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CAMARA DOSDIGNOS PARES

SESSÃO DE 15 DE JULHO DE 18G1

PRESIDÊNCIA DO EX.™ SR. VISCONDE DE LADORIM VICE-PRESIDENTE

Secretários: os dignos paHíxTd^ Brito do K;o

(Assistiram os' srs. presiãente ão conselho, e ministros ãa guerra e marinha).

Depois das duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 28 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da sessão antecedente contra a qual não houve relamação.

O sr. Secretario (Conãe ãe Mtllo)\:—Deu conta do seguinte expediente:

Tres officios do ministério do reino: 1.°, satisfazendo a uma parte do requerimento do digno par visconde de Fonte Arcada, feito em sessão de 28 de junho ultimo, relativo ás contribuições- directas e indirectas que se pagam a diversas camaras municipaes; 2.°, satisfazendo o requerimento do digno par marquez de Vallada, relativo á pesquiza feita na typographia universal; e 3.*, enviando, para se distribuírem pelos dignos pares, oitenta exemplares das consultas das juntas geraes do anno de 1859.

Tiveram o ãevião ãestino.

Osr. Marquez ãe Vallaãa:—Deseja ser informado do andamento que teve uma proposta por elle apresentada nos fins da sessão passada para a organisação da repartição ta-chygraphica d'esta camará, e que se resolvessem alguns requerimentos de diversos empregados d'esta camará, no que foi poderosamente coadjuvado pelos dignos pares os srs. visconde de Algés e conde de Thomar, e crê que ainda outros.

O nobre orador mostrou quanto era urgente proceder-se a essa reforma, e para melhor o fazer sentir lembrou que na occasião em que fez a sua proposta, se apresentou como uma das victimas das notas tachygraphicas, E não é para estranhar que assim seja, não só por ser mui restricto o quadro, mas-porque mesmo por isso, quando algum adoece, e o orador crê que alguns se acham doentes desde a sessão passada, recáe todo o trabalho sobre um pessoal diminutissi-mo. Em presença d'este estado de cousas, conta o orador que o sr. presidente, cuja actividade e intelligencia lhe são bem conhecidas, terá applicado a sua mais particular attenção a este assumpto; e por isso pede a s. ex.a algumas informações sobre o que a tal respeito julgou dever fazer, e espe-ra-as de sua benevolência.

Disse que aproveitava esta occasião para mandar para a mesa um requerimento, ou antes augmentar algumas cousas que já tinha feito n'uma das sessões passadas, pedindo a remessa dos documentos que tem relação com um negocio de contrabando na alfandega do Porto, a fim de que venha também um mappa dos rendimentos da mesma alfandega do Porto, desde o anno* de 1843 para cá. E diri-gindo-se ao sr. ministro da justiça, pediu a s. ex.a que se não esquecesse de remetter, quando seja possivel, os papeis que igualmente pediu sobre a estatistica criminal...

O sr. Ministro ãa Justiça (Moraes ãe Carvalho):—V. ex.a dá-me licença? Devo dizer ao digno par que se acham feitas as estatísticas de dez annos e já ha bastante tempo que as mandei começar; como porém v. ex.a pede as que ha desde 1833 para cá, as quaes ainda se não acham prom-ptas, nem se podem apromptar com brevidade, eu peço a v. ex.a a bondade de esperar mais algum tempo, na certeza de que darei as ordens convenientes para que os desejos de v. ex.a sejam satisfeitos.

O sr. Marquez ãe Vallaãa:—N'esse caso pede a s. ex.* que dê as suas ordens para serem desde já remettidas á camará áquellas que se acham promptas. Não pôde prescindir de modo algum d'estes documentos, porque deseja fazer vários estudos, sobre o importante negocio das prisões: entretanto se o sr. ministro não as poder mandar todas tão depressa como o orador muito desejaria... não pôde exigir impossiveis.

Manda o requerimento para a mesa. (Leu-o).

Leu-se na mesa o seguinte requerimento.

«Requeiro que sejam enviados a esta camará os mappas do rendimento da alfandega do Porto desde o anno de 1833 inclusive até 1860.inclusive.

Camara dos pares, 15 de julho de 1861.=0 par do reino, Marquez ãe Vallaãa.»

Foi approvaão. '

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O sr. Conde do Bomfim: — Sr. presidente, aproveito a occasião de se achar presente o sr. ministro das obras publicas, para dizer que desejaria que s. ex.a fosse convidado a declarar ou a dar explicações ás seguintes preguntas, no caso de estar para isso habilitado, quando não, manda-las-hei por escripto para a mesa. São estás as perguntas:

1. a A companhia união mercantil devia ter, no dia 3 d'es-te mez, segundo o contrato de 3 de abril, um segundo vapor para o Algarve, sob pena de lhe ser rescindido o contrato n'esta parte. Desejo saber se já tem o vapor, como se chama, e não o tendo, se já lhe foi rescindido o contrato na forma da lei.

2. a Desejo, igualmente saber, o motivo porque faltou a sair o vapor, no mez de maio para a Africa, que multa teve por não sair.

Se s. ex.a não está habilitado procurarei outra occasião para fazer as minhas perguntas.

Eu receiava que se não podesse verificar o que havia sidp approvado por esta camará. É preciso que nas carreiras de vapores, haja dias marcados para as suas saidas. É possivel que por qualquer inconveniente elles possam sair mais tarde alguns dias, mas não que esses dias se estendam a um mez: isso causa ao commercio um damno considerável.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Velloso de Horta):— Não estava prevenido para este assumpto, e por isso não pôde dar ao digno par os esclarecimentos que deseja, mes-.mo porque não tem presentes os documentos precisos. Portanto noutra occasião poderá satisfazer detalhadamente ás perguntas de s. ex.a No entanto diz desde já ao digno par, que se os vapores têem deixado de sair alguma vez no tempo devido, e se não tem sido applicada multa á companhia, é porque esta tem provado que não poude cumprir aquillo a que se obrigara, ou porque assim o pedia o serviço do estado, ou finalmente por qualquer outro motivo plausível. N'outra occasião se explicará mais circumstanciada-mente, como disse.

