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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 4 DE JUNHO.

Presidencia do Ex.mo Sr. Cardeal Patriarcha.

Secretarios - os Srs.

Conde de Fonte Nova.

Brito do Rio.

(Assistia o Sr. Ministro do Reino, e entraram depois os Srs. Ministros, da Fazenda, e da Justiça).

Depois das duas horas 6 meia da tarde, tendo-se verificado a presença de 36 dignos Pares, declarou o Em.mo Sr. Presidente aberta a sessão. Leu-se a acta da antecedente contra a qual não houve reclamação.

O Sr. Secretario Conde de Mello deu conta da seguinte correspondencia:

Um officio do Ministerio do Reino, satisfazendo, em parte, ao requerimento do digno Par Visconde de Fonte Arcada, em que se sollicita uma relação dos juros, censos e fóros de algumas misericordias, e hospitaes.

Para a secretaria.

O Sr. Secretario Brito do Rio — Participo á Camara que o digno Par o Sr. Visconde de Benagazil, por impossibilidade justificada, não pode comparecer á sessão de hoje.

O Sr. Visconde Sá da Bandeira leu e mandou para a Mesa um parecer da commissão de marinha e ultramar.

A imprimir.

O Sr. Conde de Santa Maria — Sr. Presidente, em consequencia do que se resolveu nesta Camara, em uma das sessões passadas, para que cada uma das commissões nomeasse dois membros para coadjuvarem a commissão de fazenda nos trabalhos do orçamento, nomeou a commissão de guerra os Srs. Visconde de Francos, e José Feliciano da Silva Costa.

O Sr. Presidente — Para o mesmo fim, fomos nomeados pela commissão de negocios ecclesiasticos e instrucção publica, eu, e o Sr. Bispo de Vizeu.

O Sr. Barão de Porto de Moz — Tenho a participar á Camara, que a commissão de administração publica nomeou para assistir ao exame da parte respectiva do orçamento, ao Sr. José Maria Eugenio de Almeida e a mim.

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O Sr. Aguiar — Para lei a redacção do projecto ultimamente approvado (leu).

Foi approvada para passar á outra Camara.

ORDEM DO DIA.

O Sr. Duarte Leitão — Sr. Presidente, o projecto que está em discussão determina que haja um Presidente do Conselho de Ministros, e que este Presidente do Conselho de Ministros servirá, por via de regra, uma das Secretarias de Estado; mas que, se o bem do Estado o exigir, possa servir de Presidente sem pasta. Não obstante, que não ha na Carta Constitucional expressa disposição de que haja um Conselho de Ministros, e que este Conselho tenha um Presidente, comtudo, ninguem duvidou até agora, nem espero que duvidará, de que é conforme ao espirito das nossas instituições, que os Ministros formem um Conselho. E digo que repugna ao systema da Carta, e por isso nunca foi admittido entre nós o que em alguns paizes se decretou, de que os Ministros não formem nunca um Conselho, como, por exemplo, o foi em França, na Constituição do anno terceiro, que o determina expressamente; e agora mesmo, tambem em França, na actual Constituição do imperio, a responsabilidade solidaria é expressamente excluida. Mas são outras instituições, é outro systema; e entre nós ninguem duvidou, ninguem talvez duvidará da regra geral estabelecida neste projecto. Ella por isso não foi impugnada, nem o podia ser, porque sempre foi praticada como conforme ao systema representativo, que a Carta Constitucional fundou. O que foi impugnado foi que este Presidente do Conselho podesse servir sem estar ligado a uma pasta. Não se fizeram objecções algumas constitucionaes contra esta disposição; antes, se bem me lembro, expressamente se reconheceu a sua constitucionalidade, ou, pelo menos, a sua não repugnancia á Carta Constitucional. Foi alliviada a commissão do trabalho dessa discussão, bem que comtudo se possa pensar que poderiam haver objecções, se não sólidas, ao menos de alguma maneira especiosas. Apesar disso o projecto, como disse, não foi impugnado por este lado, e precisamente se tractou da necessidade da medida, e da personalidade que se tinha em vista com esta medida, em respeito á doença do Marechal, actual Presidente do Conselho.

Impugnou-se o projecto dizendo-se que não era necessario, e não sendo necessario, não se podia fazer a despeza. Se não é necessario, não se deve fazer a despeza; estamos concordes; mas se é necessario, desapparece a objecção da despeza. Tambem foi isto confessado. E não podia deixar de o ser, porque se se demonstrar que é necessaria esta providencia, desapparece a questão da despeza. Mas se a providencia não é necessaria, então não se deve fazer a despeza. Nesta parte estou concorde com o digno Par o Sr. Conde de Thomar, que impugnou o projecto por estes fundamentos; e eu desejaria sempre estar conforme com S. Ex.ª; desejaria concordar sempre com elle, porque sou seu amigo, tenho por elle alta consideração, e a divergencia de algumas opiniões não faz diminuir, nem essa consideração, nem a amisade; mas no caso presente o digno Par; é a causa de eu o combater, não obstante a minha repugnancia, porque eu, como membro da commissão, como aquelle que leu aqui o parecer, sou compellido a refutar as suas razões, ou expô-las de modo que a Camara lhe dê o devido valor.

O digno Par disse, torno a repetir, que «se não é necessario, não se deve fazer a despeza.» Mas S. Ex.ª não julgou conveniente demonstrar o principio, tão sómente o suppôz. Depois lançou-se nas generalidades; correu por differentes ramos da administração publica, á pressa sim, mas com a vehemencia proporcionada á sua convicção. Eu bem sei que o digno Par não tinha tempo para entrar no exame de todos os objectos em que fallou, mas tambem sei que muitas vezes se póde esperar que o exame e a analyse sejam suppridos por uma declamação. Isso tambem eu sei. S. Ex.ª fallou em diversas cousas; fallou no Conselho ultramarino, na desnecessidade da despeza que com elle se faz, da desnecessidade de creação de um dos Ministerios, em despezas superfluas; até fallou na exposição de Paris; nos theatros, no Stoch-Exchange; mas é impossivel, absolutamente impossivel, que o digno Par com o seu abalisado talento não reconheça que tudo isto era estranho á questão. {O Sr. Conde de Thomar — Peço a palavra.) Se o Conselho ultramarino é desnecessario; se as -despezas que com elle se fazem são superfluas, que ligação tem isso com a necessidade da providencia que se discute?... Essas cousas poderão ser, ou não ser verdadeiras, em parte, ou em todo, mas na discussão que se tracta, tudo isto não podia fazer mais do que augmentar o volume, ou para melhor dizer, a superficie, do discurso.

O digno Par disse que, se se adoptasse esta medida, havia de seguir-se abuso; que todos haviamos de ver uma Secretaria para esse Conselho. A Secretaria que deve haver é a mesma que agora ha, ou deve haver, a mesma que tem havido, ou deve ter havido, porque é sempre necessario que constem dos livros competentes as convocações, as deliberações, os negocios que se propõem, as suas resoluções: é necessario que tudo isto tenha o devido seguimento; é necessario que cada um dos Ministros siga na direcção da sua Secretaria o systema adoptado no Conselho, e tudo deve constar dos respectivos livros. Se se ha-de abusar ou nao, não é a questão. O motivo deduzido do abuso que póde haver para atacar uma instituição, não me parece certamente argumento digno do nobre Par. Se Se podesse combater qualquer instituição pelos abusos que por occasião della se podem praticar, nenhuma instituição ficava em pé. O abuso, Sr. Presidente, evita-se, previne-se, emenda-se, ou pune-se; mas a instituição que é boa deve subsistir.

Sr. Presidente, os Ministros já fallaram 6, segundo a minha humilde opinião, fallaram -concludentemente, e talvez que, qualquer cousa que possa accrescentar, pareça superflua a esta Camara. Eu sei, Sr. Presidente, que toda a repetição é quasi sempre enfadonha, quasi sempre superflua; e tenho receio de caie nesse defeito, nesse vicio; tenho receio de não poder conciliar a attenção da Camara; sim, Sr. Presidente, porque todas as repetições são, como disse, pela maior parte das vezes fastidiosas, e superfluas: quasi sempre superfluas, salvo o caso das luctas politicas, em que os competidores ao poder podem alcançar algum effeito, mais tarde, ou mais cedo, repetindo todos os dias, e em todos os tons, que os Ministros não fazem nada, não sabem nada, e perdem tudo. É por isso que espero que a Camara, quando eu não diga cousa digna da sua attenção, e consideração, ao menos me desculpe, attendendo a que eu não podia deixar de fallar, como Relator da commissão.

Sr. Presidente, fallou-se na doença do Marechal para mostrar que esta lei tinha em vista um individuo: que esta questão era pessoal. Não é questão pessoal, é uma questão geral de administração. A apreciação das circumstancias em que o bem do Estado exigir que o Presidente do Conselho de Ministros o seja sem pasta, a apreciação destas circumstancias ha de se fazer quando a lei tiver de ser applicada?... «Mas para que sè esperou até agora para se fazer esta proposta?...» A proposta demorou-se pelo mesmo motivo por que muitas propostas de reis se não fizeram ainda; porque muitas leis estão por fazer na multiplicidade das necessidades do Estado, tanto economicas, como administrativas, judiciaes e militares. Em tudo isso ha muita cousa por fazer; muitas leis assim organicas como regulamentares, e não é para admirar que uma lei destas se demorasse até agora. O Sr. Ministro do Reino já disse que a doença do Marechal foi que deu occasião a pensar o Governo, que era conveniente fazer esta lei, e por isso se tinha determinado a apresentar ao Parlamento a proposta. E era conveniente, porque, Sr. Presidente, talvez o Poder moderador, a quem incumbe pela Carta exercer as attribuições que a mesma Carta lhe confere, a quem incumbe nomear os Ministros, podesse julgar, que o bem do Estado exigia a nomeação de Presidente sem pasta. Estas foram as palavras, se hão me engano, do Sr. Ministro do Reino. Mas o digno Par referindo-se a este dito do Sr. Ministro do Reino, respondeu com uma exclamação: — Desgraçada Regeneração, que não póde sustentar-se sem que o Marechal Duque de Saldanha seja Presidente do Ministerio! Assim é que foi exposto, e avaliado o pensamento do Sr. Ministro do Reino; e sem duvida não seriam necessarios grandes esforços de imaginação para responder a tudo, se assim se quizesse sempre traduzir, ou travestir o argumento. Mas não foi isso o que disse o Sr. Ministro. É possivel que se sustente, é possivel que o estado actual das cousas não sofresse, pela saída do Marechal do Ministerio; é possivel que o systema de Governo por elle concebido fosse por diante; mas o que é certo é, que póde parecer conveniente, que póde parecer conforme aos interesses da Nação, ao bem do Estado, que quem até agora tem procurado conciliar dissenções, que quem até agora tem conservado a tranquillidade, quem tem animado o trabalho depois de violentas commoções continue a dar impulso ao systema que concebeu (apoiados). O que é certo, Sr. Presidente, é que ha mais de vinte annos, ainda não houve quatro annos completos sem revolta, senão agora. Desde que uma revolta acabou, começou outra antes de quatro annos; e agora não só o paiz tem gosado de tranquilidade ha mais de quatro annos; más tambem temos a mais bem fundada esperança de que assim ha de continuar (apoiados).

Sr. Presidente, póde haver circumstancias em que o interesse publico exija que um cidadão dirija a politica do Governo. Este homem póde por si mesmo prestar uma garantia de ordem, e de paz publica. Este homem póde ser reclamado pela confiança, e pela opinião quási unanime do paiz para o Ministerio. A sua experiencia, os seus serviços, as suas especiaes circumstancias podem fazel-o designar como ornais apto. Um general que não só tenha feito longos serviços, mas a quem a nação deva em grande parte a sua liberdade, a Carta Constitucional a sua restauração, a Camara dos Pares a sua conservação: que não só com a sua espada, mas com o seu espirito justo e conciliador tenha concorrido para a pacificação do paiz, se a nação vê nelle o homem mais proprio para dirigir a politica moderada e conciliadora do Governo, não exigirá o bem do Estado que elle seja o Presidente, muito embora que lhe não seja; possivel occupar-se com os trabalhos do expediente de uma Secretaria? E se iato é assim na ordinaria situação dos negocios do paiz, não seria muito mais necessario, se acontecesse sobrevirem motivos extraordinarios, por exemplo, de ameaça de revolta, começo de desordens civis? Havia de privar-se a nação dos serviços deste homem, por lhe não ser possivel enredar-se nos detalhes immensos de uma Secretaria? Não seriam inestimáveis os serviços prestados nas funcções de Presidente por um homem tão respeitado, de tanto peso na opinião — consílio, auctoritate, sententia?

