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Concelho, do Fiscal da Camara, do Regedor de Parochia, ou Juiz Eleito, e de um Empregado da Companhia.

§ 2.° Concluido o varejo, ficarão nullos e de nenhum effeito os titulos antecedentes da existencia e qualificação dos vinhos em deposito, e se passarão outros em que se guardem as respectivas qualificações dos vinhos existentes.

§ 3.º Nenhum vinho de exportação poderá, ser armazenado senão dentro do Districto da demarcação do Douro, ou das Barreiras do Porto ou de Villa, Nova de Gaia; e perderá aquella habilitação o vinho que se achar em outro local seis mezes depois de findar o varejo.

§ 4.° Este varejo será feito todos os annos, o todas as vezes que se julgar conveniente; e as despezas pagas pela Companhia.

O SR. PRESIDENTE: - A hora já deu ha muito, e supponho que a Camara não quererá proseguir hoje nesta discussão. (Apoiados.) A Ordem do dia para Segunda-feira (3 do currente) é a continuação do exame dos Artigos deste mesmo Projecto. - Está fechada a Sessão.

Eram quatro horas e um quarto.

N.° 52. Sessão de 3 de Abril. 1843.

(PRESIDIU O SR. VISCONDE DE SOBRAL - DEPOIS O SR. DUQUE DE PALMELLA - E ULTIMAMENTE O SR. CONDE DE VILLA REAL.)

Foi aberta a Sessão pela uma hora e um quarto da tarde: estiveram presentes 35 Dignos Pares - os Srs. Duque de Palmella, Marquezes de Fronteira, e de Ponte de Lima, Condes do Bomfnn, da Cunha, do Farrobo, de Lavradio, de Linhares, de Lumiares, de Paraty, da Ponto de Santa Maria, do Rio Maior, de Semodães, e de Villa Real, Viscondes de Fonte Arcada, de Laborim, de Oliveira, de Serra do Pilar, de Sobral, e de Villarinho de S. Romão, Barões de Ferreira, e de Villa Pouca Miranda, Osorio, Ribafria, Gambôa e Liz, Ornellas, Serpa Saraiva, Tavares de Almeida, Pessanha, Giraldes, Silva Carvalho, Serpa Machado, Polycarpo José Machado, e Trigueiros - Tambem esteve presente o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.

Foi lida a Acta da Sessão precedente, e ficou approvada.

Mencionou-se um Officio pelo Ministerio do Reino, accusando a recepção de outro desta Camara ácêrca dos esclarecimentos pedidos antes sobre os bens e rendimentos do Recolhimento de S. Bernardino e das Confrarias existentes no Districto de Aveiro, e fazendo sciente que se haviam renovado as Ordens para serem competentemente cumpridas as expedidas a este respeito. - Enviou-se para a Secretaria.

O SR. SECRETARIO CONDE DE LUMIARES: - Estão em cima da Mesa duas representações, uma dos Pharmaceuticos do Concelho de Coura, no mesmo sentido de algumas que diversos tem dirigido a esta Camara; e a outra é da Camara Municipal de Lamego, pedindo a reducção de certas contribuições designadas no Projecto das ebtradas: ambas estas representações me parece que devem ser remettidas á Secção de Negocios Internos. - Assim se resolveu.

O SR. TRIGUEIROS: - O Digno Par Cotta Falcão não póde comparecer ás Sessões por molestia, nem hoje nem talvez que por mais alguns dias.

Tenho a honra de mandar para a Mesa tres representações das Camaras Municipaes de Fajão e oe Carregal, e de variou proprietarios de vinhas e de fabricas de destillação do Districto de Coimbra; todos pedem a rejeição do exclusivo das aguas-ardentee como base da Lei dos vinhos.

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMÃO

Tambem recebi representações da Junta de Parochia de Nogueiras, e dos habitantes das Freguesias da Ermida, de Andreas e Abbaças: são todas em sentido opposto ás que apresentou o Sr. Trigueiros. Chegam já tarde; mas, como me fôram remettidas, sempre quiz dar conta dellas á Camara, e vou envialas a V. Ex.ª

O SR. VICE-PRESIDENTE: - Todas estas representações ficam em cima da Mesa.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Pedi a palavra para lembrar aos Dignos Pares que temos apenas 17 ou l8 dias de Sessão, pois tantoss nos restam at~e ao fim do mez, tirados os feriados: e como estão pendentes muitos trabalhos, queria propôr á Camara houvesse de resolver que, d'aqui em deante, em todos os dias que não fôssem feriados tivessemos Sessão publica, e em segundo logar, que as Sessões nunca durassem menos de quatro horas. Se alguma resolução se não tomar neste sentido, é impossivel que os trabalhos prosigam com a gravidade que exige a natureza desta Camara. Já me parece que estou vendo chegarem aqui Leis sobre Leis, nos ultimos tres ou quatro dias da Sessão; mas isto será o mesmo que dizer-nos que as façâmos por vapor.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - Queira V. Ex.ª mandar para a Mesa o seu Requerimento por escripto, afim de evitar que haja uma discussão vaga.

Amanhan é dia de Grande Galla, e um daquelles em que esta Camara custuma enviar uma Deputação ao Paço a cumprimentar S. Magestade, por ser o natalicio da Mesma Augusta Senhora. São nomeados para formarem esta Deputação os Dignos Pares Presidente, Patriarcha Eleito, Secretarios Conde de Lumiares e Machado, e Conde de Villa Real, Visconde de Sobral, Conde da Ponte de Santa Maria, Barão de Ferreira, Barreto Ferraz, Osorio, Ribafria, Gambôa e Liz, e Ornellas.

- Foi mandada para a Mesa e lida a seguinte

Proposta.

Proponho que até ao fim da presente Sessão Legislativa, haja Sessão publica todos os dias não feriados, e que a Sessão dure pelo menos quatro horas, devendo começar á uma da tarde. - Camara dos Pares, em 3 de Abril de 1843. - Conde de Lavradio.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - Não sei se a Camara quer tractar já da Proposto, que se acaba de ler.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Segundo intendo, parecia-me muito conveniente que a Proposta se di-

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cutisse agora mesmo, por que ámanhan é feriado, e se ella ficar para Quarta-feira já se perde algum tempo. (Apoiados.)

Consultada a Camara, resolveu que entrasse immediatamente em discussão.

O SR. CONDE DE SEMODÃES: - Eu apoio a Proposta do Digno Par, e votarei por ella.

O SR. TAVARES DE ALMEIDA: - Sr. Presidente, parece-me que o que está na indicação do Digno Par se acha tambem já no Regimento: eu não faço disto questão, mas lembrarei a S. Ex.ª que é tão inimigo da ociosidade, que tambem o cançaço e fadiga e inimigo do acerto em questões parlamentares, por que uma discussão de quatro horas me parece bastante para cançar a attenção dos Membros da Camara, e tres horas bem aproveitadas seria tal vez sufficiente: entretanto eu não quero alterar o Regimento.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Sr. Presidente, eu confesso que a minha saude não é muito robusta; contudo parece-me que quatro horas de Sessão não será muito, por que em geral trabalha-se seis horas nas Repartições Publicas. No Parlamento Iglez, e mesmo no Francez, seria couza extraordinaria o trabalhar só quatro horas: o Speaker da Camara dos Communs, em Inglaterra, está ás vezes quatorze horas sentado na sua cadeira; e todavia ainda não conheci nenhum Speaker que não fôsse velho. (Riso.)

O SR. GIRALDES: - Se o Regimento Interno marca a hora ao meio dia, então executemos o Regulamento, (Apoiados.) e se não está marcada, nesse caso peço a V. Ex.ª que ponha primeiro á votação a proposta de quando deve começar a Sessão.

O SR. SECRETARIO MACHADO: - O Regulamento que tem estado em discussão não marca hora, diz isto - A hora indicada, estando presente um terço dos Pares, que tiverem tomado assento na Camara, o Presidente abrirá a Sessão &c.