ORDEM DO DIA

DISCUSSÃO NA GENERALIDADE E NA ESPECIALIDADE DO projecto DE RESPOSTA AO DISCURSO DO THRONO

O sr. J. Â. de Aguiar: — Considerando a resposta ao discurso da coroa como um mero acto de cortezia, um puro cumprimento, sem indicar approvação ou reprovação da politica do ministério e de seus actos governativos, não teria duvida em approva-la, porque entende que em nenhum dos seus paragraphos a camará se compromette a approvar ou a reprovar a politica ministerial. Não pôde todavia deixar de aproveitar esta occasião para consignar a sua opinião sobre pontos importantes em relação aos actos do governo, bem como para fazer algumas breves reflexões.

Disse que n'uma das sessões de julho de 1860 o sr. presidente do conselho, fazendo communicação á camará dos srs. deputados da nova organisação do ministério, manifestou a esperança de que a camará, pela sua sensatez, havia de dar ao governo um apoio leal e franco. Modo novo e insólito de captar a benevolência da camará! O sr. presidente do conselho não fundamentava a sua esperança na resolução em que estivesse de desempenhar a promessa de promover por todos os meios o melhoramento das finanças do paiz, de satisfazer ás necessidades publicas" com a maior economia, e de observar a mais ampla (próprias palavras do sr. presidente do conselho) tolerância, tanto na distribuição das graças como no provimento dos empregos e na remuneração dos serviços. Não foi na consciência de que havia de faze-lo; não foi na illustração da camará nem tão pouco na sua dedicação pelo interesse do paiz* que s. ex.a fundamentou a sua esperança. S. ex.a convidou a camará a apoiar o ministério, e contou com esse apoio no interesse da mesma camará, quer dizer, se não quizer, negando-o, passar por insensata, e expor-se ás consequências da sua insensatez. A camará não correspondeu ás esperanças do sr. presidente do conselho; commetteu a insensatez de deixar de approvar uma medida proposta pelo governo.

A consequência d'este seu acto era a dissolução, a camará foi dissolvida. Não lhe faleu nem o zelo, nem a assiduidade, nem a diligencia com que se occupou da resolução dos mais importantes pontos da governação publica, não lhe valeu ter dado á historia parlamentar uma das suas mais brilhantes paginas,s como se disse no discurso que a coroa pronunciou do alto do throno, nada d'isto lhe valeu, nem podia valerlhe, porque uma camará insensata não podia exercer funcções legislativas.

A camará foi dissolvida, mas o orador não sabe onde estava a insensatez, não se atreve a dizer se não seria antes a proposta apresentada pelo ministério que era insensata. Foi ella apresentada por um dos srs. ministros que não está presente, pelo qual tem o orador muita consideração, o que não é rasão para deixar de dizer que a reputa mal pensada. Que motivo podia haver para levar á camará uma tal medida? e'leva-la um governo que não havia muito ainda tinha feito dizer ao chefe do estado, do alto do throno, que a camará não poderá, quando foi chamada a discutir o orçamento, discuti-lo com toda a amplitude, como tinha manifestado vehementes desejos de o fazer, e desempenhar assim uma das primeiras obrigações politicas, se não a primeira, da representação nacional. Ha/ia porventura risco de que o governo ficasse sem a auctorisação precisa para poder cobrar os impostos e rendimentos públicos, e para satisfazer ás despezas do estado? Não restavam ainda muitos mezes para findar o anno económico? Foi esta medida proposta por um governo, no qual tomam parte cavalheiros, que tendo-se opposto ás medidas financeiras apresentadas pela administração transacta, haviam declarado, ou que o povo não podia pagar mais, ou se podia, não devia faze-lo, sem se justificarem esses novos sacrifícios, sem se verificar se effectivamente eram necessários, sem se fazerem as economias que os illustres cavalheiros então mem-

bros do corpo legislativo diziam poderem fazer-se no orçamento. Seria esta circumstancia que deu causa a tal medida? Custalhe a cre-lo, e ainda lhe custa mais a crer que a dissolução fosse o resultado de uma votação que não foi senão o reconhecimento de uma das primeiras garantias das camarás collegislativas. Qual seria porém a rasão da medida?

O orador já ouviu dizer que.a proposta tinha sido de um alcance politico, tinha sido a pedra de toque para avaliar as relações entre a camará e o governo; mas não pôde cre-lo; não-acredita que o governo para experimentar se tinha ou não o apoio na camará electiva fosse apresentar uma medida que lhe não era possivel approvar sem postergar um dever fundado na carta constitucional, e que é a primeira garantia da existência do governo constitucional. Mas ainda podia ser outra a rasão da medida: a resistência aberta que se fez na outra camará e n'esta á portaria de 5 de março sobre as irmãs da caridade, resistência que levou o governo a aconselhar a dissolução e a appellação para a opinião publica que era favorável e não contraria a idéa do governo.

Esta foi a ultima rasão que se deu n'um dos corpos co-legislativos. Mas, o orador,- appella para o sr. presidente, que quando se tratou esta questão estava sentado n'essa cadeira, que como os dignos pares que assistiram a essa sessão, podem dar testemunho de que resistência aberta não a houve n'esta casa;-houve sim dicussão, e apresentaram-se varias opiniões, comquanto as não podessem emittir todos os pares porque uma parte delles não tiveram occasião de as apresentar, impedindo a dissolução da camará dos senhores deputados que esta se pronunciasse; pelo que ainda está persuadido, o orador, que a medida tomada pelo governo não acharia n'esta casa essa resistência que suppunha encontraria n'ella. O que porém succederia na outra casa do parlamento não o sabe, ou pelo menos não o pôde affian-çar, com o mesmo conhecimento de causa. O que a idéa lhe recorda ó que aquelle negocio não passou de ir a uma commissão, e que esta não chegou a dar parecer.

