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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

A primeira sessão desta Camara terá logar na terça-feira 3 de Junho, sendo a ordem do dia os pareceres n.º 300 sobre os projectos de lei n.° 303, 305, 306, 309, e 310, confirmando differentes medidas, relativas ao Ultramar, n.° 331 Sobre a proposta do Digno Par Visconde de Fonte Arcada para que seja nomeada uma commissão de inquerito sobre o estado em que se acham os actuaes agricultores do reino, e n.º 334 sobre o projecto de lei apresentado pelo Digno Par Visconde de Sá da Bandeira estabelecendo o que deverá praticar-se, para ficarem de condirão livre os escravos que entrarem no territorio portuguez Secretaria da Camara dos Dignos Pares do Reino, em 31 de Maio de 1856. = Carlos da Cunha e Menezes.

EXTRACTO ISA SESSÃO DE 26 DE MAIO.

Presidencia do Em.mo. Sr. Cardeal Patriarcha

Secretarios – os Srs.

Conde da Louzã (D. João).

Brito do Rio.

(Assistiam os Srs. Presidente do Conselho, Ministros, do Reino, e Marinha.)

Depois das duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 35 Dignos Pares, declarou o Em.mo Sr. Presidente aberta a sessão.

Leu-se a neta da antecedente que não teve objecção.

O Sr. Presidente — Não ha correspondencia: tem a palavra o Sr. Visconde de Podentes.

O Sr. Visconde de Podentes— Sr. Presidente, eu intendo que é um dever de lealdade da parte da commissão de inquerito fazer a declaração, de que no sabbado, 24 do corrente, foi recebida a resposta que a direcção da Companhia Central Peninsular dos caminhos de ferro de Portugal remetteu á mesma commissão sobre os quesitos que esta lhe linha dirigido em 24 de Abril proximo preterito.

O Sr. Visconde de Sá — Pedi a palavra para mandar para a Mesa dois requerimentos, assim como já por diversas vezes tenho mandado outros de varios Officiaes, que pedem a approvação do projecto por mim apresentado nesta Camara, relativamente a Officiaes que tomaram parte nos acontecimentos de 1846 e 1847, propondo que se lhes applique a lei de 1843 relativa aos Officiaes que tambem serviram e tomaram parte nos acontecimentos politicos de 1836 e 1837.

O primeiro destes requerimentos é do Capitão graduado Francisco do Amaral, ajudante do batalhão de caçadores n.º 7.

O segundo requerimento 6 de João José Pereira e Horta, Brigadeiro graduado, e commandante do mesmo batalhão, que conta 41 annos de serviço.

— Permitta-me a Camara que lhe leia uma parte deste requerimento;

« Foi amnistiado por Decreto de 28 de Abril de 1847, pela fórma seguinte: = Art. 1.º É concedida geral e completa amnistia para todos os crimes politicos que tenham sido commettidos desde o dia 6 de Outubro do anno proximo passado de 1816, ficando em perpetuo esquecimento, e absoluto silencio.»

Dignos Pares do Reino! Quando a significação da palavra— amnistia—, offerecesse uma duvida na sua applicação, ella já não podia existir depois que Sua Magestade El-Rei o Senhor D. PEDRO V. pelo Ministerio da Guerra em 31 de Janeiro ultimo mandou explicar ao Exercito:

— «que os crimes amnistiados esqueceram, e que por isso é justo que a pena, ou effeito algum della subsista. » No emtanto o supplicante foi preterido para Coronel na promoção de 19 de Abril de 1847, assim como o está no posto de Brigadeiro, soffrendo por esta fórma contra a doutrina do artigo 120.º e seus §§ do Codigo Penal Portuguez, os graves effeitos de um crime que, segundo a amnistia, nunca existiu.

Agora peço a attenção do Sr. Ministro da Guerra.

A commissão de guerra tem-se reunido para tomar em attenção este projecto, mas assentou-se em que o Sr. Ministro da Guerra devia ser convidado para assistir á discussão delle; o Presidente da commissão ficou de se intender com S. Ex.ª sobre o dia em que nos deviamos reunir todos; isto porém já se passou ha muito tempo, e até agora não tem tido logar essa reunião, provavelmente em consequencia dos projectos financeiros que se teem estado a discutir na outra Camara, e que tem alli absorvido toda a attenção do Governo.

O Sr. Ministro da Guerra, porém, terá agora a bondade de dizer quando poderá ir á commissão para alli tractarmos deste objecto.

O Sr. Ministro da Guerra — Eu estou prompto sempre que a commissão queira.

O Sr. Visconde de Sá - Então quando vier o Sr. Presidente da commissão, elle se intenderá com S. Ex.ª para serem todos avisados para um dia fixo, e hora determinada.

O Sr. Presidente — Os requerimentos vão á commissão de guerra.

O Sr. Conde de Thomar disse que differentes jornaes desta capital tem publicado um requerimento feito por um cidadão de Castello Branco, que se diz dirigido ao Governo sobre um negocio que elle orador julga de summa gravidade e importancia: que, porém, antes de apresentar as suas considerações sobre o objecto, pedia licença á Camara para lêr o requerimento, porque lhe parece que convem que todos estejam bem inteirados das circumstancias de que se acha revestido este facto, para poderem avaliar melhor as mesmas considerações (leu).

