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Dadas estas explicações, nada mais tenho a dizer sobre este objecto, porque ainda não entrou em discussão o projecto de lei, e não me cumpre ingerir na resolução da questão, propriamente da casa, se se deve ou não discutir conjunctamente com o projecto o adiamento proposto pelo digno par.

(O orador não reviu este discurso.)

O sr. Visconde de Chancelleiros: — Sr. presidente, se a camara approvasse a minha proposta, essa approvação importava o dispensar-se a disposição do regimento; como vejo porém que o digno par receia um pouco que a camara vá contra essa disposição do regimento, tendo a já em muitas e repetidas occasiões dispensado do modo que a indiquei, ainda assim, para desfazer quaesquer duvidas que possam suscitar-se, mando para a mesa a seguinte proposta, que, segundo me parece, resolverá a questão (leu).

Sr. presidente, se se consultasse de per si cada um dos dignos pares, estou certo de que todos seriam concordes em declarar, que se não póde tratar a questão do adiamento, sem se tratar conjunctamente do projecto que se pretende adiar, por consequencia que precisão ha de se dar o logar principal á proposta do digno par, se se póde discutir conjunctamente com o projecto? Penso que a camara nenhuma difficuldade terá em aceitar esta idéa. Não ha questão nenhuma importante, cuja discussão não seja iniciada por uma proposta de adiamento, sempre n'esta casa se procedeu assim, porque sempre as opposições recorreram a este expediente da tactica parlamentar; e eu posso assevera-lo, porque fiz por muito tempo parte da opposição; mas o que se seguia á apresentação d'estas propostas? O mesmo que se seguiu com relação ao adiamento proposto pelo sr. Miguel Osorio, por occasião se se discutir n'esta casa o projecto de reforma da secretaria dos estrangeiros, isto é, resolver a camara que o adiamento não tomasse o logar da questão principal, mas que fosse discutido conjunctamente com ella.

Mando portanto para a mesa esta proposta, ficando assim dispensado o regimento.

Foi lida na mesa, e admittida á discussão a proposta do sr. visconde de Chancelleiros, que é do teor seguinte: PROPOSTA

Proponho a dispensa do artigo 57.° do regimento na parte em que diz que qualquer proposta de adiamento sendo admittida tomará o logar de questão principal. — Visconde de Chancelleiros.

O sr. Presidente: — Como ninguem pede a palavra, vou pôr á votação a proposta do sr. visconde Chancelleiros.

Consultada a camara, approvou a proposta.

O sr. Presidente: — Em vista da resolução que a camara acaba de tomar, vae entrar em discussão o projecto, conjunctamente com a proposta de adiamento do sr. Costa Lobo. Os dignos pares que quizerem usar da palavra deverão declarar, quando a pedirem, se se inscrevem pró ou contra, conforme o determina o nosso regimento.

Tem a palavra sobre a ordem o sr. barão de Villa Nova de Foscôa.

O sr. Barão de Villa Nova de Foscôa (sobre a ordem): — E para mandar para a mesa um parecer de commissão.

O sr. Rebello da Silva: — Peço a palavra, mas não posso declarar a V. ex a se é pró ou contra, porque isso depende do modo por que correr a discussão.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o digno par.

O sr. Rebello da Silva: — Não me achava ainda na sala quando se encetou a discussão da generalidade d'este projecto; mas entrando ha poucos minutos pareceu-me perceber que havia sido a proposta uma questão preliminar, para saber se o governo ainda julgava util a nomeação de uma commissão externa incumbida de estudar a questão de fazenda por todos os seus aspectos, e com mais especialidade de rever e traçar a vasta reforma dos quadros de diversos serviços publicos. Abraçando esta idéa em resposta a uma interpellação do sr. duque de Loulé, o gabinete concorda com ella ainda ou descobriu obstaculos na sua execução? Creio que concorda, segundo deprehendi e ouço dizer; e como este ponto era para mim de vulto vou entrar no assumpto com a certeza de que elle fica assentado e definido.

