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SESSÃO DE 19 DE JULHO DE 1887 703

guerra da Peninsula, e eu podia recordar á camara os factos historicos é assignalados do exercito, que tinha como legenda nas suas bandeiras versos sublimes do immortal Camões.

Eu tomei a palavra para em boa paz fazer estas reflexões ao sr. ministro da guerra, por quem tenho a maxima consideração e a maior estima; mas a quem não vejo agora como camarada e sim como ministro da guerra.

Tinha ainda a referir-me aos outros elementos constituitivos do exercito e sobre as suas leis organicas, especialmente sobre as leis de promoções, mas eu não desejo abusar da benevolencia da camara, mas não posso dispensar-me de dizer alguma cousa sobre a lei da promoção.

Um dos requisitos essenciaes para que um exercito seja forte, e desempenhe cabalmente a missão que a sociedade lhe confia, consiste, em que todos os commandos, desde os de menor importancia até aos mais elevados na hierarchia militar, sejam exercidos por quem, ás demais qualidades que devem distinguir o verdadeiro homem de guerra, reuna uma instrucção militar adequada ao cargo que desempenha, e os conhecimentos que hoje se exigem a toda a pessoa civilisada.

Será porventura possivel conseguir este resultado em Portugal sem os inconvenientes que muitos imaginam?

Em todas as nações cuja organisação militar póde tomar-se por modelo, a lei tem determinado as condições de capacidade, pelas quaes se regulam as promoções nos diversos postos, desde o de cabo de esquadra até ao de general. O principio, geralmente admittido, de que a cada funcção do serviço publico deve corresponder uma conveniente habilitação, não deve ser rejeitado na carreira militar; porque seria rebaixar a nobilissima profissão das armas ás condições de um mister mechanico, em que a pratica menos esclarecida dispensasse o auxilio de toda a luz intellectual.

A arte da guerra foi sempre entre os povos cultos, e é, hoje principalmente, mais alguma cousa do que o systema de arrojar um contra o outro dois exercitos,, para decidirem, pelo simples conflicio da força bruta, as pendencias entre as nações. A guerra, tornou-se uma sciencia vastissima, que pede auxilio a muitas outras sciencias, e que aperfeiçoa os seus meios e multiplica os seus recursos, á medida que o progresso vae alongando o horisonte dos conhecimentos humanos. O militar destinado pelo seu posto a exercer sobre os seus subordinados a influencia do commando, não póde sem grave prejuizo do exercito e da nação a que pertence, isentar-se de possuir os conhecimentos indispensaveis, segundo a arma em que servir, e a importancia do cargo que lhe cumpre desempenhar. Assim como o official do estado maior, o engenheiro e o artilheiro, tem de satisfazer ás condições scientificas que a lei previdentemente lhes impõe, não ha rasão plausivel que dispense o official de infanteria, e o de cavallaria de possuir as habilitações que se julgam indispensaveis para desempenhar com proficiencia os deveres da sua honrosa profissão.

Promover um militar a official, abrindo-lhe assim o caminho que conduz aos mais elevados postos, acceitando-lhe por habilitação exclusivamente a prática do serviço e o bom comportamento, qualidades aliás apreciaveis, quando mesmo o não recommende alguma acção distincta no campo da batalha, seria retrogradar aos tempos primitivos, em que preceitos de barbarie estabeleciam uma absurda anti-pathia entre a intelligencia e a acção, entre a sciencia e o valor, como se a defeza da patria, a mais alta de todas as funcções sociaes, não merecesse os cuidados do talento e o auxilio da sciencia?!

Os exercitos mais exemplares na organisação, na disciplina e na instrucção; mais ennobrecidos por distinctas acções guerreiras, são exactamente aquelles em que a sciencia preside com maior esplendor a todos os trabalhos militares, desde o fabrico do material, até ás mais elevadas operações da estrategica e da grande tatica. Ali, as palmas da intelligencia abraçam-se com os louros da victoria; o vigor do entendimento convive com os brios do coração.

Em Portugal, as difficuldades dos tempos tem obstado á organisação moral de muitos serviços publicos, consentindo apenas que alguns fundamentos, ainda desconnexos, se lançassem, para sobre elles se estabelecer a illustração do exercito. As suas antigas mas previdentes leis de accesso foram esquecidas, prevalecendo o receio do patronato aos justos preceitos, que regulavam tão importante objecto. A admissão ao primeiro posto de official não está ainda, rigorosamente dependente de que os candidatos provem por documentos, ou por exames a sua capacidade: primeira regra a estabelecer, com proficuo resultado, para a. regeneração do exercito, respeitando-se todavia, em termos habeis, os direitos adquiridos.

Attenda-se quanto possivel, ao principio da antiguidade, porque não, seria justo cortar, o accesso a officiaes encanecidos nas fadigas da guerra, e que tão valiosos serviços, prestaram ás liberdades patrias; mas não se, comprometia a existencia do exercito, como se demonstra a priori, e com ella, talvez, a garantia da independencia nacional, deixando de se prescrever as habilitações indispensaveis, pelo menos para os postos de, alferes, major e general de brigada.

A hora está adiantada, eu estou cansado e a camara, muito, mais de me ouvir.
(Vozes: - Falle, falle.)

Vou pois terminar, lembrando a s. exa. duas cousas: a primeira que tenha muito cuidado com a disciplina do exercito, e com os factos para que chamei a sua attenção; a segunda para conjurar as aspirações manifestadas n'um discurso que a proposito da tomada de Roma pelas valentes, tropas de Victor Manuel, proferiu o grande tribuno Emilio Castellar, o primeiro orador da peninsula, lembrava ao seu governo em phrases eloquentissimas que aproveitasse qualquer circumstancia politica, dando como exemplo da Italia, para tornar Lisboa capital da Iberia. (Apoiados.)

Eu escuso de lembrar a s. exa., porque estou certo do seu patriotismo, e confio na sua illustração e na sua solicitude, que a defeza da patria é a mais alta de todas as funcções sociaes. Que o exercito deve tornar-se pela sua disciplina, pela sua illustração e espirito militar um poderoso elemento de civilisação e de ordem publica na paz, e em, taes condições um seguro penhor de bons resultados na, guerra, para garantir a independencia nacional.

Tenho concluido.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado por varios dignos pares.)

Leu-se na mesa o seguinte

Projecto de lei

Artigo 1.° A força publica em Portugal, constará de tres elementos:

1.° Exercito activo;

2.° Reserva de 1.ª e 2.ª classe;

3.° Milicia nacional.

§ 1.° A milicia, nacional será organisada por uma lei especial.

§ 2.° O exercito activo será composto, em tempo de paz de 40:000 praças de pret de todas as. armas.

Art. 2.° A reserva de 1.ª classe será formada com as praças que concluirem o seu tempo de serviço no exercito permanente; a de 2.ª classe, compor-se-ha dos mancebos, definitivamente apurados no recenseamento, mas excluidos pela sorte do serviço activo, dos que se fizerem substituir, dos que trocarem e dos isentos do serviço activo.

Art. 3.° Todo o cidadão portuguez será obrigado a servir a patria, desde a idade de dezenove annos completos, até á de cincoenta.

Art. 4.° O tempo de serviço no exercito nacional continuará, a ser fixado em oito annos. Os que a sorte designar para comporem o contingente activo, servirão tres, annos