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CAMARA DOS DIGNOS PARES.
EXTRACTO DA SESSÃO DE 2 DE MAIO DE 1859.
presidencia do ex.mo sr. visconde de Laborim, vice-presidente.
Visconde de Ovar, Secretarios, os Srs. D Pedro Brito de Rio
(Assiste o Sr. Ministro da Justiça.)
Pelas duas horas e meia, tendo-se verificado pela chamada a presença de 28 Dignos Pares, declarou o Ex.ª Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta da antecedente que não teve reclamação.
Não houve correspondencia.
O Sr. Aguiar — Sr. Presidente, o Conselho do Lyceu de Coimbra encarregou-me de apresentar este documento, pelo qual se mostra, que elle adheriu á representação que antes de hontem apresentei aqui, feita pela Universidade de Coimbra, relativamente á extincção do Conselho Superior estabelecido hoje naquella cidade e em Lisboa.
Mando para a Mesa a representação, e peço que se lhe dê o destino que se tem dado ás outras para ser tomada em consideração, assim como as razões dadas por estes differentes corpos, quando aconteça que a respectiva proposta do Governo, convertida em projecto de Lei, tenha de vir a esta Camara.
O Sr. Presidente — A recommendação do Digno Par fica ao cuidado da Mesa para produzir os devidos effeitos.
O Sr. Visconde de Castro — Peço licença por parte da commissão de fazenda para devolver á Mesa um projecto de Lei, que nos persuadimos que pertence á commissão de administração publica.
(Fez indicação do que era.)
O Sr. Conde de Thomar (sobre a ordem) — Esse negocio em parte pertence á commissão de administração publica, e estou de accôrdo com o que o Digno Par acaba de dizer, mas como se tracta tambem de prover a meios de indemnisação que hão de saír do Thesouro, parece-me que tambem o negocio pertence á commissão de fazenda, e por tanto deverá ir a ambas as commissões (apoiados).
O Sr. Presidente — Será remettido á commissão de administração publica, ouvida porém a de fazenda igualmente.
O Sr. Visconde da Luz — Tenho a participar a V. Ex.ª e á Camara, que o Sr. Conde da Ponte de Santa Maria me encarregára de pedir aqui desculpa delle não vir hoje á sessão em consequencia de objecto de serviço.
O Sr. Presidente — Ficamos scientes. ORDEM DO DIA.
Discussão do seguinte parecer n.º 447.
A commissão de guerra examinou o projecto de lei n.º 123, que veio da Camara dos Srs. Deputados, e os numeros os documentos que lhe são relativos, que auctorisa o Governo a mandar contar como tempo de vencimento para o accesso ao Capitão graduado do regimento de infanteria n.º 5, Bernardo José Ferreira, todo o tempo que lhe foi descontado desde que se publicou a sentença contra elle proferida, publicada na Ordem do Exercito n.º 39, de Agosto de 1856, e o tempo anterior em quanto correu o processo que occasionou aquella sentença.
A commissão, com quanto não desconheça que ao beneficio que ao mencionado Official confere o projecto de lei de que é questão resistem em termos expressos, e positivos os Avisos de 24 de Abril de 1824 e 1 de Maio de 1855, e a Legislação militar anterior; todavia, attendendo aos bons serviços e soffrimentos do supplicante pela causa da liberdade; é de parecer que o sobredito projecto do lei n.° 123 seja approvado e submettido á Sancção Real.
Sala da commissão de guerra, em 18 de Abril de 1859. = Conde do Bom fim = Conde de Santa Maria = Tem voto dos Srs. Visconde da Luz = Visconde de Villa Nova de Ourem.
projecto de lei n.º 123.
Artigo 1.º É o Governo auctorisado a mandar contar como tempo de vencimento para o accesso ao Capitão graduado de infanteria n.º 5, Bernardo José Ferreira, todo o tempo que lhe foi descontado desde que se publicou a sentença contra elle proferida, publicada na Ordem do Exercito n.º 39, de Agosto de 1856, e o tempo de prisão anterior em quanto correu o processo que occasionou aquella sentença.