Como é pois, em vista d'isto, que se pôde dizer que havia necessidade de appellar para o paiz com relação a uma camará que tantos serviços lhe tinha feito, serviços reconhecidos pelo governo e até pelo monarcha nas palavras que lhe dirigiu do alto do throno?! Como é que se pôde dizer, que foi a rasão dada pelos srs. ministros, a verdadeira causa da dissolução da camará dos srs. deputados? Por isso entende que pôde chamar aquelle acto injustificável. Ter-se-ía porventura verificado algum dos casos em que um alto interesse publico pedisse a dissolução~da camará dos srs. deputados? Certamente não. (O sr. Marquez de Vallada: — Apoiado.) Antes de tudo declara e pede que não se entenda que deixa de ter o maior respeito e acatamento pelo chefe do estado, no exercicio das suas attribuições constitucionaes; o que não deve impedir que se aprecie esse acto em relação aos srs. ministros, porque o ministério na presença de uma crise que existiu, ou que elle imaginou, tanto podia dar a sua demissão, como apresentar ao chefe do estado a dissolução da camará. O ministério porém decidiu-a antes pela dissolução, e foi esse expediente o que aconselhou ao chefe do estado! Vê-se portanto que os srs. ministros não podem deixar de ter a responsabilidade que lhes cabe pelo conselho que deram ao monarchai E porque votaria o orador contra a dissolução da camará dos srs. deputados? Porque previu os inconvenientes que appareceriam se tal facto viesse a verificar-se; e um d'esses inconvenientes era que os agentes do governo haviam de empregar necessariamente todos os meios, recorrer a todas as violências para vencerem as eleições. E comquanto não esteja disposto a acreditar tudo quanto referem os jornaes, não obstante ha certos factos que assentam em fundamentos comprovados por documentos incontestáveis, e n'esses não pôde deixar de crer.

Outra má consequência havia de seguir-se da dissolução, supposto dever-se esperar que se não seguiria: e diz que não se devia esperar, porque n'aquella mesma sessão de que ha pouco fallou, o sr. presidente do conselho tinha declarado que seria observada a máxima tolerância. Enganaram-se porém aquelles que confiaram n'essa promessa: e muito lamenta o ver que se tornam a renovar as más praticas d'esses tempos de perturbação e de desordem, que deviam ter passado para nunca mais voltar.

Quer-se ver o que vale a promettida tolerância, e qual é a do sr. presidente do conselho? Dois deputados, dois homens de intelligencia, que tiveram a audácia de votar contra essa medida proposta n aquella camará pelos srs. ministros; e ainda mais, porque tiveram depois a audácia de se apresentarem como candidatos a deputados para a nova eleição a que ía proceder-se, foram por isso destituidos dos empregos que exerciam! Veja a camará se n'este procedimento não houve uma grande violação dos principios do systema representativo? Pois alei constitucional e a lei eleitoral admittem nas camarás os empregados, ainda mesmo de confiança, e será compativel com isto que o governo no caso de que elles votem conforme a sua consciência, e conforme entendem ser do interesse do seu paiz, possa destitui-los? Isto não se pôde imaginar; porque se podesse ima-ginar-se, seria reconhecer ao governo o direito de destruir a constituição do estado, e de passar o poder legislativo das camarás, com a saneção do chefe do estado, para os srs. ministros.

Mas ha mais. Se um foi demittido, porque a esse acto se pôde chamar uma demisssão, de uma funeção de que podia sê-lo, o outro foi demittido de um logar de que não podia ser demittido senão nos casos designados na lei; refere-se ao director geral da instrucção publica: mas era preciso puni-lo pelo voto que deu, era preciso desvia-lo da urna, era preciso ainda mais: miserável engano! era preciso offen-

der uma corporação cuja maioria se apresentou a favor d'este distincto empregado (O sr. Marquez de Vallada: — Apoiado); e não houve nada que se oppozesse á satisfação desta... não sabe se lhe chame vingança. O director geral da instrucção publica não podia ser demittido por arbitrio do governo: ó isso bem expresso no decreto de 8 de setembro de 1859, que o considera entre ps empregados do quadro da secretaria do reino, tanto para os vencimentos, como para todos os effeitos enumerados no titulo em que se trata das nomeações, aposentações, suspensões e demissões de todos os empregados d'aquella repartição. Foi portanto uma grave violação da lei. Elle não podia ser demittido senão nos casos expressos na lei, quer dizer, pronuncia definitiva em certos e determinados crimes, condemnação por alguns outros, e impedimento physico ou moral. Só se o sr. presidente do conselho assim como julgou a camará insensata por não lhe prestar o seu apoio, julgou também insensato o deputado por não votar com o governo: e isso é lógico. .

Outra causa da demissão é o abueo de confiança no exercicio das funcções do seu emprego; mas devidamente provado. Haverá abuso de confiança no exercicio das funcções do director geral da instrucção publica pelo voto que elle deu na camará contra uma proposta do governo? Pois elle não tinha recebido uma procuração, como todos os outros deputados, para votar segundo a sua consciência e os interesses do paiz que representava? E a lei ainda exige mais, mesmo no caso de abuso de confiança, devidamente provado, quer que seja ouvido o aceusado. Temos pois outra solemnidade a que se faltou. O que é doloroso dizer é que d'estes factos ha muitos. Ainda não ha muito tempo que se acabou de praticar outro que realmente é uma iniquidade. Mas a arma que o sr. presidente doconselho quiz descarregar contra a camará municipal de Coimbra,- ainda bem, que resvalou e foi ferir a s. ex.a o sr. presidente do conselho. A camará de Coimbra tem um grande peccado, o seu presidente também concorreu para a eleição do sr. José Maria de Abreu. Por isso em primeiro logar foi altamente reprehendida aquella camará municipal pela demora na remessa do orçamento, e hoje viu n'um papel official que a culpa tinha sido não só da camará, mas também do governo civil, não obstante foi esse governo civil o encarregado de estranhar este procedimento. Fortissimo motivo devia haver, e não podia ser senão muito justo, para que assim se procedesse, porque o sr. marquez de Loulé sabe por experiência própria que muitas vezes se falta a esta obrigação no termo prefixo, s. ex.a sabe muito bem que tem demorado vários orçamentos por annos na sua secretaria: não era portanto muito para admirar que a camará municipal de Coimbra demorasse os seus orçamentos por algum tempo. Fez mais s. ex.a, estranhou á camará o ter incluído no seu orçamento uma imposição, que está reprovada e não pôde ser admittida pelo código administrativo, qual é a dos carros. Entretanto o sr. marquez de Loulé, se tivesse reparado, havia ver que essa imposição fora estabelecida por uma provisão de 1802, poderá dizer-se que caducou pela publicação do código administrativo? S. ex.a devia saber que por uma lei de 1856 foi esta camará municipal auctorisada para hypothecar a imposição dos carros a um empréstimo, e por consequência estava restabelecida por aquella lei, e devia saber mais, que tendo se dado em penhor esse rendimento não podia assim destruir a hypotheca que tinha sido estabelecida com a confiança que dava a lei. Será a camará de Coimbra a única que tem d'estas imposições? Ha outras, por exemplo a do Porto, e entretanto s. ex.a approvou os orçamentos das camarás que têem iguaes imposições, e rejeitou o d'esta! São muitos os factos que ha com que podia provar a sua proposição de que receiava-se das consequências da dissolução da camará, ainda que alguns d'elle3 nasceram antes, porque nasceram da votação; mas não pôde referi-los aqui, porque seria abusar muito da paciência da camará, e da sua sensatez.