Concluida a leitura, continuou observando que por este requerimento se via que o Governador civil de Castello Branco intendeu que podia, sem offensa das leis e da moral, tirar por justiça ao poder paterno uma criança de pouco mais de doze annos, que nem physica nem moralmente se acha desenvolvida, e depositar aquella criança n'uma casa a que o pai chama de sugestão! Não se acha esta circumstancia completamente desenvolvida, mas elle orador é informado de que a casa onde se acha depositada esta criança é habitada por dois moradores, um dos quaes é o Secretario geral; que a casa porém é a mesma, que ha communicação por toda ella; que são, finalmente, duas familias, que estando separadas no nome, e talvez em relação a alguns negocios domesticos, comtudo vivem conjunctamente! Além disso esta casa tem sido frequentada pelo proprio Governador civil, sempre que o tem querido, e que nem se lhe podia prohibir a entrada, attento o caracter de que alli apparece revestido. Mas todos estes factos parecem ao orador que auctorisam o pedido do infeliz pai, que sómente se reduz a requerer ao Governo a remoção do Governador civil para outro districto, a fim de que a sua presença e immenso poder que elle exerce no districto não influam para que elle pai seja privado de empregar os meios que a lei lhe fornece para advogar a sua justiça perante os tribunaes.

O Digno Par não sabe o que o Governo tem feito a este respeito, e antes de progredir nas suas considerações pede ao Sr. Ministro do Reino que lhe declare primeiro que tudo, se o requerimento chegou effectivamente ao poder do Governo, e nesse caso quaes são as medidas que tem adoptado para que a lei seja executada, separando inteiramente todos os meios de seducção, oppressão, e violencia, que a auctoridade póde empregar em taes casos. Em segundo logar, se o Governo acha regular, conveniente e moral o comportamento daquella auctoridade? Ou, por outras palavras, se o Governo está ou não decidido a conservar no mesmo logar aquelle empregado.

Deseja, finalmente, que o Governo lhe diga se concedeu licença aquelle mesmo funccionario para vir a Lisboa: pois consta-lhe que effectivamente o dito Governador civil, depois de praticados todos estes actos, partiu para Lisboa, onde se acha seguindo o processo para ver se póde influir na decisão dos tribunaes! ou se pelo contrario saíu sem authorisação nenhuma do districto da sua jurisdicção. Por ultimo, deseja saber que opinião fórma o Sr. Ministro do procedimento que neste negocio tem tido o Governador civil de Castello Branco.

Depois de obter resposta ás perguntas que acabava de dirigir ao Governo, pede o orador ao Sr. Presidente, que lhe conceda outra vez a palavra.

O orador quer comtudo que se fique intendendo bem, que havendo neste negocio duas partes mui distinctas, uma que diz respeito á questão em si, e outra aos seus accidentes e circumstancias, é sómente a esta que se refere, porque a responsabilidade della recáe sobre o Governo, com o mesmo direito com que a resolução da primeira pertence ao poder judiciario; e por isso espera que o Sr. Ministro se não entrincheirará na que pertence ao tribunaes para confundir, ou não responder á parte que pertence ao Governo.

O Sr. Ministro do Reino — Como se tracta de um negocio que pertence verdadeiramente ao poder judiciario, o Sr. Ministro será o mais conciso que poder nas suas respostas; e por isso quanto á pergunta disse que o requerimento chegára ao conhecimento do Governo, não só quando a questão já estava entregue ao poder judiciario, mas até quando o Tribunal de primeira instancia já tinha dado a sua sentença, esta se achava appellado para a Relação de Lisboa; e como nenhuma queixa tinha vindo a respeito das violencias que se allegavam, como de que haviam sido violentadas as testimunhas para não deporem, intendera o Governo que nada tinha que ver com a questão; por quanto parece que o Governador civil de Castello Branco fez o que faria outro qualquer que achasse na auctoridade paterna a resistencia que elle achou para casar com a menina que tinha escolhido para sua esposa; accrescendo que lhe constou, que nem o requerimento para supprir o consentimento paterno fóra feito por elle, assim como que da parte do pai tinha havido mudança de opinião, que se não compadecia com a vontade permanente de sua mulher. Que este desaccôrdo entre os pais da esposada apparecêra ha poucos dias; porque durante muito tempo ambos se mostraram conformes em consentir no casamento.

Accrescentou, quanto á segunda pergunta, que nos termos a que as cousas tinham chegado, qualquer modo de proceder do Governo faria pender a balança para um ou outro lado; e isso aconselhou-o a prudencia e o seu dever a que o não fizesse; o que não quer dizer que não procederia convenientemente se quando lhe chegou ás mãos o requerimento ainda não tivesse o negocio sido levado aos tribunaes.