O SR. GIRALDES: - Então peço que se ponha a indicação a votos, e se façam duas differenças, uma do tempo a que deve começar a Sessão, e a outra de quanto deve durar, e que seja primeiro votado quando deve ter principio a Sessão, por que, marcada a hora, a outra dependerá dos trabalhos que houver.

O SR. TRIGUEIROS: - Sr. Presidente, eu voto pela indicação do Sr. Conde de Lavradio se S. Exa. mudar a hora, para começar a Sessão ao meio dia, por que, começando á uma hora para acabar ás cinco, é muito tarde, e a Camara ha de muitas vezes achar-se nas circumstancias de não votar as materias que tiver discutido, perdendo-se deste modo o trabalho de um dia; S. Ex.ª conhecerá pela experiencia que em certas occasiões não estarão jé presentes Dignos Pares em numero sufficiente para tomar resoluções. Não me parece muito trabalhar quatro horas, mas a Sessão deve começar ao meio dia, mesmo para a gente que tem habito de acordar mais tarde. Por tanto, se S. Ex.ª não tem inconveniente em mudar a hora, votarei pela sua indicação.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Eu não questiono u hora, por que para mim é indiffercnte que a Sessão comece á meia noite ou ao meio dia; eleja-se a hora que melhor parecer, que eu estou sempre prompto; mas o que não me e indifferente e o numero de horas que devemos trabalhar: por conseguinte modifique-se a minha Proposta como a Camara intender com tanto que não trabalhemos menos de quatro horas em cada Sessão.

O SR. CONDE DE LUMIARES: - Tambem julgo que é indiffercnte começar a Sessão ao meio dia, ou á uma hora; mas devo lembrar á Camara que, mesmo para a regularidade dos nossos trabalhos, é necessario marcar tempo para as Commissões: no estado de adeantamento em que se acha a Sessão, não podêmos perder um dia de discussão; entretanto a maior parte dos negocios de que a Camara tem de occupar-se, hão de ser primeiro tractados nas Commissôes. Isto é que eu queria que a Camara tivesse em vista antes de tomar uma resolução final.

Como ninguem mais pedisse a palavra, o Sr. Vice-Presidente propoz - se as Sessões deveriam começar ao meio dia? E se resolveu affirmativamente. - Disse

O SR. TAVARES DE ALMEIDA: - Sr. Presidente, a reflexão que fez o Digno Par Secretario é de muita attenção, por que realmente ha trabalhos nas Commissões muito necessario, e que convem concluir. Está marcado no Regimento que haverá quatro horas de Sessão, mas não se designa o espaço por que devemos trabalhar nas Commissões; e então parece necessario destinar algum dia determinadamente para esses trabalhos... (O Sr. Vice-Presidente - Eu ia consultar a Camara a esse respeito.) Talvez que o melhor de tudo seja seguir o Regimento, por que elle previne todas estas couzas; lá tem quatro horas de Sessão, a hora do meio dia para começar, tem os dias das Commissões, e a faculdade de dispensar esses dias quando os trabalhos urgem. Se ha só 17 dias de Sessão de Legislatura, e os trabalhos apertam, quando os Projectos venham, e não houver espaço para se examinarem, não se resolvam, ponham-se de parte, e outra Sessão virá; mas cançar a Camara com muitos trabalhos por que são só 17 dias de Sessão, não me parece justo.

O SR. GIRALDES: - Parece-me que tendo-se marcado a hora do meio dia para começar a Sessão, tem se votado o principal: depois de aqui estarmos se conhecerá a necessidade de haver, ou não mais duas horas para a Sessão, e então neste caso proroga-se. Em quanto a haver todos os dias Sessão, é o que me parece quasi impossivel, por que hão de faltar os trabalhos; então a Camara julgará que não deve haver Sessão por proposta do Sr. Presidente. Logo que se vote a hora, temos votado o principal, e se ha necessidade de haver Commissôes, o Sr. Presidente consultará a Camara, a qual decidirá para marcar os dias das Commissões no caso que seja necessario; e tudo fica assim remediado.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Quando não haja trabalhos, está claro que não havemos de estar aqui quatro horas sem fazer nada; mas isso não póde acontecer agora, porque já cá estão muitos trabalhos para nos occuparmos, e por que é de esperar que venham ainda alguns Projectos que estão na outra Casa e pelos quaes o Governo provavelmente ha de urgir. Ora o motivo principal que me levou a apresentar esta Proposta e para haver tempo de fazer as couzas regularmente, e não nos vermos obrigados a trabalhar d'empreitada: pela parte que me toca, como tenho um talento muito limitado, quero meditar aquillo sobre que fôr obrigado a votar, por que a esta Camara vem differentes Projectos, e a decisão de cadaum delles, segundo fôr por nós tomada, póde ser util ou nociva ao Paiz. Quanto á observação que fez o Sr. Conde de Lu

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miares, acho-a muito justa, mas é necessario tambem analysar como se fazem os trabalhos de Commissões, o que todos nós sabemos pela experiencia por que pertencemos a ellas. As Commissôes, ordinariamente, reunem-se e assentam nas bases do trabalho que lhe foi encarregado; depois um, ou dous Membros dellas incumbem-se do desinvolvimento dessas bases e de redigirem o respectivo Parecer; segue-se mais tarde uma, ou duas conferencias na Casa da Commissão nas quaes se lê e se asaigna esse Parecer, ficando aasim concluido o negocio. Sr. Presidente, fallemos claro, o grande trabalho de qualquer Commissão quasi sempre recahe em um só ou (quando muito) em dous individuos; os mais apenas entram na discussão de algum ponto, e depois assignam o que se lhes apresenta já feito: mas, de qualquer modo, esse trabalho não se faz no edificio da Camara; cadaum leva os documentos para sua casa, lança por aquillo que intende sobre o negocio, e vem depois apresentar o seu trabalho para receber a approvação ou a rejeição dos seus Collegas na Commissão.

O SR. VICE-PRESIDENTE propoz mais -- se a Camara deveria ter Sessão, em todos os dias uteis, até ao fim da presente Sessão da Legislatura? Resolvou-se, que sim. -- Disse

O SR. GIRALDES: - Sr. Presidente, eu declaro que votei a favor do quesito proposto, por V. Ex.ª na déa de que, quando houver necessidade de trabalhar nas Commissões, a Camara possa deliberar...

(muitas Vozes: - É do Regimento. Apoiados.)

O Sr. Vice-Presidente propoz, ainda - se as Sessões durariam quatro horas? Nenceu-se pela affirmativa.

O SR VICE-PRESIDENTE. - Passâmos á Ordem do dia, que é a continuação da discussão especial do Projecto de Lei sobre os vinhos do Douro.

O SR. CONDE EE LAVRADIO: - (Sobre a ordem.) Na Sessão passada tive a bonra de submetter a esta Camara uma substituição, ao Artigo 12.º do Projecto N.º 31, a qual foi admittida á discussão, ficando reservada para quando se tractasse a materia a que diz respeit: mas eu lembro á Camara que, se o Artigo 8.° fôr approvado, ficará a minha substituição prejudicada, e por tanto sem ser discutida como a Camara determinou:, peço poe isso. a V. Ex.ª que mande ler o Artigo 8.°, e por elle conhecerá a Camara a exactidão do que eu acabo de dizer, por que neste Artigo começam a descrever-se os deveres que se impôem á Companhia, e se taes disposições fôrem approvadas, necessariamente se lhe devem conceder os direitos correspondentes. Desejaria que V. Ex.ª, depois do Artigo, mandasae ler tambem a substituição, e que seguidamente propozesse á Camara esta questão de ordem.

- O Sr. Vice-Presidente mandou ler o seguinie Aet., 8.º A Companhia fica obrigada, a comprar, desde a abertura da feira a 30 de Maio de cada anno, até vinte mil pipas do vinho de segunda e terceira qualidad"; "os lavradores, que- lh'o quizerem vender, sendo o da segunda qualidade de l4$000 a 16$00000 réis por pipa; e o da terceira qualidade pelo preço de 10$000 a 12$000 réis por pipa; e uns e outros, conforme a marca que tiverem, sendo, pagos aos prazos de 2, 4, e 6 mezes da data da compra, deduzidos os signaes que serão, pagos na fórma do custume.