Disse que ha um negocio, a respeito do qual deve dizer algumas palavras, porque já foram contrariadas por alguém do governo as suas opiniões a este respeito. Quando o orador viu (já n'outra occasião o disse aqui) condecorado com uma gran-cruz o nosso ministro em Roma, entendeu que algum negocio pendente da cúria romana tinha sido resolvido a contentamento e satisfação do governo e sem offensa das prerogativas e dignidade da coroa, porque só assim podia justificar-se uma mercê tão subida; sente comtudo ter de confessar que se enganou. Viu que achando-se proposto um digno ecclesiastico, hoje membro d'esta câmara, para o arcebispado de Goa, a corte de Roma se recusara a re-conhece-lo, com o fundamente de que, não pela concordata, mas por uma certa nota que não fazia parte do convénio, se tinha compromettido o governo portuguez a não fazer a primeira nomeação dos prelados para as dioceses do ultramar, sem o communicar oficiosamente a sua santidade. Quando o orador entrou no ministério o negocio estava 1 n'este estado. Não é segredo esta questão, que deve ser do dominio publico, e que o governo já fez tal, porque deu nova nomeação a este prelado. Entendeu-se que a nota de um governo, em que todos 03 tratados dependem da approvação do corpo legislativo, não podia ter valor algum por que nos tratados só se devia executar aquillo que estava incluído n'elles e na lei que os ratifica, do que tira por consequência que, não fazendo esse tratado nenhuma referencia a essa nota, nem tendo o corpo legislativo cogitado da sua approvação, visto que do contrario faria expressa menção de que a approvava, o que era tanto mais necesserio quanto é certo que essa restricção do direito amplo de nomear para os bispados do reino e do ultramar sem dependência de consultar a cúria romana, era contraria ás regalias da coroa; devia o governo responder que essa nota invocada não podia ser tomada em consideração por não fa-

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zer objecto de tratado approvado pelo corpo legislativo; e portanto devia considerar-se, nem podia deixar de se-lo, como um acto sem valor que não ligava o governo.

Comtudo ouviu que assim não foi, e que se deu como causa para assim não ser, e ter-se feito d'essa nota menção n'esta camará; mas essa circumstancia não altera a essência- da cousa, deixa portanto em toda a sua força o argumento do orador, que tem um profundo pesar em ser obrigado a dizer que lamenta que o seu antigo amigo e collega, 0 sr. ministro dos-negócios estrangeiros, deu rasão ácorte de Roma. E o que se obteve com isso? Seria muito o que só se conseguiu a custa de sacrifícios (porque é preciso saber-se que todos estes exemplos são sempre tomados em consideração, e ficam registados na lembrança da ouria romana para poderem ser allegados a todo o tempo)? Não se conseguiu nada. Mas,' diz-se, o que havia de fazer se? O que se fez, > e não em tempos constitucionaes, em que poderia allegar-se que era obra do espirito irreligioso, próprio d'estes tempos. O que.se devia fazer era antes de tudo salvar a dignidade da nação e da coroa, e o exercicio dos direitos mages-taticos, que não foram nunca disputados: devia fazer-se o que se fez por aviso de 30 de julho de 1816, assignado pelo marquez de Aguiar (leu).

Neste documento não se estabeleceu doutrina nova; é a disciplina dos primeiros séculos da igreja, que deve existir sempre que o pontífice romano, ou não possa, ou não queira, conceder a confirmação dos bispos: pois quando a necessidade exige a sagração de um bispo, cumpre que ella se possa fazer sem dependência da confirmação pontifícia. Aqui está o que se devia fazer ^ é esta a doutrina referida e sustentada pelos escriptores mais orthodoxos. Quando a cúria romana recusou confirmar os bispos nomeados por D. João IV, consultaram-se todas as universidades e corporações de theologos, e todas responderam n'este sentido, porque este era o meio de assegurar as prerogativas do padroado, e a ssberania temporal.

Ha outro negocio pendente em Roma; o do breve para a desamortisação dos bens dos conventos das religiosas. O orador repete outra vez, que sempre entendeu que não só não era necessário, e n'isto concordou o governo, mas que também não era conveniente pedi-lo, comtudo, uma vez que se solicitou, desejaria saber se tem havido repugnância em concede-lo; que rasões se têem dado; n'uma palavra, o que ha a este respeito. Não sabe que isto 6eja um segredo d'estado para deixarem de dar-se-lhe as informações que pede. Também insiste em saber se o governo está sempre decidido a executar a lei, independente do breve. N'outra occasião em que fallou aqui n'isto, respondeu-lhe o sr. ministro da justiça que sim; o orador pediu que lançasse esta declaração na acta, se não se lançou então, pede que se lance agora.

Não quer o orador fazer uma forte arguição ao governo pelo que se está passando a respeito do recrutamento; mas è realmente lamentável que, estando estabelecidas pela lei as regras, segundo as quaes se deve proceder á distribuição d'esta grande, d'esta pesadíssima contribuição de sangue, se não observem, e que os moços vão recrutados a cordel. Bem conhece que no nosso paiz é muito difficil conseguir o contrario; mas entretanto também é possivel que isto nasça em muita parte de algumas provisões das leis actuaes que devem ser modificadas, e a isso é que vae re-ferir-se.

