522 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
pto breves reflexões, a que me obriga o que disse o sr. ministro da fazenda na ultima sessão.
Pretendeu s. exa. justificar-se das suas reconsiderações; affirmando que não lhe ficava mal transigir com a opinião dos seus amigos e a opinião publica, porque transigir é da indole do systema representativo; teria talvez s. exa. rasão se não se tivesse manifestado tão claramente nas duas casas do parlamento contra a transição que acceitou.
A verdade é que s. exa. adoptou as emendam apresentadas por alguns dignos pares, não porque as achasse rasoaveis, mas porque a manifestação imponente do corpo commercial de Lisboa influiu por tal fórma no seu animo, que o determinou a esse procedimento contra a sua opinião já declarada.
Isto significa que o sr. ministro não sabe o que quer, nem o que convem, não têem persistencia no seu plano, nem convicções formadas sobre o assumpto.
Diz s. exa. que lhe não ficava mal ter mudado de opinião, porque este systema de transigir está acceito em todos os parlamentos, e adoptado nos governos representativos.
N'esse caso o sr. ministro devia ser mais franco, declarar que estava disposto a emendar o seu projecto no que fosse rasoavel, e não affirmar pelo contrario muito positivamente, que não acceitava as emendas, que depois foi obrigado a acceitar.
Eu não censuro s. exa. por ter mudado de opinião (a questão para mim não é ter mudado do opinião), eu censuro-o pelos motivos que determinaram essa mudança.
Porque mudaria o sr. ministro da fazenda de opinião?
O sr. ministro da fazenda mudou de opinião, e sujeitou se a que lhe esfarrapassem o projecto, porque a representação da associação commercial de Lisboa foi d'esta vez acompanhada de uma manifestação ruidosa de centenares de pessoas, que vieram a essa camara pedir que lhe attendesse a representação junta, por todos os negociantes de Lisboa.
E digo, que o sr. ministro só cedeu ante aquella manifestação imponente, porque se, s. exa. estivesse resolvido a attender ás rasões expostas na representação da associação commercial, já teria attendido a ellas quando aquella associação representou a outra casa do parlamento dentro dos strictos limites da legalidade e de uma maneira menos energica.
As condições do sr. ministro, os protestos feitos nas duas casas do parlamento, de que não acceitava modificação, desappareceu tudo por fraqueza e diante do medo. É, pois essa fraqueza e esse medo que eu censuro ao sr. ministro, e não o mudar de opinião, porque sapientis est mutare concilium.
O sr. ministro, para se justificar ainda e à commissão de fazenda, por ter acceitado a modificação dos artigos 17.° e 18.°, funda-se em que ella já estava consignada no artigo 11,°, e que está admittida e consignada na legislação franceza.
É sempre a França, são sempre as outras nações que hão de determinar para s. exa. esta ou aquella doutrina, sem saber se póde ser applicada entre nós!
Se é a Franca para tudo, que lhe serve, imite-a pelo que respeita ao imposto do rendimento.
Pareceu-me que com estas e outras considerações o sr. ministro quiz sustentar que o principio que s. exa. sustentava lá fóra sustenta da mesma fórma no projecto.
N'este caso, se estes artigos assim modificados o são só na redacção, estando a sua doutrina consignada já no projecto de ler em artigos anteriores, não precisa, o projecto voltar á outra casa do parlamento; mas se o sentido, o espirito da lei, fica tambem modificado, então precisa o projecto lá voltar, porque a questão não é de redacção, mas de disposições que foram alteradas.
Explique-se, pois, melhor o sr. ministro, e declare precisamente qual o sentido em que as modificações foram acceites.
Convem tambem notar que na representação não se representaram os bancos, e não obstante a modificação introduzida na lei vão tambem favorecer estes estabelecimentos; por consequencia, indo a modificação n'esta parte do projecto mais longe do que se pedia na representação, mostra se que houve desejos de favorecer os interesses dos bancos e a parcialidade do sr. ministro. Sobre este ponto devia s. exa. tambem explicar-se, pois sabe perfeitamente as fraudes que eram feitas pelos bancos, como a maior parte dos documentos ficavam por sellar, como as transacções eram feitas em prejuizo do thesouro, o que deu origem á legislação que estava em vigor, e contra a qual não se atreveram a reclamar.
Pois, sr. presidente, o sr. Barros Gomes, acceitou a modificação que favorece todos estes estabelecimentos, que vae dar origem a novos abusos ou fraudes.
Desejo tambem ouvir o sr. ministro ácerca da redacção do artigo 18.°, que precisa de explicação.
(Leu.)
N'este artigo falla-se de sociedades em geral, não se especifica; que sociedades, pois, são estas; são as que têem firma ou são outras, ou isto refere-se simplesmente ás sociedades anonymas?
Sobre esse ponto é necessario que o governo dê explicações.
Não desejo demorar a discussão, e apenas quiz fazer estas reflexões para que os factos fiquem bem accentuados. A camara votará como entende.
O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): - Apenas tenho a responder ao digno par que acaba de sentar-se, que me parece s. exa. interpretar mal o meu pensamento, de certo por culpa minha, por não me ter exprimido com a precita clareza. Não vim aqui sustentar que esta disposição do projecto importava uma alteração essencial na doutrina da legislação existente; o que eu desejei unicamente fui justificar a proposta do governo, allegando que na legislação actual e na anterior estava implicitamente consignada a doutrina que n'essa proposta procurei tornar clara, como convinha, para não dar logar a duvidas. Então disse eu que não era nova a disposição a que me refiro, nem absurda, nem impossivel de admittir, porquanto n'um paiz tão illustrado como a França era preceito legal e estava em vigor uma doutrina similhante ou ainda mais accentuada do que a que se contem n'essa disposição.
Quanto ás sociedades a que alludiu o digno par, está claro que o preceito da lei não póde deixar de se entender com respeito ás sociedades anonymas.
O sr. Conde de Valbom: - (O digno par não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)
O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): - Sr. presidente, é para declarar, por parte do governo, que acceitâmos a reflexão feita pelo digno par o sr. conde de Valbom, que em nada altera o pensamento, e antes dá melhor redacção ao projecto que se discute, e creio que a commissão mesmo poderá fazer essa emenda, que considero de redacção.
O sr. Barjona de Freitas: - Pedi a palavra para fazer umas observações, sem comtudo ter intenção, nem querer mesmo aggravar a situação do governo n'esta questão. Já aqui foram notadas as declarações do sr. ministro da fazenda, que parecia ter deliberado não acceitar, as emendas que tinham sido apresentadas, e que todavia não foram attendidas.
Eu não quero, porém, como disse, aggravar a situação do governo n'este ponto; os factos são de todos conhecidos e podem ser apreciados; portanto, não sendo esse o fim para que eu pedi a palavra, vou tratar do assumpto que tenho a occupar-me.
A minha idéa é lembrar uma cousa que me pareceu rasoavel.