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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 28 DE JULHO.

PRESIDENCIA DO EXMO. Sr. VISCONDE DE LABORIM,

VICE-PRESIDENTE.

Secretarios os Srs. Conde da Louza (D. João)

Visconde de Ovar

(Presentes ao começar a sessão, os Srs. Ministros da Marinha e da Fazenda,)

As duas horas e meia da tarde, achando-se presente o numero legal, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão, elida a acta da precedente foi approvada. Deu-se conta da seguinte correspondencia: Um officio do Digno Par Conde dos Arcos, participado que o seu estado de saude lhe não permitte comparecer ás sessões da Camara. Ficou inteirada.

—Outro de Filippe Folque, remettendo á Camara a resposta que a Direcção da Empreza das agoas julgou conveniente fazer publica, sobre os argumentos oppostos á sua informação anterior.

Mandou-se distribuir.

O Sr. Visconde de Benagazil — O Digno Par o

Sr. Marquez de Ponte de Lima não póde comparecer á sessão por estar anojado pela morte do Sr. Marquez de Castello Melhor, o que participo á Camara.

O Sr. Presidente — Será desanojado o Digno Par.

O Sr. Sequeira Pinto — Não pude vir á Camara no sabbado passado, choje ao entrar aqui constou-me que nesse dia o Digno Par o Sr. Marquez de Vallada proferira algumas palavras de censura com relação á administração do hospital de S. José. Como porém agora está presente o Digno Par, rogava a S. Ex.ª a bondade de repetir o que disse naquella sessão, para eu vêr se posso dar explicações taes que satisfaçam a S. Ex.ª, com quanto me pareça que talvez fosse objecto de interpellação ao Sr. Ministro do Reino: todavia eu desejo ouvi-lo para esclarecer S. Ex.ª, visto ter isso relação com a administração a meu cargo.

O Sr. Marques de Vallada—Sr. Presidente, quando do alto desta tribuna avanço uma proposição qualquer, tenho sempre, não só a consciencia della, mas tambem coragem bastante para sustentar o que digo, nesta Casa, e fóra della. É assim que procede quem se presa de ser homem de bem; é assim que procede quem se presa de ser homem de honra.

Sr. Presidente, por occasião de um projecto de lei que nesta Camara se discutia, e que viera da outra Casa do Parlamento, relativamente aos 3:300$000 réis applicados para o pagamento das dividas passivas do hospital da Universidade de Coimbra, tomando eu na ultima sessão a palavra em seguimento ao Digno Par o Sr. Visconde de Fonte Arcada, que censurava o Ministerio por não estar presente áquella discussão, respondi ao Digno Par que não devia dirigir tal censura ao Governo naquella occasião, apesar de eu muitas vezes a haver tambem feito nesta Casa do Parlamento; pois estava persuadido que essa censura cabia melhor, em occasião mais opportuna. e sobre motivo mais plausivel e importante. Então, Sr. Presidente, disse eu, como V. Ex.ª e a Camara estarão lembrados, que quando este Governo, ou qualquer outro que se sentar naquellas cadeiras, trouxer aqui a grande questão de beneficencia, desde já me compromettia a tractar tal assumpto com os meus fracos conhecimentos, e tanto quanto me permittirem as minhas forças; promessa esta que fazia perante o Senado, e perante o paiz, promessa que hoje ratifico.

Esta questão, Sr. Presidente, é uma questão de alta magnitude, e da qual já se hão occupado muitos paizes, aonde a civilisação tem feito mais progresso do que neste; e haja vista a todas as discussões a que ella tem dado logar na Belgica, e em outros paizes, e especialmente tambem na França. Na sessão passada disse igualmente, que desculpava o não estarem então presentes os Srs. Ministros, mas que chamava a attenção de todos os meus collegas sobre um negocio altamente grave, e do qual a imprensa deste paiz já se tinha occupado; e com quanto eu julgue que nem os jornaes, nem os jornalistas são infalliveis, todavia no caso em questão vi que todos elles tractavam bem o assumpto, com consciencia, e attendendo á gravidade do negocio.

V. Ex.ª ouviu eu levantar a minha voz, e dizer: quando se dá um escandalo tão grande como esse a que me refiro, e que succedeu no hospital real e nacional de S. José desta corte; quando se commettem escandalos e roubos n'um hospital de tal ordem, a attenção do Governo deve convergir sobre esse ponto, e occupar-se de o considerar sériamente. E porque dizia eu isto, Sr. Presidente? Seria porque se fallasse neste objecto n'um artigo de qualquer jornal, escripto por jornalista talvez homem de pouca experiencia, e que no calor da discussão apresentasse uma opinião que ás vezes póde não ser a expressão da verdade, e sim do odio? Não, senhores. Fallava no facto das duas quebras (releve-se a expressão) do Sr. David Alves Renda, já fallecido, e que foi thesoureiro do hospital de S. José, e do Sr. Azevedo que foi cobrador daquelle estabelecimento de caridade. Sr. Presidente, tenho razões para dizer que o Sr. Azevedo é pessoa capaz, e essas razões são tanto mais fortes quando eu vejo que o Digno Par o Sr. Joaquim Antonio d'Aguiar, que se acha presente, e que é provedor da Santa Casa da Misericordia, conserva exercendo o emprego de cobrador daquelle estabelecimento ao Sr. Azevedo, ao passo que elle foi suspenso do exercicio de identico logar no hospital de S. José, e por ladrão, como já disse (O Sr. Aguiar—Peço a palavra para uma explicação), e foi-o pelo Digno Par o Sr. Sequeiro Pinto, enfermeiro-mór daquelle hospital! O facto

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deu-se, o homem foi suspenso, e porque? Por se dizer que não tinha entregado as quantias que recebêra, mas lá é continuado a conservar na Misericordia. O Digno Par o Sr. Aguiar sabe a grande veneração que tenho por S. Ex.ª, mas o Digno Par ha de permittir lhe observe, que o não julgo tão innocente que, se se desse o caso de lhe ser inculcado para sua casa um criado, e alguem informasse depois S. Ex.ª de que esse tal criado já tinha roubado outro amo, o Digno Par o conservasse em vez de o despedir immediatamente. No caso que aponto deu-se o contrario, Sr. Presidente, deu-se este facto, o que é publico, e nelle posso eu fallar para chamar a attenção do Parlamento e do Governo.

Ora, todos estarão lembrados de que no Jornal do Commercio, que se publica nesta corte, appareceu uma carta desse Sr. Azevedo, na qual dizia serem infundadas as accusações que se lhe faziam, e que estava resolvido a desagravar a sua honra offendida nos tribunaes. São estas, pouco mais ou menos, as palavras da sua carta. Depois disto, Sr. Presidente, não ha duvida que o meu, nobre amigo e parente o Sr. Marquez de Loulé, Chefe do Gabinete e Ministro do Reino, que é a repartição competente, ordenára que este homem fosse chamado aos tribunaes, porque não entrára em cofre com o dinheiro com que devêra entrar, Em vista desta allegação poderá responder-se; que este homem não é accusado de roubo, porque tem uma fiança de oito contos de réis, que é a que se exige para o logar de cobrador?! É o mesmo que se eu, por exemplo, fosse devedor a um cavalheiro qualquer, esse me pedisse a sua divida, e em vista da minha recusa me viesse penhorar. Isto é tão trivial, Sr. Presidente, que todos nós sabemos o que se passa nos tribunaes. A primeira cousa que alli se faz é a accusação do crime. Ora este homem nega, mas embora tenha uma fortuna colossal, qual é a deducção que se tira, ainda que a nossa razão não seja muito esclarecida? Quando formamos o juizo depois do homem asseverar que tinha entregue o dinheiro, e effectivamente o não entregou, a conclusão que podemos tirar é que este individuo é ladrão, porque, muito embora se abram todos os diccionarios, não se acha outro nome que sirva para designar a acção praticada. Eu pela minha parte declaro que não conheço outro epitheto.

Conheço esse cavalheiro, tenho por elle algumas sympathias, mas direi como disse o Digno Par o Sr. Visconde de Castro, desejo muito vêl-o desagravado, porque se tal succeder continuarei! a ser seu amigo; d'outra maneira não é possivel.

Sr. Presidente, aqui ha duas cousas diversas é distinctas: a causa intentada pelo hospital contra o fallecido David Alves Renda, e a causa intentada pelo hospital, por ordem do Ministerio do. Reino, contra o Sr. Azevedo, cobrador.

Ora, todos sabem, e estimo vêr aqui presente o meu amigo o Sr. Ministro da Fazenda, que tambem não deve ignorar o que vou dizer, e vem a ser: que durante o Ministerio chamado da regeneração, houve uma Lei, julgo que de Novembro de 1851, em que se dava tal ou qual organisação á beneficencia publica, organisação que achei irrisoria em vista dos principios da sciencia; todavia, nella se estabelecia, que na irmandade da Misericordia se nomeassem vinte e quatro adjuntos para os estabelecimentos de beneficencia, e parece-me que é dos estatutos que elles possam nomear vinte e quatro letrados por causa dos litigios e demandas que podem ter; mas, até hoje, que eu saiba, ainda os taes adjuntos não nomearam os letrados. Talvez fosse por esquecimento; ou como o Governo tem tido muito de que se occupar, talvez o não tenha podido fazer; e por isso peço que se cumpra a Lei, e quanto antes, não querendo, todavia, censurar agora o Governo.

Ora, Sr. Presidente, tambem me parece que o Digno Par o Sr. Sequeira Pinto, na pequena exposição que acabou de fazer, e que terminou pedindo que me explicasse sobre o que outro dia eu disse; parece-me, repito, que S. Ex.ª disse, que talvez isto fosse negocio que devesse ser affecto ao Sr. Ministro do Reino, porque elle era o chefe superior daquelle estabelecimento. Julgo serem estas as palavras de S. Ex.ª Estou convencido, Sr. Presidente, que se o Sr. Ministro do Reino estivesse presente na occasião em que tractei este objecto, teria respondido como lhe competia. Talvez fosse mais regular fazer uma interpellação; porém, dirigi tantas em outro tempo, que um Digno Par já fallecido, o Sr. José Maria Grande, me chamou o Par interpellador. Além disso tão pouco fructo hei tirado de todas essas interpellações, que já as não tenho -em fé, visto que por tal meio se não conclue nada, e hoje recuo, e tenho receio de as emprehender. Entretanto, se fôr preciso, não terei duvida em fazer uma interpellação sobre o assumpto.