O Sr. Duque da Terceira foi nomeado Presidente sem pasta em 1851: ao outro dia foi nomeado Ministro da Guerra. Então não havia Lei para a nomeação de Presidente sem pasta. O Sr. Duque não acceitou pelas circumstancias bem sabidas dessa época; e as nomeações não tiveram effeito. Mas, digo eu, se occorressem outras circumstancias, ainda que diversas daquellas, mas em que fosse necessario dirigir o Ministerio uma pessoa tão recommendavel como o Sr. Duque da Terceira, e que elle se considerasse

Impedido de se occupar incessantemente com os embaraços de qualquer das Secretarias, quem hesitaria em fazer votos, em desejar que elle fosse chamado ao Ministerio? Elle, o Duque da Terceira, virtuoso na familia, affavel, e benefico na sociedade, illustre na paz, illustre na guerra? Sr. Presidente, para servir os interesses de um partido! Nós os membros da commissão appro vamos este projecto por ser para os interesses de um partido? Nós os da commissão! É para os interesses geraes da nação: é para a possivel conciliação de todos os partidos: é para evitar, que não degenerem em facções turbulentas, e sediciosas. Os Governos, Sr. Presidente, não devem excluir senão o crime. Nunca devem rejeitar os auxiliares, que não querem continuas crises; e que os apoiarão, se virem, e em quanto virem segura por elles a tranquilidade, respeitada a liberdade, e promovida a prosperidade publica.

Sr. Presidente, fallou-se no Commando em chefe. Essa questão é totalmente alheia ao objecto, que nos occupa. Não se tracta de saber se ha-de continuar a haver Commando em chefe, ou se ha-de acabar; não se tracta de decidir se o Marechal ha-de continuar a ser Commandante em chefe, ou não; se o Marechal ha-de ou não accumular este cargo. Esta questão, repito, é absolutamente estranha ao projecto, que se discute; e comtudo se fosse occasião de tractar della, eu além do mais que poderia dizer-se, poderia confirmar o que disse o Sr. Ministro do Reino, de que não havia repugnancia constitucional, que tornasse incompativel a accumulação de Commandante em chefe, e Presidente sem pasta. O Presidente, nesta qualidade é membro de um corpo politico, do Conselho de Ministros, que constitue uma pessoa moral; e como Commandante em chefe tem direitos, e obrigações diversas; e não ha incompatibilidade. No Conselho nada resolve só por si; e a respeito das resoluções, que se tomam, não é superior ao Ministro da Guerra. Poder-se-iam apontar exemplos e casos analogos, e aqui está perto de mim o Sr. Visconde de Francos, que é Commandante da guarda municipal, e como tal, sujeito ao Sr. Ministro do Reino; e como membro da Camara póde servir de Presidente, e não só concorrer em resoluções que obriguem o Sr. Ministro do Reino, mas censural-o, interpellal-o, e chamal-o á ordem. O caso não é perfeitamente identico, porque se verifica no exercicio de poderes politicos differentes; mas a rasão é a mesma, e a analogia é evidente. Mas, Sr. Presidente, eu repulso a questão, como impertinente para o projecto; porque nelle sómente se tracta de uma disposição organica, de uma questão geral.

A questão não é pessoal, porque não se tracta da applicação da Lei a um individuo (apoiados), nem nós podemos fazer uma Lei para que uma pessoa determinada seja Ministro. Pois nós poderiamos decretar por Lei, que pessoa determinada fosse Ministro? Isso seria uma exorbitancia do Poder legislativo; seria um attentado contra a prerogativa mais ampla da Corôa! (apoiados do lado direito.) Repito, isso seria um attentado contra a mais ampla prerogativa da Corôa (apoiados do lado direito, e susurro). O Sr. Presidente — Peço attenção. O orador — Dão-me apoiados (O Sr. Aguiar — Mas de que?) e eu estimo que assim seja, ainda que só concordem no principio. Reconhecem o principio? Estimo: pois eu tirarei a conclusão. O Rei exerce o Poder moderador nomeando livremente os seus Ministros. Nem mesmo percisa ouvir o Conselho de Estado. Esta nomeação não é acto ministerial. Creado o logar pela Lei, o Poder moderador faz a applicação, apreciando as circumstancias. Pôde fazer a applicação ao actual Presidente, ou não a fazer. Pôde demittir o actual Presidente, e nomear outro livremente. Donde ha-de pois vir o abuso, se os Ministros não tem, não podem ter influencia alguma indevida nessas nomeações? Donde ha-de vir o abuso, se nem póde dizer-se, nem presumir-se, que o Poder moderador não ha-de fazer bom uso da attribuição constitucional, porque se a Carta entregou ao Rei esta livre faculdade, presumiu, sem duvida, que sempre havia usar della para felicidade da nação.

Sr. Presidente: os negocios que se tractam, ou devem tractar no Conselho de Ministros, não podem enumerar-se em uma Lei; e sómente se póde estabelecer a regra geral. São os negocios mais importantes do Estado, é o que diz respeito propriamente á acção governativa, ao systema geral de administração, segundo o qual cada um dos Ministros na sua respectiva Repartição, ha de dar aos negocios a competente resolução, em harmonia com aquelle pensamento. É assim, que no Conselho de Ministros se deve deliberar sobre Decretos necessarios á execução das Leis, sobre o exercicio de parte da Soberania, que o Poder legislativo em certos casos delega ao Governo; — sobre regulamentos geraes de ordem, de policia, e de segurança publica; — sobre melhoramentos a introduzir nos interesses materiaes e moraes do paiz; — sobre negociações com as nações estrangeiras, e em outros mais objectos, todos tendentes a que a execução das Leis seja forte, prompta, e regular, e a que haja unidade e concordancia na marcha do Governo. Tudo isto deve ser meditado, e dirigido pelo Presidente do Conselho; é elle que deve dar impulso ás resoluções, regularidade ás deliberações, e concordancia a todo o systema de politica. Os Ministros opprimidos com os detalhes; occupados com as discussões das Camaras, e com as interpellações, as quaes, ainda que feitas, como sempre são, de um modo suave, e polido, e ainda que não tenham resultado algum immediato, não deixam comtudo de os embaraçar; não podem fazer marchar os negocios com a devida promptidão, obrigados muitas vezes a fazer alto; — obrigados a hesitar a cada decisão por uma legislação immensa, algumas vezes contradictoria, muitas vezes obscura, muitas vezes incerta. Mesmo em circumstancias ordinárias um Ministro, apenas consagrando-se todo á sua respectiva repartição, poderá com alta capacidade expedir os negocios: — como pois se póde suppôr, que uma pessoa escolhida em razão da sua alta posição, da sua grande authoridade, da confiança geral da nação, e que por si mesma 6 uma garantia de ordem, não possa ser Presidente do Conselho, ainda que lhe não seja possivel encarregar-se dos immensos detalhes de uma secretaria? Se isto assim é no estado ordinario dos negocios, muito mais o será se sobrevierem circumstancias extraordinarias, em que o Presidente do Conselho tem de mais a meditar, e dar impulso ás medidas, ás providencias, que exigirem esses factos extraordinarios. Eu já fallei na eventualidade possivel de uma revolta, ou de ameaça de revolta; mas além deste podia apresentar outros exemplos, como o de uma guerra estrangeira, ou ameaça de hostilidades; o de complicações com outras nações, o de reclamações. E será desconhecido que tem havido occasiões, em que reclamações feitas por nações estrangeiras tem occupado toda a intelligencia, toda a actividade do Ministro competente? Será necessario que eu aponte algum desses casos? Podia faze-lo.

Sr. Presidente: já os Srs. Ministros fizeram a observação de que em outras nações se pratica o mesmo, que se acha neste projecto de lei. O exemplo dessas nações tem muita força; e se nós somos uma nação pequena, isto em logar de obstar, é uma razão de mais. Uma nação pequena póde muitas vezes ter maiores difficuldades para vencer do que uma nação grande, por ser esta mais forte, ou melhor organisada a sua administração, do que a nossa por ora está; ou porque o estado dos partidos politicos seja diverso. Somos uma nação pequena! Temos nós por isso tido menos revoltas, menos reclamações, menos complicações? O facto é que algumas vezes a nossa justiça não tem sido attendida: o facto é, que temos estado mais expostos a que os nossos direitos não sejam respeitados; e uma nação pequena se não impõe pela força deve fazer-se respeitar pela sabedoria.

Sr. Presidente: vou concluir, mas antes disso direi, que em resultado da discussão todo o argumento contra a Lei se reduz a que é possivel que o uso, ou applicação della recaia em pessoa, cujo systema de Governo seja desagradavel a quem impugna o projecto; mas em quanto ao ponto essencial de que se tracta, em quanto a mostrar-se que não póde haver casos em que o bem do Estado exija que seja chamado ao logar da Presidencia sem pasta um cidadão, reclamado pela opinião nacional, e authorisado com a confiança do paiz, isso é o que não se demonstrou; e na verdade não podia demonstrar-se.

O Sr. Conde de Thomar — Não eram pequenas já as minhas difficuldades, tendo de tomar pela segunda vez a palavra nesta questão, porque tinha de responder a um discurso vigoroso feito na sessão passada pelo Sr. Ministro da Fazenda: hoje cresceram muito mais as minhas difficuldades, porque o digno Par que acabou de fallar, veio com o grande talento, e com toda a força, sustentar o projecto, e combater o que eu tinha dito. O digno Par classificou os argumentos que eu apresentei, como simples declamação, e accrescentou que combatendo eu este projecto não havia julgado ser preciso demonstrar o que avancei; e que lançando-me no caminho das generalidades, e apressa, me havia contentado com a declamação, meio este de que se servem muitas vezes os individuos, que teem era vista colher os resultados da rejeição da medida.

Tambem eu sei, Sr. Presidente, que quando se não póde sustentar uma causa injusta, pensa-se muito, e recita-se uma bella oração, abundante em sophismas. O digno Par pois foi injusto na apreciação dos argumentos que eu apresentei para combater o projecto de lei em discussão: e ainda mais injusto foi quando disse, que tractando eu de analysar os argumentos dos Srs. Ministros; -os tinha invertido. Agora permitta o digno Par que eu lhe diga, que foi S. Ex.ª que inverteu os meus argumentos, attribuindo-me cousas que eu não disse: isto porém não é para estranhar da parte do digno Par, porque já o Sr. Ministro da Fazenda seguiu a mesma tactica no seu discurso isso é o que acontece a quem defende uma causa injusta, e preciso inventar para combater (apoiados).

Sr. Presidente, eu quizera realmente ser muito breve nesta occasião, mas a Camara já sabe que eu tenho que responder a dois discursos importantes, e que por isso não poderei deixar de ser um pouco mais extenso: devo occupar-me não só do que disse o Sr. Ministro da Fazenda, mas também dos argumentos do digno Par que acabou de fallar.

Sr. Presidente, na primeira vez em que usei da palavra, combati o projecto de lei em discussão por ser uma medida dispensavel, e mostrei que o serviço publico não exigia a sua adopção: disse mais, que elle tendia a votar uma nova despeza, despeza que igualmente se podia dispensar; e accrescentei, que nas circumstancias financeiras em que nos achavamos, e em presença dos sacrificios que oramos obrigados a fazer, e depois das medidas fortes, e de espoliação, adoptadas pelo actual Ministerio, não era justo, disse eu, que as Côrtes sob proposta do Governo, ou de qualquer maneira, tractassem de crear despezas novas (apoiados): e por esta occasião referi varios estabelecimentos, varios logares, e varios cargos que na minha opinião podiam ser dispensados, sem que o serviço publico fosse prejudicado (apoiados): e intendi eu, Sr. Presidente, que quando o Governo lançava mão de medidas espoliadoras, medidas que teem sido classificadas por pessoas boas, com um epitheto que eu me não atrevo agora a proferir, não era em presença disto tudo, que se deviam crear despezas que o serviço publico não reclamava (apoiados). Sr. Presidente, eu intendo que para se crear

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um logar novo, como é o da Presidencia do Conselho de Ministros, sem pasta, se devia ter em vista a utilidade publica, e ter em vista tambem a nova despeza que se ia fazer. Reparei que fui censurado pelo Sr. Ministro da Fazenda por me não ter elevado á altura dos principios na discussão deste projecto. Sr. Presidente, se eu tivesse combatido no campo dos caleches, dos Alfeites, e da porcellana, então sim, então esse campo era nobre (apoiados).