§ l.º Esta quantidade e preços poderão ser alterados pelo Governo, ouvindo o Conselho d'Eatado, e sendo consultadas préviamente a Companhia, a Associeção dos Agricultores do Douro, e a do Commercio da Cidade do Porto.

§ 2.º Esta obrigação começa na abertura da feira de 1814, e durará até á feira de 1857 inclusivamente, cuja epocha comprehende quatorze novidades completas.

§ 3.º Cessa esta obrigação da Companhia a respeito daquelles lavradores que adulterarem os seus vinhos, suscitando-se porêm alguma duvida entre o lavrador e a Companhia sobre a adulteração, o vinho, querendo o lavrador realisar a venda, será reduzido a agua-ardente á custa da Campanhia, inspeccionando o lavrador o processo como lhe convier; e a quantidade da agua-ardente que produzir da força de 10 gráus de Tessa na fabrica, lhe será paga pela Companhia, a razão de 85$000 réis pipa nos prazos marcados no Artigo 8.º - Se o lavrador preferir destillar este vinho por sua conta, a Companhia será obrigada a comprar-lhe a agua-ardente que produzir, pelo preço de 90$000 réis por pipa, sendo sem defeito e dos gráus que ficam designados.

Quando se suscite duvida ácèrca da boa qualidade de agua-argente, será esta decidida por dous arbitros um nomeado pela Conpanhia, ou seu Delegado, e outro pelo lavrador, ou seu procurador; e no caso de empate, será, este decidido por um de seis Commissarios de negociantes de vinhos residentes no Districto da demarcação, tirado á sorte, os ques serão para este fim eleitos pela Direcção da Associeção dos Agricultores na primeira Sessão de cada anno; não podendo a companhia, nem o lavrador recusar mais de dous cadaum.

Se os preços dos vinhos taxados na Artigo 8.º fôrem alterados, a agua-ardente será paga na mesma proporção.

§ 4.° Quando as offertas á Companhia excederem as mais mil pipas, será esta quantidade rateada pelos lavradores em proporção do que cadaum offerecer, e das respectivas qualidades.

§ 5.° Os lavradores, nos primeiros tres dias depois de aberta a feira, manifestarão na Casa da Companhia na Regoa, aquelle vinho que quizerem vender-lhe da segunda e terceira qualidade; este manifesto consistirá n'uma relação em duplicado, a qual deve coster o nome do lavrador, Freguezia, adega, numero dos toneis, e quantidade, e qualidade dos vinhos.

Uma destas relações será entregue ao lavrador, referendada pelo Empregado da Companhia para esse fim authorisado.

§ 6.° A Companhia, nos oito dias immediatos, formará as relações dos vinhos que lhe fôram offerecidos, e do rateio que coube aos lavradores, as quaes serão affixadas nos logares do custume em cadauma das Freguezias do Douro.

§ 7.° Quando algum lavrador deixe de ir realisar a venda á Companhia até 30 de Maio, deverá esta comprar uma quantidade de vinho proporcional á quantidade e qualidade daquelle cuja venda se não realisara, e não havendo vinho da mesmo, qualidade que lhe queiram vender, verificará a compra dessa quantidade com os da outra qualidade immediata que lhe quizerem vender.

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§ 8.° A Companhia fica obrigada a mandar affixar até 30 de Junho de cada anno, em todas as Freguesias do Districto do Douro, relações impressas dos vinhos que comprou para satisfacção da obrigação que lhe é imposta nesta Lei, com designação dos lavradores, quantidades e qualidades.

- Lida tambem a Substituição do Sr. Conde de Lavradio (V. pag. 182, col. 2.ª), disse

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMÃO: - Esta substituição altera inteiramente o que já se approvou, e tanto n'uma como na outra Camara, isto é, a concessão de um subsidio á Companhia, e não um emprestimo...

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Perdôe o Digno Par que o interrompa, mas isso ainda não está em discussão. Eu propuz que a substituição fôsse discutida antes do Artigo 8.°, mas a Camara nada resolveu por ora a esse respeito, e se a minha proposta fôr adoptada, então peço eu a palavra para sustentar a substituição.

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMÃO: - Bem: eu peço igualmente a palavra para fallar contra ella.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - Eu intendo que não é possivel tractar da opportunidade da substituição sem entrar alguma couza na sua materia; (Apoiados,} e por tanta não vejo que se deva recusar a palavra ao Sr. Visconde de Villarinho, que a tinha pedido primeiro que nimguem.

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMÃO: - Éu ia dizendo que o subsidio dos l50 contos, que já está votado, tem por fim segurar aos lavradores do Douro que elles hão de vender, pelo menos, a terça parte dos seus vinhos, contribuindo assim o Estado para sustentar aquella agricultura moribunda; mas o emprestimo proposto pelo Sr. Conde de Lavradio, em vez de remedio, só serviria para aggravar o mal, porquanto, no estado em que se acham a maior parte dos lavradores, tendo o seu genero empatado, ainda ficariam de peior condição, visto que elles não podem tirar da sua industria, nem mesmo o que lhes custa o vinho, e então não poderiam pagar no prazo marcado na substituição, cujo resultado seria continuar o mesmo estado de desgraça do Douro, e em consequencia virem a morrer aquellas vinhas. Parece-me por tanto que a substituição do Digno Par não deve ser admittida.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - Como o nosso fim é adeantar trabalho, parecia-me mais proficuo discutir já a substituição, visto que a resolução de alguns,dos seguintes Artigos do Projecto em certo modo depende da decisão della. (Apoiados.)

-- Manifestando-se geral annuencia, teve a palavra

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Sr. Presidente, eu na Sessão passada fui tachado nesta Camara de incoherente, de contradictorio, de author (ou, ao menos, de cooperador) de estratagemas, e não sei de que outras cousas mais, para prolongar a discussão deste Projecto de Lei. Não ha duvida que me era impossivel negar um facto, de que toda a Camara tinha perfeito conhecimento, eu opprovei e assignei o Parecer da minoria da Commissão; e essas accusações que se me fizeram foi em consequencia de eu ter dado a minha approvação e posto a minha assignatura naquelle Parecer, vindo apresentar depois a substituição que vae entrar em discussão. Mas a Camara estará lembrada de que, no primeiro dia em que se abriu esta discussão, eu declarei logo muito formalmente que, posto tivesse assignado o Parecer da minoria da Commissão, considerava, tanto a base adoptada pela maioria della como a do Projecto vindo da Camara dos Srs. Deputados, como duas bases erradas, contra os principios, e que, na minha opinião, não haviam de produzir os resultados que, certamente de boa fé, esperavam assim os defensores de um como os do outro arbitrio; entretanto que, achando-me quasi n'uma coacção moral, me vira obrigado a optar por um delles, e então me tinha decidido pela base do Projecto da Camara dos Srs. Deputados, por me parecer menos offensiva dos verdadeiros e incontestaveis principios de Economia-politica, menos odiosa ao resto do Paiz, e principalmente á Provincia da Extremadura; em fim que, obrigado a escolher uma, eu preferira aquella pelos motivos que expuz: mas nessa mesma occasião (supposto que nenhuma proposta apresentasse) lembrei que talvez fôsse mais proficuo diminuir os direitos da exportação dos vinhos; esta minha lembrança foi depois reduzida a uma Proposta formal, apresentada pelo Digno Par, o Sr. José da Silva Carvalho, que ficou ulteriormente rejeitada: lembrei tambem nessa mesma occasião (e constará do extracto da minha falla publicado no Diario do Governo) o estabelecimento de um Banco rural como um dos melhores meios de proteger a cultura do Douro, e preferivel áquelles que se propunham.