Parece-lhe que o anno passado, apresentando-se na outra camará um parecer da respectiva commissão com as alterações e as emendas que julgou deverem fazer-se nas leis de 1855 e 1859, o sr. presidente do conselho pediu á camará que adiasse este negocio por seis ou sete dias, por que achava no projecto da commissão algumas disposições que entendia não serem convenientes. O orador ignora se esta promessa»e compromettimento de apresentar um trabalho que-o goverrio tinha feito se realisou; não sabe se esse trabalho já se apresentou, o que sabe é que ainda n'uma destas ultimas sessões se apresentaram differentes projectos na camará dos srs. deputados, e foram enviados a uma commissão ; e crê que não seriam apresentados se o governo tivesse offerecido aquelle trabalho.

Não censura, mas pede ao governo que tome e3te negocio na maior consideração, porque elle, orador, está sendo testemunha das violências que se praticam^ e apesar d'isso o exercito está n'um estado deplorável, que é impossivel que possa manter a segurança interna do paiz que lhe é confiada, e o possa fazer só (apoiados).

Também não sabe como grandes sommas, que resultam das substituições dos recrutados, não se applicam ao fim a que são destinadas; isto não se pôde justificar, e da sua não •applicação ha de resultar que muitos que não são obrigados a servir, tenham de ser obrigados a pagar este tributo de sangue.

O ministério deu um passo que não se atreve também a censurar o de ter dado as baixas aos soldados que estavam nos corpos que tinham terminado o tempo da lei, e que realmente era de justiça dar-lhas: mas também é necessário promover o recrutamento: e se ha meio de p conseguir por uma lei, faça-se, porque o estado não pôde padecer por falta de forças que o sustentem.

Disse que tinha uma grande sympathia pelo sr. ministro das obras publicas, e sente por isso dever estranhar um acto de s. ex.* que manifesta pouco respeito á constituição do paiz e aos corpos legislativos. S. ex.a, sem auctorisação legal, exerceu o poder legislativo, creando differentes inspectores de obras publicas, e estabelecendo-lhes pingues ordenados. Esta medida foi devidamente apreciada, e o governo teve de apresenta-la ás cortes como proposta de lei, quando tinha sido publicada para se executar desde logo. Já era muito ter violado a constituição do paiz, mas depois que s. ex.a foi advertido de que fizera essa violação,

presistir n'ella é que o orador não sabe como possa desculpado! E violou-a, pondo em execução o decreto em parte, isto é, nomeando os inspectores de obras publicas que o corpo legislativo ainda havia de declarar se eram necessários. E se houvesse uma grande necessidade, ainda vá; mas não havia. Podiam os nomeados ir visitar os districtos para que foram nomeados, mesmo concedendo que as necessidades do serviço publico exigiam essa aberração dos principios constitucionaes, podiam esses cavalheiros, alguns dos quaes eram candidatos a deputados, ir satisfazer a esta necessidade de servjço mesmo nas vésperas das eleições? Parece-lhe que não.

Lamenta o estado da segurança publica, que é também deplorável. O crimes, principalmente de certa ordem, são hoje muito mais graves e numerosos. Nisto não crimina o governo actual, porque não acha que tenha uma culpa determinada; mas devia procurar manter a segurança de um modo mais vantajoso do que está sendo.

No que respeita á saúde publica parece ao orador que também se cuida muito pouco, para não dizer que se acha quasi abandonada. Agitou-se aqui a questão, se devia ou não acabar-se com os arrozaes; por essa occasião fizeram-se fortes arguições ao governo; hoje a questão dos arrozaes acha-se estudada convenientemente, apresentou-se um relatório que, homens mais competentes que elle, orador, dizem quo é um trabalho perfeito, e no entretanto os arro zaes continuam na mesma; e, comtudo, os habitantes de algumas povoações, que o orador poderia mencionar, quei-xam-se com rasão porque estão soffrendo muito.' Se succe-de haver povoações em que os arrozaes não são prejudi-ciaes, a maior parte soffre com esta cultura, e grande numero delias se têem tornado insalubres.

Isto devia merecer a attenção do governo; mas o facto é que até agora lh'a não tem merecido. Nada mais dirá sobre os pontos que tem tocado, pois vae concluir renovando a promessa que fez quando fallou n'outra occasião sobre a questão das irmãs da caridade.

Recordou ter então dito que sustentava que o governo, julgando como elle orador, que o decreto de 9 de agosto de 1833 era applicavel ás irmãs da caridade, não tinha exorbitado ,das suas attribuições, que não tinha usurpado nem o poder legislativo nem o poder judicial; com a publicação do decreto de 22 de junho. O legislativo não, porquea providencia que tinha tomado era para execução de uma lei; e o judicial também não, porque a dissolução que ordenou, é um acto puramente administrativo; sendo certo que a interposição da auctoridade judicial só se exige para a applicação de pena.

Mas parece-lhe que também já aqui disse que nem por ter estas opiniões se podia suppor que louva o governo por ter tomado similhante medida, nem que ache efficazes as suas providencias n'ella contidas. Pelo contrario, lamenta que o governo não tivesse tido a coragem necessária para fazer executar a portaria de 5 de março. A isto já por essa occasião se lhe respondeu (crê que foi o sr. ministro da justiça), dizendo que o que tinha motivado a falta de execução da portaria era a questão que tem havido em relação á casa de Santa Martha. Parece-lhe que foi só isto o que s. ex.a disse.

O sr. Ministro da^ Justiça:— Com a resistência á submissão...

O Orador: — Muito bem; mas deseja que s. ex.a lhe diga o que veiu fazer o decreto. Prevê que ha de ter a mesma execução que teve a portaria, comquanto para justificar o decreto se diga que a portaria era uma ameaça da dissolução, emquanto que o decreto é a realisação da ameaça. Mas se ainda não se obedecer? O mesmo decreto tem uma provisão altamente signifiativa, que priva a corporação da entidade juridica. Mas quanto a elle já estavam privadas d'essa entidade juridica, se é verdadeira a opinião do governo a respeito do decreto de 9 de agosto dp 1833. Pois então pôde ter entidade juridica uma corporação religiosa que não tem existência legal? Parece-lhe que não, e portanto o decreto ultimamente publicado nada fez, a não ser acrescentar uma cousa inútil; e se n'aquillo que se decreta não prejudica o que é de mais, é certo que muitas vezes faz mal, como/no caso presente, em que pôde dar logar a questão, sobre se é negada somente agora essa entidade juridica, e se era reconhecida de direito antes d'este ultimo decreto.