Que tambem lhe disseram que linha havido escandalos, que se lhe não especificaram; mas que se elles tiveram logar já estavam feitos e o que se pedia ao Governo no requerimento nem já obstava a elles, nem lhes serviria de castigo se os tivesse havido. No caso de se provarem, o poder judicial no Tribunal superior de segunda instancia os puniria.

O Sr. Ministro declarou que tinha toda a confiança nos tribunaes. Que, pois os casos judiciaes se decidem em duas instancias, ainda concedendo que o Juiz de direito de Castello Branco não tivesse feito justiça, a Relação de Lisboa havia de prover de remedio.

Observou mais, que tinha intendido elle Sr. Ministro que o Governador civil não podia ser comprehendido nas prescripções da Ordenação do Reino, citadas pelo Sr. Conde de Thomar. Intendia a razão porque se exigia que os Juizes não podessem cazar sem licença de el-rei, elles que podiam vir a julgar pendencias em que fossem interessados; mas esta razão não podia plausivelmente applicar-se a funccionarios não pertencentes ao Poder judicial, hoje Poder independente e cujas attribuições se não estendem aos magistrados administrativos.

Um Governador civil não julga, e as suas attribuições administrativas não o fazem superior a qualquer pessoa particular para todas as suas demandas e negocios; e não podem por tanto estes funccionarios ter menos direitos do que tem qualquer cidadão particular.

Quanto á terceira pergunta, respondeu que dera licença ao Governador civil de Castello Branco para vir a Lisboa tractar de seus negocios, mas não para este: a licença foi anterior. Que no presente caso, e logo que o Governo teve delle conhecimento deu ordem aquelle Governador civil que recolhesse para o seu districto, porque a licença não linha sido dada para acompanhar e seguir este processo.

E quanto á pergunta que lhe fez o Sr. Conde sobre a opinião que formava dos actos e procedimentos do referido Governador civil, respondeu que esperaria a decisão dos tribunaes para emitti-la, por que antes não lhe parecia curial pronunciar-se por louvor ou censura.

O Sr. Conde de Thomar não esperava que o Sr. Ministro do Reino tractasse esta questão como a tractou; esperava que S. Ex.ª encarasse o negocio olhando-o pelo lado da decencia e da moral: e menos podia esperar que S. Ex.ª fosse procurar a sua resposta á Ordenação do Reino: assim como não esperava que dissesse que um Governador civil está no mesmo caso que qualquer particular para tractar das suas demandas e outros negocios, direito esse que lhes Concedem as Leis: não esperava ouvir tal (apoiados), porque um particular qualquer, n'um caso destes, começaria por não ter influencia bastante para que o Juiz de direito proprietario largasse a sua jurisdicção ao Juiz substituto, que é ao mesmo tempo membro do Conselho de districto, e ligado ao Governador civil, a fim de que decretasse o deposito. Isto é um facto que S. Ex.ª não devia ignorar, e que ha de horrorisar a todos os pais de familia que teem filhas, que podem ser-lhes arrebatadas por uma auctoridade a quem a Lei conferiu jurisdicção, mas não para commetter violencias desta natureza! Este facto, de passar a jurisdicção do Juiz de direito proprietario para o seu substituto, é summamente grave para se passar em silencio nesta questão.

O orador diz que não houve desavença nenhuma entre os conjuges, porque o pai desta menina nunca teve proposta alguma do actual Governador civil de Castello Branco, pedindo-lhe sua (Ilha em casamento, senão no momento em que já estava passado o despacho para ser arrancada do seu poder. Foi justamente então, que aquella auctoridade se apresentou para pedir-lhe sua filha; e todos sabem que uma criança, que frequenta ainda a mestra não tem vontade propria, e só podia ser suggerida por uma auctoridade (que tem quarenta e tres ou quarenta e cinco annos de idade), para declarar com quem quer casar; e depois do pai se oppôr a este consorcio, é que o Governador civil respondeu que já tinha tomado as suas medidas, a que não quizera dar execução sem ter uma attenção com elle: essas medidas eram ter mandado pôr uma carroagem á porta da avó da menina para levar aquella criança e deposita-la por ordem do Juiz substituto membro do Conselho de districto para casa do Secretario do Governo! que é o mesmo que se fosse a sua casa. Eis-aqui a moralidade desta auctoridade, e eis-aqui o que S. Ex.ª diz que está no caso de um particular; sem se lembrar de que nenhum particular podia fazer o mesmo, porque para praticar um acto similhante é necessario ter auctoridade, é necessario ter jurisdicção, é necessario ter poder (apoiados). E que se não diga que o deposito foi feito em casa do Sr. Visconde de Oleiros, porque todos sabem que essa casa tem duas portas, mas que as familias alli residentes vivem quasi em commum. O orador pergunta se é permittido fazer um deposito n'uma casa aonde se emprega a arma da sugestão contra a victima, e vai o proprio Governador civil influir no animo de uma criança que ainda não sabe o que mais lhe convem para responder como elle quizer?

Um particular não póde fazer isso, mas póde faze-lo um Governador civil, e assim já vê o Sr. Ministro do Reino que as circumstancias são muito