Art. 2.° Esta reparação não dá ao supplicante direito para reclamar os vencimentos que possa ter perdido em resultado da sua preterição.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Palacio das Côrtes, em 15 de Abril de 1859. — Manoel Antonio Vellez Caldeira Castello Branco, Deputado Presidente =. Miguel Osorio Cabral, Deputado Secretario = Bernardino Joaquim da Silva Carneiro, Deputado Secretario.
Não havendo quem pedisse a palavra, foi approvado tanto na generalidade, como depois na especialidade, e a mesma redacção.
Entrou em discussão o parecer n.º 448.
Foi presente á commissão de marinha e ultramar o projecto de lei n.º 120, que veio da Camara dos Srs. Deputados, auctorisando o Governo a mandar abonar ao Capitão de fragata reformado, Jeronymo Antonio Pussich, uma gratificação equivalente á somma dos meios soldos que deixou de perceber durante o tempo que esteve em activo serviço nas ilhas do archipelago de Cabo Verde.
A commissão, compenetrada da justiça que tem o Official de que se tracta a ser gratificado pelo tempo que esteve empregado em serviço activo, pertencendo á classe dos Officiaes separados do quadro da Armada, porque em seu favor milita a disposição do artigo 3.° do Decreto de 30 de Julho de 1844; é de parecer que o dito projecto de lei n.º 120 seja approvado e submettido á Sancção Real.
Sala da commissão, 19 de Abril de 1859. = Conde do Bomfim — Visconde d'Athoguia (com declaração)= Conde de Linhares = Visconde de Villa Nova d'Ourem.
projecto de lei n.º 120.
Artigo 1.º É auctorisado o Governo a mandar abonar ao Capitão de fragata reformado, Jeronymo Antonio Pussich, uma gratificação equivalente á somma dos meios soldos que deixou de perceber durante o tempo que esteve em activo serviço nas ilhas da provincia de Cabo Verde.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Palacio das Côrtes, em 15 de Abril de 1859. — Manoel Antonio Vellez Caldeira Castello Branco, Deputado Presidente = Miguel Osorio Cabral, Deputado Secretario = Bernardino Joaquim da Silva Carneiro, Deputado Secretario.
O Sr. Visconde d'Athoguia — A necessidade da presença do Governo está satisfeita com a presença de quem o represente; mas eu tenho que fazer algumas perguntas a que talvez o Sr. Ministro da Justiça não me possa responder, e sómente o faça o Sr. Ministro da Repartição competente.
O Sr. Ministro da Justiça — Posso dizer a V. Ex.ª que o Sr. Ministro da Marinha está na outra Camara, e não tardará muito aqui.
O Sr. Visconde d'Athoguia — Neste caso peço a V. Ex.ª que tenha a bondade de mandar um aviso ao Sr. Ministro da Marinha. A primeira observação que entretanto vou já fazendo é, que este projecto é inutil, porque se o pedido é justo, se aquillo que se reclama é a execução de um Decreto do Poder executivo, o Governo tem nas suas mãos os meios de decidir o negocio. Para que é necessaria uma Lei para este objecto? É luxo de fazer Leis! Já no outro dia disse aqui muito bem o Sr. Eugenio de Almeida, que nós devemos ser parcos no uso que fazemos de legislar, devendo fazer-se Lei só e unicamente sobre
aquillo que se vê que se não póde deixar de legislar; mas quando já ha Leis que podem servir para o caso, o fazer novas Leis é mais do que um luxo, é trazer a desordem entre o Poder legislativo e o Poder executivo.
Por agora, Sr. Presidente, não digo mais nada; aguardo a presença do Sr. Ministro da Marinha para dirigir uma pergunta a S. Ex.ª
O Sr. Presidente — Já foi chamado o Sr. Ministro da Marinha, e em quanto não vem poderemos passar a outro projecto interrompendo a discussão deste.