Ha ainda outra cousa, de que me lembro agora, Estou persuadido que hei de ser secundado no que voa dizer, pelos Dignos Pares que se assentam ao pé de mim, pelo Sr. Ministro da Fazenda, e especialmente pelo Digno Par o Sr. Sequeira Pinto.

Esta questão está affecta aos Tribunaes. Abster-me-hei por isso de apresentar certas considerações, e dizer o que sei, pois ninguem ignora, de certo, que ha documentos, que estão ao alcance de todos; mas á vista dos principios que devemos acatar, sendo conveniente guardar silencio sobre certos detalhes, poderá comtudo seguir-se o exemplo de outros paizes, e nosso proprio, nomeando-se uma commissão de inquerito. O Sr. Sequeira Pinto é o mais interessado neste assumpto, assim como nós todos, porque devemos zelar o que os nossos antepassados deixaram a estes estabelecimentos, e para que isto se faça, não me prendem nenhuns preconceitos, porque desde já declaro, que tenho documentos com que provo que nada devo áquella casa.

Sr. Presidente, vamos ao caso. Passo a fazer a proposta para se nomear uma commissão de inquerito. Não a quereria só para examinar o estado deste estabelecimento; mas para todos os de beneficencia; porém entendo não ser por agora occasião, devendo reservar-se para quando sé tractar a questão geral de beneficencia. Portanto, hoje proponho-a unicamente para o hospital de S. José, e depois pedirei a palavra, se fôr preciso, para responder ao Sr. Sequeira Pinto.

Pedindo a nomeação de uma commissão de inquerito, a exemplo do que já se tem praticado, desejo que ella examine tudo detalhadamente, porque, segundo me consta, acontece que a escripturação daquelle estabelecimento não está regular. A proposito disto contarei um facto que servirá para comprovar a asserção. Comprei o palacio do Sr. Marquez de Marialva em Cintra, que estava sobrecarregado com duas capellas instituidas por D. Martinho, Arcebispo de Lisboa, e quando requeri para se lançarem no registo, aconteceu uma cousa nova, que em logar de ser registado em meu nome, como havia mais duas capellas instituidas pelo mesmo D. Martinho, e estavam registadas n'um morgado pertencente a uma senhora que era possuidora dessas duas capellas, lá se me registaram as minhas em nome daquella senhora! Ora, eu sou immediato successor desta senhora, porém ainda não herdei cousa alguma.

Consta-me que no hospital não existe o livro chamado—Diario, e creio que todos sabem a importancia deste livro, que é reputado um dos principaes da escripturação; e para a boa regularidade da escripturação do hospital, entendia eu a conveniencia de tal livro.

Tenho agora mais a observar a situação dos empregados, e tambem a dos doentes. O Sr. Sant'Anna e Vasconcellos mui judiciosamente lembrou ao Governo, que tivesse em attenção os serviços prestados pelos enfermeiros. Estou persuadido que houve muita dedicação naquella classe de empregados, e comtudo é certo que teem um estipendio com que apenas podem viver, pois vencem só oito vinténs por dia! São homens que pela maior parte tem familia, e parecia-me que deviam ser mais bem recompensados, porque dessas economias em que o serviço perde em vez de ganhar não as quero eu; o que desejo é que o serviço publico não soffra, e sobre tudo que não soffra o serviço da caridade.

Folgo de que o hospital de S. José esteja em muito bom estado de aceio, como é opinião geral, e eu já tive occasião de verificar. Na verdade está n'um aceio extraordinario, mas hão sei se os doentes são tractados por todos aquelles empregados com a mesma caridade. De um facto sei eu que se passou outro dia, e creio que a pessoa com que elle se deu está já suspensa. Um ecclesiastico, pessoa respeitavel, segundo me dizem, fôra ajudar a bem morrer um doente, e o cirurgião que estava de dia, achando-se, segundo parece, embriagado, espancou o ecclesiastico, e este tendo de retirar-se deixou de soccorrer o doente, que logo depois morreu! O Sr. Sequeira Pinto procedeu, fez bem. Não posso neste caso deixar de lhe dar os meus emboras, e rogar a S. Ex.ª receba os meus louvores.

Não ha duvida que naquelle estabelecimento não póde ser rei constitucional um enfermeiro-mór; não póde occupar-se de certas miudezas, mas não póde deixar de examinar todos os negocios, mesmo porque tem a responsabilidade, delles.

Oxalá, Sr. Presidente, bem o desejo eu, que, chegasse o momento em que se fizesse para este paiz uma lei de responsabilidade de Ministros; mas querer que os Ministros sejam só os responsaveis e mais ninguem, é um absurdo que nunca sustentarei. É necessario que elles a tenham mas a lei de responsabilidade deve ser tambem para os funccionarios publicos. Tenho visto muitos Ministros carregarem com certas culpas que lhes não pertencem, tenho visto alguns Ministros sacrificados por erros dos seus empregados; por, consequencia a responsabilidade de Ministros é uma daquellas frases que soa bem, que serve para a opposição, mas eu na defeza, ou na opposição, só desejo servir a verdade, e ser apostolo della.

Concluo apresentando a proposta para a nomeação da commissão de inquerito, e pedirei depois a palavra se acaso julgar conveniente responder a algumas expressões que S. Ex.ª houver de proferir.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada—Sr. Presidente; direi unicamente duas palavras.

S. Ex.ª, o Digno Par que acabou de fallar, censurou de algum modo a maneira por que eu no outro dia fallei nesta Camara sobre os Ministros não estarem presentes á discussão. Eu censurei então a falta do Sr. Ministro do Reino nessa occasião, e tanto mais quando o projecto de que se tractava era do Governo, e assim tornava-se indispensavel que estivesse presente o Sr. Ministro do Reino.

A importancia que se votou para o hospital de Coimbra importa pouco; é insignificante, o que eu censurei foi o systema que se seguia de quasi nunca apparecer aqui o Sr. Ministro do Reino, quando se tracta de negocios que lhe dizem respeito. Embora aquelle negocio fosse pouco importante, nem por isso deixava de ser necessaria a presença do Sr. Ministro do Reino até para se constituir assim a praxe certa e determinada de que nos negocios publicos em que SS. Ex.ªs devem tomar uma parte importante, e em que esta Camara careça de que seja ilustrada, alguns dos Srs. Ministros estejam sempre presentes para darem todas aquellas explicações que se lhes exigirem; não foi pois a importancia do objecto que me levou então o fallar, foi o principio de se discutirem aqui cousas ao Governo sem que o Ministro da competencia do objecto aqui appareça.

Não tenho mais nada a dizer.

O Sr. Aguiar.....

O Sr. Sequeira Pinto—Sr. Presidente, tendo o Sr. Marquez de Vallada proferido algumas expressões desfavoraveis á administração do hospital de S. José, á qual tenho a honra de pertencer, não posso deixar por isso -de expôr a V. Ex.ª e á Camara algumas circumstancias, que tendam não só a esclarecer o assumpto de que se tracta, mas a rectificar diversas inexactidões que S. Ex.ª avançou.

Abundo nas idéas do meu nobre amigo o Sr. Aguiar, quando diz que é louvavel o zêlo que o Sr. Marquez de Vallada tem pelos estabelecimentos de caridade em geral: comtudo, como S. Ex.ª fallou em escandalos no hospital de S. José; na irregularidade da sua escripturação, adduzindo para isso um facto; no alcance do thesoureiro, e do cobrador, accrescentando que a este se offendera a honra; e chamou a attenção do Governo sobre tão grave assumpto, e sobre a exiguidade do vencimento dos enfermeiros do hospital, de que disse resultar o menos bom tractamento dos respectivos doentes, devo declarar, que, em quanto á parte sobre que o Digno Par chama a attenção do Governo, estou certo de que se o Sr. Ministro do Reino estivesse presente, havia de satisfazer a S. Ex.ª, e que nem por isso deixará de o fazer opportunamente; e que a respeito dos outros pontos, é do meu dever expôr a V. Ex.ª e á Camara os seguintes factos, que me parece provarem de sobejo que no hospital de S. José não se dão os escandalos, e as irregularidades a que o Sr. Marquez de Vallada alludiu.

A administração daquelle estabelecimento compõe-se de um enfermeiro-mór, e dois adjuntos, que concorrem a todos os actos da respectiva gerencia; mas não é ella a que recebe, arrecada, e distribuo os rendimentos do hospital, porque só determina o seu movimento: para aquelles dois serviços ha um cobrador, e um thesoureiro legalmente nomeados, que prestam fiança designada por Lei, e que teem regulamentos separados que marcam as suas obrigações.

O thesoureiro fallecido foi nomeado por um Decreto—para elle honroso — em 1842, se bem me recordo, e desde então sempre se lhe tomaram contas annualmente, na conformidade do regulamento, como consta dos termos lavrados nos livros em que se escripturava a sua responsabilidade; e o systema seguido naquella escripturação, escusado será dizer que foi o geralmente adoptado, isto é, debitando-o por todas as quantias que entravam em cofre, e de que precisamente passava recibos, e creditando-o por aquellas que pagava por ordens legaes da administração, uma vez que nas mesmas estivessem os recibos das pessoas a favor de quem se mandavam fazer os pagamentos, as quaes essencialmente são os fornecedores de generos, e outros objectos dei consumo do hospital de S. José e annexos, e os respectivos empregados. Fica, pois, bem entendido, nem outra cousa podia conceder-se, que o thesoureiro tomava a responsabilidade pelas quantias que recebia, e assim o confirmava por escripto, e declinava essa responsabilidade em presença de ordens de pagamento, com recibo da pessoa a favor de quem eram passadas. Todas as administrações que me precederam levaram ao, conhecimento do Governo, em tempo competente, as contas da sua gerencia, e o mesmo tem feito áquella, á frente da qual tenho a honra de me achar collocado. (O Sr. Marques de Vallada — Deram-se contas?) Todos os annos, e se por alguma vez se tem demorado a sua publicação por motivos supervenientes e extraordinarios, nem por isso deixa de existir nos livros respectivos a escripturação legal de que são tiradas. Nesta Camara se assentam alguns Dignos Pares, que fizeram parte das administrações anteriores á actual, que conhecem perfeitamente a verdade do que exponho.