Serei muito conciso nas observações que tenho de apresentar á camara. Não tracei discurso, nem me propuz alargar uma dissertação ácerca da theoria e da pratica do imposto de consumo. Limitar-me-hei a pedir ao governo alguns esclarecimentos e a motivar a rasão em que me fundo para os desejar. Nada mais. O meu voto depende da resposta; porque n'estas questões nunca obedeci senão ao meu convencimento, e se as reputo altamente politicas é n'um sentido que as afasta inteiramente da esphera em que lutam os partidos.

Votei a reforma dos impostos directos offerecida pelo sr. Casal Ribeiro em 1860, e não me arrependo. Via perfilhada depois pelos proprios adversarios e foi a meu ver um grande passo no caminho da organisação da fazenda. Votei o augmento do imposto de viação, e realisadas certas condições não hesito em admittir igualmente a ampliação do real de agua, denominado n'este projecto imposto de consumo.

A occasião é melindrosa e o assumpto é grave. Sabemo-lo todos e está na consciencia de todos; e se não vejo o futuro tão negro e a solução do problema tão arriscada e distante, como a pintam apprehensões respeitaveis, se não considero desesperada a situação da fazenda publica, não ignoro que o mal, por extenso e antigo, se ía tornando quasi chronico, e que importa atalha-lo com vigor e sem descuido, porque póde reverdecer e aggravar-se. A crise actual, a meu ver, está muito no caso de ser superada, e ha de se-lo com muito menores sacrificios mesmo, do que em outros reinos poderosos, aonde se empregam para o

vencer meios que, espero em Deus, não serão necessarios aqui.

O deficit é avultado e no pendor por onde escorregávamos promettia tomar proporções assustadoras. Felizmente ainda não é tarde para se lhe acudir, e a opinião publica, acordando da apathia, começa a olhar com interesse, por um negocio que é de todos. Ainda bem! Parte dos encargos que nos opprimem derivam se das despezas feitas para conquistarmos o tempo perdido na estrada dos progressos physicos e moraes. A civilisação é cara sempre, e o noviciado d'ella mais caro ainda. Talvez a impaciencia nos apressasse de mais, mas a verdade é que estavamos sem nada e carecíamos de tudo (apoiados).

Entrados no caminho dos melhoramentos, de que se colhem já vantagens visiveis, e de que de futuro a fazenda ha de aproveitar o que a prosperidade geral sempre lhe afiançou, vemo-nos obrigados hoje pelo desequilibrio financeiro, não a parar, mas a medir com mais pausa as jornadas e a calcular com menos impetuosidade as despezas. É tempo de olharmos por nós e de notarmos como e até onde podemos ir. O impulso juvenil deve ceder aos conselhos da prudencia. Aceitemos só emprezas proporcionadas ás nossas forças,

O deficit existe e representa sommas avultadas. Cumpre em presença d'elle estudar bem o nosso estado, e não excedermos as regras que elle dictar. A reforma dos quadros por meio da reorganisação mais economica de muitos serviços póde apontar-nos reducções importantes sem offensa dos direitos adquiridos, nem ruina e miseria das familias. Estreitemos mais as portas á mania dos empregos; zelemos com mais vigilancia o numero e o trabalho dos funccionarios; cortemos de futuro na pompa esteril do pessoal, e applicado este systema em larga escala com perseverança, hão desde logo começar-se a sentir melhoras, e progressivamente o beneficio irá estendendo-se e actuando. Bastaria a tendencia saudavel, não só para não augmentar as despezas, mas para as ir encurtando sempre que for opportuno, para se obterem sem ruido valiosos resultados (apoiados).

E por isso -que vinha insistir na nomeação da commissão externa, crendo que n'ella, como na de 1840, o voto de homens competentes será proficuo, e auxiliará o governo na missão difficil que pésa sobre elle.

Não são da minha provincia nem da minha especial vocação os livros de economia politica; já os li e consultei muito; mas os financeiros e os economistas nem sempre concordam, e eu que não sou uma cousa nem outra, tomo algumas vezes a liberdade atrevida de não jurar absolutamente nas palavras dos mestres. Se ouvisse uma escola diria, que o imposto de consumo merece a condemnação com que o fulminaram varios pontifices da sciencia, até pela incidiosa innocencia apparente. Mas escutando outros auctores vejo absolvida a contribuição dos maiores peccados, e senão canonisada, o que fôra muito, tratada com tributo que póde entrar na roda dos seus iguaes (riso).