O Sr. Visconde de Ourem — Mas eu peço a V. Ex.ª que me conceda a palavra sobre este mesmo objecto, e entretanto talvez compareça o nobre Ministro.
O Sr. Presidente — Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Visconde de Ourem — Pela razão de não ter o Governo deferido a pertenção deste official é que elle se dirigiu ao Poder legislativo a pedir justiça para ter o meio soldo, que deixou de receber em quanto esteve empregado activamente.
Eu farei succintamente o relatorio do negocio, e a Camara o avaliará na sua sabedoria.
Este official estava separado do quadro da Armada, e assim tinha só meio soldo; pediu licença para ir residir em Cabo Verde, o Governo concedeu-lhe esta licença, e auctorisou o Governador daquella provincia para o empregar naquillo que julgasse conveniente; o Governador nomeou-o addido ao seu estado-maior, e depois mandou-o para Governador da ilha de S. Vicente, onde esteve uns poucos de annos, percebendo só meio soldo. Vem portanto agora pedir, que durante o tempo que serviu activamente se lhe abone o soldo por inteiro, e soccorre-se para isso ao Decreto de 30 de Julho de 1844, que determina no artigo 3.°, que os empregados das classes inactivas, quando forem chamados a serviço activo, se lhes dê uma gratificação proporcional ao serviço em que forem empregados; por consequencia esta disposição parece que lhe aproveita, e que só póde haver questão se a gratificação ha de ser o meio soldo que pede ou menor quantia; mas regatear isto não me parece proprio desta Camara. O projecto passou na outra Camara concedendo o meio soldo pedido, e o Governo não o impugnou; e agora parece-me que esta Camara não será mais difficil ou menos generosa.
(Entrou o Sr. Ministro da Marinha.) (Pausa.)
O Sr. Visconde de Athoguia — Peço a attenção do Sr. Ministro da Marinha para lhe perguntar se o Governo foi ouvido sobre isto na respectiva commissão da outra Camara?
O Sr. Ministro da Marinha — A apresentação deste projecto na outra Camara é anterior á entrada do actual Ministerio, mas o Governo transacto foi ouvido, e eu estive presente quando este negocio veiu á discussão na outra Camara.
O Sr. Visconde d'Athoguia — Eu desejava saber a razão disto, porque em verdade ainda não entendo bem o negocio.
Se este Official durante o tempo que recebeu meio soldo em Cabo Verde devia receber o soldo por inteiro, o Governo está auctorisado a mandar pagar-lhe essa differença sem dependencia de nova Lei. Às Camaras não compete arbitrar taes gratificações, se o individuo tem direito a ella, o Governo tem na legislação os meios de attender á pertenção, uma Lei nova é cousa inutil e ociosa. Deste modo é estabelecer um máo precedente, que dará logar a actos iguaes, repetidos sem necessidade.
Sem fazer agora nenhuma applicação pessoal no que vou dizer, exporei com tudo, que eu estou costumado a ver que os pertendentes ordinariamente consideram que ha mais facilidade em serem attendidos dirigindo-se aos Corpos legislativos e fallando aos amigos, do que subindo as escadas das Secretarias e fallando aos Ministros que teem os papeis á vista para resolverem em vista delles, o que não acontece aos membros das Camaras, que ordinariamente se interessam arrastados quasi sempre só pelas sympathias, pela amizade e pela commiseração, não se calculando até que ponto nos póde levar o legislar para legislação já feita. Effectivamente é este o caso em que nos achamos, e eu peço ao nobre Ministro, que já se acha presente, que me diga se entende, ou me póde explicar a razão por que se quer fazer Lei para este caso?
O Sr. Ministro da Marinha — Sr. Presidente, acabei de dizer que este projecto não era do tempo da actual administração; assisti á sua discussão na outra Camara, e considerei, como não podia deixar de considerar, que o meu antecessor e os membros da commissão de marinha daquella casa não teriam andado de leve neste objecto, e que o resolveriam como julgassem de justiça, entendi que tendo elle vindo ás Camaras, é porque seria sem duvida de época em que não estivesse comprehendido na Lei da despeza. O negocio é na verdade tão insignificante, e o interessado um homem que merece a contemplação pela sua avançada idade e máo estado phisico: elle recorreu á benevolencia das Camaras, porque, naturalmente, o Governo não estava auctorisado para satisfazer este encargo. (O Sr. Visconde d'Athoguia — Mas ha Lei para pagar.) Ha Lei para pagar gratificações, mas não para o soldo por inteiro em taes casos.
