DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 543
firam principalmente ao artigo 18.°, que já está votado, peço todavia licença a s. exa. para lhe dizer que não se póde consignar verba alguma d'este artigo, porque ella ha de ser auctorisada annualmente. Póde ser maior ou menor, conforme-as necessidades a que for mister acudir, e as camaras auctorisarem. No orçamento é que essa verba ha de ser pedida todos os annos.
Emquanto ao artigo 19.°, cumpre-me dizer que o seu pensamento parece claro e manifesto. O que se pretende, creando esta medalha de oiro, é estimular o zêlo dos individuos, aliás opulentos, que desejem repartir uma parte da sua fortuna com os melhoramentos da instrucção publica.
Por outro lado, parece-me que não se póde abusar da concessão d'esta medalha, porque as circumstancias em que deve ser conferida, acham se evidentemente determinadas no artigo.
Carecem, portanto, de fundamento os receios do digno par, em quanto a esse ponto.
O sr. Presidente: - Vae votar-se o artigo 19.°
Os dignos pares que o approvam, tenham a bondade de se levantar.
Foi approvado.
O sr. Presidente: - Passâmos á discussão do artigo 20.°
Foi lido na mesa.
O sr. Ministro do Reino (Luciano de Castro): - Declaro a v. exa. que n'este artigo ha uma omissão; não designa o artigo da lei de 1878, que auctorisa as camaras municipaes, a estabelecer cursos nocturnos e dominicaes.
Proponho, por conseguinte, que o artigo 20.° comece d'este modo:
«Os cursos, a que se refere o artigo 24.° da lei de 2 de maio de 1878, poderão» etc.
O sr. Presidente: - Apontou os sr. ministro do reino uma omissão que deve ser preenchida, lendo-se d'esta maneira o artigo 20.°:
«Os cursos, a que se refere o artigo 24.° da lei de 2 de maio de 1878, poderão comprehender todas as disciplinas de cada um dos graus do ensino primario, ou sómente algumas d'ellas.»
Os dignos pares que approvam o artigo 20.° com esta nova redacção, tenham a bondade de se levantar.
Foi approvado.
Foi lido e approvado sem discussão o artigo 21.°
Leu-se o
Artigo 22.°
O sr. Visconde de Chancelleiros: - Este artigo ou diz muito ou não diz nada. Francamente confesso, a v. exa. que não comprehendo o pensamento d'elle.
«Na organisação dos cursos para adultos, attender-se-ha ás condições especiaes da industria local.»
Parece-me simplesmente uma banalidade, e portanto uma inutilidade, e as expressões vagas e palavras inuteis devem ser banidas do corpo da lei, segundo aquelle preceito que facilmente acudiu á memoria do illustre professor e nosso collega o sr. Ferrer, quando citou aos seus discipulos a sentença de Bentham, de que as palavras da lei devem ser pesadas como os quilates do diamante.
Em primeiro logar, quaes são os pontos do nosso paiz que tenham industria local?
Com excepção dos dois grandes centros de população de Lisboa e do Porto, e de dois outros pontos onde tambem excepcionalmente existe a industria fabril, Covilhão e Alemquer, quaes são as terras do paiz onde ha industria local a cujas condições especiaes se deva submetter o plano de organisação dos cursos para adultos?
Note a camara que estamos tratando de uma lei sobre o ensino primario, ao qual são completamente estranhas as altas concepções philosophicas e os principios syntheticos da sciencia, que apenas se podiam compendiar em cursos adoptados a outro grau de instrucção.
A nossa quasi unica industria é a industria agricola, é a primeira e a principal fonte de riqueza do paiz; e d'essa industria o principal ramo, o mais importante, é a da industria viticola. Tão estranhos andâmos, porém, ao estudo das cousas praticas, que o ensino elementar, já da quinta regional, já do instituto geral de agricultura, não presta áquella industria, pelos individuos habilitados que d'ali saem, quasi que serviço algum.
E falla-nos agora este projecto, com emphase, de cursos adaptados ás condições especiaes de industria local! Tanta palavra!
Sr. presidente, temos a lei de 2 de maio de 1878. Não. lhe demos ainda execução e preparamos já uma outra lei. Leis não nos faltam. Temol-as de sobra. Ensino pomposo temol-o nos programmas; mas onde estão as escolas?
É facil propor uma lei, não é muito mais difficil fazel-a approvar; mas que ganha com isso o paiz se a não fazemos executar?
Querem acaso fazer acreditar que vamos dar á instrucção publica um impulso como não tem tido até aqui? Pois não ouviram ainda agora o sr. Carlos Bento declarar que o ensino obrigatorio está estabelecido em Portugal desde 1844? E que instrucção temos? Mais ainda; impondo a obrigação de aprender, que escolas temos para ensinar? Pois temos já, e de ha tantos annos, o ensino obrigatorio, aquillo que outras nações onde a instrucção se generalisou, e que vão na vanguarda da civilisação, tiveram depois de nós.
Dir-se-ía que o empenho de todos os governos tem sido conservar o paiz estacionario em materia de instrucção. Não temos tido, não digo já a instrucção nas condições em que o projecto a define, mas n'aquellas mesmas, as mais rudimentares com que outras leis a impunham como impreterivelmente necessaria.
D'ahi vem as tristes condições em que nos encontrâmos.
Pois, se o paiz tivesse instrucção não estaria tambem mais adiantada a educação constitucional?
Teriamos como temos uma massa de eleitores, quasi que a totalidade de todos elles, ignorando completamente a Importancia do mandato que pela eleição constituem, e deixando impunemente affrontar a liberdade da uma com todas as vexações?
Concluo, insistindo pelas explicações do sr. relator da commissão ou do sr. ministro do reino, e insistindo tambem em affirmar que este artigo do projecto me pareceu completamente inutil.
O sr. Bispo eleito do Algarve: - Quero satisfazer o digno par; chamo a sua insistencia pueril.
Eu acho o artigo perfeitamente rasoavel, porque effectivamente em muitas partes do paiz ha uma industria predominante.
S. exa. sabe perfeitamente que, por exemplo, em Aveiro ha a industria do sal, assim como ha outras industrias predominantes em outras partes do paiz, que eu podia citar.
Foi approvado o artigo 22.°
Leu-se o
Artigo 23.°
O sr. Visconde de Chancelleiros: - Não comprehendo tambem o pensamento inserido n'este artigo.
«É o governo auctorisado a estabelecer durante as ferias cursos de aperfeiçoamento para professores primarios, comtanto que não seja excedida a verba do orçamento para despezas de instrucção primaria.»
Que ferias são então estas, sr. presidente, e a que despezas é que obrigam os cursos de que falla este artigo, e para as quaes póde não chegar a verba do orçamento? Que ferias são estas? Que cursos são estes? De que verba do orçamento é que se falla?
Mal comprehendo ferias em que se trabalha. Comprehendo que ferias eram os ocios que os pobres professores passariam sub tegmine ulmi; peço perdão, sub tegmine fagi.