Sr. Presidente, se eu trouxesse para esta discussão esse numero de factos com que o Governo é atacado constantemente, esse campo era nobre, e não era rasteiro (apoiados): mas como eu puz fora do campo todas essas miserias, e tractei só de combater o projecto olhado pela desnecessidade quanto ao serviço publico, e pela despeza que ella trazia, então sim, combati rasteiramente! Pois eu estou resolvido a não seguir os passos que seguiram os meus adversarios quando eu fui Ministro, poupando-me, como já disse, a trazer á discussão esse grande numero de factos criminosos com que SS. Ex.ªs teem sido aggredidos, porque intendo que isso não se deve fazer, nem é proprio da minha dignidade.

(Vozes — Muito bem — (apoiados.)

É portanto no campo em que eu tractei a questão, que a hei-de continuar a tractar: o campo dos raciocinios, inconveniencias do serviço, ou circumstancias, financeiras.

Sr. Presidente, ao argumento da inutilidade, esperava eu que se opposesse o argumento da utilidade, e da conveniencia: essa conveniencia esperava eu que se demonstrasse, provando, que o passado fazia vêr que o serviço publico tem sido prejudicado, por não ter havido um Presidente de Ministros sem pasta. Eu queria que os factos servissem de base a esta medida: mas isso é que se não tem mostrado. O que nós temos visto até agora é, que existindo um Presidente do Conselho com pasta, o serviço publico na opinião dos Srs. Ministros, note-se bem, tem sido feito ás mil maravilhas, não obstante o Sr. Presidente do Conselho actual não ir á Secretaria, nem vir ao Parlamento. Eu notei varias vezes esta falta, e os Srs. Ministros respondiam, que com isso não era prejudicado o serviço publico, antes pelo contrario nunca elle se tinha feito com tanta vantagem para a nação, como actualmente se fazia (riso). Se pois estas são as razões com que os Srs. Ministros teem defendido a falta do Presidente do Conselho já nas Côrtes, já nas Secretarias, e não dão outras razões, nem provam a necessidade da medida, como é então que teem direito de me censurarem por eu, como dizem, não entrar a fundo na discussão do projecto?

Tambem eu me queixava, de que não viesse ao Parlamento o actual Presidente do Conselho, para responder, porque sendo elle quem possuia o pensamento administrativo e politico da administração, a elle 6 que competia principalmente responder aqui. A isto observavam os Srs. Ministros do Reino, e da Fazenda, que SS. EE. tinham da mesma sorte esse pensamento administrativo e politico, e então que para se tractar e discutir, não era precisa a presença do Sr. Presidente do Conselho. É notavel isto: umas vezes o Presidente do Conselho deve ter o pensamento administrativo e o pensamento politico; e outras vezes não é preciso que elle compareça nas Camaras legislativas, porque esse pensamento administrativo e politico existe em todas as cabeças ministeriaes. E tudo isto se passava e tudo isto se dizia para mostrar, que não era necessario, que o Presidente do Conselho comparecesse na Secretaria e no Parlamento, mas achando-se elle muito doente, com o peito rasgado (expressão do Sr. Ministro do Reino) não podendo comparecer aonde o chamava o seu dever, podia comtudo ser Presidente do Conselho e Ministro da Guerra, e Commandante em chefe; ha poucos dias o Sr. Ministro do Reino nos deu a feliz noticia, de que o seu collega se achava muitissimo melhor, e quando esperavamos ve-lo nesta Camara aonde o chama o seu dever, vemos um projecto creando um logar para nunca o vermos! De modo que quando o Presidente do Conselho se achava com o peito rasgado, podia exercer o cargo de Presidente, occupando a pasta de Ministro da Guerra e Commandante em chefe, e hoje que se acha muitissimo melhor, propõe-se que elle possa ser Presidente do Conselho sem pasta, porque é conveniente que S. Ex.ª continue á frente da situação, mas livre dos cuidados nos negocios da Secretaria! Isto tudo é uma verdadeira decepção, porque em quanto se nos diz, que é absolutamente necessario, que o Presidente do Conselho continue á frente da situação, porque nos restituiu a paz, porque fez a união da familia portugueza, e deu o trabalho a quem delle precisava, censuram-se os que dizem que o projecto é pessoal: Em quanto nos dizem que o Duque de Saldanha precisa para desenvolver o pensamento administrativo e politico da Administração, e em vista do seu estado de saude ser aliviado do cargo, e ver-se desembaraçado do cahos das Secretarias, se quer todavia, continue na laboriosa, e muito activa commissão de Commandante em chefe do exercito (O Sr. Duarte Leitão — Eu não disse tal)! Pois não se disse, que só podia continuar a ser Commandante em chefe? Certamente que se disse, e o facto o prova, mas eu digo que, se o Duque estando com o peito retalhado, servio maravilhosamente todos os importantes cargos que mencionei, não ha razão para que hoje, visto que está muitissimo melhor se crie por seu respeito o cargo de Presidente sem pasta: as razões dadas para justificar o projecto são contraproducentes, o Duque podo menos quando está melhor do que quando estava peior (Vozes — É verdade, isso não se destroe). E quanto ao Commandante em chefe: Ou o commando em chefe é uma cousa muito importante, que ha-de carecer de ter á testa um homem notavel, e com forças para desempenhar o seu logar, ou não tem essa importância, e então torna-se desnecessario (apoiados). Se é indifferente, que tenha ou não a direcção dessa repartição, um homem com saude, ou um homem impossibilitado para o serviço, então o commando em chefe deve ser abolido (apoiados), acabe-se com uma despeza enorme, que está pesando sobre a fazenda publica (apoiados.)

Aonde está o programma desses homens que constantemente clamavam contra essa repartição do Commando em chefe!? (Vozes — É verdade.) Que fazem na presença deste facto, quando as nossas circumstancias financeiras os deviam convencer de que era necessario, em logar de sustentar estas sinecuras, evitar tudo que fossem creações novas, e despezas superfluas?!

Pois vós que tendes aqui tantas vezes faltado no Padroado da India, que sabeis, que a grande difficuldade em que se vê o Governo é a de prover á sustentação do clero e missionarios, porque não supprimis este logar do Commando em Chefe, para applicar esse dinheiro á sustentação do que dizeis — primeira jóia da coroa de Portugal?!

Eu bem sei, que se me ha de perguntar qual a razão porque eu tambem sustentei o commando em chefe. Fiz mal, mas eu vou dar a razão porque o conservei; as circumstancias são inteiramente differentes, e justificam até certo ponto o meu procedimento.

O Commando em chefe no tempo em que eu tinha a honra de estar nos concelhos de Sua Magestade, era uma repartição altamente economica em vista do que actualmente custa (apoiados). Então o Principe que se achava á frente do exercito não tinha vencimento nenhum; modesto em todas as suas cousas, contentava-se com quatro ajudantes de ordens, em quanto que hoje a despeza que pesa sobre a nação, por causa do Commando em chefe, é grande, é demasiadamente excessiva por muitos motivos e principalmente pelo numeroso estado maior de que se acha rodeado. Então intendia eu que o Commando em chefe em tempo de paz se podia sustentar, sómente pela consideração de que estava á sua frente um Principe estranho ás influencias dos partidos, que como tal podia ter o fiel da balança, para que não se abusasse da disciplina. Mas agora que se acha á frente daquella repartição o primeiro revolucionario do paiz, que conquistou esse e outros logares por meio de uma revolução (O Sr. D. Carlos — Apoiado), que confiança póde ter a nação na disciplina do Exercito vendo á frente do mesmo o homem que ainda ha pouco, violando as prorogativas da Corôa e das Côrtes, proclamou os principios mais revolucionarios! (Apoiados.) Como póde mesmo a opinião publica desenvolver-se, e mostrar-se na urna quando pela frente tem sempre a espada do revolucionario?! Eis-aqui a differença toda.

Mas vós tendes tanto medo do Commando em chefe?! Sim senhor, temos, e tememos o abuso da força que tem ás suas ordens; e eu agora perguntarei ao Sr. Ministro da Fazenda, que fez esse reparo; e o Sr. Ministro porque mostra tanto empenho em o conservar?! E porque S. Ex.ª sabe perfeitamente, que se aquella espada não estiver á frente do Exercito, não póde o Ministerio julgar-se tão solido (apoiados). Pois a solidez deste Ministerio vem por ventura dos actos da sua administração como diz o Sr. Ministro do Reino? Eu peço a S. Ex.ªs, que quando fallarem nos digam as vantagens que temos adquirido?!

O Commando em chefe conserva-se com tanto empenho, porque é necessario que esteja á frente do Exercito o homem que pela espada creou esta situação politica, e porque é necessario igualmente, que as futuras eleições sejam feitas como as passadas (O Sr. Ministro do Reino — Jesus!) Jesus!! Eleições saídas do chapéo de S. Ex.ª e resultado das ordens telegraphicas nunca as houve neste paiz (apoiados). A este respeito estão conformes todas as fracções politicas, menos os jornaes convencionados, ou os das necessidades, como S. Ex.ª os classifica (Apoiados — É verdade.) E a proposito, refiro-me ao que disse o Sr. Visconde de Sá n'uma das sessões passadas, quando lembrou ao Governo a necessidade de rever a Lei eleitoral, de se corrigirem os erros que as ultimas eleições tinham demonstrado, pelo que S. Ex.ª intendia, que era necessario proceder para o novo reinado a eleições, que dessem em resultado a verdadeira representação nacional! Tanto está o digno Par convencido de que aquillo que existe não é a verdadeira representação nacional! É um testimunho insuspeito; é o homem que sempre me fez opposição e que sustenta os actuaes Ministros; mas S. Ex.ªs ouviram essa sentença de uma authoridade tão respeitavel, e guardaram silencio! Espero que continuem a guarda-lo, porque em objectos desta natureza não é facil apanhar-lhes o compromisso, pois que S. Ex.ªs trabalham incessantemente, como este projecto o está mostrando, para se segurarem na situação!

O Sr. Ministro do Reino diz que o projecto não é pessoal, pois que se tracta de uma regra geral, para que em todos os Ministerios haja um Presidente, e só por excepção, quando o bem do Estado o exigir haja um Presidente do Conselho sem pasta. Eu confesso, que foi por tudo o que tenho ouvido dizer nesta discussão, que principalmente intendo que a regra é a da nomeação do Presidente do Conselho actual para Presidente sem pasta. Não foi já dito que as circumstancias em que este se acha é que deram logar a pensar na apresentação desta medida? Não foi já dito que á situação é indispensavel a pessoa do Duque de Saldanha? E quando se vem sustentar taes doutrinas? Nas vesperas da época em que começa o novo reinado! (Susurro.) Se foi simplesmente a molestia do Duque o que fez pensar, e deu causa á apresentação dessa medida, essa molestia dura ha tres annos; como é, que só agora occorreu tal pensamento, quando ao mesmo tempo, e por outro lado se diz, que o Duque vai muitissimo melhor! Além de que

S. Ex.ªªs costumavam antes dizer-nos sempre, que a falta da comparencia do Marechal nos logares onde o chamam as suas obrigações nada influia para o bom andamento dos negocios! Como é então que no fim de tres annos de ausencia nas Côrtes e na Secretaria, se vem dizer que as circumstancias especiaes em que se acha o Duque são aquellas que levaram o Governo a apresentar este projecto?! E isto porque é necessario desembaraça-lo de todos esses negocios que se tractam nas Secretarias, com uma legislação classificada de cahos, sendo necessario incumbi-lo sómente do pensamento governativo, administrativo e politico, sendo como que o fiel da balança etc.!...

Isto parece incrivel! (Apoiados.) Entrega-se o fiel da balança dos negocios do Estado ao homem, cujas circumstancias se diz são de natureza tal, que se lhe não pode entregar nenhuma das Secretarias! Pois se essa tarefa de Presidente do Conselho é de tamanha importancia, como a quereis dar a um homem que está semimorto?!