O orador queria ainda que se lhe declarasse, se alem do impedimento apontado pelo sr. ministro da justiça tinha havido mais algum? Parece-lhe que já se respondeu que não; mas é certo que também elle, orador, já ouviu dizer a um dos srs. ministros, e o mais competente neste caso', que existia a este respeito uma seguida correspondência entre o nosso ministro em França e o respectivo ministro dos negócios estrangeiros; e isto o que prova é que houve mais alguma cousa do que o embaraço de que fallou o sr. ministro da justiça. Assim pede o digno par que se reflicta muito no passo que fce deva dar, posto que teria sido melhor ter reflectido n'elle antes de dar occasião a que viessem todas estas questões (apoiados).

Disse finalmente que por emquanto está resolvido a não dizer mais nada, e esperar que qualquer dos membros do gabinete lhe responda, reservando se para ter novamente a palavra, se ainda julgar necessário pedi-la.

O sr. Presidente do Conselho (Marquez de Loidé): — Disse que sendo vários os assumptos de que o digno par se occu-pon, trataria de seguir o seu discurso pela melhor forma que lhe fosse possivel.

'Que s. ex.a tratou primeiro da dissolução da camará electiva, taxando-a de impolitica e inconveniente, e attribuin-do-a a causas que lhe parece não será fácil ao digno par mostrar que tivessem existido; ao que o sr. ministro observa que lhe parece um pouco extemporânea esta questão,

aliás julgada já pela opinião publica, não obstante o que faria algumas reflexões.

Ninguém ignora qual era a posição em que o governo se achava para com aquella camará, onde nas ultimas votações tinha obtido uma pequena maioria; alem d'isso havia, como a camará também não ignora, uma certa agitação nos eapiritos, o que tudo aconselhava a conveniência de fechar o parlamento o mais depressa possivel. O governo pelo menos assim entendia, e foi por isso que se apressou a pedir auctorisação para a cobrança dos impostos, não porque desejasse evitar a discussão do orçamento, pois o governo não tinha o menor empenho ou interesse n'isso, o que se prova com o facto de estar elle agora sendo discutido na outra casa do parlamento.

O governo, bem ou mal, entendeu que as conveniências publicas exigiam que o parlamento se fechasse, e para não exceder as attribuições que a constituição lhe confere, pediu auctorisação para a cobrança dos impostos. Posta a questão n'estes termos, era uma questão de confiança, cujo resultado devia determinar o que parecesse mais conveniente á causa publica. A questão tratou-se, e a votação determinou o governo a aconselhar a dissolução da camará electiva; acto de que não tem o ministério duvida nenhuma de aceitar a responsabilidade, porque as circumstancias são bem sabidas de todos, assim as que se deram antes, como as que se deram depois da dissolução: muito bem se conhece que já perante aquella camará tinha sido impossivel con-servar-se o ministério que precedeu ao actual, e estando a ponto de pela segunda vez se repetir-o facto de cair outro ministério com a mesma camará, o governo entendeu que devia aconselhar á coroa que dissolvesse a camará; e, se não está elle, sr. ministro, enganado, o paiz com o seu voto nas eleições a que ultimamente se procedeu, respondeu á pergunta que acaba de fazer o digno par. Esse voto justificou o governo de ter aconselhado á coroa a dissolução; e portanto parece-lhe que sobre este ponto nada mais lhe resta que áizer.

Que em seguida fora o governo, ou antes elle, orador, especialmente taxado de intolerante, por ter entendido que os verdadeiros principios e as conveniências do serviço exigiam a exoneração de dois empregados, sendo um d'elles o que dirigia e a quem estava confiada a direcção do Diário de Lisboa. O sr. ministro protesta solemnemente contra a apreciação feita pelo digno par, attribuindo a vingança essas demissões. Não é assim; elle não tem se não a lou-var-se do serviço de qualquer desses empregados e da coadjuvação que sempre lhe deram. (O sr. Marquez de Vallada:— Ouçam, ouçam.) A demissão deu-a muito contra sua vontade; mas entendeu que a moralidade publica e o respeito dos princípios exigiam-n'a. A tolerância deve ser reciproca. Não pôde negar-se que o logar de director da instrucção publica é de máxima confiança, e tanto assim, que exerce uma parte da auctoridade do ministro, por delegação deste; e ninguém pôde ser obrigado a delegar parte da sua auctoridade senão em empregados que lhe mereçam a máxima confiança. Quando pois esse empregado veiu á face do parlamento' dizer que não tinha confiança no governo, está claro que ipso facto, ficava entendido que o ministro respectivo não tinha também n'elle confiança (O sr. Marquez de Vallada:—Ouçam, ouçam.) De certo, desde que um empregado diz =não tenho confiança em vós= o ministro não pôde continuar a ter confiança n'elle. (O sr. Aguiar:—Peço a palavra.) Estes é que são os principios. Pôde o digno par apreciar o seu procedimento, como entender; a camará* também o apreciará; por sua parte está intimamente convencido de que obrou unicamente por virtude .de principios justos, e de maneira nenhuma por espirito de vingança. Disse que o digno par fizera allusão ao regulamento e ás formalidades que se deveriam ter observado para esta demissão; mas elle, sr. ministro, entende que esta hypothese não está prevenida-no regulamento; por que este trata de quando o empregado falta aos seus deveres por qualquer forma; então é justo que seja ouvido. Mas a hypothese que- se deu era toda politica, de principios claros, e de muitos precedentes de differentes administrações. Por isso está convencido de que procedeu conforme aos verdadeiros principios, reconhecidos por todos.

Observou que s. ex.a fallára também na questão da camará municipal de Coimbra, e também attribuiu o acto do governo a vingança! O sr. ministro protesta contra a insinuação. A camará de Coimbra estabeleceu impostos evidentemente contrários ás disposições do código administrativo, e foi esse o único motivo que moveu a não approvar o seu orçamento.

