SESSÃO N.° 52 DE 4 DE SETEMBRO DE 1908 35
são onerosos os sacrificios que nos impõe o nosso dominio colonial.
Terá sido suficientemente productiva está larga applicação de capitães, que tem empobrecido e extenuado o Thesouro metropolitano?
Só um estudo intelligente e consciencioso da nossa administração colonial pode fornecer resposta cabal a esta pergunta.
Comtudo, de uma maneira geral, pode diser-se que, apesar dos erros e das hesitações frequentes e, mau grado, o vicio tão português, da falta de tenacidade e persistencia em orientação ponderada e pratica, a nossa obra colonial dos ultimos trinta annos deve lisonjear o nosso sentimento patriotico.
Seja, porem, como for, o facto saliente e incontestavel é que tem sido pesadamente oneroso para o Thesouro metropolitano o desenvolvimento do nosso dominio ultramarino.
Não se pode estabelecer com rigorosa precisão o montante d'estes encargos, devido á maneira insufficiente como estão organizadas as relações financeiras da metropole e das colonias, e até das colonias entre si.
Até hoje a metropole tem sido o commodo elixir financeiro que equilibra os orçamentos coloniaes.
Os archivos da sua intervenção financeira ficam, porem, dispersos no maré maguum dos creditos especiaes e extraordinarios, e na veneravel e volumosa correnteza das collecções orçamentaes.
Não parece mesmo que esta larga e persistente sangria no Thesouro metropolitano nos traga como compensação o claro reconhecimento dos serviços recebidos.
Parece á vossa commissão de fazenda que será erro grave continuar a manter este systema confuso e inconveniente, e por isso chama a vossa attenção, e especialmente a do Governo, para a necessidade de organizar em contas correntes as relações financeiras da metropole e das colonias, e das colonias entre si.
Conveniente seria até que se procurasse tambem apurar a conta dos ultimos trinta annos.
Assim se cortaria cerce a falsa ideia de que a metropole é uma simples exploradora da vitalidade colonial.
Assim se tornaria mais facil a obtenção de fundos para os melhoramentos materiaes das colonias, visto que gradualmente a metropole viria a ser distes reembolsada.
A boa escrituração e a boa politica aconselham que ás colonias se imputem os seus encargos e que a sua prosperidade futura seja garantia do pagamento dos encargos e despesas da primeira exploração.
Parece por isso á vossa commissão
urgente a publicação de um diploma, que organize a escrituração das relações financeiras da metropole com as colonias e das colonias entre si, por contas correntes.
Com a mesma orientação de boa ordem e clareza financeira parece-nos igualmente conveniente que a verba global inscrita no orçamento metropolitano, como despesa extraordinaria da Direcção Geral do Ultramar para despesas geraes das provincias ultramarinas, seja no orçamento sub-dividida conforme a attribuição a fazer a cada colonia.
Passando agora a analysar o caso concreto do pedido de um credito de 1:241 contos de réis para despesas já feitas e em divida na provincia de Angola e no districto de Timor, tem a vossa commissão occasião de observar que este facto é apenas um incidente da crise economica e financeira que Angola vem soffrendo desde 1900.
Nos ultimos tempos a vida financeira da provincia de Angola tem sido angustiosa, lançando-se mão de todos os recursos para occorrer aos deficits da provincia.
Dos cofres das outras provincias e dos cofres metropolitanos sommas consideraveis foram enviadas para Angola, para compensar a insufficiencia de receitas e o aumento incessante de despesas.
De urgencia em urgencia foram absorvidos os depositos de vales do correio e o fundo do caminho de ferro de Malange, e deixaram de ser pagas á metropole as annuidades devidas pelo emprestimo para o caminho de ferro de Mossamedes, etc.
Apesar de tudo isto, o desequilibrio financeiro não cessou e as dividas a fornecedores attingem a quantiosa somma que consta d'este projecto de lei. Não é difficil estabelecer a etiologia da crise angolense.
Á baixa de preços do café e da borracha, a crise do alcool, a insufficiencia das vias de communicação, a agitação e sublevação de alguns regulos, a crise da emigração indigena e as peias do regime pautai excessivamente pesado, taes são as multiplices causas da crise economica e a explicação racional de uma parte da crise financeira.
As consequencias da crise economica fizeram sentir-se gravosamente na productividade das receitas da provincia. No seu magistral relatorio de 1899 dizia o Ministro da Marinha e Ultramar d'aquella epoca: «Mal se comprehende. que as receitas da provincia de Angola não excedam 1:500 contos de réis».
Hoje, passados 10 annos, durante os quaes temos gasto na provincia sommas consideraveis, quasi podemos repetir
textualmente aquella mesma apreciação!
No mappa que em seguida publicamos podem ver-se a estagnação das receitas em Angola e os seus deficits de cobrança:
A par d'esta primeira causa de perturbação financeira outra se ia avolumando dia a dia tornando o desequilibrio cada vez maior.
Referimo-nos ao aumento de despesas.
Em 1894-1895 o orçamento da provincia fechava com um saldo positivo sendo as despesas orçadas em 1:532 contos de réis. De então para cá abriu-se o periodo dos deficits e a progressão das despesas accelerou se fortemente, sendo hoje de mais do dobro d'aquella importancia.
O mappa seguinte é consideravelmente elucidativo a este respeito.
Do que deixamos exposto resulta claramente a natureza da crise financeira de Angola.
Rápido decrescimento das receitas, que de 1:634 contos de réis em 1894-1895 desceram até 981 contos de réis em 1901-1902, seguido de uma longa estagnação, que apenas duas vezes permitte exceder ligeiramente o algarismo de 1894-1895; consideravel e rapido aumento das despesas, que de 1:532 contos de réis em 1894-1895 chegaram a 3:300 contos de réis em 1906-1907.
A comparação dos algarismos das receitas e despesas nos pontos extremos d'este periodo dá-nos para as receitas um aumento de 14 contos de réis, para as despesas um aumento de 1:798conto s de réis.
O desequibrio resultante do antagonismo d'estas duas ordens de factos financeiros é a origem dos deficits da provincia de Angola, cuja importancia nas despesas orçamentaes da provincia se pode avaliar no mappa seguinte:
Resulta d'estes algarismos que, para os seis exercicios a que se referem, o deficit, de Angola ascendeu a 6:508 contos de réis. Sc lhe addicionarmos o credito agora pedido de 1:241 contos de réis, obteremos a importante somma de 7:794 contos de réis de deficit, grande parte dos quaes teem sido pagos pela metropole e o restante pelas outras provincias ultramarinas de 1901 para cá.
E porem de notar que, se addicionassemos a estes algarismos a importancia gasta com expedições, o pagamento das garantias de juros e outros encargos a empresas que interessam a provincia de Angola, as despesas pagas durante este periodo pela metropole para melhoramentos materiaes da provincia, chegariamos a um deficit de mais