Comtudo pareceu-me que a prudencia pedia, e o desejo que tinha de acertar me obrigava a esperar a discussão afim de me fortalecer mais nos meus principios sobre as verdadeiras conveniencias do paiz do Douro: eu sabia que nesta discussão haviam de entrar muitos illustres Oradores, defensores de uma ou de outra base, Oradores que reuniam ás theorias o conhecimento pratico das couzas daquelle paiz, e que possuiam grande copia de dados estatisticos que a mim me faltavam - e não admira, por que em Portugal só se podem obter colhendo-os cadaum com o seu proprio trabalho; - ouvi pois com muita attenção os Oradores dos dous lados, e, se é possivel, com muita mais os meus adversarios: confesso que assás me instrui nesse debate, porêm o resultado foi confirmar-me ainda mais na opinião, que já tinha antes, mas que é agora para mim arreigada, de que a Companhia do Alto Douro não é o verdadeiro, o conveniente vehiculo por onde deva passar o auxilio que todos nós desejâmos, e ainda hoje queremos dar aos lavradores do Douro. Ora, convencido eu desta verdade, lembrei-me de um outro meio, fundando-me na,observação de que, em geral, quaesquer soccorros chegam sempre melhor, quero dizer, com mais brevidade e mais inteiros, ao fim que se tem em vista, quando são distribuidos directamente por individuos cujos interesses sejam communs com os daquelles que se tracta de soccurrer. Isto posto, pergunta-se, a quem deverá encarregar-se a distribuição do auxilio proposto no Projecto? A resposta é obvia: como queremos soccurrer directamente os lavradores, entregue-se este subsidio a uma commissão eleita por elles, a qual terá o cuidado de bem lh'o administrar. Segundo o Projecto, este soccorro e para repartir pela Companhia e pelos lavradores (se lá lhes chegar um real, o que eu duvido muito, ou, pelo menos, é para mim uma questão); concedâmos que haja uma igual divisão

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de interesses, metado para a Companhia e metade para os lavradores: mas como nós não queremos soccurrer senão os lavradores, dêmos-lhes tudo, e creio que assim teremos conseguido melhor o nosso fim. Dir-se-ha porêm que o Projecto concede 150 contos de réis por quatorze annos, em quanto que a substituição apresenta apenas a mesquinharia de 600 contos, não dados, mas emprestados. Sr. Presidente, o emprestimo que proponho, conforme eu o intende, vale mais que o donativo indicado no Projecto. Costuma dizer-se; "do pão do nosso compadre grande fatia ao nosso afilhado"; mas nós não podêmos dar do que não é nosso: estes 150 contos hão de sahir das algibeiras dos contribuintes, os quaes, geralmente fallando, se acham em máu estado, por que a maior parte delles soffrem, e alguns muitissimo; lembre-se pois a Camara que dentro em poucos dias o Governo, provavelmente, ha de trazer ás Camaras alguma Proposta para cuhrir o desfalque de 150 contos, que este donativo produzirá no Orçamento do Estado.

(Entrou o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.)

Sinto que S. Ex.ª só agora entrasse, por que vou concluir, mas falo-hei repetindo o que mais de uma vez tenho já dito. Eu não apresentei a substituição com o fim de demorar esta discussão; o meu fim é soccurrer o Douro efficazmente, mas tambem, quanto seja possivel, com o menor detrimento do resto do Paiz: parece-me que assim se conseguiria sendo adoptada a minha Proposta, por que davamos algum soccorro aos lavradores do douro diminuindo porêm o onus que pelo Projecto ficará o cargo de todo o Reino. Tenho dado as razões do meu proceder; a Camara póde escolher o arbitrio que tiver por melhor.

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Não é possivel buscar meios mais variados do que os que propoz o meu amigo para impugnar todo o Projecto. Direi que, visto a demora que tem havido nesta discussão, eu mesmo não desejo fazer nenhuma pequena emenda. As que se propõem são tendentes a demorar o negocio: e se digo que o meu amigo habilmente sustenta a sua emenda, tambem de facto quer destruir todo o Projecto. Este, como já se tem dito, tem outros fins, por que não são sómente os de dar um auxilio aos lavradores do Douro por uma vez, como se propôem pela emenda do Digno Par. Não se tracta já do exclusivo, mas se deve dar-se aos lavradores do Douro todo o auxilio possivel por que as circumstancias assim o exigem. Pela minha parte sempre lhes darei o meu fraco apoio; e seria de justiça por que, quando tem pezado sobre a lavoura do Douro muito maiores encargos do que sobre a outra lavoura, merece tambem mais contemplação. Isto é justiça, não é privilegio. Eu não entro na questão da substituição, por que ella altera todo o Projecto, e se o Digno Par se limitasse a querer restringir a concessão a um menor numero de annos, podia a este respeito apresentar uma emenda, mesmo neste Artigo, o qual contêm um paragrapho que tem relação a essa concessão. Resumindo-me, digo que o Digno Par na sua substituição já propôem um prazo muito menor; e por isso sou de parecer que ella se não póde admittir.

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMÃO: - Não tractarei de combater as razões expostas com toda a eloquencia pelo Digno Par, o author da moção, em defeza della, por que estou persuadido de que um dos fins principaes, que se leve em vista na apresentação desta substituição, foi demorar a discussão do Projecto; entretanto não posso deixar de responder a um dos ultimos argumentos que S. Ex.ª acaba de expender.

Disse o Digno Par que "do pão do nosso compadre grande falla ao nosso afilhado," e que o Reino se não acha em circumstancias de dar gratuitamente 150 contos de réis á Companhia por alguns annos. Sr. Presidente, a resposta a este argumento está. no Artigo 20.° do Projecto. (Leu-o.) Já se vê que a Nação não perde todo este dinheiro que agora dá, e não para auxiliar a Companhia, mas sim a lavoura do Douro, afim de que aquella lhe possa comprar 20:000 pipas de vinho cada anno, para cuja transacção ainda será necessario que a mesma Companhia entre com muito dos seus fundos, mesmo quando houvesse de comprar o genero a l0$000 réis por pipa, visto que tambem terá a fazer despezas com cascos, alugueres de armazens, Commissarios &c., e por tanlo não lhe será possivel empregar em tudo isto menos de 500 contos de réis. - Quanto á contribuição (em que o Digno Par faltou) que se torna precisa para cubrir o déficit que estes 150 contos de réis hão de produzir no Orçamento do Estado, respondo que tambem aquelle paiz contribuirá para esse desfalque; álem disso, tructâmos de um interesse geral da Nação, e não de vantagens locaes de uma Provincia. Todos os membros de qualquer sociedade tem deveres reciprocos uns pura com os outros; e, para a sociedade inteira obter grandes interesses, ás vezes é necessario que uma parte dos individuos que a compõem percam alguma couza a favor do todo, quando assim seja indispensavel. Com muita admiração minha tenho ouvido reputar-se este negocio como um objecto particular do Douro, por que, Sr. Presidente, tracta-se de não deixar perdido o immenso capital que custaram aquellas vinhas, e de sustentar uma exportação que ainda produz milhares de contos de réis.

Concluo que se esta Camara, intendendo que devia approvar uma couza (a base vencida como ella o foi), depois approvar outra que destroe a primeira, digo que deste modo nada faremos, e nem será possivel acabar com a discussão do Projecto, cuja urgencia nenhum dos Dignos Pares ainda contestou.