O Sr. Visconde de Ourem — Sr. Presidente, é simplesmente para dizer duas palavras. O projecto de lei n.º 117 acaba de ser approvado sem discussão; e o projecto n.º 118, que se refere a um Official, que vem pedir ao Parlamento a justiça que julga lhe assiste, e que ainda lhe não fizeram, vai sendo bastante debatido, na minha opinião sem fundado motivo. Este Official tinha direito ao meio soldo que recebeu, estando em sua casa sem fazer nada, e parece de toda a justiça que se lhe dê o outro meio soldo pelo tempo que serviu activamente.
Sr. Presidente, não é por pedidos que me dirijo, quando se tracta de negocios publicos: estes resolvo-os sempre pela cabeça, e não pelos affectos do coração. Ao Official de que se tracta entendo que é de justiça se lhe conceda o que pede, e estou certo que a Camara, neste sentido, approvará o projecto de lei de que se tracta.
O Sr. Visconde d'Athoguia — Sr. Presidente, sou membro da commissão de marinha, e não quero que, em casos destes, se diga que consinto que passe um projecto que não é preciso, porque só se tracta de dar cumprimento á Lei, e para isso basta o Governo.
Não tracto da justiça ou injustiça do que pede este Official; póde ou não o Governo pagar? (O Sr. Visconde de Ourem — Não póde, porque é exercicio findo). Ainda assim tenho razão, porque se não faz um projecto para um individuo, quando se acabou o exercicio; o Governo deve pagar-lhe uma gratificação ou complemento de ordenado, e tendo acabado o exercicio, vem ás Camaras, e propõe: tanto para taes e taes pagamentos; mas o principio de que não é precisa a Lei para mandar pagar, continua a subsistir de pé. Esta é que é a questão.
O que é necessario é que o Sr. Ministro venha pedir uma auctorisação para este pagamento; agora o que eu não sei é se elle deve ser feito pela secretaria da marinha, se pelo archipelago de Cabo Verde, porque sendo feito o serviço alli, aquella provincia é que deve pagar (O Sr. Ministro da Marinha — O projecto auctorisa o Governo a pagar por onde pertencer). Mas o Governo não póde pagar sem vir pedir auctorisação ás Côrtes, porque é exercicio findo; mas não deve ser pedida para um individuo especialmente. Supponha o Sr. Ministro que um Official da Armada foi mandado para uma commissão no estrangeiro, demorou-se por lá, e por não ter procurador não recebeu os seus vencimentos aqui; o nobre Ministro não hesita em dizer que tem direito a elles, e vem á Camara pedir a somma, porque é de exercicio findo, mas não se faz uma Lei para este Official.
Se insisto nisto é porque sou membro da commissão, e desejo ordem nestas cousas; e não querendo fazer injuria ao Digno Par e meu nobre amigo o Sr. Visconde de Ourem, porquê não me referi a elle quando disse que muita gente cedia a pedidos, devo dizer que o proprio Sr. Ministro foi quem disse que este Official mettia compaixão pela sua avançada idade, etc.. e que todos sympathisavam com elle, e por isso S. Ex.ª não examinou muito o que se passou na outra Camara.
Sr. Presidente, são estas as minhas observações; não fallarei mais sobre este negocio, e a Camara fará o que entender; agora o que protesto é contra a inutilidade deste projecto, que é para pagar uma cousa que a Lei determina; para o exercicio findo não é preciso um projecto para cada caso.