O Sr. Marquez de Vallada—Eu não sei se pedi a palavra a V. Ex.ª, mas peço-a agora.

O Sr. Presidente—Já está inscripto.

O orador—Tendo exposto a V. Ex.ª e á Camara, ainda que resumidamente, o mais essencial ácerca da responsabilidade do thesoureiro, exporei tambem o que acontece a respeito do cobrador.

Este empregado, como já disse, prestou a fiança marcada por Lei, e as suas obrigações estão determinadas por um regulamento. A sua responsabilidade é effectiva desde que se lhe entregam conhecimentos para cobrança, e elle assigna no livro competente em como os recebeu, com expressa declaração dos respectivos numeros de ordem, e quantias que representam; e esta responsabilidade cessa, quando entrega as quantias que cobrou ao thesoureiro, e este passa dellas recibo.

Antes do cobrador entregar as quantias que tem em seu podér ao thesoureiro, é verdade que vai á Contadoria do hospital, aonde se lhe conferem os talões dos conhecimentos, e se praticam outras formalidades marcadas no seu regulamento, nem outra cousa podia fazer-se, porque em materia que importa a responsabilidade de um individuo, o primeiro a evitar e a oppôr-se aos arbitrios seria elle mesmo; mas note V. Ex.ª e a Camara, que todos estes actos que precedem a entrega de dinheiro feita pelo cobrador, o que a declina e transfere para o thesoureiro é só o recibo que este passa, como tambem é expresso no regulamento do cobrador.

Resumindo, direi ainda: o cobrador, por meio da sua assignatura, toma a responsabilidade de todos os conhecimentos que se lhe entregam, e quando presta contas tem tres modos de a declinar; o primeiro, pelos recibos do thesoureiro das quantias que lhe entregou; o segundo, pela apresentação dos conhecimentos cuja cobrança não realisou até áquella época; e o terceiro, pela daquelles que, por qualquer motivo, são incobraveis. Isto é o que se fez sempre, e dos respectivos livros em que se escriptura a sua responsabilidade, consta, que não se lhe abonou jamais quantia alguma que não estivesse comprehendida em qualquer daquellas hypotheses.

Depois de ter assim mostrado que o thesoureiro e cobrador do hospital de S. José são duas entidades distinctas, porém muito ligadas no exercicio de suas funcções, cada uma com sua fiança e com seu regulamento, que lhe determina o serviço; tractarei agora dos alcances.

Se Presidente, permitta V. Ex.ª e a Camara que eu apresente uma reflexão que me occorre. sobre a materia de que vou occupar-me: muito se tem dito ácerca do modo de evitar o abuso de quem gere os dinheiros publicos, e não poucos são os principios regulamentares que por ahi ha escriptos, e mandados observar neste sentido; mas, Sr. Presidente, se nos responsaveis falta probidade, de que servem esses regulamentos por mais preventivos que sejam? E se não, para que é que a Lei exige fianças?

Sr. Presidente, eu não faço comparações entre os caracteres a quem tem sido commettida a laboriosíssima administração do hospital de S. José, e se as fizesse seria para tributar respeitosas homenagens aos que me precederam, porque lá estão naquella casa de caridade irrefragaveis testemunhos de que todos se esmeraram por levar aquelle consolador refugio da pobre humanidade enferma, ao possivel grao de perfeição. Mas seja-me licito dizer, que a administração actual não. tem trilhado caminho opposto: se ha erros na sua gerencia, são de entendimento, e nunca de vontade, porque esta com a maior força, tem procurado sempre o bem estar dos enfermos, e a prosperidade dos estabelecimentos a seu cargo (muitos apoiados.)

Os alcances, em que tão alto se fallou nesta Camara, sou eu o primeiro a lamental-os; e os meus collegas, adjunctos da administração a que tenho a honra de presidir, não menos os sentiram, porque um delles já desceu ao tumulo, e o que existe, com quanto tenha a consciencia de não ter sido por falta de cuidado administrativo, que taes factos se deram, ainda hoje o vejo assas impressionado pelo que elles são em si; impressão bem propria de um homem honrado e honesto como é o Sr. Conselheiro Francisco José Vieira, que tendo exercido os mais elevados cargos da magistratura judicial e administrativa, tem sabido conservar até hoje uma reputação illibada. De grande vantagem nos foi comtudo, que a nomeação do adjunto que substituiu o Sr. Guerra Quaresma, recaísse n'um cavalheiro distincto por suas virtudes e conhecimentos do ramo administrativo, como é o Sr. Côrte Real, porque examinando elle todas as circumstancias de que os mesmos alcances se revestiram, é mais um testimunho que tenho para invocar, de que a administração de que veiu fazer parte, procedeu naquella occorrencia como lhe cumpria.

Logo que o thesoureiro falleceu, o que teve logar em 24 de Janeiro deste anno, mandou a administração proceder, com relação á thesouraria do hospital, a todas as formalidades do estylo, de que deu conta ao Governo: e em seguida ordenou que pelos livros em que se escripturava a responsabilidade daquelle funccionario, e em presença de quaesquer documentos que á mesma dissessem respeito, se extraísse a respectiva conta. Assim se fez, e mostrando-se por aquelle modo legal, que o fallecido thesoureiro ficára alcançado em oito contos e tanto, propoz-se a competente acção em juizo, sendo em todo este processo ouvido o advogado do hospital, a fim de que nem uma só das convenientes formalidades deixasse de ser attendida; dando-se tambem opportunamente conta ao Governo.

Ora, sendo a responsabilidade do cobrador muito ligada á do thesoureiro, como já expuz, tomaram-se contas aquelle responsavel. Repetirei aqui, que assim como a conta do thesoureiro foi tirada, attendendo ao que lhe havia sido debitado por effeito da sua assignatura, e creditado pelas ordens de pagamento em que havia recibos das pessoas a favor de quem tinham sido passadas; assim tambem ao cobrador se attendeu a» seu debito, que eram todos os conhecimentos que deviam existir em seu podér, e ao seu credito, que eram as importancias daquelles que tinha cobrado e entregado ao thesoureiro, segundo os recibos que deste existiam.

A primeira operação pois, que havia a fazer, era pedir ao cobrador todos os conhecimentos, que existiam em seu podér, quer fosse dos incobraveis, quer daquelles de que não tinha ainda podido realisar a cobrança, e foi isto o que se praticou no dia 3 de Fevereiro deste anno, em, presença de toda a administração, do proprio cobrador e dos empregados da contadoria, que tinham a seu cargo os livros em que se escripturava a sua responsabilidade, pelos diversos ramos de receita porque se haviam extraído os conhecimentos que se lhe pediam.

Cabe aqui observar que esta entrega de conhecimentos, realisada por meio de uma relação que de todos elles se fez, cujas folhas foram numeradas e rubricadas por toda a administração do hospital, assignando-a os empregados da Contadoria a quem competia, e o proprio Cobrador, é talvez o acto a que o Sr. Marquez de Vallada alludiu, quando disse — que ao cobrador se tinha já dado um documento assignado pela administração, o qual declarava aquelle responsavel quite para com a fazenda do hospital. Mas, Sr. Presidente, convem rectificar tamanha inexactidão; nem aquelle documento foi assignado pela administração, que apenas lhe rubricou as folhas, como é uso em todos os que comprehendem materia que importa responsabilidade de alguem, nem quando o fosse importava a quitação geral do Cobrador, porque apenas se limita a mostrar que os conhecimentos alli mencionados por numeros de ordem, e por valores, que estavam confiados á sua responsabilidade, foram por elle entregues, cessando assim nesta parte a dita responsabilidade.

Se de nada mais o Cobrador tivesse a dar conta, gravissima injustiça seria, bem digna dos epithetos de que o Digno Par se serviu, exigir-lhe mais alguma cousa; mas aquelle empregado ainda tinha outros valores porque era responsavel, e então o que se seguiu? Fizeram-se as descargas nos livros competentes de todos aquelles conhecimentos entregues no dia 3 de Fevereiro, e nos dias 9 e 10 do dito mez pediu-se-lhe, em presença dos mesmos livros e documentos analogos, o mais de que ainda devia dar conta, que nenhuma relação tinha com os conhecimentos entre

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gues no dia 3, por que esses todos lhe foram abonados.

Já disse que o Cobrador, sendo responsavel pelos conhecimentos que recebe para cobrar, declina essa responsabilidade devolvendo esses mesmos conhecimentos, e dos que não devolve existindo recibos do Thesoureiro, pelos quaes se mostra que recebeu as quantias que elles representavam; e isto não só deve ser assim, porque nenhum outro modo ha que decline responsabilidade na hypothese dada, mas accresce que é disposição do regulamento do Cobrador.

Ora, como nos dias 9 e 10 de Fevereiro, em que rigorosamente se tomou a conta ao Cobrador, já não havia conhecimentos a exigir-lhe, porque todos os que tinha em seu podér os havia entregado, como ha pouco expuz, no dia 3, o que é que se lhe pedia então? Eram certamente a importancia daquelles que não tinha entregado, e estas importancias deviam estar, representadas em recibos do Thesoureiro se lhas tivesse entregado. As de que effectivamente havia recibos abonaram-se ao Cobrador, e as de que não os havia, não se lhe abonaram; declarando-se nos ter, mos que nesses dois dias se lavraram nos livros da sua responsabilidade, as quantias relativas a um certo, porém alli mesmo designado numero de conhecimentos, de que não havia recibos do Thesoureiro, e tudo isto com tanta verdade e exactidão, que o proprio Cobrador, essencialmente interessado em que os factos se não desfigurassem, assignou aquelles termos.