Ser-me-ia facil adduzir citações, mas agora não se trata de uma disputa de preferencia de impostos, nem de uma ostentação doutrinal, de suas qualidades e defeitos relativos. Em absoluto, declaro que não sympathiso com o imposto de consumo como existe em França e em Hespanha. Quanto ao imposto de que trata o projecto, que apenas affecta uma das fórmas da contribuição vexatoria das duas nações, e a fórma menos violenta, hei de approva-lo, obedecendo á necessidade, porque não vejo que o deficit se possa vencer sem sacrificios, e porque é obvio que não ha reducções sisudas que evitem este mal indeclinavel. Se podesse optar pelo imposto directo, preferia-o seguramente; não sendo porém justo, nem opportuno concentrar todo o peso do encargo em uma só fórma de contribuição, antes o real de agua ampliado do que o deficit accumulado e ameaçador.

Todo o imposto é um mal, uma dor. Por isso o primeiro dever do legislador é attenua-lo quanto possivel, repartindo-o com a maior equidade, e variando as suas fórmas para que o sacrificio se divida por todas as classes proporcionalmente e não esmague uma só.

Não me opponho pois á idéa geral do projecto sobre o imposto do consumo, já vê a camara porque reconheço e confesso a necessidade de lutar sem demora com a crise e de limpar os horisontes financeiros; e embora a situação não seja desesperada, é todavia bastante grave para exigir imperiosamente que se não levante máo do remedio, porque cada dia que decorrer inutil aggravará pelo recurso ao credito os encargos permanentes do estado.

Eis a rasão por que não duvido votar a generalidade do projecto. Se alguem sabe e me aponta meio pratico e efficaz, melhor do que este, desde já protesto segui-lo.

Quando entrarmos no exame da especialidade, apresentarei algumas duvidas dictadas unicamente pelo desejo de esclarecer ou suavisar uma ou outra disposição. Estou convencido de que o governo, depois de attender ás necessidades do momento actual, ha de desenvolver e aperfeiçoar a base que hoje vejo esboçada apenas.

A igualdade com que as tabellas ferem os generos sem attenção á diversidade de preços e de população pareceme envolver em si grande desigualdade. Eis o primeiro ponto.

Sei que o projecto, alem de fugir ao escolho das excessivas despezas de fiscalisação, procura insinuar o governo no logar dos municipios, sem ruido e com a possivel suavidade; entretanto quando nós vamos collectar com a mesma taxa vinhos de qualidades e de preços mui differentes, arriscamo-nos a incorrer na censura de que caímos talvez em um mal grande por evitar outro menor. Em relação a carne, noto o mesmo, alem de outra circumstancia digna de contemplação.

E de summo interesse para o paiz que esta alimentação não essencial, nem de primeira necessidade em quasi todo o reino, em vez de se tornar inaccessivel se torne mais facil ás classes pobres. O projecto só por si não altera muito as condições do consumo, mas aggravado pela percentagem municipal, receio que restrinja ainda mais o uso da carne nas povoações ruraes especialmente.

Um relatorio importante do sr. ministro das obras publicas discutiu já profundamente este ponto, mostrando quanto convinha que a alimentação do paiz melhorasse por este aspecto.

A questão do imposto, como todas as questões que affectam interesses, suscitou, não direi só, como o sr. ministro do reino, certo sobresalto, mas verdadeiro descontentamento em diversas localidades. Entretanto estou convencido de que não foram unicamente as propostas relativas aos impostos a causa d'esta agitação, aliás natural. As apprehensões correram adiante da verdade, e a coincidencia de muitas reformas no mesmo momento assustou e inquietou os povos.

Hoje creio que principia a acalmar a maior effervescencia... A opinião publica, que não é de nenhum partido, embora ouça todos, começa a ver o problema com extrema clareza e com admiravel instincto. Teme o deficit, teme as tendencias que o crearam, e quer que se governe de outro modo. Tem mil vezes remedio. Sabendo que uma senda vae direita a um abysmo ninguem teima em correr por ella. Não se põe termo ao estado, em que se acha a fazenda pública, senão unindo as economias aos sacrificios e confiando nas forças vivas do paiz. Aliás o resultado seria terrivel. Não ha repugnancia absoluta ao pagamento de novos impostos, mas deseja-se, pede se que as tendencias governativas tomem esta direcção prudente.