O Sr. Ferrão — Sr. Presidente, voto pelo projecto, tanto porque o julgo fundado em justiça, como porque o não considero acto inutil, e antes que é necessaria uma Lei, para que essa justiça seja administrada, nos termos em que vem proposto da outra Camara. Considero-o fundado em justiça, porque ninguem a contestará, para que os Officiaes, tanto do Exercito como da Armada, que não teem senão o vencimento da inactividade, sendo chamados ao serviço activo, não tenham mais alguma cousa, alem desse vencimento. Quem tem um vencimento legal sem obrigação de servir, tem necessariamente o direito a um accrescimo, como retribuição, logo que é chamado a serviço.
Este principio está consignado em diversas Leis, mas especialmente na de 18 de Maio de 1854, auctorisando o Governo a arbitrar uma gratificação aos Officiaes militares inactivos, durante o serviço em que sejam empregados, calculada essa gratificação, segundo a importancia e natureza do mesmo serviço.
O Governo, applicando a Lei de 1854 a este Official, de que tracta o projecto, podia fazer esse arbitramento de modo que fosse menos ou mais do que o meio soldo, como vem proposto da outra Camara.
E esta Lei que faz agora? Dispensa o Governo dessa appreciação, fixando a quantia.
Ora, substituir uma quantia certa e determinada a outra incerta e indeterminada, é alterar neste caso especial o que se acha estabelecido na Lei anterior; e definir assim o direito resultante antes illiquido é derogar por nova Lei; o que, não pertencendo ao Governo, sómente podia ser decretado pelo Corpo legislativo.
Logo, parece-me evidente, que a Camara dos Srs. Deputados, votando o presente projecto de lei, e esta Camara approvando-o, não pratica um acto superfluo, mas necessario.
Não tendo pois ouvido expender razões algumas que sejam contrarias ao acto de justiça a que tende o projecto de lei; não sendo excessiva a quantia que vem fixada; e sendo necessaria uma Lei para este fim: não encontro fundamento solido para deixar de me conformar com o parecer da illustre commissão de marinha, e por isso voto pelo projecto (apoiados).
O Sr. Visconde d'Athoguia — Peço a palavra. (O Sr. Presidente — O Digno Par já fallou duas vezes, e não lhe posso dar a palavra na fórma do Regimento.) Mas eu sou membro da commissão.
O Sr. Presidente — Então eu consulto a Camara. (Vozes — Falle, falle.) Tem V. Ex.ª a palavra (apoiados).
O orador — São duas palavras. Sr. Presidente, eu não quero fallar n'um ponto que o Digno Par com illustração superior acabou de dizer, eu impugno a idéa de S. Ex.ª que a Camara deve determinar o quantum da gratificação, porque isso é uma attribuição do Governo que já está na Lei, que diz — que a Camara auctorisa o Governo para aquelle objecto: portanto o Governo é que vem pedir á Camara essa auctorisação, mas o Governo é quem arbitra a quantia, e não é cousa que esta Camara se metta a arbitrar mais ou menos, principalmente quando ha uma Lei muito explicita a este respeito, e a qual diz o seguinte: (leu).
Por consequencia o Governo tem neste parti
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cular tudo quanto é necessario, e a Camara, no meu entender, é que não póde determinar a quantia da gratificação. Eu opponho-me a isto, e não direi mais nada.
O Sr. Ferrão — Sr. Presidente, não posso deixar em silencio uma asserção que acabo de ouvir ao Digno Par.
Não se offendem, de modo algum, pelo projecto as attribuições do Poder executivo. Nas attribuições constitucionaes do Governo está sómente o fazer executar as Leis geraes ou especiaes. É por virtude de uma Lei geral e das faculdades, que esta lhe confere, que o Governo póde arbitrar em mais ou menos as gratificações dos Officiaes em inactividade chamados a serviço activo.
É preciso não confundir attribuições constitucionaes, com attribuições legaes do Governo.
A respeito destas podem as Camaras fazer Lei especial que" modifique, altere ou limite em determinado caso as faculdades concedidas por outra Lei.