Ainda que os empregados da Contadoria do hospital de S. José não fossem dotados de tanta, probidade, que nenhum receio tenho, antes muita satisfação de declarar aqui, que tomo sobre mim toda a responsabilidade dos seus actos (apoiados), quem ha ahi que duvide que falla a prova essencial e unica de que o Cobrador tivesse entregado ao Thesoureiro certas e determinadas quantias, quando o mesmo Cobrador é o proprio que assigna os termos em que se declara que não existem recibos daquellas quantias? E sem esses recibos pertenderia alguem que similhantes quantias se creditassem ao Cobrador, levando-as por conseguinte ao debito da conta do fallecido Thesoureiro? E com que fundamento se pediriam aos seus herdeiros, uma vez que o Thesoureiro não póde ser responsavel senão pelo que assignou? Sr. Presidente, isto não tem resposta possivel! Por mais que o sophisma pertenda invadir o campo da verdade, e da legalidade das cousas desta ordem, o triumpho ha de cair-lhe das mãos.

- Tomadas assim as contas ao Cobrador, e não havendo documento legal que salvasse a sua responsabilidade, com relação á importancia de 11 -contos e tanto, que havia de fazer a administrarão do hospital de S. José? Em negocio particular póde cada um dispor da sua fazenda como quizer; mas dentro da esphera administrativa passam-se as cousas de outro modo.

A administração, portanto, ordenou á Contadoria que avisasse o Cobrador, para no prazo de cinco dias apresentar os conhecimentos que lhe haviam sido carregados na sobredita importancia, de que não mostrou recibos, ou entrar com ella no cofre do hospital, quando por ventura não apresentasse documento legal de alli lhe ter dado já entrada.

O Cobrador, depois de assim avisado, requereu, a titulo de fundamentar a sua resposta, certidão dos termos, das contas que prestara, e de muitos outros documentos de que agora me não recordo; requereu tambem prorogação de prazo para responder; e tudo lhe foi concedido pela administração: e sabe V. Ex.ª e a Camara qual foi aquella resposta? Foi a que o Digno Par disse ter visto publicada nos Jornaes; mas a administração não tem tempo para lêr Jornaes.

O Sr. Marquez de Vallada—Pois deve lêr; não lhe era isso preciso nesta hypothese, porque a resposta foi-lhe officialmente dirigida, e concebida em termos bem pouco regulares.

- A vista disto, devia o Cobrador continuar no exercicio das suas funcções? Certamente que não. Disse o Sr. Marquez de Vallada, que o Cobrador fóra suspenso por Diogo Antonio Corrêa de Sequeira Pinto, e não sei para que desceu a individualidades quando não foi um individuo, mas sim a administração do hospital de S. José, composta de um Enfermeiro-mór e dois Adjuntos, e auxiliada pelo Advogado do mesmo estabelecimento, a entidade moral que resolveu em todos os pontos desta occorrencia, e assim na suspensão de que se tracta.

Não tendo, pois, o cobrador satisfeito ao que lhe exigia no aviso a que me referi, e sendo suspenso, mandou a administração tirar a conta da sua responsabilidade; mas, antes de ser remettida para juizo, consultou, em conferencia, o syndico e advogado do hospital, sobre este ponto; e presente está o Digno Par, o Sr. Visconde d'Algés, cujo testimunho invoco, assas ponderoso pelos vastissimos conhecimentos juridicos e administrativos, que todos lhe reconhecem, para confirmar se a administração trouxe aquella conferencia todos os documentos, todas as explicações, e tudo quanto podia esclarecer o assumpto.

Resolvido, pois, que se remettesse a conta, contra o cobrador, para juizo, procedeu-se nessa conformidade, dando-se conta ao Governo, cujas ordens, expedidas pelo Ministerio do Reino, foram no mesmo sentido.

Eis-aqui, Sr. Presidente, como as cousas se passaram relativamente ás responsabilidades do thesoureiro e do cobrador; V. Ex.ª e a Camara, relevando-me as faltas oratorias que se tenham dado no que deixo dito, porque isto não é um discurso estudado, nem eu aspiro ás honras de orador, terá comtudo conhecido pelos factos que com fidelidade expuz, que os escandalos em que o Sr. Marquez de Vallada fallou, são immerecidas censuras lançadas sobre a administração do hospital de S. José.

Disse o Digno Par que a escripturação daquelle estabelecimento não está regular, mas similhante asserção não desceu do vago para o positivo, porque o facto para que pareceu apontar, relativo á instituição de uma capella, todos sabem que o ramo de legados pios, cuja tomada de tontas e cobrança passou nestes ultimos annos por diversas.! reformas tendentes ao seu aperfeiçoamento, não poderá talvez por isso estar organisado a ponto de não apresentar uma inexactidão sequer: mas, se essa inexactidão se der, por exemplo, em o nome do instituidor de uma capella, ou do possuidor, referindo ainda um que já não é o actual, será isso grande erro ou influirá desfavoravelmente na escripturação das respectivas contas que se processa no hospital? Supponho que não.

E demais, a escripturação na contadoria do hospital de S. José toda se faz regularmente com relação aos diversos ramos de receita e despeza do mesmo estabelecimento, e em livros tambem regulares. Não é um trabalho occulto, antes patente a todos os que o querem observar: o Digno Par sabe isto muito bem, e se não, peço-lhe a bondade de dizer se é verdade ter sido bem recebido nas occasiões em que foi aquelle estabelecimento, e terem-se-lhe franqueado todos os esclarecimentos que exigiu?

O Sr. Marquez de Vallada — É verdade.

O orador—Ainda podia invocar o testimunho de outros cavalheiros que se assentam nesta Camara, não só a respeito dos trabalhos da contadoria, como da organisação do hospital, e do modo por que os doentes são tractados (O Sr. Barão de Porto de Moz — Apoiado). Se da escripturação da contadoria se querem tirar illações desfavoraveis por causa da conta tomada ao cobrador, não sei em que se funda o argumento, porque se nas outras occasiões em que aquelle empregado prestou contas existiam os mesmos livros e o mesmo systema, e delles se não queixou, para que se queixa agora? A contadoria do hospital de S. José não se póde considerar uma casa mercantil; tem um regulamento que determina os trabalhos a seu cargo, e tem os livros que elles reclamam, e que satisfazem a todas as suas indicações.

Mas, Sr. Presidente, para que é attribuir a livros, ou a methodos de escripturação o facto relativo ao cobrador? Elle é muito simples, limita-se a ter ou não ter recibos do thesoureiro; porque, suppondo mesmo por hypothese que lhe entregou, em particular, as quantias de que ora é responsavel, sem lhe exigir o competente recibo, como era do seu interesse, e do seu dever em observancia do respectivo regulamento,; impute a si as consequencias dessa falta, e nunca a uma administração que não póde mandar debitar, nem creditar os responsaveis pela fazenda que administra, senão á face dos documentos legaes. Voltando ainda á escripturação direi, que o Sr. Barão de Porto de Moz, que haverá pouco mais de anno visitou o hospital, tendo tido a bondade de examinar a escripturação da contadoria, materia sobre que ninguem lhe póde negar a competencia, declarou que a achava regular; e sobre isto invoco o testimunho de S. Ex.ª - A administração actual do hospital de S. José, a que tenho a honra de pertencer, na qualidade de enfermeiro-mór desde 1851, tendo já antes servido na extincta commissão administrativa, não se recusa, nem remotamente, a que os seus actos sejam examinados por uma commissão de inquerito, antes o estima, e mesmo que della faça parte o Sr. Marquez de Vallada: essa commissão verá, que se em 1850 tinha o hospital uma grande divida passiva, figurando nella só com relação a vencimento de empregados, mais de vinte e tres contos de réis, hoje estão pagos em dia, assim como satisfeitas na maior parte, as demais verbas de que se compunha! Verá que dos devedores ao hospital, incluindo os de legados pios, a respeito dos quaes o mesmo estabelecimento não é mais do que uma parte como outra qualquer, poucos são os compellidos judicialmente, porque a quasi todos a administração tem admittido meios suaves de pagamento, sem os vexar (apoiados); verá que as antigas barras de madeira nas enfermarias estão substituidas por camas de ferro; as mesmas enfermarias sobradadas, convenientemente divididas, e com melhor systema de ventilação, e illuminadas a gaz; verá que, sem se haver pedido ao Governo mais auxilios do que os que estão marcados por lei, completou-se a organisação do hospital de Rilhafolles com um bello estabelecimento de banhos que lhe era indispensavel, cosinha a vapôr, agoa elevada a todos os pavimentos, novas enfermarias, etc...; verá que no hospital de S. José se organisou, tambem com os proprios recursos do estabelecimento, uma lavanderia com enxugadouro e estufa para servir no inverno, de que resulta mais perfeição e brevidade no processo da lavagem de roupa, e uma economia talvez de dois contos de réis annuaes; verá, finalmente, que no hospital de S. Lazaro tambem se teem feito muitos melhoramentos.

A vastissima propriedade rustica e urbana do hospital tem merecido muitos cuidados á administração; nos dominios directos tem-se rehavido muita cousa, pelo que o rendimento de fóros augmentou.

Recordo-me agora do que o Sr. Marquez de Vallada disse ácerca da má retribuição dos enfermeiros, e de isto ser causa do menos bom tratamento dos enfermos. Oh! Sr. Presidente, aonde está a consideração de que são tão dignos os facultativos do hospital de S. José, para suppôr que elles tolerem o máo tratamento dos doentes confiados aos seus immediatos cuidados? Aonde está a vigilancia que a administração, por si e pelos empregados que lhe estão mais proximos, exerce, visitando-os amiudadas vezes a diversas horas, examinando as dietas, e tendo o maior cuidado em que todos os viveres e medicamentos de consumo do hospital de S. José e annexos, sejam da melhor qualidade, e não se admittam sem prévia approvação dos facultativos?