Se o governo, como espero, declarar que a execução sincera d'este systema será o seu programma, se as reformas dos serviços se estudarem e propozerem, se todos os ministerios seguirem os exemplos dados pelos da fazenda e obras publicas, o imposto ha de ser aceito pelo paiz, e eu não duvido vota-lo, tanto mais, que sei que se o negasse a este gabinete teria de o conceder ao que lhe succedesse, porque a necessidade não se declina e o dever dos homens publicos é pedirem ao paiz os sacrificios indispensaveis.

Mas o paiz tem direito tambem a exigir dos governos que as despezas se limitem ao estrictamente necessario, e que não excedam as condições de um paiz como o nosso.

Não creio na tesoura orçamental, mas creio nas reorganisações meditadas. Existem varios conselhos que apenas custarão 100.000$000 réis, nem tanto, e que servem de texto ás declamações. É possivel reduzi-los a um só, o de estado administrativo com proveito publico e economia. Outras muitas reformas iguaes se me representam faceis.

As circumstancias e os deveres politicos pedem e mandam que demos satisfação ao paz.

Votando os impostos que são necessarios, acudimos ao mal que se adianta, affirmando e executando o principio das reducções sensatas evitaremos que elle se repita.

Em relação á cidade do Porto, sem querer que ella seja isenta de concorrer para os sacrificios geraes, desejaria que a transição fosse mais suave. O argumento, deduzido do que paga aquella cidade, em relação a Lisboa, não me parece inexpugnável, porque Lisboa é das capitaes mais oneradas e porque se deve attender á população e á situação anterior. Esta questão precisa, a meu ver, ser estudada ainda, e talvez podesse resolver-se pela combinação dos impostos, actuaes com uma pauta menos extensa e menos carregada.

Agradeço á camara a benevolencia com que me ouviu, e peço-lhe que me releve a incoherencia d'estas desatadas reflexões. O meu estado de saude ainda não é bom.

Resumindo, repito que voto o imposto que for indispensavel para superarmos o deficit, mas que o voto com a condição expressa de que a sua justiça e opportunidade serão justificadas pela mais economica applicação; e hoje a justificação de impostos só podem ser reformas e reducções, que provem novas tendencias e assegurem que não haverá reincidencia no erro antigo, erro que foi de todos os governos e do paiz tambem. Não lisonjeio o povo que hoje, como soberano, tem aduladores, nem cortejo falsas auras tão ephemeras como vãs; obedeço ao meu dever e á minha consciencia e nada mais. O meu desejo é ver o paiz, que amo, tranquillo, prospero e respeitado das outras nações como era ha pouco e ha de ser. O seu melhor exercito é a paz, e a sua mais poderosa arma o trabalho.

O sr. Ministro da Fazenda: — Sr. presidente, eu applaudo as eloquentes reflexões que o digno par acaba de fazer: são ellas mais uma prova do alto e proverbial talento do s. ex.ª

Effectivamente, se o ' governo se apresentasse ao parlamento pedindo-lhe que votasse impostos sem acompanhar este pedido da apresentação de outras medidas tendentes," inquestionavelmente, a melhorar a situação da fazenda publica, e a estabelecer uma tendencia que é ao mesmo tempo moralisadora e economica, de certo procederia mal, e daria logar a negar-se-lhe a approvação d'esses impostos; mas não se fez assim: V. ex.ª e a camara sabem perfeitamente que, nas differentes propostas apresentadas ao parlamento, por differentes membros de que se compõe a actual administração, têem-se indicado reducções importantissimas, que montam já á somma de 700:000$000 réis. Ora o digno par, e toda a camara, não acharão de certo, na apreciação d'esta medida, e tendo em attenção o estado da fazenda publica, que seja esta somma tão pequena, que possa passar despercebida. As intenções do governo, como se sabe, porque elle bem as tem manifestado em actos positivos de administração, são todas tendentes a reduzir a despeza do estado; e não pára aqui: tenciona continuar com estas reducções, que são — umas, proprias economias, outras, me