaco podem fazer-se ou importar-se em quinze dias ou n'um mez, para estar sortido o paiz d'este genero, ha só o rapé que precisa de longo tempo para fermentar e se fabricar, e portanto era caso nenhum se deve propor a expropriação alem do rapé.

Quer V. ex.ª saber o que aconteceria se a expropriação podesse abranger todos os generos do contrato? Resultaria que não ha de haver a concorrencia que a commissão teve em vista para quando a liberdade se estabelecer, porque a situação de hoje passaria para janeiro, e os novos contratadores apropriando-se dos generos dos actuaes, livravam-se de um concorrente para a epocha da liberdade de commercio e ficavam senhores do monopolio por algum tempo, podendo vender depois os generos pelo que quizessem, porque nenhum correctivo ou providencia vejo no projecto para evitar este inconveniente, e é para lamentar que a commissão esquecesse um ponto tão importante.

Resultaria ainda que os actuaes contratadores, não estando seguros de que os generos que podem fabricar nos dois mezes da prorogação do seu contrato, ficarão sendo propriedade sua para concorrerem na epocha da liberdade, não têem vantagem nem rasão para fabricarem generos para outros, e que mesmo não sabem porque preço lhe serão pagos, e então deixariam de fabricar, com excepção dos que lhes fossem necessarios para cumprir as condições do seu contrato, donde resultaria que um grande numero de operarios da fabrica ficaria sem trabalho, com grave perda para os trabalhadores da fabrica e risco da segurança publica.

A illustre commissão tambem não attendeu, como aliàs é necessario, apesar de todas as providencias que propoz, á segurança não só dos direitos que o thesouro deve receber pelos tabacos que ficarem na mão dos futuros contratadores, mas tambem das garantias que são indispensaveis para que os futuros contratadores usem, mas não abusem, dos elementos que têem á sua disposição. E é de esperar, que os futuros contratadores sejam homens de toda a confiança pela sua probidade, mas como ainda senão conhecem é licito tambem admittir que sejam pessoas que não dêem garantias.

Quaes são porém as medidas que a commissão tomou para se assegurar de que em janeiro seguinte se possa conhecer a verdadeira existencia dos tabacos? Quaes são as medidas ou precauções que tomou contra o abuso que póde fazer quem tem um pessoal de fiscalisação, e que póde evitar o contrabando, mas póde tambem protege los? Tenha a illustre commissão como certo, que sem um commissario regio, que tome parte na gerencia do novo contrato dos seis mezes, e que gerindo com os contratadores esteja ao corrente não só da administração geral do contrato, mas das ordens e instrucções que se dão, não tem uma garantia segura e hão de arriscar-se a correr á sorte que póde deparar bons ou maus contratadores.

Eu declaro porém que quando me refiro aqui a estas eventualidades, não é porque tenha apprehensões, porque devo antes suppor boa fé nos homens que se propõem a certas emprezas e a certos contratos; e declaro mesmo que se tratasse dos actuaes contratadores eu não fazia a menor reflexão, porque elles são bastante conhecidos n'esta camara como no paiz, e nenhuma voz se levantaria para suspeitar da sua boa fé, da sua probidade geralmente reconhecida (apoiasos). Tenho respeito e estima por todos elles, e entre elles alguem ha cujas relações de amisade datam de quarenta annos, e ainda mal para mim, porque esta longa data é um indicador de que a vida tem corrido e que sou já velho; o caso porém é que n'estas cousas os homens publicos não devem tratar de pessoas mas sim da entidade moral (apoiasos).

Confio bem que o governo não poderia nem quereria em caso algum, ou por qualquer fórma, tratar com algum troca tintas que se lhe apresentasse (riso).

Peço a V. ex.ª me desculpe o eu haver me assim quasi insensivelmente afastado do ponto da questão e do fim para que pedi a palavra; vou já concluir, dizendo que me parece que já deixei provado exhuberantemente, que o artigo não póde passar tal como está no projecto.