Demais, Sr. Presidente, todos os empregados do hospital de S. José teem moralidade, e comprehendem o seu dever para o cumprirem, sem se deixarem levar por sentimentos mesquinhos; e os das enfermarias, a quem a administração tem procurado melhorar a sorte, e o fará mais amplamente logo que as forças do cofre o permittam, é injustiça suppôr que a modicidade dos vencimentos influísse nelles a ponto de não tratarem bem Os doentes, nem a administração lh'o consentia, não deixando impunes quaesquer faltas (apoiados)

Vem aqui a pello o facto, a que S. Ex.ª alludiu ácerca de um cirurgião ultimamente demittido é verdade, que aquelle facultativo, sem attender ás admoestações que lhe haviam sido feitas por algumas faltas que commettera, as repetiu por tal fórma, que a administração, com quanto tivesse em si auctoridade para o suspender, andou prudentemente ouvindo a commissão consultiva, que foi de parecer, que não só a suspensão lhe cabia,. mas que além, disso não devia servir mais no estabelecimento,; {O Sr. Marquez de Vallada. — Ainda bem) e que fez a administração? Conservou-o suspenso, deu conta ao, Governo, propondo a sua demissão, que effectivamente já lhe foi dada. (Vozes. — Muito bem).

Por aqui se verá que a administração procura evitar, quanto humanamente é possivel, as faltas no serviço dos estabelecimentos a seu cargo, (apoiados) sem que com isto queira dizer que entre 300 e tantos empregados que ha no hospital de S. José e annexos (refiro-me aos de inferior ordem) não haja que corrigir. Mas aonde está a sobre-humana intelligencia que a tudo proveja dentro de um tão dilatado circulo, e no meio de tão variadas circumstancias? (Vozes. — Muito bem).

Sr. Presidente, muito devo eu á indulgencia com que V. Ex.ª e a Camara me têm escutado. Talvez eu devesse ter sido mais breve nestas reflexões, e factos que produzi, mas depois de um anáthema fundido nos moldes do escandalo, como não me desaffrontar com todas as forças que, em mim cabem, e á administração a que tenho a honra de pertencer? A essa administração, que depois de ter feito o que os estabelecimentos a seu cargo attestam, se conservou firme no seu posto de honra, com os empregados que lhe são, immediatos, e com os facultativos a quem (tanto a uns como aos outros) tributo, e dirijo deste logar os elogios de que são credores, durante, as duas epidemias de cholera morbus e febre amarella! Mas que agora se lhe lança o stygma de escandalo!

A essa administração que, sem prejuiso das obrigações ordinarias que já lhe estavam commettidas, se desempenhou do difficultosissimo encargo de organisar os hospitaes provisorios naquellas duas calamitosas épocas, de os prover de todo o necessario, e de vigiar a todos os momentos, com risco pessoal, sobre tantos infelizes fulminados pelas epidemias, porque só durante a febre amarella foram mais de cinco mil doentes que entraram nos respectivos hospitaes!

A essa administração, que ainda foi além deste cumulo de encargos, satisfazendo outros com relação a pontos fóra da capital: aqui está ao meu lado o Sr. Julio Gomes, cujo testemunho invoco, que sendo Ministro do Reino na occasião em que a cholera morbus invadia tanto esta cidade, como a ilha da Madeira, me encarregou de apromptar roupas e outros objectos, bem como enfermeiros para aquella ilha, e entre as ordens que a administração do hospital de S. José assim recebeu, e o seu cumprimento, mediaram apenas horas, - porque de um dia para o outro saíu pela barra de Lisboa o navio que conduzia aquelles soccorros!

E não seria tudo isto feito com zêlo, actividade, amor do proximo, e sem grande despeza? Sim, Sr. Presidente, a administração attendeu ás regras de bem entendida economia, e lá estão no Ministerio do Reino as contas legalmente documentadas, que provam esta verdade. A essa administração em fim, que tem a consciencia intima de haver cumprido os seus deveres, e que por isso não esperava que se lhe lançasse a grave censura que a Camara ouviu, e que eu declino por immerecida! (muitos apoiados). ' Porque fallei em economia, devo observar tambem que não se tire dahi argumento desfavoravel, porque os hospitaes provisorios, tanto de cholera morbus como de febre amarella, organisaram-se e funccionaram muito regularmente, e se eu invocasse agora o testemunho dos nacionaes e estrangeiros que os visitaram, e podesse trazer aqui esses testemunho, fallaria elle mais alto do que a minha voz, por muito robusta, que fosse (apoiados).

O Governo, no exercicio da suprema inspecção deste estabelecimentos, tambem os visitou a horas inesperadas, e na folha official appareceu um documento, tambem official, que não deixa em duvida o que eu disse relativamente á boa organisação dos hospitaes provisorios.

Repito, Sr. Presidente, ao concluir este discurso, pobre de galas, mas não falto de verdade, que a administração do hospital de S. José tem na sua consciencia a recompensa moral das suas fadigas; e tem muito bons fundamentos para suppôr que todos os que a acompanharam na arriscada lucta de salvar as victimas das duas epidemias, nutrem iguaes sentimentos.

Agora, se algum dos Dignos Pares, ou os que directa ou indirectamente tiveram conhecimento do que disse com relação aos escandalos que se attribuiram ao hospital de S. José, quizer desenganar-se pelo seu proprio testimunho, lá estão abertas as portas do mesmo hospital e annexos; vejam os doentes; vejam as dietas, e os remedios que se lhes ministram; vejam os livros de escripturação; vejam as contas; vejam em fim tudo, que assim ficará supprida a falta de documentos, que teria aqui trazido se estivesse prevenido, para com elles provar tudo que avancei. (Vozes— Muito bem, muito bem.)

O Sr. Marquez de Vallada—Continuarei a usar da palavra, pedindo a V. Ex.ª permitta, que tendo eu de responder a dois Dignos Pares, siga a ordem chronologica. Principiarei respondendo ao Sr. Aguiar,. a quem digo que faço bastante justiça em acreditar no seu bom coração, para crer tambem. que S. Ex.ª nesta questão as palavras que empregou foram mais filhas delle do que da Sua esclarecida razão. S. Ex.ª acostumado ás lides parlamentares e, a politica desde longos annos; um dos mais antigos nessas lides, não poderá sustentar com vantagem os dois principios que estabeleceu, começando por dizer que não era proprio que uma: questão destas, relativa a um empregado publico, fosse trazida assim á Camara. O Sr. Aguiar—V. Ex.ª dá-me licença?

O Sr. Marquez de Vallada—Com muito gosto.

O Sr. Aguiar—Eu disse que lamentava que uma questão que estava affecta ao Poder judicial, e para cuja decisão elle é o competente, fosse agora assim trazida aqui; e disse mais: que entendia que a administração respectiva tinha, feito bem, tinha cumprido com o seu dever, quando entendendo que um empregado seu estava em alcance tinha ouvido logo o fiscal competente, e tinha apoz isso remettido o negocio para o Poder, judicial.

Foi isto o que eu disse, e digo ainda, embora, S. Ex.ª impugne estes principios, que eu acho de tal evidencia que me parece que a Camara me dispensa de dizer mais.

O Sr. Marquez de Vallada—Ouvi com a de, vida attenção a rectificação do Digno Par, e estimo que S. Ex.ª nos fizesse conhecer que não, foi por julgar insignificante a questão, que declarou não approvava que em tal se fallasse. (O Sr. Aguiar—Apoiado.)

As questões, segundo o que eu entendo, não se tractam senão em vista dos grandes principios, mas estes ferem-se ás vezes contra um homem do povo, e em favor dos de mais elevada classe, porque infelizmente neste paiz, e permitta-se-me a expressão, que não sendo muito portugueza, já foi com tudo empregada por certo orador; e conhece-se o que ella expressa; porque infelizmente, repito, neste paiz ha uma cousa a que se chama a gravatocracia, e os homens obscuros são muitas vezes os condemnados. (O Sr. Aguiar— Mas com. quem é isso?) Dê-me V. Ex.ª licença, para continuar, porque eu tenho direito de fazer>;as observações que julgar, apropriadas, analysando os principios estabelecidos por um orador qualquer desta Camara; tenho direito de fazer todas e quaesquer reflexões que entender convenientes.

Disse o Sr. Aguiar (e aqui direi eu, que S. Ex.ª consultou mais o seu coração do que a sua, razão pura e esclarecida) «como havia eu suspender um empregado que no estabelecimento que administro não commetteu o mais leve erro?» Oh! Sr. Presidente, pois um homem accusado de ladrão,... (O Sr. Aguiar—Não é accusado....) Então não sei que nome lhe possa dar! Ha um homem que é suspenso por ordem do Sr. Sequeira Pinto, por dizer que entregara aquillo que se affirma não entregou. Que nome se ha de dar a este homem? Isto não se sophisma; não se lhe póde dar senão o nome de ladrão no caso de ser condemnado.

O Sr. Sequeira Pinto alludiu a ter eu dito, que era amigo daquelle individuo. É verdade que sou seu amigo; porém, desde que se provar o crime de que é accusado, dou a certeza ao Digno Par e á Camara, que dahi por diante cessou a minha estima por esse individuo. Em todo. caso entendi que não devia occultar ás minhas relações com esse homem.

Sou eu de opinião que havendo um processo contra esse individuo, e tendo elle de responder nos Tribunaes, o Sr. Aguiar devia suspendel-o immediatamente. (O Sr. Aguiar—A suspensão só tem logar em consequencia de pronuncia, e esta não existe; é uma acção méramente civel, intentada no juizo competente, não existindo por em quanto accusação.) Acção civel por ladrão?, Isso é o mesmo por que o homem é accusado, e por isso é que foi suspenso do hospital.

Agora, Sr. Presidente, depois de ter respondido ao Digno Par o Sr. Aguiar, vou tractar de responder tambem ao Digno Par o Sr. Sequeira Pinto, que começou dizendo que o hospital tinha, prestado contas.

E sabido que os estabelecimentos de beneficencia publica prestam contas ao Governo civil respectivo, e ao Conselho de districto, e parece, me que, se me não engano, até á quantia de dez, contos de réis; e que dahi para cima é ao Tribunal de Contas a quem compete examinal-as. Que dirá o Digno Par o Sr. Sequeira Pinto, se eu lhe disser que ha uma certidão deste mesmo Tribunal, na qual se diz que o hospital de S. José se ha recusado a prestar as suas contas, como lhe competia? (O Sr. Barão de Porto de Moz—Peço a palavra).