O Poder legislativo que deu auctorisação póde limital-a, e o Poder executivo, cumprindo e fazendo cumprir a Lei limitativa, não póde perder assim direitos que, segundo a Carta, lhe não competem, pois que em todo o caso lhe fica intacto o direito, ou antes a obrigação de executar as Leis do paiz.
Considerações especiaes póde ser que tenham existido, e creio que sim, a respeito deste Official, para em seu favor se fixar em determinada quantia a retribuição que lhe é devida, e nada impediu a outra Camara, e portanto impede esta de dar peso a essas considerações.
Agora o Governo, respeitando esta Lei, e executando-a como lhe cumpre executar todas as outras Leis do Estado, está perfeitamente nos limites das suas attribuições.
Nem o Poder legislativo invade portanto as attribuições do Governo, nem este se vê limitado pela promulgação da nova Lei.
Por conseguinte, se o presente projecto de lei, vem da outra Camara por ella approvado, e se nem a justiça, nem a necessidade do mesmo projecto, nem a constitucionalidade delle podem oppôr-se á sua approvação nesta Camara, pela minha parte, declaro não ter a menor duvida em lhe dar o meu voto.
Vozes — Votos, votos.
0 Sr. Ministro da Marinha — Eu peço a palavra.
0 Sr. Presidente — Tem V. Ex.ª á palavra".
0 Sr. Ministro da Marinha — Pedi a palavra unicamente para responder á ultima parte do que disse o Digno Par o Sr. Visconde de Athoguia. S. Ex.ª entende que era necessario auctorisação para se fazer esta despeza, e que ella deveria ter a iniciativa do Governo na outra Camara. Parece-me que era o mesmo que está neste projecto, mas a questão é se o Governo está auctorisado para reconhecer o direito e pagar; mas se não póde pagar ha a necessidade de que o Governo venha á Camara pedir a auctorisação para fazer um pagamento que não estava nos limites da despeza auctorisada. Pondo de parte a questão de direito, deixando-a ao Digno Par o Sr. Ferrão, limitar-me-hei a observar ao Sr. Visconde de Athoguia, que SJ Ex.ª entende que era necessario o Governo vir ao Parlamento pedir auctorisação para esta despeza, e exactamente o que diz esta Lei, 6 o Governo auctorisado para fazer essa despeza. (O Sr. Visconde de Athouguia — Todos que estiverem neste caso vem pedir o mesmo.) Eu já disse na outra Camara que todas estas pretenções devem ter a iniciativa do Governo (O Sr. Visconde de Athouguia — Apoiado), a qual deve attender ás pertenções de todos os individuos que se julgam lesados, e no caso que lhe não faça justiça, poderão recorrer ás Camaras, e então qualquer Deputado ou Par do Reino está no caso de interpellar o Governo por não ter feito um acto de justiça.
Agora, no caso especial de que se tracta, depois da Camara dos Sr. Deputados ter tomado a iniciativa do negocio, e depois do Governo ter dito de que era justo fazer este pagamento, parece-me que se não deve negar, e que o Governo não fica senhor de meios para dispor desta quantia sem auctorisação o Sr. Visconde de Fonte Arcada — Então é uma graça?) Não é graça, e um acto de justiça; o Sr. Visconde de Athoguia não questiona a justiça, é por ser desnecessario o projecto, por tanto logo que S. Ex.ª reconhecer que ha necessidade desta auctorisação para fazer o respectivo pagamento por não estar dentro do competente exercicio, a auctorisação poderá ser dada por qualquer modo, ou por este projecto, que conduz ao mesmo fim.
O Sr. Visconde de Balsemão — Eu peço a palavra.
Vozes — Votos, votos.
O Sr. Presidente — Tem o Digno Par a palavra.
O Sr. Visconde de Balsemão — Eu não impugno este projecto, ainda que me parece uma excepção á regra geral, porque eu entendo, como o Sr. Visconde d'Athoguia, que pelo artigo 75.º da Carta, §11.°, estava nas attribuições do Governo fazer este pagamento, vindo requerer ás Côrtes a competente auctorisação. Mas não posso deixar passar a idéa de que se paga porque e exercicio findo, porque a Camara estará lembrada de que já duas vezes interpellei o Sr. Ministro da Fazenda sobre este objecto, porque ha muitos individuos que estão nas mesmas circumstancias deste Official, e que não tem sido pagos pelos exercicios findos.
