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368 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

do assim, não sei para que servem as discussões nas commissões e no parlamento. Isto tem se visto sempre, e se não acontecesse assim, não sei para que serviriam os parlamentos. Ainda não ha muitos annos que veiu a esta camara um projecto de lei importante para a administração publica, que soffreu aqui monificações profundas, que lhe alteraram quasi inteiramente a essencia, e com todas essas modificações foi para a outra casa do parlamento, que as approvou, e hoje é lei do estado. Ora, nem por isso o ministro que aceitou taes modificações se julgou offendido, nem largou o seu cargo. Isto foi um facto que não se passou ha muitos annos, e que deve estar na memoria de todos.

S. exa. disse tambem que queria fazer uma pergunta que não era relativa á politica pequena de que ora a camara se occupava, mais elevava se a maior politica, pois se referia á união iberica.

(Interrupção do sr. Vaz Preto, que não se ouviu.)

Até notei as palavras do digno par...

O sr. Vaz Preto: - Eu referi-me á politica de casa.

O Orador: - Politica pequena ouvi eu, e tomei nota, e trouxe para aqui o facto, de que aliás muito se admirava, de um nosso collega ter escripto ha dezesete annos o prologo de um livro em que se expunham doutrinas puramente republicanas e ibericas. Ora, toda a gente sabe que actual mente em Coimbra, e em muitas partes do reino, a geração nova professa muito idéas republicanas, idéas que depois pouco a pouco vão desapparecendo com a idade, com os logares publicos que essa mocidade vae occupando, e com o amadurecimento de pensar, e apesar de se verem muitas vezes diffundidas essas idéas por quem não tinha ainda a experiencia das cousas, mas que depois mudou inteiramente de opinião, não me consta que se tenha feito d'isso menor reparo, nem se lhe lance uma nódoa no resto da sua vida por tal contradicção. Não sei onde li que o homem muda de idéas em cada decada da sua vida. Não me parece que deixe de ser assim.

O sr. ministro da marinha escreveu a um dos nossos collegas, dizendo lhe que estava bastante incommodado, e por isso não podia vir á camara, e o digno par, na sua bondade, ha de de certo aceitar esta escusa, por isso que não ha rasao alguma plausivel que leve a acreditar que o nosso collega não quer vir ao parlamento para se esquivar a responder ás perguntas que desejem fazer lhe, e mui especialmente em relação a uma materia sobre a qual todavia já s. exa. deu categoricas explicações.

Tambem o sr. ministro da marinha foi accusado por ter apparecido ha poucos dias em Madrid uma traducção em hespanhol d'esse prólogo que s. exa. escreveu ha dezesete annos.

Creio que todos acreditarão não se poder concluir d'este facto cousa alguma contra s. exa., ainda que essa obra e o respectivo prologo tivessem tres ou quatro edições, assim como nenhuma deducção logica se póde tirar de que, ad vogando um certo jornal d'esta cidade doutrinas republicanas ou democraticas, e havendo em alguma apocha n'elle escripto o sr. Latino Coelho, a responsabilidade do sr. ministro se prenda tambem agora só com essas doutrinas. Então devia proceder-se do mesmo modo para com outros cavalheiros que, collaborando n'aquelle jornal, têem sido ministros n'este paiz, e eu mesmo declaro que na minha humildade já para aquelle jornal dei alguns trabalhos, mas presumo que ninguem dirá que no fim He dez annos, que tanto vae o tempo a que me refiro, deva eu ter hoje tambem responsabilidade das doutrinas que elle actualmente publica.

O meu collega está no caso apontado; já declarou que desde que entrou para o ministerio nunca mais escreveu para jornal nenhum, e não tem responsabilidade no que as folhas periodicas escrevem. Aos jornaes é livre a emissão das suas opiniões, e são responsaveis perante a lei pelo que publicam. Como se pretende, pois, fazer convergir esta responsabilidade para a pessoa do ministro, que nem uma linha ali publica desde que subiu ao poder? Sinto que s. exa. esteja doente, e que não possa vir a esta camara responder, como já respondeu em outra occasião, puis daria de si satisfactoria rasão.

Emquanto á união iberica parecia-me melhor não fallar n'isto. Pois que teme o digno par hoje que seja mais terrivel do que era hontem? Quaes são os factos que o determinam a levantar a voz mais alto hoje do que a podia levantar hontem? Emquanto aos clubs republicanos declaro a s. exa. e á camara que não tenho tempo, nem vagar, nem estou habituado, para os visitar. Tenho eu porventura direito a penetrar no pensamento de alguem, quando cada um póde pensar como quizer, e a liberdade de pensamento tem fóros de liberdade?! Emquanto se não suspenderem as leis que regem, é dever nosso dar segurança ás pessoas, ás idéas, ás opiniões e á propriedade. Assim tem procedido e ha de proceder o governo; e demais para as demasias da imprensa lá estão os executores das leis, aos quaes compete chamar em seu auxilio a acção da justiça. Não pertence aos ministros, nem me compete a mim, accusar os jornaes pelos abusos da liberdade de imprensa.

A manifestação das idéas é liberrima a todos, da mesma fórma que nós aqui expomos tambem as nossas opiniões. Portanto, não se oppondo essa manifestação ao que o codigo assegura protecção, todos podem usar d'ella. Perigos da união iberica!... ha a este respeito trabalhos subversivos para a ordem publica, disse o digno par. Não posso partilhar dos receios do digno par, e presumo que a camara fará justiça ao governo actual e a todos os governos, porque não concebo nem posso conceber que venha homem algum para estas cadeiras, ou aceite este logar, para atraiçoar a monarchia...

(Interrupção do sr. Marguez de Vallada, que não se ouviu.)

O sr. Presidente: - Peço silencio.

O Orador: - O que temos nós com o que aconteceu em Napoles? Todos os partidos devem fazer se mutuamente justiça, e é na divergencia das opiniões que está a harmonia do mundo. Se ha quem divirja das nossas idéas, não devem por isso as suas merecer nos tambem respeito? Teremos de declarar guerra aos que pensam de modo diverso? Isto não póde ser.

A independencia nacional não periga. Para que se está portanto sempre aqui a levantar estes sustos a pretexto de tudo que apparece em discussão? Pois a nossa independencia corre porventura algum risco por se ter publicado um artigo republicano? Fará esse artigo tantos proselytos e tamanha propaganda que a nossa patria corra perigo, que esteja Catilina, portanto, a bates ás portas de Roma? Não, senhores.

O melhor é deixarmos cada um livre a sua opinião (apoiados), porque para a liberdade, para as instituições, para a monarchia e para a nossa independencia, não ha perigo com a livre manifestação do pensamento. (Interrupção que não se ouviu). Não me parece que devam fazer-se responsaveis os ministros por tudo quanto se escreve. Até nos querem fazer responsaveis pelo que se passou em Napoles! Tomaramos nós poder carregar com todo o peso dos negocios publicos e com as faltas que possamos commetter, quanto mais o respondermos tambem pelas faltas alheias.

Pelos apontamentos que tomei, não me resta mais nada a dizer aos dignos pares. Se alguma outra materia nova fixar a minha attenção, pedirei outra vez a palavra.

(O orador não reviu as notas dos seus discursos na presente sessão.)

O sr. Presidente: - Agora tem a palavra sr. ministro da justiça. Não sei se s. exa. quer fazer uso d'ella n'esta occasião.

O sr. Ministro da Justiça: - Não sendo contra o regimento d'esta casa, desejo que me seja reservada a palavra para depois do sr. Rebello da Silva,