Sr. Presidente, não estando munido da competente certidão, é claro que não a posso apre, sentar; mas acha-se aqui o Digno Par o Sr. Barão de Porto de Moz, dignissimo Presidente daquelle Tribunal, que acaba de pedir a palavra, e que poderá certificar se é verdade o que avancei. Julgo ter respondido, como devia, a esta parte do discurso do Digno Par.

Disse tambem S. Ex.ª, que o thesoureiro e o cobrador deram uma fiança de oito contos de réis cada um, segundo dispõe a Lei. Sei que é verdade terem-n'a dado; mas sabe V. Ex.ª o que aconteceu? Foi que quando se procedeu á avaliação das propriedades, que constituiam a fiança do thesoureiro, encontrou-se valerem apenas tres contos de réis! Dir-se-ha, o que tem o hospital com isto? Digo que tem muito, porque se devia ter andado mais prudentemente na escolha dos funccionarios.

As contas foram prestadas pelo cobrador; O Sr. David Alves Renda morreu em Maio, e em janeiro é costume prestarem-se contas no hospital, e prestaram-se? Depois da morte do Sr. Alves Renda, o cobrador pediu para dar contas, e não poderam tomar-se desde logo: tomaram-se-lhe depois na presença da administração do hospital. Estava presente o Digno Par o Sr. Sequeira Pinto, o Sr. Cezario, Official-maior, e outros cavalheiros. O que aconteceu, pois? Adiantando-se muito a hora, julgo que não se terminaram!

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Diz-se tambem que ha um termo do cobrador ter entrado no cofre com aquella quantia, e que este termo é passado pelo Sr. Sequeira Pinto, e S. Ex.ª deve saber que o individuo a que me refiro já chamou para testemunhas alguns empregados do hospital, e que se fizeram as perguntas na presença do sr. advogado Abel Maria Jordão Mas se elle tiver sentença contraria, desde logo fica perdido para a opinião publica, e então ha-de de certo ser demittido pelo sr. Aguiar. Terei muita pena, mas é uma necessidade, porque sempre é necessario desaggravar a justiça. É preciso que sejam castigados todos os crimes, sejam quaes forem os culpados, para que se não diga que ha crimes felizes, por serem praticados por homens que teem protecção, em quanto que aquelles que são praticados pelos homens do povo raras vezes ficam impunes, porque a estes faltam as protecções com que aquelles se acobertam. Aqui é que é necessario a igualdade, mas a igualdade bem entendida, que é a que nivella os homens perante a lei. Tal é o principio mais salutar do christianismo; é nisto que se baseia a verdadeira religião.

Termino aqui as minhas observações, e mandarei para a Mesa a proposta para a nomeação da commissão de inquerito; reservando-me para quando a questão fôr decidida, fazer a minha interpellação, que não sei se terá o mesmo resultado de muitas outras que já fiz em diversas occasiões; apesar do que, não posso deixar de ser energico na pesquiza da verdade, porque esse é o meu dever.

O Sr. Visconde de Algés chamado á autoria pelo Sr. Sequeira Pinto sobre este incidente que teve origem na indicação do Sr. Marquez de Vallada, não póde eximir-se de fazer uma laconica exposição do objecto.

Com a devida venia a este cavalheiro que muito respeita, é opinião delle orador que a materia devia ter acabado desde o momento em que se disse estar o negocio dependente da decisão do podér judicial, porque tanto mais auctorisada é esta tribuna quanto mais cautelosa deve ser em manifestar uma idéa ou juizo ácerca de qualquer negocio pendente nos tribunaes; principalmente tendo a Camara membros do podér judicial, que podem vir a ser Juizes na mesma causa; e podendo mesmo dar-se o caso d'esta Camara ter de se constituir em Tribunal de Justiça para julgar o administrador do hospital, que tem nella assento!

Pelo conhecimento que tem do Sr. Marquez de Vallada, e porque sobre todos faz justiça ao seu saber e docilidade, espera de S. Ex.ª que em conhecendo bem a questão fique desde logo do lado daquelles que entendem, que ella se deve pôr de parte. Nestes termos passa elle orador a ennuncial-a no seu verdadeiro ponto de vista.

Supponha o Sr. Marquez de Vallada que é chamado ao hospital de S. José, na qualidade de empregado daquelle estabelecimento, e que se lhe apresenta a seguinte questão: — Existe um Thesoureiro desta administração, o qual tem a respectiva fiança, e ha tambem um Cobrador que tem outra fiança: a do Thesoureiro e de 8:000$ réis, e a do Cobrador igual. Qual o modo porque se debitam o Thesoureiro e o Cobrador? Qual o modo porque elles declinam a sua responsabilidade?...

Quando elle orador foi chamado para dar sua opinião sobre este objecto, que já estava mui tractada pelo Advogado do hospital (o Sr. Massa, um dos principaes Advogados da capital, e que ha de ser um dos primeiros Jurisconsultos deste paiz) perguntara se havia duas entidades separadas; se o Cobrador era agente do Thesoureiro, e se a responsabilidade corria só pelo Thesoureiro e seu fiel?.... Fora devidamente informado; e abrindo os livros de assentamento destes logares, vira serem inteiramente distinctos e separados, sem ingerencia de um no outro.

Quiz saber o modo porque se debitava o cobrador, e como se desonerava da sua responsabilidade. Havia dois modos de debitar o cobrador pela entrega dos conhecimentos; conhecimentos que tinham talão, e outros que não o tinham; o cobrador assignava o termo ou recibo dos papeis de credito, e ficava debitado pela quantia correspondente que designava a sua responsabilidade; e quando cobrava por conta de uns ou por conta de outros, vinha á contadoria desencarregar-se daquella responsabilidade. Se o recibo era de talão cortava-se este; se não era, tomava-se nota no livro ou caderno competente. A contadoria, porém, não via nada sonante, porque a contabilidade e a thesouraria são repartições distinctas e separadas. O cobrador, depois de ter descarregado alli a quantia que havia recebido, devia ir entrega-la ao thesoureiro; e não ficava exonerado della senão pelo recibo que lhe passasse esse funccionario. Quando elle orador foi chamado, como disse, examinou miudamente este negocio. Nos livros da contadoria viu as quantias recebidas; mas a sua effectiva cobrança devia ter logar na thesouraria, e para o cobrador evitar a responsabilidade, era necessario que apresentasse o recibo do thesoureiro de como a este tinham sido entregues as respectivas quantias; esse recibo não appareceu.

Pergunta, pois, ao Sr. Marquez de Vallada: havendo dois empregados inteiramente distinctos, com responsabilidades separadas, e dois regimentos diversos, exigindo-se que o cobrador, para ficar exonerado da sua responsabilidade, apresente os documentos de ter entrado com as quantias recebidas no cofre da repartição, pergunta, se depois de lêr o cobrador registado o dinheiro recebido, mas não a sua effectiva entrega, se S. Ex.ª lhe creditaria taes quantias? De certo que não, pela falta do recibo.

O cobrador diz que entregou estas quantias, mas não apresenta recibo! Diz que entregara ao fiel! Mas de que serve essa entrega? Quem paga a quem não deve, sempre deve. O fiel é um agente do Thesoureiro; não está porém auctorisada para passar recibo, nem o passou, ou não se exhibe. Se acaso o Sr. Marquez de Vallada fosse administrador do hospital de S. José, creditaria taes quantias?

A administração não podia credita-las, porque o regulamento exige que para o cobrador ser exonerado dellas, devia apresentar o respectivo documento. Não póde a seu arbitrio abona-las.

Mas diz-se (continua o orador) que ha documentos e provas para mostrar a verdade! Apresentem-se nos Tribunaes, que é o meio de acabarem as responsabilidades tanto da administração, como do cobrador. Lá ficará demonstrado se o cobrador pagou. A administração não recebeu, porque para receber devia a quantia ter entrado no cofre do thesoureiro, auctoridade competente para passar o recibo. Então é o cobrador responsavel. Se pagou ao fiel, esse não tem responsabilidade: responde para o thesoureiro, mas não deste para cima.

Este e o verdadeiro estado da questão.

Passando o orador a tractar do que o Sr. Marquez de Vallada dissera em relação a ser o mesmo individuo cobrador da Misericordia, expendeu que neste caso não se tractava de acção criminal, mas civil; e que nesta acção ha sómente o facto da responsabilidade, que é a que existe para com o cobrador. Pôde acontecer depois que no processo para se exigir a responsabilidade do thesoureiro ou do pagador, advenham certas circumstancias que denunciem um crime, e que sirvam de fundamento ao corpo de delicto para a acção criminal; mas simplesmente por um homem ser levado aos Tribunaes por podér estar, ou não, alcançado, não resulta dahi crime, nem auctorisa a ninguem para lhe lançar tal qualificação.

Expõe tambem o orador não ser exacta a asserção relativamente ás contas do cobrador; porque se as pertendeu dar, não as deu. Relata a este respeito o que se passou entre elle orador, e o alludido individuo, cuja familia conhece mui bem, e em perfeita abstracção de sua responsabilidade sempre o teve, e ainda tem por pessoa de muita probidade. Pedira-lhe elle uma conferencia, e nessa o aconselhara a ir aos Tribunaes, porque se ahi demonstrasse, e convencesse da verdade, teria ganho a sua causa, e segura a sua reputação; sendo em todo caso certo que praticou uma leviandade mui grande, entregando quantias de sua responsabilidade, sem exigir os competentes recibos!

Taes eram as explicações que succintamente tinha a dar; tal era a verdade, exposta em poucas palavras; e esperava de S. Ex.ª acreditasse que esta era a religiosa exactidão do que se passár.