O SR. CONDE DE SEMODÂES: - Sr. Presidente, diz o Parecer da minoria da Commissão... é de opinião que o Projecto deve passar tal veiu da Camara dos Srs. Deputados. Desde que tenho a honra de me assentar nas cadeiras do Parlamento, e tanto na Camara dos Deputados, como na dos Senadores, como agora nesta depois que fui elevado á alta dignidade de Par por S. Magestade, tenho observado, e visto sempre que os Pareceres das Commissões são combatidos pelos adversarios e sustentados pelos que os exararam e os assignam; mas vejo agora o contrario, por que um dos Membros da Commissão que assignou o Parecer em que se propoz que o Projecto passasse tal qual veiu da outra Camara (onde foi longamente discutido) é quem mais se oppôem a elle! Se se admittir a substituição do meu nobre Collega, de cuja amizade me honro muito, o Projecto não serve de nada, acabou, por que fica annullada com-

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pletamcnte a sua base. Em nome dos meus patricios, eu agradeço a S. Ex.ª o interesse que toma em os querer favorecer; mas se se lhes fizer o emprestimo que propôem o Digno Par (e que elles não pedem), nunca o poderão pagar no prazo que marca a emenda: é preciso não conhecer aquelle paiz para alguem se persuadir de que os seus lavradores estariam nas circumstancias de pagar similhante emprestimo no fim de seis annos. Sr. Presidente, uma vez que se não de ao Douro o remedio proposto no Projecto, que vem a ser, o restabelecimento da Companhia, ou a reforma della, com este auxilio, cujo resultado é a venda certa da terça parte dos seus vinhos, tudo o mais em nada o favorecerá; este e o unico meio de podêr promover a agricultura daquelle paiz. Eu espero pois que a Camara não será contradictoria com aquillo que approvou por uma grande maioria, que foi o Parecer da minoria da Conmissão, que eu tambem approvei; se porêm agora ficar sem effeito essa votação, então é melhor não tractar mais deste Projecto, por quanto elle morre no caso de se adoptar a substituição.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Sr. Presidente, se se tractasse simplesmente de tirar a lavoura do Douro de difficuldades momentaneas, estou persuadido que um emprestimo tão generoso como propôem o Digno Par, o Sr. Conde de Lavradio, seria bastante; mas aqui não se tracta só disto: na confecção deste Projecto de Lei houveram vistas um pouco mais elevadas, vistas que hão de procurar um equilibrio no commercio dos vinhos, e cortar a tendencia que vae a haver em accumular os depositos, assim como dar uma fórma áquelle commercio, afim de que os lavradores possam tirar lucro das suas terras, e os negociantes ter a certeza de que senão hão de accumular ainda mais esses depositos de anno para anno. Este Projecto de Lei é um complexo de medidas; é necessario por tanto olhar para todas ellas conjunctamente, e ver a connexão em que estão umas com as outras: ora aquelles Dignos Pares que julgam que não deve haver Companhia, votem contra tudo isto, o que seria antes uma couza mais razoavel. Esta Companhia existe em consequencia da Lei de 7 de Abril de 1838, cuja duração ha de se estender por estes quatorze annos; mas quem e de opinião que esta Companhia não presta para nada, vota contra isto e a favor da substituição do Sr. Conde de Lavradio; quem julga que esta inspecção não vale nada, vota contra ella; quem se persuade de que este commercio é como o do algodão e da seda, ou outro qualquer, vota contra estes varejos e medidas policiaes; finalmente, vota contra todo o Projecto se com effeilo lhe parece que elle não preencho os fins que se tiveram em vista: mas está mostrado com toda a evidencia que este commercio não e como outro qualquer, e que por consequencia não póde passar sem algumas medidas policiaes. Isto não vejo eu só em Portugal, por que em toda a parte ha certos ramos de commercio que estão subjeitos a inspecções, e se estas não houvesse, no commercio do Douro, esteja V. Ex.ª persuadido de que elle não havia de ter durado ha cem annos, conservando sempre a mesma estimação o vinho do Porto como a teve no principio, ou talvez ainda mais. Lancem-se olhos para a Europa, e veja-se se os linhos da Russia não estão subjeitos a medidas e inspecções; veja-se se o commercio de pelles feito pelos Americanos, e o das sedas de Napoles não estão debaixo da inspecção do governo; e se não fôsse isso ellas teriam cahido como as nossas de Chacim. Poderei procurar agora um exemplo da ruina e acabamento de commercio em consequencia de se pôrem no esquecimento estas inspecções: ainda não ha muito tempo que o commercio de meias de sedas que vinham de Italia para Hespanha foi arrazado, aonde eram reputadas excellentes nos seus mercados, e se gastavam immensas, mas depois que acabou a inspecção, e que cessou o esmero da qualidade, os Francezes e os Inglezes apoderaram-se daquelle commercio - Julga-se que isto seja só uma esmola, ou prestacão concedida aos lavradores; mas eu intendo que assim démos um passo mais longe, e para isso é necessario tomar a tempo algumas medidas, as quaes,intendo que, como remedio, se determinam neste Projecto de Lei na sua totalidade.

Sr. Presidente, disse-se - dão-se 150 contos de réis, e multiplicados por quatorze annos fazem tantos contos de réis: - e para que se diz isto, é para fazer sensação? Mas quem disse que se deitassem os direitos abaixo não despia o Thesouro dos mesmos rendimentos? Só havia uma differença, e era, que se haviam de perder esses 150 contos de réis annuaes sem resultado nenhum; mas por este modo vae a Nação e o Governo habilitar um paiz de que se espera hão de vir beneficios a este commercio, e por tanto não vejo motivo pelo qual se não approve o Projecto como veiu da Camara dos Deputados.

Sr. Presidente, quem tem sustentado o credito daquelle vinho tem sido as medidas salutares successivamente tomadas a respeito delle, e é por falta de taes medidas que alguns ramos de commercio, de natureza igualmente delicada, se tem perdido entre nós: por exemplo, na Ilha da Madeira a falta de inspecção foi a causa de ter aquelle vinho perdido o seu credito, credito que tem custado muitos suores a restabelecer.

Não gastarei tempo na explicação do Douro e do seu commercio, mas digo que todo o Douro, todo o Norte, todo o commercio, toda a lavoura, estão persuadidos de que da approvação deste Projecto lhes ha de vir um grande beneficio, e se não fôr muito ha de ser algum; conseguintemente eu não posso considerar a substituição do Sr. Conde de Lavradio senão como destruidora de tudo isto: tal e a minha opinião.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Sr. Presidente, eu não dou nada pela vida da minha substituição, por que já quando ella nasceu vinha fraca, e tanto que eu aqui manifestei que havia de morrer sem chegar a baptizar-se, mas em fim sempre consegui que ficasse com esse sacramento, e isto alguma couza é. Agora accrescentarei poucas palavras em resposta a certas asserções, o que faço unicamente por decencia, ou methodo, e não por que tenha esperança de faxer vingar a minha idéa. - Voltou-se novamente á questão da Companhia, mas eu já não outro nisso, por que a Camara deve estar enfadada de ouvir tantas couzas como se tem aqui dito a esses respeito, e tambem por que todos nós sabemos o que a Companhia foi, o que é, e o que ha de ser. O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, dirigindo-se creio eu que directamente a mim, disse que o soccorro dos 150 contos tinha por fim beneficiar a lavoura... (O Sr. Ministro dos Negocios Estran-

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geiros: - O commercio em geral.) V. Ex,ª fallou na lavoura, se não estou equivocado. (O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: - Referi-me ao commercio em geral, e á lavoura em geral.) Mas ao commercio representado na Companhia?