Quando a expropriação se justifique, a indemnisação ha de ser previa, nem seria justo que aquelle que for expropriado contra sua vontade, ficando privado do goso e posse da sua propriedade, deixe de receber primeiro o valor da cousa de que fica desapossado. Mas, sr. presidente, como sei, e vejo bem que o artigo offerecido pela illustre commissão melhora agora muito com a nova proposta, eu, que não tenho em vista causar embaraços, declaro que não tenho duvida em retirar a questão previa que propuz, se a commissão convier em que a expropriação seja só no rapé, e que o deposito Beja feito pelo maior preço que os árbitros propozerem, havendo recurso d'estes na resolução final. Lisongeio me de que a illustre commissão aceitasse como boas as rasões que produzi, ou estivesse convencida d'isso antes ou se convencesse depois, é cousa que pouco importa, o resultado é mesmo. O que não póde de modo algum passar é a disposição ácerca do valor que se manda consignar em deposito, como garantia da indemnisação, porque esta garantia não é sufficiente, e não é sem surpreza que ouvi a argumentação de alguns dignos pares.

E que direi eu sobre o que expoz a este respeito o digno par o sr. Moraes Carvalho? S. ex.ª julga garantia para a indemnisação o preço que todos ignoram porque os contratadores compraram tabacos ha seis annos, pois s. ex.ª quer que o preço de uma cousa que se vende, regule justamente por aquillo que se deu pela mesma cousa, isto é pelo preço por que se comprou? Não se trata de saber se augmentou de valor por qualquer circumstancia, ou se diminuiu muito por qualquer motivo. Vende-se por aquillo que custou? Não se admitte que o tempo tenha feito perder de valor, assim como não se admitte que o capital tenha juros! Em qualquer tempo que seja, o mesmo objecto ha de ter o mesmo valor, ha de se vender por aquillo que custou! Eu declaro que não admitto tal proposição (apoiados). A cousa vale o que vale na occasião em que se vende; os árbitros é que podem decidir (apoiados). Tudo isto me parece claro, logico e justo; mas este arbitrio não só é infundado e sem base, mas significa que nem se póde defender nem sustentar um principio que não tem a menor plausibilidade. Querer dizer que os tabacos que se venderam ha seis annos por um certo preço agora se avaliem pelo mesmo preço, é não só fugir das regras recebidas sobre o valor das cousas, mas desconhecer completamente a mudança de valor que tem quasi todos os objectos agricolas e industriaes; e a respeito dos tabacos é necessario ainda mais esquecer a guerra dos Estados Unidos que fez variar completamente o valor.

Se o deposito significa garantia, é necessario que elle seja sufficiente para a garantia ser sufficiente; aliàs é illusoria.

Do maior deposito, quando mesmo julgado depois excessivo, não ha perigo nem risco para ninguem; do menor deposito ha risco para o proprietario a quem se fez a violencia da expropriação, e que tem direito a não correr riscos nem incommodos para usofruir a sua propriedade ou o seu equivalente.

Agora, sr. presidente, resta-me tocar mui succintamente um ponto, em resposta ainda ao digno par, o sr. Moraes Carvalho, e vem a ser quando s. ex.ª avançou que eu fazia mal em dizer que não tinha confiança na entidade moral do governo, e era melhor que tivesse a franqueza de censurar o governo, e mesmo de o accusar, quando entendesse que tanto convinha e podia faze-lo dentro do circulo das nossas attribuições. Ora, sr. presidente, eu fallava da entidade moral governo, e tinha dito que não fallava dos actuaes ministros, que me mereciam confiança, não sei realmente era que s. ex.ª tivesse de me notar falta de coragem (apoiados). Emquanto porém a factos que comprovem a rainha asserção é escusado gastar tempo em expo-los, porque ha tantos que é impossivel que esta camara os tenha esquecido todos, assim como o digno par os não póde de certo ter olvidado (apoiados). Mas se o illustre orador sabe que o governo do nosso paiz tem sido pontual e rigoroso observador dos contratos; se sabe que elle nunca tocou nos depositos publicos, que os guardou fielmente, e que não tem merecido nem inspirado senão confiança, se o digno par sabe tudo isto, eu por lhe ser agradavel retiro as expressões que proferi sem aceitar nem a observação nem o conselho.