Estava elle orador de accôrdo relativamente á commissão de inquerito; só pedia, que se ella começasse a funccionar desde já, fosse em preparação de trabalhos, não manifestando cousa alguma do que colhesse, em quanto não, acabasse a questão no Poder judicial; porque qualquer que seja a manifestação que faça a dita commissão do inquerito, a favor, ou contra, póde influir; e, quando não influa, não é bom exemplo. O Sr. Marques de Vallada (sobre a ordem) — Eu não tinha mandado a proposta para a mesa para a nomeação da commissão d'inquerito, porque fazia tenção de a não mandar por em quanto, pois realmente me parece de justiça que estando o negocio affecto aos tribunaes haja de sobre estar-se; entretanto eu não desisto da idéa de se nomear uma commissão d'inquerito para examinar não só o que respeita ao hospital de S. José, mas a todos os estabelecimentos pios; realmente no estado em que se acha este negocio parecia delicado, como disse o Sr. Visconde d'Algés, que essa commissão manifestasse por qualquer modo os seus trabalhos, as suas pesquizas, e as suas descobertas.

Agora para não passar da ordem para a materia abstenho-me de tomar neste momento mais tempo á Camara sobre esta questão, reservando-me porém, como já tenho dito, para continuar em occasião opportuna.

O Sr. Sequeira Pinto — Sr. Presidente, o Digno Par fez uma grave censura á administração do hospital de S. José, e foi menos exacto quando disse que havia um documento em que se mostrava não querer dar as suas contas ao Tribunal de Contas. O que aconteceu foi o seguinte: em 1856 fez aquelle Tribunal saber á administração que devia alli remetter as contas da sua gerencia, relativas a um certo numero de annos anteriores, de que me não recordo. A administração não se negou a isto, o que fez, sim, foi dirigir-se officialmente ao dito Tribunal, ponderando que pelo Decreto de Novembro de 1852, se a memoria me não falha, ficára commettida ao Conselho geral de beneficencia a tomada das ditas contas com relação a todos os estabelecimentos pios; e que sendo aquella disposição confirmada pelo Poder legislativo, era assim uma lei especial, posterior á lei geral que regia na materia sujeita, isto é, á que creou o Tribunal de Contas; pelo que, e porque já tinha cumprido, na parte que lhe tocava, esta disposição, enviando directamente ao Governo, pelo Ministerio do Reino, as suas contas, e depois por intermedio do Conselho geral de beneficencia, entendia aguardar a resolução do mesmo Governo, a quem havia representado sobre o assumpto, para a cumprir.

Ficando o negocio neste estado, a administração continuou a remetter as contas da sua gerencia ao Governo, por intervenção do Conselho geral de beneficencia; e irá indo assim em quanto lhe não fôr ordenado o contrario.

A respeito, finalmente, do cobrador do hospital, nada tenho a accrescentar depois do que disse o Digno Par o Sr. Visconde d'Algés.

Agora permitta o Sr. Marquez de Vallada que pondere que, se não tanto pelo que eu disse, como pelo testimunho dos Dignos Pares que fallaram na questão, e pela benevolencia com que a Camara em geral me escutou, o que muitissimo lhe agradeço, ficará convencido da pouca exactidão dos apontamentos que tomou para me arguir; sendo, certo que ao passo que não devo attribuir intenções obsequiosas da parte de S. Ex.ª nesta hypothese, sempre me fez obsequio dando-me uma occasião solemne de restabelecer fados de interesse publico, porque o credito ou descredito do hospital de S. José, a sua boa ou má organisação não podem ser indifferentes a ninguem, a menos que se não desprenda dos vinculos que ligam o sentimento humano á sorte dos desgraçados enfermos. * O Sr. Barão de Porto de Mos—Sr. Presidente, a questão está completamente acabada, e pelo que me toca, a conclusão do Sr. Marquez de Vallada, tirou-me a palavra. Eu queria oppôr-me á commissão de inquerito, mas S. Ex.ª retirou a sua proposta, e por consequencia sobre isso nada tenho que dizer. Mas chamado á auctoria pelo Sr. Sequeira Pinto, a respeito de uma visita que eu tive occasião de fazer ao hospital de S. José. em que elle se referiu á inspecção que eu fiz por occasião da minha visita nos livros da contabilidade daquelle estabelecimento, em obsequio á verdade devo dizer, que achei a escripturação realmente no melhor estado possivel. Tanto em aceio como em ordem observei quanto se póde observar em breves momentos; mas, em fim, os grandes traços, que é a que me refiro, agradaram-me.

Depois de visitar as enfermarias, que encontrei na melhor ordem e aceio, entrei na contadoria, e o Sr. Sequeira Pinto pediu-me, mesmo porque era membro, do Tribunal de Contas, que visse os livros, e no exame que fiz observei o que disse; e não faltava nenhum dos livros que a Lei manda que existam, e algumas partidas que vi escripturadas, e que examinei, estavam em boa ordem.

O Sr. Marquez de Vallada, referindo-se ao Tribunal de Contas, parece-me que alludiu a um documento que alli se passou, de que por parte do hospital de S. José se não tinham dado contas. E preciso entender este documento, que eu tomo como existente, só pelo facto de ser mencionado pelo Sr. Marquez de Vallada; mas pelo documento não se póde concluir, que o hospital de S. José não queira dar contas. O documento prova que o hospital não apresentou as suas contas. Desgraçadamente e por outros motivos diversos muitas contas deixam de se dar ao Tribunal, porque os responsaveis são remissos. (O Sr. Visconde de Algés—Apoiado.)

O Sr. Sequeira Pinto já disse o motivo que tinha para não enviar as contas, e bem se vê que não recusa fazel-o; mas duvida sobre o modo. Existem, é verdade, muitas duvidas em certas responsabilidades sobre os documentos com que devem instruir as suas contas. Faltam regulamentos; muitas repartições duvidam enviar os seus livros, que o Tribunal exige, como parece necessario para o exame; taes são as causas da falta de muitas contas, e creio que é esta a causa da falta das do hospital, não negando eu que muitas ha que por omissão se não apresentam. E não se admire a Camara disto que lhe digo; ainda que o Tribunal conta annos de existencia, póde comtudo considerar-se nascente em vista das difficuldades que existem sempre nesta ordem de cousas. O Tribunal de Contas da França, só depois de 26 annos póde existencia de funccionar regularmente, e sabe Deos as difficuldades com que ainda lucta ácerca das contas das municipalidades e estabelecimentos de beneficencia. Pelo que respeita á competencia não ha duvidas; a regra é que quando o rendimento das Camaras e estabelecimentos pios não chega a 2:000$000 réis, pertence aos Conselhos de districto tomar as contas, e quando chega ou excede a 2:000$000 réis, pertence ao Tribunal; sobre esse (ponto não ha duvidas, em que as ha é no que disse; as alfandegas teem algumas vezes duvidado do dever da remessa dos seus livros, o Tribunal julga necessario que elles se produzam para o exame; é pois necessario acabar com isto pelos regulamentos, cuja falta accusei. Estas são as duvidas, mas não me consta que se recusem dar contas ao Tribunal, e por tanto a este respeito tenho dado as minhas explicações.

Agora, quanto á nomeação da commissão de inquerito, repito, que o Digno Par fez bem em retirar a sua proposta. Eu não tenho nenhuma antipathia com as commissões de inquerito, só penso que se devem nomear com circumspecção, mesmo para não lhe enervar a força, penso mesmo que as commissões nomeadas devem saber quaes os objectos do seu inquerito; na questão sujeita qual seria o fim, era o facto da responsabilidade a favor do cofre do hospital; mas, como se disse, esse negocio está entregue ao podér judicial, quando o não estivesse deveria submetter-se-lhe, e é necessario aguardar a decisão desse podér independente, depois se houver motivo a Camara póde nomear a commissão.

Disse o Sr. Marquez de Vallada convindo com estas idéas, que a commissão poderia guardar segredo: não é para isso que ella seria nomeada, e para que o guardaria? Se era á espera da decisão, do podér judicial é escusado nomeal-a. Quando um negocio pende de um podér independente, aonde se acha competentemente, o que se póde fazer de melhor é deixal-o livre.

Estimo muito que o Digno Par retirasse a sua proposta, a commissão de inquerito não estaria realmente no caso de ser votada (apoiados).

O Sr. Silva Sanches— Sr. Presidente, eu tambem sou de opinião que, estando o negocio affecto ao Poder judicial, se deve esperar a sua decisão sem de modo algum a prevenir. Não entraria, por isso, na questão; mas, tendo o Digno Par o Sr. Sequeira Pinto alludido ao facto que teve logar, quando eu tinha a honra de ser Ministro do Reino, não posso deixar de confirmar aquillo que elle disse.

É facto que recebi uma requisição do Governador civil da ilha da Madeira, para lhe serem remettidas 400 ou 600 camas completas: não sei agora qual destas cifras foi; 200 saccas de arroz, uma quantidade immensa de sanguesugas, muito grande importancia de medicamentos proprios para o tractamento da cholera-morbus, e mais dinheiro além do que já se lhe tinha remettido, pedindo-me com particularidade que remettesse o dinheiro em especie.

Eu obtive os enxergões do Ministerio da Guerra, e encarreguei o ilustre Enfermeiro-mór do arranjo da roupa para as camas, da compra do» arroz, das sanguesugas e dos diversos medicamentos. Quarenta e oito horas depois de receber esta requisição saíu um vapôr do Estado, levando a requisição totalmente satisfeita.

Mas, ainda não foi só isto, porque tambem se requisitaram medicos, cirurgiões e enfermeiros, e pelo hospital de S. José me foi igualmente facultado um habil facultativo, que prestou importantissimos serviços naquella ilha (apoiados).

Pouco depois recebi outra requisição para mais medicamentos, e varios objectos. Ainda tornei a encarregar o ilustre Enfermeiro-mór da compra destes objectos e medicamentos; e ainda quarenta e oito horas depois saíu o navio levando tudo quanto se me tinha novamente requisitado.

Talvez que a roupa para tão grande numero de camas fosse o mais difficil de apromptar; e, todavia, apromptou-se tudo neste curtíssimo espaço de tempo: o que de certo prova grande actividade e zêlo. *

E da grande actividade e muito zêlo do Digno Par dou eu ainda testimunho pelo que lhe vi constantemente praticar durante a terrivel epidemia da cólera morbus. Se de um dia para outro era necessario montar-se mais um hospital, era logo montado.