E pensa V. Em.ª, ou pensa a Camara, que os Srs. Ministros, ou os seus defensores dizem, que o Presidente do Conselho ha de vir ás Côrtes sustentar o pensamento da administração? Nem uma palavra soltaram ainda a tal respeito. Aqui se vê que isto não é mais do que uma sinecura, para o homem que nem ha de vir ás Côrtes, nem ha de ir ás Secretarias, nem cumprir com as suas obrigações, ou com serviço algum importante para o paiz, mas ha de receber, sem duvida além de muitos ordenados, os doze mil cruzados de gratificação de Commandante em chefe, que pelo seu estado não serve nem póde servir.

Sr. Presidente, trouxeram-se exemplos para mostrar que muitas vezes um homem é que fórma uma situação: fallou-se em Sir Robert Peel e Canning, e fallou-se nos seus systemas e planos, e quiz-se fazer a comparação com a situação actual. Sr. Presidente, estes exemplos, ainda assim, não colhem, porque os systemas daquelles dois grandes homens politicos não morreram com as suas pessoas, progridem, e lá se acham em execução na Inglaterra; mas, Sr. Presidente, ainda se apresentou outro exemplo, foi o do Duque de Victoria, e esse acceito eu: tem razão o Sr. Ministro da Fazenda, o Duque de Victoria é necessario á situação que existe no paiz visinho, e o Duque de Saldanha acha-se nas mesmas circumstancias, porque sendo ambos revolucionarios, e tendo-se apossado do poder por uma revolução, só com a espada podem sustentar essa situação. E este exemplo colhe, mas não é conforme aos principios, nem ás conveniencias e ao bem da nação querer continuar aquella situação que só se póde sustentar com uma espada: e, ainda assim, devo dizer que ha uma pequena differença nestas duas situações, favoravel ao Sr. Duque de Saldanha, porque de um lado se pede votos para medidas de oppressão contra todo aquelle que não concordar com o systema ministerial, aqui, felizmente, ainda não chegou esse systema de perseguição; o Sr. Presidente do Conselho tem-se limitado a conservar os logares que conquistou com a espada, e sustentar nos seus empregos os 64 parentes que despachou e sentou á mesa do orçamento.

Disse o Sr. Ministro da Fazenda — que só como meio oratorio eu podia dizer que se não cuidasse nos melhoramentos do nosso paiz, sem que pagassemos as nossas dividas; e eu respondo a S. Ex.ª — que só como meio oratorio, mas improprio do Sr. Ministro, porque foi menos leal, me podia attribuir aquillo que eu não disse; pois disse eu, por ventura, Sr. Presidente, que não deviamos tractar dos melhoramentos do paiz sem pagarmos as nossas enormes dividas? O que disse eu? Eu disse que na occasião em que se adoptavam medidas fortes, medidas que cortavam pelos interesses legitimos dos nossos credores internos e externos, não deviamos crear repartições, nem logares, que não fossem reclamados pela exigencia do serviço publico; isto, Sr. Presidente, não é dizer que o Governo não deve tractar desses melhoramentos do paiz sem que pague a divida nacional: sei perfeitamente que uma divida tão enorme não se póde assim pagar, mas sei tambem que não colhe por maneira alguma a comparação que o Sr. Ministro da Fazenda trouxe do lavrador que se achava muito individado, tractava de romper a terra para augmentar a sua cultura, e achar-se em melhor posição; porque assim como eu justificaria a conducta do lavrador que assim procedesse, havia justificar tambem a conducta do Governo que adoptasse medidas que podessem collocar o paiz nas circumstancias de melhorar a sua situação. Mas, Sr. Presidente, se o lavrador que S. Ex.ª referiu, em logar de tractar da sua terra, e de a cultivar de modo que augmentasse o seu producto, despendesse o dinheiro que tirasse das algibeiras dos seus credores para fazer jardins, e dar bailes e jantares, elle seria censurado, por que, embora essas cousas fizessem o seu goso e delicias, não eram necessarias para augmentar o producto da sua lavoura, antes a arruinavam.

Sr. Presidente, eu bem sei que algumas das repartições em que toquei podem prestar um tal ou qual serviço ao Estado, e tambem sei (e isto não póde ter duvida) que a sua creação se podia adiar, e que os negocios publicos não prejudicavam se fosse adiada. Eu bem sei que o Conselho ultramarino póde fornecer alguns meios de illustração aos Srs. Ministros, mas sei que o Governo passou muitos annos sem elle, e sem que o serviço publico fosse prejudicado; eu bem sei que o Instituto agricola poderia produzir dois resultados se estivesse bem organisado e administrado, e sei tambem que podiamos adiar esta creação; e quaes são os melhoramentos que daí teem resultado? (O Sr. J. M. Grande — Peço a palavra). Mas o Sr. Ministro da Fazenda confundiu o que eu disse a respeito deste estabelecimento com o que S. Ex.ª disse do estabelecimento industrial, em que não fallei; deste, sim, estão-se colhendo resultados, e para saber a differença que existe a respeito do industrial, basta notar que no industrial apparecem muitos operarios que pertendem instruir-se para se adiantar nas suas diversas profissões; em quanto que o instituto agricola, para ter alguns alumnos, foi necessario que o Governo os mandasse buscar á Casa-pia, e lhe pagasse 6$000 réis cada mez.

Sr. Presidente, não podem disfarçar. Foi o digno Par quem agora acabou de demonstrar evidentemente que nada mais se pertende do que fazer ver, com a criação deste novo cargo ao novo Rei, que o Sr. Duque de Saldanha é um homem indispensavel. Pertendem fazer crêr que tanto é esta a opinião do Corpo legislativo, que não obstante reconhecer-se que o nobre Duque não está no caso de continuar a gerir os negocios, se vai criar um logar, expressamente, e que não tenha nada a fazer. Que se espera desta nova criação? Espera-se que o Sr. Duque de Saldanha venha ao Parlamento sustentar as medidas de administração, e que venha aqui desenvolver o pensamento governativo? Sr. Presidente, seria muito pessoal quanto podesse dizer a este respeito, e por isso me abstenho, e appello para todos que conhecem a S. Ex.ª — Todos me intendem!... E é extraordinario que para sustentar este projecto se recorresse a um precedente, o qual se adoptou com razões inteiramente oppostas aquellas que agora se apresentam a respeito deste projecto, que é o precedente do Sr. Duque de Palmella em 1834. O Sr. Duque de Palmella foi nomeado Presidente do Conselho, porque queria, como disse o digno Par, effectivamente estar desembaraçado de todos os negocios de expediente da repartição, para estar assiduamente no Parlamento a defender as medidas do Governo (O Sr. Duarte Leitão — Eu não fallei nelle). Mas fallo eu, porque estou respondendo a mais oradores. Logo responderei ao digno Par. Agora é, como já disse, o contrario: cria-se este logar, porque não podendo o Sr. Duque vir ao Parlamento, era necessario que sirva um logar em que não tenha nada que fazer! Mas o digno Par fallou na nomeação da Presidencia do Sr. Duque da Terceira em Sol, que foi nomeado Presidente sem pasta um dia, e no outro, declarado sem effeito esse despacho, foi nomeado Ministro da Guerra, e disse que S. Ex.ª não acceitou esta nomeação; peço licença para dizer ao digno Par que se esqueceu da historia da época, e não sabe o motivo da não acceitação? Eu o digo: foi que veio um boletim do Sr. Duque de Saldanha, do Paço da Casa-pia, que mandava não entrasse ninguem no Ministerio, tendo pertencido á Administração corrupta, ou ás suas maiorias corruptas; eis-aqui a razão que o digno Par, referindo-se ao facto, devia ter mencionado (O Sr. Duarte Leitão — Não disse tudo). S. Ex.ª não disse tudo, foi por isso que julguei necessario concluir o argumento, ou antes a historia.

Mas a despeza, Sr. Presidente, que se vai fazer com o logar da Presidencia sem pasta é uma despeza mesquinha. Já lá vai o tempo, Sr. Presidente, em que os nossos adversarios politicos questionavam oito dias sobre o ordenado de um porteiro do Thesouro (riso); já lá vai o tempo em que 50$000 réis mais ou menos de ordenado para, um continuo fornecia, materia para uma discussão de quinze dias na Camara dos Srs. Deputados: hoje a questão do ordenado de um Ministro não vale a pena de ser discutida no Parlamento, nem vale a pena de annunciar á Camara que a despeza não ha-de parar no ordenado do Ministro, porque a par delle está o ordenado dos empregados que hão-de formar a secretaria do Presidente do Conselho de Ministros. O digno Par disse — que não podia condemnar uma medida, pelo abuso que se ha-de fazer della, porque a secretaria do Presidente do Conselho ha-de ser a mesma que tem sido até agora. — Quem nos affiança isso? Quem o disse ao digno Par? Pois comprehende que sendo criado este logar tão elevado, e occupado por essa personagem, ha-de deixar de criar-se uma Secretaria, na qual se trabalhe para desenvolver o grande pensamento politico que ha-de germinar na sua cabeça; diz S. Ex.ª que hão-de continuar os negocios a ser tractados como até agora? — S. Ex.ª já sabe que os Ministros hão-de continuar a redigir as actas de todas as resoluções que tomarem no Conselho de Ministros? E é só a isto que se hão-de limitar os trabalhos da Presidencia do Conselho? Já viu S. Ex.ª que os Srs. Ministros se compromettessem a não augmentar a despeza publica além daquella quantia que é votada neste projecto? E ainda que o asseverem, Sr. Presidente, podemos decidir-nos a acreditar? Não teremos nós precedentes que nos habilitem a por em duvida as asserções de SS. Ex.ªs? Não ouvimos nós a sessão passada a galhardia e desembaraço com que o Sr. Ministro da Fazenda, sendo interpellado por mim sobre a despeza da exposição de Paris, nos disse que não sabia se ella se faria com os dez contos de réis, que foram votados pelas Camaras; mas que se fosse necessario gastar mais, alguma cousa, não dava em resposta senão o que lord Palmerston respondeu quando fora interpellado sobre a embaixada de lord Russell — gastou o que havia gastar. E não vemos nós que S. Ex.ª a respeito de despezas tem esse grande, pensamento de nunca se importar com as sommas que aliás hão-de sair da bolsa dos contribuintes? Sr. Presidente, em objectos de despeza, publica desejaria eu que o Sr. Ministro se mostrasse mais rigoroso, e que quando se tractou de mandar a Paris uma commissão, se considerasse: que as nossas circumstancias financeiras não permittem que apresentemos luxo tia nomeação desta, commissão. O Sr. Ministro, referindo-se a um dito que eu havia apresentado nesta Camara, e, que se attribuia a um Principe estrangeiro, intendeu que se elle era verdadeiro, não resultava dali deshonra nenhuma ao Governo portuguez, e eu accrescento que para ninguem dizer que um paiz pequeno mandava uma pequena exposição de productos e que manda um grande quartel-general de membros da commissão, não des-

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honra ninguem, é um facto que todos podem presencear e avaliar como quizerem.

Eu fallando na exposição disse que me admirava que Sr. Ministro, depois de ter feito a sua primeira nomeação, houvesse nomeado mais tarde ainda outros individuos pelas exigencias de homens influentes da situação. Sr. Presidente, este facto é verdadeiro, haviam-se effectivamente nomeado os individuos que deviam formar a commissão, e porque alguem mostrou desejos e vontade do ir passear a Paris, recorreu a um homem influente da situação, que exigiu do Sr. Ministro essa nomeação, e appello para a lealdade de S. Ex.ª para que diga se não foi obrigado a fazer esta nomeação por aquelle motivo.