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Totalmente o contrario disso: se o Digno Par consente, eu me explico em duas palavras. - O commercio do Porto não é a Conpanhia, por que esta exporta tres mil pipas de vinho em quanto que o que se chama o commercio exporta trinta mil. Que ha pois de commum entre o commercio do Porto e a Companhia do Alto Douro!.. A Companhia é um estabelecimento hoje reduzido a quasi nada, mas que com o auxilio do Projecto póde concurrer grandemente para levantar a exportação desse estado de decadencia em que se acha, fazendo com que se vão removendo cento e setenta mil pipas de vinho do Porto que alli estão accumuladas (pagando seus donos 5 por cento ao anno), deposito este que tem complicado as couzas do Douro ao ponto em que hoje estão. Quando fallo de commercio dos vinhos do Porto, intenda-se, não me refiro só á Companhia, por que são objectos distinctos.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Pelo que ouço, Sr. Presidente, a Companhia vae substituir os frades Franciscanos, que pediam esmola para a darem depois. (Apoiados.) Para favorecer a lavoura, e o commercio dos vinhos do Douro era preciso que a Companhia tractasse de ter depositos, e que, álem disso, se occupasse da inspecção do genero, pondo muito particular cuidado nos meios de conservar a pureza dos vinhos do Porto; eis ahi no que se deveria fazer consistir o grande officio da Companhia. Não obstante o ser eu um amigo decidido da liberdade de commercio, reconheço comtado que ha certos ramos cuja conveniencia exige uma tal ou qual inspecção, ás vezes mesmo algum tanto rigorosa, para não virem a ser fraudados nos mercados externos, sobretudo quando são susceptiveis de se apresentar sem aquella pureza que constitue quasi exclusivamente o seu valor; convengo mesmo que um dos ramos que mais carecem dessa inspecção seja o vinho do Douro: mas, pergunto eu, não haverá outro meio mais directo de fiscalisar a qualidade do vinho senão pelo intermedio da Companhia de envolta com o donativo dos 150 contos de réis? Não poderia obter-se essa fiscalisação com a commodidade necessaria se se encarregasse a pessoas de probidade e com 03 conhecimentos especiaes precisos para a desempenharem devidamente? Parece-me que sim, e que para isso de pouca despeza se careceria.

Eu contenho com S. Ex.ª, o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, em que na Russia, na Italia, na Inglaterra, e em outros paizes onde ao principio da liberdade de commercio se tem dado maior desinvolvimento, diversos ramos delle estão rigorosamente subjeitos a certas inspecções: mas por ventura provarão estes exemplos que a fiscalisação da qualidade dos vinhos do Porto, que se exportam, não póde ser feita senão pela Companhia, e incorrendo o Thesouro na forçada despeza de 15O contos de réis pelo espaço de cadaum dos seguintes quatorze annos?.. S. Ex.ª admirou-se de nós lamentarmos que se gastem dous mil e cem contos (que a tanto montam os 150 contos no espaço de quatorze annos) para fazer um beneficio ao Douro, e manifestou admirar-se muito mais ainda quando via que as pessoas que isto lamentavam eram aquellas mesmas que haviam proposto, ou apoiado a idéa da diminuição dos direitos de exportação: eu confesso que entro nesse numero; apotei aquella idéa (e talvez me engane) mas na esperança de que, diminuindo-se os direitos na sahida do vinho do Porto, o consume delles augmentaria - e quando chiegarmos ao Artigo 12.º direi então o meu parecer, mas desde já peço a palavra para offerecer-lhe uma emenda - e em certo modo podia conseguir-se areparação dessa diminuição pela maior somma dos direitos do genero que se exportasse, não tractando agora das outras vantagens que d'ahi tiraria o Thesouro: e então o que se perdia por um lado vinha a ganhar-se por outro.

O Sr. Conde de Semodães intendeu que a substituição dava pouco tempo para os lavradores poderem pagar o emprestimo que proponho; S. Ex.ª persuadiu-se que esse tempo eram apenas seis annos: não é isso o que se deprehende da substituição, pois se lhe concedem treze annos, começando a pagar no anno de 1850 e devendo acabar no de l856; e por tanto vinha a dar-se aos lavradores do Douro uma larga sufficiente para effectuarem o seu pagamento.

Sr. Presidente, eu não quero demorar mais a Camara, por que ella parece desejosa de votar a rejeição da minha substituição; consolo-me de que ao menos pude conservar ao meu filho mais estes momentos de vida, e sento-me já.

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Ainda que a questão esteja muito debatida, e que eu não queira prolongala, não posso deixar de dizer que o Sr. Conde de Lavradio confundiu as couzas; fez-nos uma descripção da Companhia que se pretende proteger, que realmente não é exacta. A Companhia é composta de homens intendidos neste commercio dos vinhos do Douro, e eu tambem desejo que ella por essa razão venha a ser (como o Digno Par o indica) a promotora dos interesses da lavoura do Douio. Os calculos que fez o Digno Par da somma que se ha de entregar á Companhia, debaixo da supposição que este auxilio se dá a lavoura, não são applicaveis ao que se tem em vista, que é animar o commercio do vinho do Douro, por que tambem é indispensavel que se faça reviver esse commercio para proteger a lavoura do Douro. Não se deve perder de vista que eu sempre parto, e tenho partido do principio de que este commercio e esta lavoura são de uma importancia tão grande que nós não os devemos deixar perder, e que não lhes é applicavel o exemplo de outras industrias, que não eram de uma natureza especial, que se tem deixado perder, e mesmo acabado de todo. Citando-se o do commercio do sal, deu-se um exemplo que é contraproducente, por que este commercio esteve com effeito muito abatido, mas tornou a animar-se. Este exemplo que se applicou á Companhia prova, pelo contrario, que não se deve permittir que esta pereça. Eu considero que por meio do auxilio que se dá á Companhia poderá esta animar ainda o commercio do Douro, por que ella não é composta pelo modo que o Digno Par suppôem, ou quiz imaginar.

O SR. GIRALDES: - Direi duas palavras a respeito da substituição do Sr. Conde de Lavradio. Ella tem sido combatida por alguns Dignos Pares só com o fundamento de que é contra o Projecto, que foi

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já approvado pela Camara em sua generalidade. Segundo estou convencido, não só é contra o Projecto, mas contra o Parecer da Commissão, por que o que se venceu aqui, e foi a vontade da Camara, é que não só se favorecessem os lavradores do Douro, mas que fôsse por uma determinada maneira que se fizesse aquella dotação do 150 contos de réis, isto é, que se désse á Companhia com o destino de beneficiar os lavradores do Douro: por tanto venceu-se, não só que se fizesse o beneficio, mas tambem o modo como devia ser feito. (Apoiados.) Porêm isto, Sr. Presidente, não é o verdadeiro argumento para o objecto da discussão; é sobre a bondade, ou não bondade da substituição do Sr. Conde de Lavradio que esta deve versar, e se ella vem ou não a beneficiar directamente o lavrador. Ninguem negará que é um beneficio, e um beneficio muito grande, que os vae habilitar prompta e directamente com fundos necessarios para empatarem as suas novidades, e depois as venderem por mais razoaveis preços: por tanto a substituição do Digno Par tem sido unicamente combatida como materia já vencida, e contraria ao Parecer da Commissão, e não por ser, ou deixar de ser um beneficio para o lavrador. Entretanto, unicamente pela circumstancia de ser contra o que já se venceu, direi que nos não fica mal, quando houver razões a favor, e que appareça um meio mais util para beneficiar os lavradores do Douro, deixar de tomar uma outra resolução; seria mesmo um prejuizo que lhe causariamos por um mal intendido amor-proprio: digo por tanto que o que ficaria indecente á Camara era se fizesse esta mudança por peditorios, por manejos secretos, ou por motivos menos honestos; mas quando se tem motivos fortes e razões ponderosas, não póde ficar mal a ninguem mudar de opinião; os meios por que as couzas se fazem e que cohonestam o fim.

Não havendo outro Orador inscripto, o Sr. Vice-Presidente poz á votação a substituição do Sr. Conde de Lavradio, que ficou rejeitada por 21 votos contra 7.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - Entra agora em discussão o Artigo 8.º do Projecto conjunctamente com os seus paragraphos: um e outros fôram já lidos á Camara, estão impressos e nas mãos dos Dignos Pares, julgo por isso desnecessario repetir a sua leitura. (Apoiados.)

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE. S. ROMÃO: - Devo observar que na parte final do Artigo existe uma lacuna. Os signaes do vinho de feitoria fôram sempre de uma moeda em pipa, mas houve tempo em que a Companhia tomou o arbitrio de os reduzir a meia moeda, e outro tempo mesmo em que ella não dava nada: por tanto se nesta Lei se disser sómente na fórma do custume, passando o Artigo como está, poderá isto dar logar a duvidas das quaes resulte não receberem os lavradores couza alguma de signal, o que necessariamente lhes causaria transtorno, por que sempre d'ahi tiram um grande remedio pnra a sua cultura, pela epocha em que este dinheiro lhes é fornecido. Por este motivo mando para a Mesa a seguinte

Emenda.