Direi mais, que apresentando-me uma occasião no hospital de S. José, sem a ninguem ter previnido a minha ida, e tanto que nessa occasião nem lá estava o Sr. Sequeira Pinto, que appareceu algum tempo depois, e principiando pelo exame da escripturação, a achei em dia e tão regular, quanto eu o poude então comprehender. Passando depois a examinar tudo o mais daquelle estabelecimento, retirei-me não só satisfeito, mas até satisfeitissimo, como particular, e na minha qualidade de Ministro, pela boa ordem e acceio em que estava tudo. Não posso, portanto, deixar de aproveitar esta occasião para dar ao Digno Par um testimunho publico de que o seu bom zêlo póde ser igualado, mas que me parece não poderá ser excedido (apoiados).

O Sr. Presidente—Vão lêr-se dois officios que vieram agora da outra Camara.

Leram-se. O primeiro a proposição de Lei sobre o Governo ser auctorisado a contractar um emprestimo até á quantia de 1.800:000$000 réis, sendo applicados 1.000:000$000 réis a obras de estradas do reino e ilhas, e os restantes 800:000$000 réis, a diversas obras para melhoramento da salubridade da cidade de Lisboa.

Enviou-se á commissão de fazenda.

O segundo enviava outra proposição de Lei, sobre ser prorogada para o anno economico de 1858 a 1859, a auctorisação concedida ao Governo pelo Carta de Lei de 5 de Junho de 4857, para applicar á provinda de Moçambique o subsidio mensal de 5:500$000 réis.

Para a commissão do Ultramar.

O Sr. Presidente—Não sei se a Camara quererá progredir nesta questão: todavia ainda está inscripto o Sr. Marquez de Vallada.

O Sr. Marquez de Vallada—São poucas palavras, parece-me que o Sr. Silva Sanches não pediu a palavra para me responder, porque ninguem contestou o que S. Ex.ª disse, nem de certo ninguem veiu aqui fazer uma censura ao Sr. Sequeira Pinto, e ninguem duvidou que durante a epidemia da febre amarella S. Ex.ª se não houve como administrador digno e zeloso.

Agora o que eu não posso deixar passar é uma asserção do Sr. Silva Sanches. S. Ex.ª no ardor do seu enthusiasmo, e da verdade, não parou? diante da asserção que fez para provar que o Sr. Sequeira Pinto era um empregado activo e probo, e foi mais ávante. Disse que visitara o hospital de S. José, não só como homem particular, mas como Ministro (parece-me que foram estas as suas expressões), e ficou altamente satisfeito com a cantabilidade e boa ordem daquelle estabelecimento.

O Sr. Silva Sanches—Perdoe V. Ex.ª Quando eu fallei na escripturação disse que a achei eíndia etão regular quanto eu podia comprehender que ella estava, e que passando depois a examinar as enfermarias e o resto do hospital achei tambem tudo mais em muito bom estado, e que me retirei não só satisfeito, mas satisfeitissimo do modo como achei tudo.

O Sr. Marquez de Vallada — Bem, o que S. Ex.ª podia vêr nessa rapida visita era que áquella escripturação estava feita com aceio; isso podia logo conhecer o Sr. Silva Sanches, ou qualquer de nós; mas conhecer de relance se uma escripturação está regular, sem defeito, nem cousa que duvida faça, isso não é possivel. Não se póde, não se deve entender, que S. Ex.ª dissesse neste ultimo sentido que tinha ficado contente com o seu relancear de olhos por sobre áquella escripturação.

Não vejo agora presente o Digno Par o Sr. Visconde de Algés, ao qual desejava tambem dirigir a respectiva resposta; mas apesar disso, sem me deter muito, direi sempre o que se torna indispensavel; vem a ser, que S. Ex.ª sabe de certo — por ser bastante entendido, homem de grande proficiencia em todas as materias, e que tem a gloria de as tractar sempre muito bem — que para qualquer emprego de responsabilidade se exige certidão de corrente com a fazenda. Não se devia surprehender do que eu disse. Eu é que devo surprehender-me da admiração do meu amigo; e de quem confesso que o sou ha muito; e tenho razão, segundo me parece, para me surprehender.

Disse o Sr. Silva Sanches, e tambem o Sr. Visconde de Algés e o Sr. Aguiar, que sendo isto um negocio affecto aos tribunaes seria conveniente não lhe dar aqui andamento. É necessario tomar nota de que eu apenas toquei por incidente outro dia nesta questão, e hoje o Sr. Sequeira Pinto, que então não estava presente, pediu explicações do que eu antecedentemente dissera. Sempre estou prompto a dal-as; porém não fui quem encetou hoje esta questão, nem se apresentou

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proposta em que eu tomasse iniciativa a tal respeito; visto porém que ella voltou á télla não posso dispensar-me de a seguir dando passos prudentes, não me precipitando no progresso rapido, porque delle não gosto, especialmente em materias destas. Limitar-me-hei portanto a indicar uma commissão de inquerito, reservando-me o direito de cumprir com os deveres de consciencia sobre este caso em occasião opportuna.

Agora direi tambem que estimo fosse presente o Sr. Ministro da Fazenda a esta discussão, pois estou certo de que S. Ex.ª no interesse publico, sendo um homem de grande intelligencia e alcance, não deixará passar desapercebidamente algumas asserções apresentadas pelos Srs. Sequeira Pinto e Barão de Porto de Moz, relativamente ás contas do Hospital Nacional e Real de S. José. pois o Sr. Barão de Porto de Moz, chamado á autoria, disse o que todos ouvimos sobre as contas ante o tribunal onde se devem dar. S. Ex.ª disse não contestar a existencia da certidão em que fallei! Embora eu a não tenha no meu bolso, segundo a fé de que existe, se fôr necessario me comprometterei a apresental-a; assim como quando ensejo se offereça poderei tambem exhibir os documentos que tem em geral relação com esta questão, pois que affecta, como está, aos tribunaes, posso delles extrahir as certidões de que carecer. Não sabemos, verdade é, qual será o resultado; mas qualquer que seja, para desaggravar a justiça, eu, tomando parte nesta questão, reservo-me o direito de fazer presentes esses documentos; e seguindo o conselho tão precatado, como prudente, dos Dignos Pares os Srs. Visconde d'Algés e Silva Sanches — mesmo para mostrar que prefiro caminhar a passos lentos, pois só gosto do progresso rapido em caminhos de ferro — procederei com a devida circumspecção neste assumpto; não abrindo com tudo mão delle, e compromettendo-me a colher os esclarecimentos necessarios ao objecto de que me constitui advogado officioso, e nada mais.

Com estas observações tenho pois terminado a minha resposta, lamentando sempre não estivesse a ella presente o Sr. Visconde d'Algés, a quem agradeço a cortezia com que me tractou, bem como á Camara a benevolencia com que me escutou.

O Sr. Presidente—Pelo Ministerio do Reino foi communicado á Mesa que no dia 31 do corrente haverá recepção em grande galla no Real Paço das Necessidades; em consequencia está nomeada a deputação do estylo, e será composta pela maneira que o Sr. Secretario vai dar conta.

Leram-se os nomes dos Dignos Pares que deviam compor a deputação, e que vinham a ser

Os. Ex.mos Srs.:

Visconde de Laborim, vice-Presidente

Conde de Mello, Secretario

Conde de Peniche, idem

Sequeira Pinto

Felix Pereira de Magalhães

Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão

Francisco Simões Margiochi

Joaquim Antonio de Aguiar

Joaquim Larcher

Julio Gomes da Silva Sanches

Luiz do Rego da Fonseca Magalhães

Duque da Terceira

Marquez de Ficalho.

O Sr. Conde da Ponte leu um parecer da commissão de administração publica.

O Sr. Presidente—O Digno Par Marquez de Ponte de Lima acha-se anojado em consequencia do fallecimento do Digno Par Marquez de Castello Melhor; na conformidade do estyllo manda-se desanojar por um dos Srs. Secretarios.

Como não se apresentam hoje mais pareceres será conveniente que ámanhã haja sessão, a vêr se reunidas as commissões antes disso podem apresentar alguns trabalhos, ou pelo menos adiantal-os quanto possivel.

O Sr. Visconde de Ourem — Na commissão de marinha e ultramar não ha trabalhos a preparar.

O Sr. Presidente—Eu não argui essa nem qualquer outra commissão, fiz em geral a advertencia para regular o andamento dos trabalhos da Camara.

O Sr. Aguiar — Se V. Ex.ª permitte observarei que segundo me parece havendo sessão ámanhã não temos que discutir, mas se ella ficar para mais tarde poderá haver alguma cousa impressa e distribuida que sirva de occupar a nossa attenção na reunião seguinte.

O Sr. Presidente — Eu dava sessão para ámanhã porque assim era mais certa a reunião das commissões.

Vozes — Pôde não haver numero para a sessão por não haver que discutir.

O Sr. Presidente — Segundo a manifestação da Camara ficará a seguinte sessão para segunda-feira (apoiados).

Está levantada a sessão de hoje.

Eram quatro horas e meia da tarde.

Relação dos Dignos Pares presentes na sessão do dia *8 de Julho de 1*58.

Os Srs.: Visconde de Laborim; Marquezes: de Ficalho, das Minas, de Niza, e de Vallada; Arcebispo de Braga; Condes: d'Alva, do Bomfim, de Linhares, da Louzã, da Ponte, da Ponte de Santa Maria, e do Sobral; Viscondes: d'Algés, d'Athoguia, de Benagazil, da Borralha, de Castro, de Fonte Arcada, da Granja, de Ovar, de Sá da Bandeira, e de Ourem; Barões: de Chancelleiros, de Pernes, de Porto de Moz, e da Vargem da Ordem; D. Antonio José de Mello, Sequeira Pinto, Ferrão, Aguiar, Larcher, Isidoro Guedes, Julio Gomes, e Brito do Rio.

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