Em quanto ao secretario, ultimamente nomeado, estimo que o Sr. Ministro dissesse que esta nomeação fosse feita sobre requisição do Presidente da commissão; porque isso serve para destruir uma insinuação malevola, que queriam fazer recair sobre o mesmo Presidente: pertendia-se fazer acreditar que o individuo nomeado para o logar de secretario, e que se julgava com direito de ser nomeado commissario á exposição de Paris por ter já desempenhado o mesmo cargo na exposição de Londres, desistira da sua pertenção porque o Governo intendeu que era conveniente nomear o Sr. Ávila para o tirar das Camaras, e S. Ex.ª era incapaz de se prestar a desempenhar este serviço de similhante maneira (apoiados). O que é certo é que o Governo não achou entre os seus amigos politicos quem fosse desempenhar aquelle logar como o Sr. Ávila o póde desempenhar; o que se verificou já na outra commissão de estatistica: ninguem a podia desempenhar melhor do que aquelle cavalheiro, e neste caso o Governo julgou, pela mesma razão, que devia fazer todos os esforços para S. Ex.ª acceitar esta nova commissão. Fica portanto bem claro pela declaração do nobre Ministro, de que tudo quanto se tem dito para poder lançar no publico essa insinuação é falso! E por esta occasião direi eu ainda duas palavras a respeito de um ponto que eu aqui já toquei, e a que o Sr. Ministro da Fazenda me respondeu dizendo que havia mandado todos esses individuos que compunham a commissão, porque julgára necessario que fossem eximios chimicos a fim de examinarem na exposição as manipulações chimicas. Como! Na exposição praticam-se essas manipulações! E em verdade parece impossivel que o Ministerio tivesse de recorrer a tão fraco argumento para assim justificar a nomeação de alguns membros dessa commissão, e mais impossivel me parece que se invertesse o que eu havia dito a este respeito, censurando a grande despeza que se havia feito, e teria de fazer, e o Sr. Ministro da Fazenda respondeu-me, dizendo: «pois S. Ex.ª censura-me porque o Governo nomeou para essa commissão homens sabios, homens tão dignos, e que obtiveram as suas cadeiras por um concurso?» Quem é que havia censurado as qualidades e sciencia dos membros da commissão?!.. O que eu estranhei foi que se nomeasse uma commissão tão numerosa sem ser necessaria, fazendo-se assim uma despeza que ia pesar demasiadamente sobre o Thesouro, o que era para lamentar nas nossas apuradas circumstancias! No entanto intendeu-se que o melhor modo de responder era inverter-se o meu argumento!

Sr. Presidente, tambem eu, pertendendo provar que se faziam despezas escusadas, tractei de mostrar que pesava sobre o Thesouro um onus que devia acabar por inutil. Referi-me ao grande numero de ajudantes d'ordens, officiaes addidos e supranumerarios que existem em differentes repartições do Estado, e disse que daqui devia necessariamente resultar um grande prejuizo para a fazenda publica; e S. Ex.ª respondeu-me, que dahi nenhum resultado máo havia para a fazenda publica, por isso que esses officiaes que tinham sido empregados como ajudantes d'ordens, e que se achavam addidos e como supranumerarios, lá tinham os seus logares nos corpos a que pertenciam, e que por conseguinte nenhum augmento havia de despeza á fazenda publica. (Entra o Sr. Ministro da Marinha.) Ora, a fallar a verdade, parece impossivel que, sendo o Sr. Ministro da Fazenda um official tão distincto, diga que esses officiaes assim empregados a mais no serviço de ajudantes, d'ordens, e como addidos e supranumerarios não façam augmento nenhum de despeza á fazenda, quando pelo menos uma grande parte delles recebem forragens e gratificações, e não fazem além disso o serviço nos corpos a que pertencem, e ficando os supranumericos com direito ao accesso e antiguidade com prejuizo da fazenda publica; mas tudo isto é o resultado de um completo compadrio que por toda a parte se observa!

E, comtudo, se censuramos S. Ex.ªs porque assim desbaratam a fazenda publica, respondem-nos com as palavras de lord Palmerston! Eu, Sr. Presidente, o que pertendi demonstrar foi, que quando as nossas circumstancias financeiras eram as mais difficeis, que quando se não occorria a estabelecimentos de que tanto se carecia, e que quando finalmente se falta a tanta cousa de utilidade para o paiz, se ia agora por este projecto fazer uma despeza que nenhum resultado bom traria, antes ao contrario muitos inconvenientes, e quem assim argumenta parece-me ser logico e adduzir argumentos proprios para combater uma tal medida; e, comtudo, o Sr. Ministro da Fazenda, pertendendo combater os meus argumentos, não fez mais do que cair naquelle mesmo defeito que notara o digno Par o Sr. Duarte Leitão, de que exclamara mas que não se provára! Por esta fórma tenho respondido ao Sr. Ministro, assim como á primeira parte do discurso do digno Par o Sr. Leitão, em quanto S. Ex.ª considera que todos os argumentos que eu tenho trazido para a questão não vêem a proposito. Disse S. Ex.ª, não se tracta de discutir a organisação do Conselho ultramarino, não se tracta de discutir o estabelecimento de agricultura, não se tracta de discutir õ commando em chefe do exercito, e nem se o Duque de Saldanha deve continuar a servi-lo ou não, e daqui deduz que tudo quanto se disse a este respeito é uma pura aberração. Mas eu não tinha trazido tudo isso se não com o fim de mostrar as despezas que se haviam feito, e que comtudo se poderiam ter dispensado; e que ao passo que senão faziam aquellas que se deviam fazer, e que além disso se iam roubar os particulares espoliando-os do que era seu, porque foi uma perfeita espoliação (como muita gente boa lhe chama) o corte que se fez nos fundos dos credores da divida interna e externa! Medidas desta ordem só devem ser adoptadas quando se dão imperiosas necessidades, e eu não sei que se tivessem dado essas necessidades imperiosas para assim se ter obrado! E comtudo quando tudo isso se fez, e quando se falta ao cumprimento de obrigações as mais sagradas, é que o Governo se lembra de ir crear um Presidente do Conselho sem pasta!

O digno Par, o Sr. Duarte Leitão, fallou em repetições, que taxou de fastidiosas, e que só eram permittidas áquelles que se preparavam para subir ao poder. S. Ex.ª creio que disse isto que aqui tenho escripto, porque tomei nota (leu).

Quero aproveitar a occasião, para dizer ao digno Par, visto que lhe deu tanto cuidado esta minha repetição, que esteja S. Ex.ª descançado, que eu não tenho em vista, com esta discussão, ir ao Poder, e não posso aspirar a tal por muitas razões — umas já foram ditas pelo Sr. Ministro da Fazenda, e escusado será agora repeti-las; e as outras disse as aqui o digno Par, o Sr. José Maria Grande, que me julgou prostrado a seus pés, e, por assim dizer, já morto (riso); se o digno Par disse isto para me annunciára sua opposição, protesto a S. Ex.ª que lhe não hei de dar o gostinho de me combater naquellas cadeiras, nas quaes, todavia, já tive a honra, em outro tempo, de ter o seu mais decidido apoio.

O digno Par fez-nos um quadro magnifico do estado das cousas: fallou-nos nos quatro annos de paz e tranquillidade; fallou-nos no systema, de conciliação, no systema de tolerancia, tecendo elogios ao Duque de Saldanha, para a final concluir, que podia muito bem ser que o novo Rei, ou o Poder moderador, julgasse necessario chamar o Marechal para esse cargo da presidencia do Conselho de Ministros, sem pasta! Não era certamente necessario que o digno Par se tivesse dado ao trabalho de nos pintar todo esse quadro, para depois concluir desse modo, porque nós já tinhamos previsto o que era que se pertendia conseguir com a approvação deste projecto de lei, embora isto lá não esteja claramente: o que lá está é um disfarce daquillo que se pertende, mas o digno Par esclareceu. O digno Par acha muito conveniente, que, apparecendo qualquer ameaça, esteja á testa do Governo um homem de braço forte, que resista a essas ameaças, e sustente a actual situação. S. Ex.ª tem razão; infelizmente essas ameaças já appareceram, mas appareceram sómente nos jornaes que defendem esta situação (apoiados). Providencias para o caso da ameaça ao Chefe do Estado (O Sr. Marquez de Fronteira — Apoiado), é preciso toda a cautela. O Governo quer-se prevenir contra as ameaças? Tem razão, ellas ahi estão nesses papeis do Governo (O Sr. Marquez de Vallada—:Apoiado). Guerra ás ameaças, e se fôr preciso cortar essas ameaças na sua origem, e os Srs. Ministros se não sentirem com forças para tanto, contem com o nosso apoio (muitos apoiados do lado direito). E não referirei quaes são essas ameaças, porque ellas teem sido repetidas, estão sabidas de todos, e não ha ninguem que as ignore; e eu receio muito que SS. Ex.ªs, querendo a presidencia do Conselho de Ministros, sem pasta, para o Duque de Saldanha, seja, não para destruir, mas para satisfazer a essas ameaças.

Tambem se fallou em guerra e reclamações, como motivo de justificação á medida que se discute! Quando se lançam n'um Parlamento similhantes proposições, por um Par tão respeitavel, e unido ao Governo, nós temos todo o direito de pedir, que nos diga o mesmo Governo, se ha receio de alguma guerra, ou se existem algumas reclamações. Se effectivamente existem essas reclamações, não posso persuadir-me, que, estando o Duque de Saldanha na presidencia do Conselho de Ministros, sem pasta, seja isso uma garantia para nós, porque não ha duvida nenhuma que o actual Ministerio deu um exemplo, sem exemplo, a esse respeito!... O actual Ministerio, para satisfazer a exigencias estrangeiras, não teve difficuldade em desfazer uma resolução, que tinha força de caso julgado! Não teve duvida em attender uma reclamação, revogando uma decisão do Conselho de Estado (secção do contencioso administrativo), publicada no Diario do Governo! Eis aqui a garantia que nos dá o Presidente do Conselho de Ministros, sem pasta! E, comtudo, querem que approvemos este projecto, porque no caso de reclamações, precisamos ter á testa do Governo, mas sem pasta, o Duque de Saldanha!... Seria um absurdo, um contrasenso, e até um crime, disse o digno Par, fazer uma Lei para um individuo Pois é isso o que se está fazendo actualmente, e por mais que se queira disfarçar o caso, não o podem conseguir, porque aquillo que se tem dito, é claro de mais. Portanto, Sr. Presidente, votando-se o projecto, depois de feitas estas declarações, commette-se um absurdo, um contrasenso, e um crime: e tanto isto é verdade, que o digno Par empregou as seguintes palavras. Ouça o digno Par a condemnação do seu procedimento. Está nestas frazes que proferiu — «E podendo acontecer que o Poder moderador queira chama-lo aos Conselhos, é necessario prevenir este caso anteriormente.» Pois se as qualidades, os serviços, e os dotes que tem o nobre Duque de Saldanha, o que eu não ponho em duvida, nem agora se tracta disso, são tão eminentes que convenha chama-lo á presidencia do Conselho de Ministros, sem pasta: para ser chamado a essa mesma presidencia, com pasta, não são esses mesmos dotes attendiveis? Pois não póde elle fazer os mesmos serviços, sendo Presidente com pasta? Pôde. Mas o que se quer é crear uma nova situação, e mostrar-se que S. Ex.ª é indispensavel: podemos já ficar certos de que, approvado este projecto, raras vezes havemos de ver o nobre Duque sentado naquellas cadeiras: o futuro provará o que eir digo, para lá appello eu, e então ficará demonstrado que as verdadeiras razões da apresentação deste projecto de lei, são as que eu tenho dito durante a sua discussão (apoiados). (Vozes— Já deu a hora).

Ouço dizer, Sr. Presidente, que já deu a hora, e porque eu não quero cançar a Camara, e mesmo porque hei de ter ainda que fallar neste assumpto, certo de que a Camara não quererá privar-me de o fazer, até porque sou eu só quem está combatendo os oradores que defendem o projecto em discussão, limito-me a estas considerações que tenho adduzido, para mostrar que o projecto não é digno de ser approvado, porque não se demonstrou a sua conveniencia e necessidade, e tambem porque elle traz uma despeza dispensavel, e não exigida pelo serviço publico (apoiados).

O Sr. Ministro da Fazenda — Ainda que a hora se acha adiantada, parece-lhe conveniente responder por parte do Governo a alguns argumentos apresentados pelo digno Par o Sr. Conde de Thomar na sessão de hoje: tarefa que até certo ponto lhe é muito menos difficil hoje, do que o foi n'uma das sessões passadas, porque ouviu a S. Ex.ª a repetição, com pequenas alterações, dos argumentos que nessa sessão apresentou. Sente comtudo que o digno Par, durante o seu discurso, e apezar do que se disse do banco dos Ministros, e que tambem disse o digno Par da maioria, que sustentou hoje, este projecto, se occupasse só e unicamente, de discutir a pessoa do Presidente do Conselho de Ministros, e não de discutir o projecto, que contém um principio de organisação e de administração, e que devia ser combatido pelo digno Par com outros argumentos, e com outras razões.