O Sr. Avila disse aqui que esperava pelas respectivas relações para pedir a necessaria auctorisação para os comprehender nesses exercicios; e depois, quando o Sr. Casal Ribeiro se apresentou nesta Camara, tambem eu lhe fiz ver a justiça destes pagamentos, porque quando aquelles individuos requerem dizem-lhe que não se paga a sua divida por pertencer a exercicios findos, e então eu pedia ao Governo que adoptasse alguma medida a este respeito. Este está no mesmo caso, pertence a exercicio findo, estava na regra geral, a Camara póde contudo fazer excepção, mas estabelece um precedente que não póde negar a sua applicação a qualquer outro.
Eu entendo que é de justiça pagar tudo que é de exercicios findos, e assim é que voto pelo projecto; mas parece-me que elle importa uma excepção, que depois trará a necessidade de se attender de igual fórma a reclamações de igual natureza.
Posto a votos foi approvado.
Entrou em discussão na especialidade, e foi approvado sem discussão; e bem assim a mesma redacção.
Entrou em discussão o parecer n.º 120.
Senhores. — Foi presente á commissão de marinha e ultramar o projecto de lei n.º 128, que veiu da Camara dos Srs. Deputados, auctorisando o Governo a decretar, ouvindo previamente o Conselho Ultramarino, a entrada livre de direitos, no, archipelago de Cabo Verde, dos generos alimenticios de primeira necessidade para as classes pobres, quando no dito archipelago se derem casos de escassez de chuvas que reclamem essa medida; e bem assim promovendo, pela isenção de direitos de importação, e do dizimo por quatro annos, a entrada e o restabelecimento do gado perdido nos annos de fome por que teem passado as referidas ilhas.
A commissão considerando que o projecto de lei de que se tracta é uma ampliação ás disposições contidas no Decreto das Côrtes geraes, datado de 29 de Março do corrente anno, que por esta Camara subiu á Real Sancção, util para a eventualidade de falta das producções de primeira necessidade precisas na provincia de Cabo Verde para o sustento dos seus habitantes, e que no dito projecto estão acautelados os inconvenientes que poderiam resultar ao Thesouro Publico da isenção de direitos que se estabelece: é de parecer que o mencionado projecto de lei n.º 128 deve ser approvado por esta Camara, quando a illustre commissão de fazenda da mesma com melhores razões o não impugne.
Sala da commissão, 27 de Abril de 1859. = Conde do Bom fim = Visconde de Athoguia — Visconde de Villa Nova de Ourem.
PROJECTO DE LEI N.° 128.
Artigo 1.º Fica o Governo auctorisado a decretar, ouvido previamente o Conselho Ultramarino, a importação livre de direitos, no archipelago de Cabo Verde, do milho, arroz, fava, feijão e lentilha, das farinhas de milho, e de mandioca, da banha de porco, e das carnes verdes, seccas ou salgadas, de carneiro, de vacca e porco, incluindo o toucinho, quando, em consequencia da escassez das chuvas, as circumstancias do mesmo archipelago assim o exigirem:
§ unico. Quando o Governo fizer uso da presente auctorisação não poderá estender cada concessão alem do fim do anno em que se der a escassez de mantimentos, produzida pela irregularidade das chuvas.
Art. 2.° É permittida a importação livre de direitos, até o fim do anno de 1863, no archipelago de Cabo Verde, do gado vaccum, lanígero, caprino, cavallar, muar, suino, e dos camellos.
§ unico. Ficam livres de dízimos até o fim do anno de 1863, no archipelago de Cabo Verde, as especie de gado de que tracta este artigo.