O sr. Eugenio de Almeida: — Em resposta ao precedente orador, observou que não ha meio absoluto de evitar que os futuros contratadores, quando chegar o mez de janeiro, não fiquem monopolistas de facto por causa dos generos que tiverem fabricado, circumstancia que justifica as prescripções que a commissão estabeleceu no projecto que se discute. São necessarias, e como a justiça acaba onde começa a necessidade, estão legitimadas por esta.

A redacção que offerecera em nome das commissões torna mais claras as idéas contidas n'aquelle artigo.

O sr. Xavier da Silva: — Requeiro que se consulte a camara se a materia da questão previa está sufficientemente discutida.

O sr. Marquez de Vallada: — Peço a votação nominal.

O sr. J. I. Guedes: — Eu não tenho a menor duvida em retirar a minha moção de questão previa, quando a commissão me esclareça da opinião que tem ácerca das reflexões que a honra de lhe fazer, pois desde que a commissão concordou em que em logar da caução nas mãos do governo se faça o deposito no deposito publico, não resta senão tornar a garantia completa, determinando que o deposito tenha logar pelo preço que os árbitros julgarem calculado entre o pedido e a offerta, e que seja sufficiente garantia para a liquidação final; pois a camara não tem base alguma para marcar desde já a quantia necessaria para essa garantia, e a que se indica no projecto é insufficiente, como pela commissão, ou ao menos por alguns membros d'ella, não póde deixar de ser reconhecido.

Com esta modificação, não tenho duvida em retirar a proposta que fiz, e que contém a questão previa ou constitucional, reservando me o direito de entrar na discussão da materia para que tinha a palavra.

O sr. Eugenio de Almeida: — Opina que nas commissões não podia fazer se a avaliação para o deposito, o que mostrou por diversas considerações.

O sr. Xavier da Silva: — Eu peço licença para fazer uso do meu requerimento. Requeiro que se consulte a camara se está ou não discutida sufficientemente a questão previa. Em logar de se ter discutido esta questão, o que tenho visto é que se tem tratado do projecto, e portanto peço a V. ex.ª que consulte a camara se julga a materia sufficientemente discutida. Os dignos pares podem-se reservar para tratar do projecto quando se tratar o artigo 19.° (pois agora não se trata senão da questão previa), e n'essa occasião podem fazer as reflexões que quizerem e com a extensão que desejam; mas agora não é opportuno faze-lo, até para se não perder tempo inutilmente.

Vozes: — Votos, votos.

O sr. J. I. Guedes: — Eu tenho a palavra para um requerimento e ninguem m'a póde tirar. Depois da declaração do illustre relator da commissão, o digno par, o sr. Eugenio de Almeida, que reconhece que não é necessario aos novos contratadores mais, do que expriação de rapé para quatro mezes, e que essa expropriação não se póde nem é justo fazer a outros generos os quaes se podem fabricar facilmente, depois de haver tambem o mesmo digno par reconhecido que a indemnisação é insufficiente como demonstrou pela apreciação dos preços, eu julgo poder retirar a minha proposta, e peço a V. ex.ª que consulte a camara se consente em que eu a retire.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que são de opinião que o sr. José Izidoro Guedes possa retirar a sua proposta para se entrar desde já na discussão do artigo 19.° tenham a bondade de se levantar.

Foi retirada.

O sr. J. I. Guedes: — Segundo o que a camara determinou é o ultimo parecer da commissão que se deve discutir.

O sr. Presidente: — Vae ler-se.

O sr. Secretario: — Leu.

O sr. J. I. Guedes: — E para mandar para a mesa uma substituição. Eu já disse que voto contra o artigo; mas como é possivel que elle passe, por isso offereço uma substituição ao artigo 19.° (leu) pedindo que ella seja remettida á commissão, para que sem prejuizo da votação do artigo a considere como entender.