Por esta occasião quiz explicar-se sobre as expressões que lançou na Camara, na ultima sessão, quando disse, que sentia que o digno Par descesse tão baixo aos argumentos que apresentava, porque a sua intelligencia e talento lhe permittiam tractar a questão na elevada região dos principios: no que bem se vê que não quiz fazer injuria nem ao seu talento, nem ao seu caracter.

Que a resposta que o digno Par deu a esta exposição de um sentimento que era seu, foi que os argumentos dos oradores que defendem o projecto, não provaram que elle seja util, nem conveniente! e por sua parte não provou que fosse inutil e inconveniente; pelo que elle orador vê-se embaraçado na resposta que ha de dar á simples manifestação de uma idéa do digno Par. Parece-lhe que primeiro que tudo cabia ao digno Par, que disse que o projecto é inconveniente e inutil, demonstrar esta sua asserção, e depois disso responder-lhe elle orador: mas que S. Ex.ª não fez tal, e apezar disso exige resposta por parte do Governo.

O Sr. Ministro sente que o digno Par nomeio das considerações que fez lançasse uma insinuação tremenda, que não póde passar sem resposta da parte dos Ministros. A insinuação de que o Governo tracta de impôr ao novo Rei, a pessoa do Presidente do Conselho de Ministros, para estar á testa da situação: que esta insinuação é impropria do digno Par, e não menos impropria deste logar, e até mesmo impropria dos conhecimentos, que naturaes e estrangeiros reconhecem no Joven Monarcha, que vai em breve achar-se á testa dos negocios do paiz (apoiados). Que quer dizer, que o Governo tracta de impôr ao novo Rei, um individuo, o Presidente do Conselho de Ministros? Se esta insinuação podesse ser exacta, e no coração dos Ministros podessem haver sentimentos tão Ínfimos, para que era então este projecto de lei apresentado ás duas Camaras? Para poder ser o nobre Duque de Saldanha, Presidente do Conselho sem pasta! Se o Governo podesse ter tal pensamento, que nunca passou, nem podia passar pelas cabeças dos Ministros; se o Governo tivesse a audacia de querer impôr esse homem ao novo Rei, de que servia que elle fosse Presidente do Conselho sem pasta? A injuria pois que o digno Par fez aos Ministros, é indigna dos cavalheiros que se sentam nestas cadeiras (apoiados).

Pois os actuaes Ministros, que deixam fallar, que deixam reunir, que deixam imprimir o que se quer, e como se quer, que garantem a liberdade individual e politica, que não atacam a liberdade dos cidadãos, haviam de ser elles os que fossem attentar contra essa liberdade que tem o Monarcha, e que lhe dá a Carta Constitucional? Isto é impossivel que se diga; e admira que tal saísse da bocca do digno Par, que já foi Ministro da Corôa! Que quer S. Ex.ª que se conclua desta insinuação tremenda que descarregou sobre as cabeças dos Ministros?

O Sr. Ministro tinha dito que desejava que S. Ex.ª tractasse esta questão em um ponto de vista mais elevado: e o digno Par ou não quer seguir este caminho que lhe indicou, por honra do debate, ou então não póde elle orador ter a fortuna de se fazer comprehender por S. Ex.ª Pois o tractar a questão do Presidente do Conselho de Ministros sem pasta, será só o discutir o ordenado mesquinho, e a differença insignificante, que ha de auferir o individuo de que se tracta, se esta Lei passar? Pois será isto tractar a questão na região dos principios, e debaixo de um ponto de vista elevado, cem que a deve tractar um homem que tem obrigação de a discutir n'outro terreno, e com outra elevação de idéas, sem descer á percepção dos emolumentos que recebe o Marechal como Commandante em chefe do Exercito, e da que poderá dar a Presidencia sem pasta? E intende o digno Par que discutindo em analyse as diversas verbas que estão no orçamento; e que por fazer a critica da commissão nomeada para ir á exposição de Paris, critica essa já refutada na sessão passada, e que ainda o ha de ser hoje melhor: — pensa o digno Par, que é com estes meios o com estes argumentos que se ha de combater o projecto que actualmente se discute, da Presidencia do Conselho de Ministros sem pasta?

Observou que o digno Par póde trazer a questão ao terreno que quizer; que já lh'o disse da outra vez que teve a honra de fallar, mas elle orador não tem remedio senão seguil-o, segundo a feição que o digno Par pertende dar ao debate. Se lhe coubesse a iniciativa neste debate, se lho coubesse expôr os fundamentos pelos quaes o Governo adoptou esta providencia, e a propõe ás Côrtes; se tivesse de apresentar o pró e o contra da doutrina consignada neste projecto; se tivesse de se authorisar com exemplos estranhos; se tivesse de tractar a questão constitucional em objecto tão importante como este, de certo que tractaria o negocio debaixo de outro ponto de vista; mas está obrigado a seguir o digno Par, e, por consequencia, não quer ser responsavel pelo terreno em que o colloca a discussão, pelo campo em que é obrigado a acompanhar o mesmo digno Par.

Que S. Ex.ª tracta a questão toda em hypothese, e não na these geral; que vê o Presidente do Conselho diante de si, e não o projecto, pelo qual se authorisa o Governo a estabelecer a Presidencia do Conselho sem pasta; que quer mesmo que os Ministros se comprometiam sobre o futuro, em relação á despeza que possa provir desta providencia; e não quer lembrar-se de que todo o augmento é impossivel sem ser por uma lei, e que quando essa lei se discutir, do que todavia não ha a mais pequena intenção, é então o logar opportuno para o digno Par fazer sobre isso as suas reflexões! Como é pois que isso póde servir agora para esclarecer a opinião publica e a da Camara?

Que o digno Par quiz achar uma contradição nas palavras do Sr. Ministro do Reino; porque S. Ex.ª disse uma vez na Camara, que o Presidente do Conselho não podia assistir aos debates em consequencia do seu máo estado do saude, e mais tarde disse, que o Presidente do Conselho felizmente se achava melhor; conclue o digno Par que ha contradicção, porque é quando o Presidente do Conselho está melhor que o Governo vem trazer ao Parlamento a proposta de lei de que se tracta! Como o digno Par se não aparta nunca da hypothese, como não vê senão o duque de Saldanha no projecto, como intende que é possivel, que quem se encarrega de umas cousas, haja forçosamente de se encarregar de outras, não obstante o melindre do seu estado de saude, é claro que assim póde-se achar contradicção onde ella verdadeiramente não existe.

Que foi a situação pessoal do Presidente do Conselho o que despertou a idéa de trazer o Governo ao Parlamento a proposta que se discute, isso já foi confessado, porque não ha intenção de o occultar, nesse é preciso. Se acaso essa situação foi a causa de se pensar em trazer ao Parlamento esta medida; que o digno Par devia notar que era precisamente essa uma das épocas, em que o cavalheiro a quem se referiu se achava em estado de saude mais melindroso, e o Governo pelas rasões politicas, que podem ser inconvenientes, de pouca importancia, ou estranhas ao digno Par, intendendo que era conveniente conservar sempre á frente da Administração a pessoa do Duque de Saldanha, não admira que viesse effectivamente solicitar do Parlamento uma authorisação, em virtude da qual elle podesse conservar a direcção superior dos negocios, sem comtudo ter a responsabilidade da pasta.

Mas fatal contradicção, exclamou o digno Par: não póde ser Ministro da Guerra e póde ser Commandante em Chefe!

Ora, que, quem póde o mais póde o menos, isso tem-se ouvido muitas vezes dizer, mas, que, quem pode o menos possa o mais, isso é uma doutrina nova, que se não comprehende, e que nem mesmo o digno Par a poderá explicar. Se alguma razão de debilidade de forças physicas impede um Ministro, ou um homem qualquer do exercicio de funcções importantes, não se intende que por isso fique provado que elle não possa exercer outras funcções, que com quanto importantes, sendo separadas das primeiras, não pesam tanto sobre os seus hombros.

Que é claro e inquestionavel, porque ha de ser evidente a todos, que é mais pesado, mais oneroso para qualquer o exercer dois logares, do que servir um só (apoiados): mas que o digno Par intende que o Duque de Saldanha, podendo ser Commandante em Chefe, póde e deve ser tambem Ministro da Guerra.

Que S. Ex.ª tambem tinha perguntado qual era a razão porque o Governo, depois das espoliações, como disse que lhe chamava muita gente boa, depois de um accrescimo espantoso de despezas que pesam sobre o Thesouro, vem ainda propôr, que se crie o logar de Presidente do Conselho sem pasta? Qual a razão porque se conserva tambem este Commando em Chefe, que gasta tantos contos de réis? Porque razão se crearam tantos estabelecimentos em que se gastam grossas sommas? Perguntas estas que attribuiu a que o digno Par não se faz cargo das respostas que já tem tido os seus argumentos e as suas reflexões!

Que o digno Par ainda não quiz examinar as vantagens que produzem, e que promettem essas creações novas; e conclue que em vista da despeza que tudo isso faz, e da nossa divida, o Governo não devia ter tido pressa em augmentar as despezas.

Observou que o digno Par não dissera que era sua opinião, que não se fizesse cousa alguma de melhoramento em quanto tivessemos divida; que seria uma deslealdade tirar essa conclusão dos seus argumentos, sendo o digno Par um homem tão illustrado, e com conhecimentos praticos de governação; mas que S. Ex.ª se referira ás medidas que chama, de espoliação, e

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intendeu que o Governo não podia, nem devia augmentar as despezas publicas. O Sr. Ministro respondendo a isto disse, que essas medidas são de natureza permanente, e algumas dellas taes, que só o braço de Deos é que as podia desfazer, visto que a Esse nada é impossivel: que o proprio digno Par, se ámanhã fosse chamado ao Poder, deixaria em pé as consequencias do Decreto de 3 de Dezembro, inevitavelmente. Mas que a theoria do digno Par seria fatal para este paiz, porque o conduzia á morte, pelo caminho da esterilidade e da inacção! Obrigava o Governo a não despertar os melhoramentos publicos, pois que o orador não sabe como se possa conceber que se abrisse a viação publica, que se desenvolvesse a industria agricola, e derramasse a instrucção publica pelos diversos ramos da administração de qualquer paiz, sem que estejam montadas e organisadas devidamente as estações superiores, que hão de dar a direcção e o impulso ao pensamento do Governo!

Podia o Governo por ventura desenvolver os trabalhos que se tem mandado effectuar nas estradas do Reino; podia ter dirigido a construcção do caminho de ferro de leste; podia ter preparado o terreno para outras construcções igualmente importantes, sem que tivesse uma corporação especial, um centro donde emanasse toda a acção, para fazer progredir os trabalhos, dar-lhes direcção e regularidade, fazer os projectos, e encaminhar, n'uma palavra, a acção do Governo a todos os diversos pontos do reino onde fosse necessario! Intende-o assim o digno Par? De certo que não, porque não era possivel. E sendo certo que se devia necessariamente recorrer a uma estação superior, observou o Sr. Ministro que o digno Par devia confrontar os encargos publicos que trouxeram essas creações, com as vantagens que ellas produzem, e que de certo promettem: que isto era melhor do que recusar o digno Par a comparação que elle orador fez, boa, ou má, mas sufficiente para o caso — sobre o lavrador que dispendia em arrotear as suas terras, abrir-lhes melhores communicações para o transporte dos seus productos, melhorar os vehiculos para esse transporte, e fazer, n'uma palavra, com que o seu genero podesse chegar o mais barato possivel aos focos do consumo.

E que não dissesse o digno Par, que se pode comparar a despeza que o Estado tem feito nessas diversas repartições, com o lavrador que tractasse do levantar dinheiros, e que deixasse de pagar aos seus credores, para fazer jardins e dar bailes. Os jardins e os bailes que o Governo tem dado (comprehendendo a finura do digno Par), tem sido a creação do Ministerio das Obras Publicas, repartição necessaria e reconhecida como de primeira ordem; tem sido a organisação do Conselho ultramarino, que se não póde devidamente impugnar, para illustração do Ministerio que tem de gerir os negocios do ultramar; tem sido os estabelecimentos agricola e industrial, n'um dos quaes o digno Par mesmo achou a sua justificação; e, n'uma palavra, tem sido os centenares de contos de réis, que chegam quasi a mil no anno corrente, que o Governo tem dispendido com creações intelligentes, que reputa de alta conveniencia para o paiz, para lhe desenvolver a sua riqueza, e colloca-lo, tanto quanto possivel, em relação ás outras nações cultas.

