50 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
tendidas no assunto que este anno, por um conjunto de circunstancias, em que predominam a temperatura e a humidade, o Douro terá uma colheita tão boa como a de 1870. E, todavia, a procura é a mesma! Estamos a quinze dias da vindima, e, até agora... não ha procura alguma, quando é certo que em outras epocas, nesta altura, todo o vinho estava já vendido.
O preço da aguardente ó, sempre, proporcional á qualidade dos vinhos licorosos nas diversas colheitas. Pois este anno esse preço pode ter subido alguma cousa por motivo da aproximação da colheita, mas não vae alem de 70$000 réis a pipa em Gaia, apesar da excellencia da novidade que se annuncia, o que demonstra bem o caracter agudo da crise.
É fora de duvida que se as 50:000 pipas da exportação do vinho licoroso fossem adquiridas no Douro, como o seriam se os armazens de Villa Nova de Gaia não estivessem abarrotados de vinhos de outras regiões, o Douro não teria a sua crise resolvida em absoluto, mas encontrar se-hia em condições relativamente desafogadas.
No Douro ha muitas propriedades ao abandono: umas por falta de recursos para o amanho respectivo, outras por falta de confiança no futuro d'aquella região.
O Douro pode morrer, se não lhe valerem. Mas essa morte representará um golpe terrivel para a economia do país, porque, apesar de tudo, a exportação do vinho do Porto faz que entrem em Portugal, todos os annos, 6:000 contos de réis.
O desanimo começa a invadir, até alguns dos espiritos mais fortes da região duriense.
O Sr. Conde da Folgosa, por exemplo, que apresentou sempre a sua quinta da Folgosa como um verdadeiro modelo de tratamento, mais parecendo um cuidado jardim do que uma propriedade para a cultura da vinha, já este anno a deixou abandonada, convencido de que seriam inuteis todos os sacrificios do amanho, visto não haver saida para o vinho a produzir.
E um quadro desolador, que impressiona vivamente quem por ali passa, e se recorda do que foi aquella quinta, em melhores tempos.
O exclusivo da barra do Porto é a unica esperança de salvação para a garantia do credito dos vinhos do Douro.
Tudo, pois, aconselha que, directa ou indirectamente, se soccorra o Douro, emquanto os armazens de Villa Nova de Gaia não se esvaziam do vinho do sul e a exportação não é feita por compras realizadas na região duriense.
No dia em que o vinho generoso exportado pela barra do Porto for adquirido no Douro, o Douro não poderá recuperar a sua grandeza antiga, unica neste país, mas encontrar-se-ha em uma situação de mediania, compensadora dos seus esforços.
O decreto de 10 de maio, á sombra da miseria do Douro, beneficiou, em alta escala, os interesses de outras regiões.
Os que mais lucraram com elle foram os productores de aguardente do sul e os de açucar da Ilha de S. Miguel.
Abandono a questão sob o ponto de vista geral, fazendo incidir a minha analyse apenas sobre algumas disposições, a fim de justificar o meu voto e provocar explicações e compromissos, da parte do Governo, sobre o que julgo prejudicial no projecto em discussão.
Occupando-me da area da região duriense, lembro que a demarcação adoptada no decreto de 10 de maio era a do projecto por mim apresentado ao Parlamento, tempos antes.
Desde que se estabelecia o principio de que, pela barra do Porto, só poderia ser exportado, como vinho do Porto, o vinho produzido na região duriense, entendi que tudo recommendava produzir essa região o vinho necessario para a exportação.
D'ahi, a extensão da area.
Todos os que se occupam do assunto, com interesse, conhecem o mappa da região demarcada pelo Barão Forester, que serviu de base á demarcação actual.
Na epoca em que essa area foi demarcada, podia ella admittir-se, não só porque a exportação era menor, como tambem porque todos os terrenos que a constituiam estavam plantados, o que hoje não succede.
Hoje, a região Forester não produz, sequer, metade do vinho necessario para a exportação pela barra do Porto!
Todavia, depois das correcções feitas á proposta do Governo, que alargaram a area primitiva, não vejo inconveniente em que seja approvada a demarcação proposta.
Contra uma disposição do artigo 3.° me insurjo porem: a que permitte incluir na região dos vinhos generosos do Douro as propriedades situadas na região do vinho de pasto que se reconheça deverem gozar d'esse privilegio.
Essa disposição briga com a economia do projecto.
É, sempre, muito difficil dividir freguesias para effeitos d'essa ordem, porque a lei não permitte que na região demarcada entrem vinhos de fora, o que tira a estes vinhos os seus mercados naturaes.
Quaes as garantias de fiscalização d'esta providencia? Sendo a região
continua, o proprio interesse dos pó vos aconselha estes a que fiscalizem o cumprimento da lei, impedindo a entrada do vinho estranho, para que esse vinho não possa sair, depois, com a marca da região.
Havendo soluções de continuidade, isto é, legalizando-se o regime de privilegio para propriedades isoladas, dá-se, precisamente, o contrario: os povos vizinhos lucram com a fraude, que lhes permittirá introduzirem o seu vinho na zona privilegiada.
Nestas circunstancias, o que se propõe é a sancção de um systema de ludibrio, para viciar o espirito da lei.
A fiscalização só poderia exercer-se, se o Governo pudesse dispensar um cordão de tropas para cada propriedade das que usufruissem as garantias do § 1.° do artigo 3.°
Passando a occupar-me do artigo 4.°, noto que a commissão de viticultura da região do vinho do Douro, a que me refiro, é uma das innumeras commissões do projecto.
Quando, o anno passado, se falou tambem na constituição d'essa commissão, e correu o boato de que os logares eram remunerados, appareceram pretendentes aos cardumes.
A commissão foi nomeada. Mas o enthusiasmo arrefeceu. Até hoje nada ella fez, não havendo noticias, sequer, de se ter constituido. Decididamente... os logares não eram remuneradas!
Temos agora o artigo 13.° É o que autoriza o Governo a restituir aos viticultores da região dos vinhos generosos do Douro, durante o prazo de 2 annos, o imposto do real de agua que pagar, á entrada na cidade do Porto, o vinho produzido nessa região, devendo, em regulamento especial, ser fixadas as condições em que será feita esta concessão.
Eu tenho a responsabilidade de affirmações no sentido de não se votarem providencias da que resultem aumentos de despesa ou reducção de receitas, dada a situação precaria em que se encontra a Fazenda Publica, excepto, é claro, em casos de força maior, impostos pela gravidade de circunstancias.
Ora é precisamente um d'esses casos o que se dá neste momento.
Trata-se de minorar os terriveis effeitos de uma calamidade publica e, porventura, de evitar graves perturbações da ordem.
Por isso não. combato o artigo em questão. De resto, elle tem um caracter provisorio para valer ao Douro, emquanto os armazens de Gaia não estiverem desembaraçados do vinho do sul ali introduzido, á sombra do decreto de 10 de maio.
Qual é a importancia do que se propõe?
No Porto entram, todos os annos,