Proponho que no Artigo 8.° se intercalem as palavras seguintes na ultima linhar" = de 4$300 réis em pipa e.... = o que deve ter logar entre as palavras serão e pagos - Visconde de Villarinho de S. Romão.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Sr. Presidente, eu não darei muito trabalho ao meu nobre adversario em responder ás observações que vou fazer sobre este Artigo 8.°, só quero tirar um escrupulo, por que assirn me parece necessario. Diz o Artigo que

- a Companhia fica obrigada á comprar até vinte mil pipas de vinho de segunda e terceira qualidade

- mas não declara quantas pipas ella deverá comprar de segunda qualidade, e quantas de terceira; parecia-me que era do interessa dos lavradores que esta declaração se fizesse na Lei. Eu constitui-me mais procurador delles do que da Companhia; e por tanto intendo que devemos tornar a redacção do Projecto o mais clara possivel, afim de que esees individuos a quem queremos favorecer não fiquem lezados por falta das declarações necessarias. Chamo sobre isto a attenção da Camara.

O SR. VISCONDE DE VlLLARINHO DE S. ROMÃO: - O sentido do Artigo é que a Companhia tenha obrigação de comprar aos lavradores do Douro a terça parte da novidade, pouco mais ou menos. Ha lavrador que tem menos vinho da terceira qualidade e mais da segunda (que é melhor); e então, daquelle que tiver, fica obrigada a Companhia a comprar a quantidade que lhe tocar sobre o total das vinte mil pipas. Por mais bem que se redija uma Lei sempre póde dar logar a abusos, por que não ha couza nenhuma que não seja susceptivel de abusar-se della, mas a intelligencia que se deu ao Artigo é a que acabo de explicar.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Essa e a intelligencia que lhe dá o Digno Par; mas, se não estiver clara na Lei, a Companhia ha de comprar como fizer mais conta, não aos lavradores, mas a ella Companhia, e quando lhe fizer mais conta comprar da segunda qualidade do que da terceira, observará o que determina a Lei comprando um barril, ou uma canada da que menos lhe convenha, mas isto póde ser de grave prejuizo ao lavrador: por tanto desejava que esta determinação fôsse positiva, para não ficar ao puro arbitrio da Companhia, umas vezes por amor outras por odio, fazer a este respeito sómente o que quizer, e não o que fôr justo.

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMÃO: - O Artigo 19.° diz isto: (leu ) Parece-me que ficam salvas todas essas duvidas, se se combinar esta disposição especial com a attribuição geral, que compete ao Governo, de fazer os Regulamentos para a execução das Leis; e não só fica salvo esse que o Digno Par receia, mas muitos inconvenientes que poderão apparecer, no caso de que a Companhia com effeito quizesse abusar.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Parece-me que o antidoto está mais perto do que acaba de dizer o Digno Par. Segundo o paragrapho 4.º deste mesmo Artigo, tem a Companhia obrigação de comprar todo o vinho de segunda e terceira qualidade, que se lhe offerccer, até vinte mil pipas, mas se lhe offerecerem mais ha de ratear o excedente por todos os lavradores. Diz o paragrapho: (leu.) Por consequencia já está neste mesmo Artigo a providencia que o Sr. Conde de Lavradio exigia, Em quanto á emenda do Sr. Visconde de Villarinho, talvez o Digno Par não insista nella, por que realmente não vale a pena de fazer voltar este Projecto

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200 DlARIO DA CAMARA

a outra CamarA: estes signaes são por custume de uma moeda, mas se a marcha do commercio os vier a estabelecer de menos alguma couza, e objecto em que me parece que não será muito propria a ingerencia do Corpo Legislativo nem do Governo. Por tanto, quando mesmo fôsse muito justa a idéa, talvez que não valesse a demora, que havia de resultar se o Projecto ainda tivesse de voltar á outra Casa.

O SR VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMÃO: - Supposto que algum transtorno poderá vir aos lavradores se não receberem estes signaes, eu cederei da emenda, mas na hypothese de que se não approve qualquer alteração que faça voltar o Projecto á outra Camara, por quanto, se elle houver de tornar lá novamente, então insisto no que propuz. Em todo o caso, convenho que a minha emenda se reserve para o fim da discussão deste negocio.

Não havendo quem pedisse a palavra, foi o Artigo 8.º posto á votação e ficou approvado com os seus respectivos §§

A emenda do Sr. Visconde de Villarinho de S. Romão reservou-se para o fim desta discussão, na fórma declarada pelo seu author.

Leu-se depois o

Art. 9.° A Companhia fica obrigada a fazer o commercio de vinhos de exportação e de consumo, sem que entre ella, e os conmerciantes, haja a mais pequena distincção e privilegio.

O SR. CONDE DE LINHARES: Apoio a doutrina do Artigo 9.º deste Projecto (Leu-o.) Este é o Artigo que eu desejaria fôra o principal, e por tanto redigido de uma maneira mais explicita, para vir a promover de um modo efficaz as exportações dos vinhos do Douro objecto principal deste Projecto. No meu intender, nada o faria melhor do que uma Companhia exportadora e commercial estabelecida com fundos sufficientes a estender o nosso commercio de vinhos nos mercados estrangeiros, aonde elles podessem ser vendidos a um preço que convidasse o consumidor a lhes dar a preferencia. - Entre as causas, Sr. Presidente, que alleguei como tendo poderosamente contribuido para diminuir as exportações dos vinhos do Porto, notei a da falsificação, a que desgraçadamente os nossos vinhos em geral se prestam, e mui particularmente os do Porto. Esta falsificação opéra-se principalmente em Inglaterra e no proprio mercado de Londres. - É singular que, por um acaso, a propria gazela Ingleza (que me acaba de ser entregue ao entrar para a Camara) me forneça uma prova inquestionavel desta verdade, por um caso julgado em um dos tribunaes de policia correccional de Londres, e narrado na Britannia, de 25 de Março deste anno, n.°206, no qual foi perseguido um certo Tennant, por ter alterado, ou estragado (embézled) quatro duzias de garrafas de vinho do Porto; e o letrado defensor exigiu o juramento da parte queixosa, de ser vinho do Porto genuino o que existia nas garrafas com o letreiro de Vinho do Porto, o qual a parte queixosa não póde dar, vindo a confessar que nellas não existia uma gota se quer do tal vinho, do Porto, sendo este vinho de Marselha com decocção de páu de campeche e uma pitada de pedra hume. Arguido desta falsificação, respondeu que era uma couza currente, e geralmente admittida pelo commercio de retalho em Inglaterra, que os vinhos do Cabo, ou de outras quaesquer qualidades, preparados devidamente, eram vendidos por vinhos do Porto. - Donde concluo que se os vinhos genuino-do Porto fôssem postos em concurrencia no mercado Inglez com estas falsificações, e a preços moderados, sempre embaraçariam taes falsificações, pela preferencia que mereceriam, sendo por genuinos muito melhores, e que então augmentaria o consumo do nosso vinho. Ora a Companhia de exportação poderia melhor do que ninguem fazer esta concurrencia nos mercados estrangeiros, e desta sorte vir a ser uma causa de prosperidade para o Douro. (O Sr. Conde de Villa Real: - Apoiado.)

Sendo por tanto necessario que, para este fim, a Companhia tenha capitães numerosos e sufficientes, e sendo muitos os interessados no augmento dos mercados em que se consome o artigo genuino, não vejo mal em obrigar a Companhia a emittir com este fim novas acções, para adquirir maior fundo, e por tanto quizera que a Commissão désse a redacção deste Artigo maior força, obrigando a Companhia a considerar como objecto principal da sua instituição a exportação dos nossos vinhos aos mercados estrangeiros, sendo esta condição sine qua non do seu restabelecimento. - Nas idéas emittidas pelo Ministerio a respeio deste Projecto, nada vejo que contrarie a minha proposição; e então que mal viria de se consignar idéa tão util ao Paiz no mesmo corpo da Lei?