Que destes meios tem o Governo disposto com utilidade publica, e o digno Par com os principios que estabeleceu condemna esta applicação, porque quer o impossivel! Quer estradas sem ter quem as dirija; quer caminhos de ferro sem ter quem examine e fiscalise a sua construcção, para se ver se os processos que se empregam são os mesmos que os usados nas nações mais adiantadas! E podia-se adiar esta questão! Tudo se pode adiar; mas o Sr. Ministro não esperava esse argumento do digno Par, nem o esperava ouvir aqui nesta casa, porque esse argumento conduz-nos ao estacionamento perpetuo, como o de certos individuos, que, quando se tracta de introduzir alguns melhoramentos na cultura das terras e no fabrico dos seus productos, respondem: — eu faço como fez meu pai, como já fez meu avô, por consequencia não tracto de melhoramentos, não os conheço, não quero embrenhar-me nelles!

Que á vista disto lhe parecia que o digno Par intende tambem que devemos ficar estacionarios, adiando indefinidamente esta questão de utilidade publica, sem o que o Estado não póde prosperar! Mas que o que cumpria ao digno Par era mostrar, ao menos, que o mesmo fim se podia conseguir em todas essas cousas que o orador acabava de enumerar, sem que comtudo se creassem essas repartições, e se fizessem essas despezas, para se irem realisando esses melhoramentos. Isso é que era necessario que se provasse, mas que o digno Par não o provou.

Que tambem o digno Par fallára na exposição de Paris, e que com uma certa expressão de censura citára a resposta que elle Sr. Ministro deu fama sessão passada, referindo-se á Camara dos Communs, em que sendo Lord Palmerston interpellado sobre as despezas que Lord John Russell tinha feito na sua embaixada a Vienna de Austria; authorisou-se elle orador com as praticas do um dos principaes parlamentos da Europa, e do um dos Ministros mais distinctos que se tem conhecido, pois que como elle, tinha a seu favor a disposição da lei.

E a este respeito observou que o digno Par não perguntava se o Governo havia de gastar mais dos dez contos; que isso foi depois, o que ao principio disse foi, que queria saber como era que elle Sr. Ministro tinha dividido por esses individuos, que foram mandados em commissão á exposição de Paris, as quantias incluídas na cifra dos dez contos de réis. Que a isso é que respondeu, que, como tinha intendido conveniente, e estava no seu direito respondendo assim, porque a verba que se votou foi em globo; e a lei não o obrigava a dar conta senão do modo como tinha applicado essa verba, que o Governo não podia exceder sob sua responsabilidade. Que se por acaso as circumstancias, e as necessidades publicas vierem a exigir que se faça uma despeza maior, disse o orador então, respondendo a S. Ex.ª quando lho fez essa pergunta, que havia de faze-la; que o Governo ha-de gastar mais alguns contos de réis se fôr preciso, porque tem confiança no patriotismo dos cavalheiros que compõe as duas Camaras do parlamento, e está certo que não lhe hão-de negar as quantias que de mais dispender com os individuos que mandou á exposição de Paris, para que aquella commissão seja como ella é capaz de ser (apoiados).

O orador sente ainda que o digno Par não comprehendesse, ou não quizesse comprehender, porque não faz injuria á sua intelligencia, qual era a missão dos homens encarregados pelo Governo para ir a Paris junto da exposição universal, e que repetisse que o Governo mandou um grande estado-maior, e usou desta expressão— um grande estado-maior — para acompanhar um pequeno numero de productos! Que o digno Par parece continúa a pensar que os individuos a que se referiu foram nomeados para acompanhar os productos mandados áquella exposição. (O Sr. Conde de Thomar ri-se.) Se S. Ex.ª se ri do seu argumento, então para que vem a confrontação do grande numero de membros da commissão? O Sr. Ministro espera que o digno Par o illustre sobre esta duvida, e muito mais depois que o vê rir da sua expressão. (O Sr. Conde de Thomar — Riu-me da maneira como V Ex.ª a expõe.)

O orador diz que esta expondo textualmente: que S. Ex.ª dissera que o Governo mandava á exposição de Paris uma pequena quantidade de productos, acompanhada por um grande quartel-general; donde se concluia que o digno Par intendeu que o numero dos individuos devia estar em harmonia com os productos que vão; e se não devia haver essa proporção, a comparação é inutil.

Que S. Ex.ª porém, não quiz reflectir que a commissão tem uma missão mais alta, a qual comprehendeu perfeitamente o seu presidente pela discussão que teve com o Governo antes de partir, assim como pelas instrucções que lhe foram dadas; mas que o digno Par, que ignora provavelmente esta discussão e instrucções, começou a fazer censuras pelo máo resultado da commissão, mas que a questão que ella tem a resolver em Paris já o orador disse nesta casa, questão que ha-de chegar, não diz que se resolverá com aquelle trabalho, mas que ha-de concorrer em grande parte para essa resolução, é a da protecção e liberdade do commercio, e até que ponto se deve dar essa protecção ás materias e productos a que ha-de ser applicada. Que esta é a questão maxima do paiz, e por mais homens technicos e especiaes, e de estado que o Governo mandasse não perdiam o seu tempo, porque este negocio é muito vasto e importante para as forças de um só homem; e ainda que a commissão não tenha que pronunciar o seu voto sobre este importantissimo objecto, ha-de apresentar a sua opinião ao Governo, para que elle illustrado com ella, possa resolver a questão como formais util; porque essas questões são de annos, e não se resolvem promptamente (apoiados).

Que o digno Par intendeu que, pela declaração que elle orador tinha feito á Camara n'uma das ultimas sessões, se destruia uma insinuação perfida, que alguem em alguma parte tinha feito contra a pessoa do presidente da commissão; ou antes tinha feito contra o Governo, accusando-o de querer tirar do Parlamento um dos seus membros mais distinctos, a fim de Se livrar, provavelmente, do incommodo dos seus discursos. O orador não esperava que um homem, que reputa amigo do presidente da commissão, fizesse uma tal injuria ao caracter daquelle cavalheiro; porque se o Governo tivesse o pensamento de tirar de qualquer casa do Parlamento um individuo, por lhe fazer uma opposição impossivel de superar, tão grande injuria se fazia ao Governo, por lhe ter offerecido uma commissão, como a esse cavalheiro que a acceitasse (apoiados). Mas o cavalheiro de que se tracta está muito acima dessa accusação pelo seu nobre caracter (O Sr. Conde de Thomar — Apoiado). Ora, apoiado! Se S. Ex.ª sabe que o Governo podia resistir a esta suggestão, então para que vem trazer aqui este argumento, que não é mais do que um boato; e para a Camara vem argumentos, e não os boatos dos botequins, nem das praças publicas, n'uma palavra, daquelles individuos que são menos amestrados nos negocios, e não teem por isso responsabilidade alguma.

Que o digno Par ainda quizera considerar o Governo tão acanhado nos recursos de que dispõe, que teve de ir buscar á opposição, como S. Ex.ª tambem disse, um caracter distincto para o mandar a Paris; e é uma das censuras que o digno Par nos fez, porque elle Sr. Ministro está persuadido que a commissão de que se tracta, não é de tal sorte incommoda, nem perigosa, que se diga que o Governo usou da sua situação politica para obrigar um individuo que tem opiniões diversas das delle para acceitar essa commissão: que o Governo intendeu que até certo ponto aquella commissão não era desagradavel, e quando foi buscar um cavalheiro para ir desempenha-la, não curou se elle estava na maioria, ou se fazia opposição ao Ministerio; o de que tractou foi de vêr se esse cavalheiro era capaz de desempenhar a commissão de que o queria encarregar. Que tudo o mais era em abono do Governo, e não para sua condemnação. Procurar homens fora do gremio que sustenta para commissões tão importantes, dentro e fora do paiz, poderá provar tudo, menos o exclusivismo dos homens do Governo (apoiados): e, se até certo ponto, o Ministerio julgou esse homem digno, de certo não está em contradicção com a opinião proxima nem remota dos membros do Gabinete, porque lhe parece que nenhum dos membros da Administração actual disse que o Sr. Ávila não era capaz de desempenhar commissões delicadas. Ao Sr. Ministro parece que o digno Par quiz fazer sentir á Camara a pobreza intellectual do partido politico que sustenta este Ministerio; e o que elle orador quiz fazer saber a S. Ex.ª é que o Governo não tracta de saber aonde estão collocadas as intelligencias do paiz, e procura os caracteres intelligentes e os homens idoneos aonde os acha (O Sr. Conde de Thomar — Eu não fiz censura). O orador tambem não julga que tivesse razão para isso; e se alguma cousa houvesse a este respeito a dizer era de louvar, o que não pode esperar de S. Ex.ª

O orador pediu á Camara que não se admirasse de uma certa desordem nas idéas que ia apresentar, porque tinha de responder a diversos discursos, e não podendo attender a todas as notas, que estavam diante de si, era provavel que houvesse algum transtorno de idéas, pois não deseja que fiquem sem resposta argumentos que o digno Par considera importantes.

Que o mesmo digno Par insistia ainda na sua idéa, sobre a despeza que se faz com o Commando em Chefe do Exercito, que é o thema permanente de S. Ex.ª, devendo notar-se que o digno Par já quiz acautelar a época, quando disse que tinha sido o proprio que havia conservado o Commando em Chefe do Exercito; mas agora accusa o Governo por isso mesmo! E porque é que o. digno Par conservou o Commando em Chefe? Porque era um Principe, que não recebia vencimentos pela sua elevada posição, e reconhecida abnegação, a que todos fazem justiça (apoiados); e tambem porque intende que para haver Commando em Chefe, deve estar na mão de um Principe, que tenha o fiel da balança reguladora da politica; doutrina esta que o Sr. Ministro e o Governo não admitte, que reputa fatal, porque intende que o Commandante em Chefe do Exercito, qualquer que seja a sua cathegoria pessoal, nunca deve ter na mão o fiel da balança dos partidos politicos. Que o Exercito não tem essas pertenções, e se tivesse, não era de certo o Governo que o havia consentir; que S. Ex.ª eleva o Exercito a mui grande altura, porque lhe attribue as funcções do Poder moderador, desconhecendo assim as disposições da Carta (apoiados). Que o digno Par pertende, com esta theoria, que, como a força existe no Exercito, com força deve governar-se o paiz (O Sr. Conde de Thomar—O Sr. Duque de Saldanha é que o quer na sua celebre ordem do dia, em que appella para o coração do soldado). O orador - No meio de uma revolução… (O Sr. Conde de

Thomar — Depois). O orador — Quando estava ainda quente, e quando a voz dos partidos não estava suffocada; (O Sr. Conde de Thomar — Foi muito depois). O orador — Então é sabido que acontece muitas vezes fora do paiz, e no mesmo paiz, que se saia fora da rigorosa observancia dos principios constitucionaes, porque as Constituições não permittem as revoluções; mas desde o momento que ellas triumpham, ninguem appella contra esses factos, e nem mesmo o digno Par, quando foi revolucionario. E accrescentou que esse homem, a quem S. Ex.ª se referiu, dizendo que não póde estar fora do Poder, sem se revolucionar, esse homem, a quem o digno Par collocou no dilemma, ou de estar no Poder, ou de fazer revoluções; que esse homem sustenta, com a maioria da nação que o apoia, a paz publica, ha uns poucos de annos nesta terra (apoiados); e elle orador não quer agora fazer reviver a historia velha, á qual S. Ex.ª recorre muitas vezes, e que, por interesse de todos, devia ficar sepultada n'um silencio perpetuo (apoiados).