Fallou ainda o digno par sobre a grancruz dada ao nosso encarregado em Roma, sobre a questão do arcebispo, e sobre a nota respectiva: mas como o seu collega o sr. ministro da marinha é mais conheceder deste negocio, e elle já pediu a palavra, espera o orador que elle responderá cabalmente a s. ex.a sobre este negocio.

Quanto á lei da desamortisação, quer o digno par que o governo ratifique o que já por muitas vezes tem dito, isto é, que ha de executar a lei da desamortisação, independente da annuencia da corte de Roma? O governo disse-o, quando este negocio ainda estava a discutir-se; hoje que já se acha publicada a lei, e até o respectivo regulamento, não tem mais a fazer que repetir o que já disse; e quaesquer outras informações que deseje o digno dar, é o que s. ex.a e toda a camará sabem, isto é, qve esse negocio está entregue aos cuidados do digno negociador, o sr. conselheiro João de Sousa Pinto de Magalhães: está-se em via de negociação, de que não pôde n'este momento dizer a altura em que vae. Entretanto, como o governo está resolvido a ir executando a lei, parece-lhe que s. ex.a se deve dar por satisfeito.

Sobre o recrutamento disse não' haver duvida que era

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para lamentar o estado em que se acha o recrutamento (O sr. Conde do Bomfim:—Apoiado.); mas que sempre diria ao digno par, que ainda assim não está o caso tão mau como se julga, porque ha mais de vinte semanas, com pequenas alterações, que entram cento e tantas recrutas por semana para o exercito, o que anteriormente não acontecia. E em quanto porém ao procedimento da auctoridade, que o digno par também notara e lamentou, também o sr. ministro lamenta que tenha de se proceder assim; comquanto o facto seja que a lei auctorisa a que os refractários possam ser presos e compellidos; e a experiência tem feito ver que em muitos casos não ha outro meio de se conseguir o fim senão a prisão.

O governo o que quer é que se execute a lei, para termos o exercito com a força que lhe pertence, e tem a convicção de que ella ha de ir tendo melhor execução do que tinha até agora, que é o que todos desejam.

Annunciou que tinha já prompto um projecto, que se está copiando, e que apresentaria brevemente na camará dos srs. deputados, pelo qual espera se remediarão algumas das difficuldades que se têem encontrado na execução da actual legislação.

Pelo que respeita ás grandes sommas de dinheiro de que fallou o digno par aconselhando a conveniência de se appli-carem, e notando ter havido grande e indesculpável negligencia da parte do governo em lhe não ter dado o devido destino...

O sr. Aguiar: — Eu não disse que era uma negligencia indesculpável; disse, e repito, que não tem nenhuma desculpa o não se ter applicado esse dinheiro ao íim para que elle é destinado.

O Orador:—Pois eu digo a v. ex.*, que ha muita des-

culpa, e que o governo e censurado injustamente por esse facto. (Apoiados); o que passou a mostrar, dizendo que as substituições fazem-se pelo preço da media, preço esse que se fixa todos os annos: que porém succede que, quando o' sorteado, ou refractário vem a querer pagar o preço da - substituição, é um, dois, ou, tres annos depois, e então acontece que n'essa occasião já se não podem achar substitutos por aquelle preço, porque a taxa vae sempre subindo. Éesta a difficuldade em que se tem achado o ministério da guerra, mas para resolver este inconveniente já o sr. ministro da repartição competente apresentou uma proposta na camará dos srs. deputados.

Disse também, que, com relação aos arrozaes, assumpto em que também tocou o digno par o sr. Aguiar para censurar o governo por não tão apresentado alguma medida ao parlamento; que esta questão ha de ser resolvida brevemente, apresentando-se uma proposta de lei na outra casa.

Julgando ter por sua parte respondido ás principaes indicações que fez o digno par; tendo a certeza de que no que podesse ter esquecido responderia o seu collega que vae usar da palavra; pareceu-lhe que poderia abster-se de pro-seguir.

O sr. Ministro ãa Marinha (Carlos Bento): —Disse que usava da palavra, em primeiro logar para se associar aos actos a que se referiu o digno par, o sr. Aguiar. Ouviu dizer a s. ex.a, que considerando a resposta ao discurso da coroa um mero cumprimento, não apresentava por isso nenhuma proposta, limitando-se a expor a sua opinião sobre alguns factos praticados pela administração, e notou que s. ex.a referira alguns actos do governo, sobre os quaes adduziu algumas reflexões, a que o sr. presidente do conselho respondera que tomava toda a responsabilidade desses actos. Que n'isto reconheceu o governo que as prero-gativas do poder moderador não diminuem a responsabilidade das pessoas que exercem o cargo de ministros da coroa, e em presença d'isto é evidente que nenhuns dos ministros se pôde subtrahir á responsabilidade que a todos elles toca.

Parece ao sr. ministro que a apreciação feita pelo digno par sobre o facto da dissolução da camará dos srs. deputados, não o foi, tendo em vista as verdadeiras circumstancias que se deram, e o forçaram a tomar essa medida.

A consideração que se tem por qualquer camará, seja por actos que a recommendem, seja por quaesquer outras circumstancias, não obsta a que, dadas certas causas, se recorra ao meio da dissolução. Foi assim que, em 1852, apesar de se dizer então d'essa camará, que era a mais digna e a mais livremente eleita, a administração que se achava então á testa do governo, não duvidou aconselhar a sua dissolução, assim que entendeu ter chegado o caso em que ella devia ser dissolvida, e mais, não se apresentou n'essa epocha um motivo como o que agora se deu.

A circumstancia referida pelo sr. presidente do conselho, qUando ha pouca fallou, justifica a dissolução. Alem d'isso o sr.' ministro entende também que esse acto teve mais uma vantagem, qual foi a de ver-se pela nova eleição que o governo tinha obtido uma grande maioria, circumstancia esta indispensável para que possa caminhar qualquer governo. Fallou-se em orçamento, e em economias n'essa occasião e serviu isso então de argumento ; mas pôde asseverar á ca mara, que antes de levar o governo á camará dos srs. de putados a questão da cobrança dos impostos, tinha antes d'isso reunido os srs. deputados de todos os lados d'ella, e lhes expoz qual era a necessidade do governo. E por isso, e também porque o governo mais de uma vez foi aceusado de não querer instaurar a questão de confiança, é que se resolveu a apresenta-la. Esta camará e o paiz sabem o que então se passou, e por isso dispensa-se o orador de o referir agora.