Art. 3.º A banha de porco e as carnes verdes, salgadas ou seccas, de carneiro, de vacca e de porco, incluindo o toucinho, que se importarem no archipelago de Cabo Verde desde oi." de Janeiro de 1860 até ao fim do anno de 1863, pagarão nas respectivas Alfandegas, sendo de producção estrangeira, unicamente 10 por cento dos direitos de importação que lhes estão marcados na Pauta geral das Alfandegas do mesmo archipelago; e terão entrada livre de direitos no mesmo periodo, sendo de producção portugueza, e transportados de porto nacional em navio nacional.
Art. 4.° A farinha de milho pagará por importação na provincia de Cabo Verde, desde o 1.º de Janeiro de 1860 em diante, 200 réis por barrica, sendo estrangeira, e será admittida livre de direitos de importação, sendo de producção nacional, e transportada de porto nacional em navio portuguez.
Art. 5.° As especies de gado de que tracta o artigo 2.° desta Lei, bem como a banha de porco e as carnes das especies de que tractam os artigos 1.° e 3.°, que forem exportadas do archipelago de Cabo Verde para qualquer porto nacional, serão consideradas como estrangeiras, em relação a importação nesses portos, até o fim do anno de 1864, ainda mesmo que sejam de producção nacional.
§ unico. Serão igualmente considerados como estrangeiros, para os effeitos deste artigo, até o fim do anno de 1860, os generos alimenticios de que tracta o artigo 1.° desta Lei, bem como o serão, sempre que o Governo fizer uso da auctorisação que lhe confere o artigo 1.° em relação aos generos a que se referir cada concessão, desde a data do respectivo Decreto, até o fim do anno immediato aquelle da concessão.
Art. 6.° O Governo dará conta ás Côrtes do uso que fizer da auctorisação que lhe é conferida no artigo 1,° desta Lei.
Art. 7.º Fica revogada toda a legislação em contrario.
Palacio das Côrtes, 18 de Abril de 1859. =
Manoel Antonio Vellez Caldeira Castel-branco, Deputado, Vice - Presidente = Miguel Osorio Cabral, Deputado, Secretario = Bernardino Joaquim da Silva Carneiro, Deputado, Secretario.
Foi approvado sem discussão, tanto na generalidade, como na especialidade, e a mesma redacção.
O Sr. Presidente—Não ha já sobre a mesa senão o parecer n.º 124, que foi hoje distribuido, e portanto não se póde discutir hoje; é necessario que passe o tempo que marca o Regimento.
Ha tambem alguns pareceres a imprimir, e esses serão tambem distribuidos assim que cheguem.
Agora vailêr-se uma cemmunicação do Ministerio do Reino, acompanhando o Decreto de pro-rogação das sessões.
O Sr. Secretario; deu conta de um officio do Ministerio do Reino, enviando o Decreto authographo, que tambem foi lido, pelo qual SuaMa-gestade Houve por bem prorogar as Côrtes geraes até ao dia 21 de Maio corrente.
Para a Secretaria.
O Sr. Presidente — Em vista pois do estado dos nossos trabalhos, a seguinte sessão terá logar na quarta-feira; e a ordem do dia será o parecem.0 121, e o mais que se poder discutir, e que possa occorrer. Está levantada a sessão.
Eram tres horas e meia da tarde.
Relação dos Dignos E»aics qtic estiveram presentes na sessão de t de Ululo de ISSO.
Os Srs.: Visconde de Laborim; Marquezes: de Fronteira, das Minas, e de Pombal; Condes: das Alcaçovas, do Farrobo, de Penamacor, do Sobral, e de Thomar; Viscondes: d'Athoguia, de Balsemão, de Benagazil, de Castellões, de Castro, de Fonte Arcada, da Luz, de Monforte, de Ovar, e de Ourem; Barão da Vargem da Ordem; Mello e Saldenha, Pereira Coutinho, Sequeira Pinto, Pereira de Magalhães, Ferrão, Margiochi, Pessanha, Silva Carvalho, Aguiar, Larcher, Silva Costa, Eugenio de Almeida, e Brito do Rio.