Observou mais que esta expressão constante de revolucionario, que dirigem assim os homens politicos uns aos outros, esta accusação que o digno Par constantemente pertende fazer aos outros, era mal cabida em S. Ex.ª essencialmente revolucionario, revolucionario mais que ninguem, porque quando não póde revolucionar-se contra os outros, revolucionou-se contra si proprio! (Hilaridade.) Mas que esta accusação de revolucionario já o digno Par a havia proferido em outra occasião, a que lhe não foi possivel responder, porque então lhe não chegou a palavra: que então dissera o digno Par, que se se tinha revolucionado, havia sido para restabelecer neste paiz a Carta Constitucional, que era a bandeira das liberdades publicas, da gloria, e da prosperidade da Nação! a que elle orador observava que o digno Par era então Ministro da Corôa; que o digno Par havia então jurado a Constituição, contra a qual se revolucionou; que o digno Par tinha ido ao Chão da Feira sustentar principios contrarios á Carta Constitucional, que depois restaurara; que o digno Par que tudo isto havia feito, sustentando os principios da Constituição de 1838, que nessa occasião reputava serem os melhores, e que mais podiam interessar ao seu paiz; sustentando-os, e defendendo-os com toda aquella força que é propria do seu caracter, mais tarde em 1842 intendera que devia restabelecer a Carta Constitucional, porque com quanto tivesse jurado a Constituição de 1838, julgou que podia revolucionar-se contra ella!... (O Sr. Conde de Thomar — Não me pesa, e eu lhe responderei.) O Sr. Ministro está certo disso; que se a S. Ex.ª lhe não pesa o ter feito essa revolução, não admira, porque S. Ex.ª poz-se á frente dessa revolução, entrou depois na Administração que se formou, e foi tractar dos negocios publicos (O Sr. José Maria Grande — E dos seus...) e tractou delles por muitos annos (O Sr. Conde de Thomar — Quaes foram esses meus negocios? Diga?...) (O Sr. José Maria Grande — Como eu tenho a palavra, eu logo os direi.) E que com isso intendeu o digno Par que fazia a felicidade do seu paiz! Portanto o digno Par, que é o primeiro revolucionario do paiz, não deve atrever-se a atacar os outros de revolucionarios!

Que o digno Par veio mais aqui dizer que o Ministerio actual devia a sua existencia á força da espada do Marechal Duque de Saldanha, e que reconhecendo isso vinha apresentar ao Parlamento esta medida, que tinha por fim unico collocar o Marechal na Presidencia do Conselho

de Ministros sem pasta, para deste modo ainda a actual situação poder continuar por algum tempo! ao que o Sr. Ministro dizia que o Governo não vive pela força da espada do Marechal, o que o digno Par bem sabe, e sabe-o todo o paiz; mas como S. Ex.ª pediu que lhe respondessem a esta sua accusação, respondia dizendo-lhe que o Governo vive porque tem mantido a paz ha muitos annos, e isto vale alguma cousa n'um paiz onde as revoluções appareciam periodicamente, e com pouco intervallo umas das outras; o Governo vive porque tem aberto estradas, e quasi n'uma extensão tal que iguala a de todas aquellas que se fizeram durante vinte annos, isto é, desde 1833 até 1851; porque tem estabelecido caminhos de ferro, um dos quaes já de ha muito teve começo, está muito adiantado, e em breve acabará, e com o qual hão de trazer a riqueza e a prosperidade a este paiz; porque tem mantido a mais ampla liberdade de imprensa, liberdade como nunca houve, e que o digno Par julgou que devia algemar; é porque, tem permittido as associações, porque tem pago os encargos publicos, porque tem satisfeito o preço do sangue de todos esses que o haviam derramado em defeza da patria e das liberdades publicas, fazendo assim com que as suas viuvas não morram de fome, como até certa época, porque nada se lhes pagava; porque tendo sido accommettido o paiz por enfermidades publicas, e desgraças reconhecidas por todos, que se tem dado em quasi toda a parte do paiz, taes a que nenhum Governo se podia oppôr porque são o resultado da acção da Providencia que assim o tinha resolvido em seus altos designios, porque tendo tido colheitas escaças, comtudo tem dado o pão a essas povoações tão ameaçadas e esfomeadas; tem soccorrido o pobre que o pede em nome da primeira necessidade de homem, a fim de que o livre da fome — esse tremendo flagello da humanidade! Que nestas circumstancias o Governo tem estendido a mão ao pobre, dado trabalho ás classes operarias, e mantido a paz publica, dentro e fora do Reino. E será pouco tudo isto?! O Sr. Ministro não precisa de fazer elogios ao Governo, porque os factos fallam mais alto, os factos são o seu maior elogio; porque quando o Governo falla em estradas vê-se que ellas apparecem, feitas á força de trabalho; porque quando falla em caminhos de ferro, vê-se que os trabalhos progridem; porque quando falla em associações, vê-se que ellas ahi se estabelecem com grande proveito da industria, da agricultura, do bem publico, e da liberdade do cidadão; porque «quando falla em liberdade de imprensa, ahi a tem o paiz a mais ampla; e porque quando falla em instrucção, o Governo aponta para os seus estabelecimentos novamente creados; por conseguinte o Governo falla em nome dos factos que todos presenceiam, e nisto cifra-se o seu maior elogio; mas que como o digno Par provocou e exigiu que o Governo lhe dissesse quaes eram os beneficios que havia feito ao paiz, intendeu elle Sr. Ministro, que não podia dispensar-se de lh'os apontar, satisfazendo por este modo aos desejos do digno Par, e mostrando que não era com a espada do Marechal que o Governo se sustentava, mas sim com a sua muita força moral, creada em virtude dos seus actos, que O paiz vê e reconhece. Que isto com tudo não era dizer que a espada do nobre Marechal não valia, porque ella vale muito pela sua muita recommendação publica, adquirida n'um paiz ao qual o illustre Marechal tem prestado relevantissimos, serviços (apoiados), e porque esse homem não é simplesmente o Commandante em chefe do Exercito, porque não é unicamente um homem de banda á cinta, mas porque é o Presidente do Conselho de Ministros, o Chefe do Gabinete, aquelle que tem o pensamento da Administração a que preside, e porque nelle estão substanciadas todas as idéas, todos os pensamentos e principios do actual Ministerio, que todos os Ministros sustentam e defendem em nome da solidariedade Ministerial que tanto os une, e faz com que adoptem os factos de um dos seus collegas como se fossem de todos; e que defendem os actos do actual Presidente do Conselho de Ministros, como elle defenderia os delles se por ventura aqui se achasse assentado.

Que tinha dito noutra occasião que muitos homens representavam as situações deste ou daquelle paiz, e o digno Par não deixou de assim o reconhecer, acceitando a sua proposição na pessoa do Duque de Victoria: mas que se enganara S. Ex.ª na interpretação que deu ás expressões que a este respeito havia proferido o Sr. Ministro do Reino, invertendo o seu pensamento claro e obvio, porque em quanto que elle orador dizia que certos homens representavam certas situações, e idéas, e trouxe para exemplo lord Palmerston e o Duque de Victoria; o Sr. Ministro do Reino citou sir Robert Peel e Canning, para mostrar que as situações e as opiniões não mudam nem morrem, porque morrem os seus auctores; mas que o digno Par, confundindo as differentes hypothese e as opiniões que se haviam emittido, pertendeu acha-los em contradicção: que por isso elle orador repete que disse que homens havia que, tendo creado uma situação, não podiam deixar, e era mesmo muitas vezes conveniente ao paiz onde essa situação se dava, que esses homens se demorassem á testa dos negocios publicos, porque elles assim representavam a situação que haviam creado, e as idéas que tinham sabido apresentar e desenvolver; e citou como exemplo o Duque de Victoria, que o paiz visinho julgou indispensavel collocar á frente da actual situação, assim como lord Palmerston que com quanto tivesse feito parte de um Ministerio que caíra perante uma votação parlamentar, a Inglaterra o fora collocar á testa dos negocios publicos, e presidindo a um Ministerio em que entrára lord J. Russell que havia feito guerra a esse Ministerio decaído; e isto pela necessidade que o paiz reconheceu que havia de ir collocar á testa dos seus negocios aquelle que

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representava umas certas idéas e um certo pensamento. Que porém o Sr. Ministro do Reino tinha apresentado sir Robert Peel e Canning para provar a sua proposição de que os pensamentos e as idéas nem sempre passam e acabam com a morte daquelles que as apresentaram, porque Mr. Canning representava as idéas da liberdade das nações, e estas idéas não se haviam perdido com a sua morte, nem as da liberdade de commercio proclamadas por sir Robert Peel com quanto este deixasse de existir. Que era isto o que ambos tinham dito, mas que o digno Par intendeu dever confundir;

Que o digno Par ainda insistiu nessa tal ou qual despeza que o Thesouro ia fazer com a approvação deste projecto; e que não só insistiu, mas que até chorou e suspirou por uma época, que já lá vai, em que o Parlamento discutiu por espaço de oito dias sobre o ordenado de um continuo de Secretaria! Ainda bem que essa época, pela qual o digno Par chorou e suspira, já lá vai! ainda bem que hoje o Parlamento se occupa de questões mais elevadas! ainda bem que hoje encara este projecto como um assumpto de interesse e conveniencia publica, sem fallar nesses poucos de centos de mil réis de despeza que o Thesouro fará com a Presidencia do Conselho de Ministros sem pasta! Que o digno Par não só chorou e suspirou por esse antigo systema, mas que até lhe deu as honras de escola! É muito! Pois essa escola (para S. Ex.ª) morreu, e morreu felizmente, e julga o orador que para nunca mais voltar! Morreu felizmente, e entoemos-lhe o requiescat in puce em nome dos bons e dos verdadeiros principios parlamentares! Hoje já se não discute se uma verba é mais augmentada com cincoenta ou sessenta mil réis, como outr'ora com o ordenado de um continuo de Secretaria; hoje de que se tracta é de saber se os serviços são uteis, e se são exigidos pelas imperiosas necessidades publicas; porque o que se quer é que os funccionarios sejam remunerados como o exige o seu serviço e as conveniencias publicas: é isto o que se examina; é esta a escola que hoje se segue; e não essa pela qual o digno Par tanto chorou.

Ao concluir disse o orador que o digno Par não tinha atacado, nem insultado os individuos nomeados para a commissão de Paris, o que diria em satisfação á reclamação de S. Ex.ª, mas disse que elles haviam sido nomeados por influencias particulares, e não porque nisso fosse o bem publico, praticando-se assim um completo patronato! E por isso que o Sr. Ministro tractára de fazer vêr á Camara que o Governo havia nomeado para aquella commissão unicamente os homens que um jury competente tinha julgado os mais capazes para fazerem parte della; que foram um lente de mecânica da escola polytechnica, um lente de chimica da mesma escola, e um lente do instituto industrial, os quaes são de certo os mais aptos e proprios para irem examinar todas essas machinas e instrumentos aperfeiçoados destinados á industria e á agricultura; e não para irem fazer esses exames unicamente no local da exposição de Paris, mas para irem faze-los nas officinas, nas fabricas, nos arsenaes, e onde esses trabalhos estão mais adiantados e aperfeiçoados, a fim de que fazendo depois um relatorio baseado sobre os seus estudos e observações, o Governo podesse resolver convenientemente as grandes questões que tanto interessavam á prosperidade e riqueza deste paiz.

O Sr. Presidente — Ámanhã (5 do corrente) continúa a mesma ordem do dia. — Está fechada a sessão. — Eram cinco horas e meia da tarde.

Relação dos dignos Pares presentes na sessão de 4 do corrente.

Os Srs. Cardeal Patriarcha; Silva Carvalho; Marquezes de Fronteira, de Minas, e de Vallada; Arcebispo Bispo Conde; Condes das Alcaçovas, de Arrochella, do Bomfim, do Farrobo, de Fonte Nova, da Louzã (D. João), de Paraty, da Ponte, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, do Sobral, de Thomar, e de Vimioso; Bispos de Bragança, e de Vizeu; Viscondes de Algés, de Athoguia, de Balsemão, de Castro, de Fonte Arcada, de Fornos de Algodres, de Francos, de Laborim, de Nossa Senhora da Luz, de Ovar, e de Sá da Bandeira; Barões de Chancelleiros, de Pernes, e de Porto de Moz; Mello e Saldanha, Pereira Coutinho, D. Carlos Mascarenhas, Sequeira Pinto, Ferrão, Margiochi, Aguiar, Larcher, Silva Costa, Guedes, Eugenio de Almeida, José Maria Grande, Duarte Leitão, Brito do Rio, Fonseca Magalhães, e Aquino de Carvalho.

Rectificação. — Na pag. 732, col. 4.ª do Diario n.° 137, de 13 do corrente, onde se lê = Extracto da sessão de 29 de Maio = deve ler-se = Extracto da sessão do 1.º de Junho.

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