O orçamento, como mui exactamente disse o sr. presidente do conselho, está-se discutindo na outra camará, e com isso deu esta administração um documento de que desejava se preenchesse esta necessidade do paiz, e n'isto vae de accordo com os seus precedentes, porque oito dias de-

pois de ter tomado a gerência dos negócios apresentou o mesmo orçamento dos seus antecessores, podendo aliás dar a desculpa de que não podia sustentar um orçamento que não era estudo seu; mas vendo que se tratava da execução de um preceito constitucional, não duvidou aceitar aquelle orçamento para não prejudicar os interesses da nação com a falta de approvação da lei da receita e despeza do estado.

Em quanto a economias, tem-se sustentado as idéas do sr. ministro da fazenda, em quem todos reconhecem grandes conhecimentos económicos, e pôde assegurar que se tem feito grandes economias" que enumerou.

Disse que na resenha feita pelo digno par dos actos d'esta administração, a respeito dos quaes s. ex.a entende'que não tinha sido regular o procedimento do governo, o orador oc-cupar-se-ha especialmente do que diz respeito á nomeação de ura prelado para o oriente; e a esse respeito declara, sem querer entrar agora mais a fundo nesta questão, por não ter presentes os documentos comprovativos, do que rapidamente e de lembrança vae dizer; e por isso muito sente não estar prevenido, porque, teria apresentado á camará os documentos para mostrar que quando se formou o actual ministério já pelo governo portuguez se tinha dado conhecimento ao núncio de sua santidade n'esta corte, da intelligencia que o governo portuguez ligava á execução da concordata sobre a nomeação do prelado para o oriente, communicação que compromettia um pouco a conclusão do negocio. Os governos não podem deixar de aceitar as obrigações tomadas pelos seus antecessores, maximè nos assumptos internacionaes; seria inadmissivel que um governo, numa dada occasião, dissesse aos das potencias estrangeiras: eu enceto uma nova carreira e dou por findo tudo o que se tem feito. O sr. ministro está muito longe de querer censurar os actos dos seus antecessores, mas carece de mostrar que tem a convicção

de que na occasião^em que este governo foi chamado para tomar uma resolução sobre este assumpto, não podia tomar outra differente da que se tinha já tomado...

O sr. Aguiar: — Mas que era differente da que tinha tomado aquelle ministério...

O Oraãor: — Repete que tem muita pena de não ter aqui os documentos a que se refere, para poder ler á camará o officio que o presidente d'aquella administração dirigiu ao ministro da marinha declarando que não podia apresentar para bispo de uma diocese do ultramar, a qualquer eccle-siastico, sem ter havido primeiro uma intelligencia-com o núncio da santa sé n'esta corte, assim como a annunencia do sr. ministro que foi seu antecessor. Que por isso era evidente que esta questão estava prejudicada para poder ser resolvida pelo ministério actual no sentido que s. ex.a declarou; e note-se bem que nem n'esta occasião entendeu que o modo como se dirigiu este negocio podesse ter sido outro, nem se julga com o direito de censurar aquella administração pelo caminho que esta questão já tinha tomado; porque na sua opinião ella não podia ter outra decisão senão aquella em que vinha encaminhada.

Disse que o seu illustre collega já respondeu a alguns dos pontos em que tocou o digno par, porque s. ex.a fallou a respeito de varias questões importantes, entre as quaes a dos arrozaes, que é também uma questão muito importan-

te, como bem o mostram os esclarecimentos ministrados no relatório apresentado ao governo. Se não se engana parece-lhe que um dos meios mais profícuos, na opinião dos redactores deste documento, para remover a máxima parte dos inconvenientes d'esta cultura, era a diminuição dos direitos da importação do arroz, o que elle, orador, também-sempre assim entendeu, porque a protecção exagerada que se deu á entrada de uma similhante industria havia dar em resultado que a sua cultura se não'fizesse unicamente nos terrenos já insalubres, onde ella seria menos prejudicial, mas também noutros que assim se tornavam igualmente insalubres. Bto posto, quanto maior favor se der ao arroz estrangeiro menor será o inconveniente para este paiz, porque esta cultura não se havia então de fazer senão naquelles pontos onde os inconvenientes d'ella não seriam tamanhos, nos terrenos paludosos. E portanto evidente que a pauta resolveu essa questão; pôde ser que ainda deva ser mais reduzido esse direito, mas actualmente está reduzido a muito menos do que era, e também ha medidas policiaes a adoptar, algumas das quaes já estão em vigor; e quanto ás que convém adoptar para impedir os actuaes inconvenientes d'essa cultura, o illustre presidente do conselho já declarou que havia apresentar um projecto ás cortes sobre este objecto.

Mais algumas reflexões teria a fazer, mas como já deu a hora, não quer abusar da benevolência da camará."

O sr. Presiãente:—Teremos amanhã sessão; e será a ordem do dia a continuação d'esta discussão. Está levantada a sessão.

Tinham ãaão cinco horas.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão do dia 15 de julho de 1861

Os srs. Visconde de Laborim; Marquezes de Ficalho, de Loulé, de Vallada; Condes do Bomfim, de Mello, de Mes-quitella, de Peniche, da Ponte de Santa Maria, do Rio Maior; Viscondes de Algés, de Balsemão, de Benagazil, da Borralha, de Castellões, de Castro, de Fornos de Algodres, da Luz, de Sá da Bandeira; Barões das Larangei-ras, de Pernes, da Vargem da Ordem, de Foscoa; Mello e Carvalho, Mello e Saldanha, Sequeira Pinto, F. P. de Magalhães, Costa Lobo, Margiochi,- Moraes Pessanha, Aguiar, Braamcamp, Pinto Bastos, Reis e Vasconcellos, Izidoro Guedes, Baldy, Silva Sanches, Vellez Caldeira, Franzini, Brito do Rio.

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