Como se não offerecesse outra observação, foi o Artigo 9.° entregue, á votação, e approuou-se.

(O Sr. Presidente, occupou a sua Cadeira.)

Passou-se ao seguinte

Art. l().° Fica obrigada a Companhia a mandar padrões e balisas do vinho genuino e puro do Douro aos principaes mercados da Europa, e de qualquer outra Região, e especialmente ás Possessões Inglezas na India, d'Austria, e da America septemtrional.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Desejaria saber que pena se impôem á Companhia se ella não cumprir o que vae disposto neste Artigo? Como não vejo aqui sancção para o caso de omissão da parte da Companhia, desejava uma explicação a este respeito.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Eu desejaria entrar nesta discussão o menos que me fôsse possivel, mas, visto que nenhum dos Dignos Pares pediu a palavra, direi que como este ainda aqui ha outros Artigos que repousam unicamente n'uma certa obrigação moral que se impôem á Companhia, e na vigilancia que o Governo deve ter sobre tudo isto. A Companhia (por exemplo) -tem obrigação de fazer o juizo do anno, e se não cumprir este preceito da Lei mostra pelo seu proprio facto que renuncia ao beneficio della. N'uma palavra, a Companhia está sempre subjeita á vigilancia do Governo, e por tanto não póde haver o receio de que seja omista.

Approvou-se logo o Artigo 10.°

Leu-se o

Art. ll.° É tambem obrigada a Companhia a estabelecer no Rio de Janeiro depositos de vinhos, que fara vender por grosso e a retalho.

§ Unico. Iguaes depositos é obrigada a estabelecer em outras quaesquer Praças estrangeiras, logo que lhe fôr ordenado pelo Governo em consequencia de reclamações da Consules Portuguezes, fundadas em representações, e pedidos dos negociantes das mesmas Praças.

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DOS PARES. 201

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Pela instituição da antiga Companhia, era ella obrigada a ter no Rio de Janeiro um deposito de dez mil pipas de vinho: ora aqui não se marca a quantidade dos depositos de que falla o Artigo, e parece-me isto uma lacuna quc se deveria preencher, aliás póde a Companhia illudir esta obrigação tendo lá um barril de vinho do Porto.

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMÂO: - A antiga Lei impunha essa obrigação a Companhia, por que ella então era exclusiva na venda do vinho no Brazil, e por isso assim como lhe dava o favor tambem a onerava com o encargo: todas essas couzas me parecem hoje de mais, nem sei se poderiam satisfazer-se. Entretanto a obrigação destes depositos fica ao zelo da Companhia e a vigilancia do Governo, e creio que não é possivel dizer mais nada a esse respeito no Artigo, attendendo a circumstancia das relações em que o Brazil se acha actualmente comnosco; o proprio interese da Companhia é a garantia do cumprimento desta obrigação.

Não estando já ninguem inscrpto, foi o Artigo 11.º proposto e approvado com o § Unico.
Foi então lido o

Art. 12.º Em compensação destes encargos são concedidos á Companhia cento e cincoenta contos de réis annuaes deduzidos dos direitos de consumo e de exportação que os vinhos do Douro pagam na Alfandega do Porto.

§ 1.° O Thesoureiro da Alfandega do Porto fica obrigado, com responsabilidade sobre os seus bens e fianças, a entregar á Companhia, no primeiro dia de cada mez, metade da importancia dos direitos pagos no mez antecedente pelos vinhos exportados para os portos da Europa; e 1$200 réis por cada pipa de vinho que se tiver despachado para consumo do Porto e de Villa Nova de Gaia.

§ 2.º A Companhia poderá estabelecer um Empregado junto da Alfandega do Porto devidamente affiançado, afim de effeituar a cobrança destes direitos no acto em que fôrem pagos pelas partes, devendo assignar os respectivos documentos com o Thesoureiro da Alfandega.

§ 3.° No caso que o producto dos direitos consignados á Companhia não importe os 150 contos de réis, o Thesoureiro da Alfandega do Porto, independente de ordem do Governo, completará sob sua responsabilidade á Companhia esta sómma pelo producto de outros quaesquer direitos.

§ 4.º Tanto a Companhia, como o Thesoureiro da Alfandega, são obrigados a dar conta todos os mezes ao Governo, da importancia dos direitos recebidos no mez antecedente.

§ 5.° A Companhia começará à perceber os direitos que lhe são consignados, no 1.° de Julho de 1843.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Eu vou mandar uma emenda para a Mesa, mas antes disso desejaria saber outra couza. O Artigo 3.° da Lei de 7 de Abril de 1838 diz o seguinte: - Para satisfazer ás despezas que a Companhia é obrigada a fazer com o arrolamento, provas, guias, ou marcas, perceberá 400 réis por cada pipa de vinho que tiver recebido guia &c. - Desejaria saber se os 400 réis, concedidos por este Artigo á Companhia, ainda continuarão a ser percebidos por ella, ou se ficam incluidos nos 150 contos que por esta nova Lei lhe vão ser dados annualmente!... Peço que alguem me responda... (Pausa,) Seja como fôr, vou-me apressando a mandar para a Mesa esta

Emenda.

Proponho que ás palavras - cento e cincoenta contos de réis annuaes - se accrescente - durante cinco annos. - Camara dos Pares 3 de Abril de 1843.
- Conde de Lavradio.

Sendo esta emenda admittida á discussão, proseguiu.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - É escusado sustentar longamente a emenda que acaba de se admittir, por que não seria mais do que repetir o que já está: dito, e muitas vezes. O imposto é grande, e muito forte se durar por quatorze annos, muito forte sobre tudo para uma Nação que se acha nas circumstancias em que nós estâmos: por tanto pareée-me que à diminuição delle a um prazo menor viria a ser no interesse geral do Paiz; se dentro em cinco annos conhecermos que esse imposto é proveitoso, se virmos que o Douro prospéra muitissimo, então lhe votaremos outros cinco annos, depois ainda outros cinco, e assim por um modo successivo, de maneira que talvez aquelle paiz possa vir a ficar com este apanagio perpetuamente.

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMAO: - Os Dignos Parés que advogaram a reducção dos direitos de sahida; sustentando esta opinião, diziam que d'ahi haviam de vir grandes resultados em consequencia do augmento da exportação dos vinhos do Douro: ora o mesmo digo eu tambem, á respeito das diversas disposições deste Projecto (uma vez que a Camara adoptou a sua base), por que não só se dá auxilio aos lavradores daquella Provincia, mas sustenta-se, o corpo fiscal do genero, e o restante, deste dinheiro (como determina o Artigo~20.°) ha de ser empregado nas communicações do paiz. Agora peço licença para notar que esta Camara já approvou o paragrapho 2.°,do Artigo 8.°, o qual declara a duração das obrigações impostas á Companhia; votado pois o encargo, a consequencia necessaria é que se vote igualmente o favor para elle podêr ser preenchido.

O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA: - Eu creio que não póde haver razão para combater essa emenda, que tende a procurar um meio de saber se este sacrificio que a Nação vae fazer, sacrificio de certo muito grande, será, ou não proficuo. A diminuição dos direitos de sahida, ainda quando fôsse approvada sem limite, podia revogar-se a todo o tempo, se as circumstancias assim o exigissem; mas o donativo é feito á Companhia em compensação de varios encargos (como acaba de dizer o Digno Par), e por tanto, havendo uma especie de contracto, será muito mais difficil acabar com esse donativo, se as circumstancias futuras do Douro assim o aconselhassem. Acho pois que faremos um grande melhoramento na Lei quando esta concessão seja pelo menos tempo possivel: mostrâmos o nosso desejo em acudir á situação do Douro, e ao mesmo tempo usâmos de um meio pelo qual viremos a reconhecer se este sacrificio é, ou não util áquella lavoura. Intendo pois não haver razão para que a emenda se combata, e pela minha parte declaro que a apoio, por isso que tende a restringir a concessão, para que o Corpo Legislativo tenha tempo de ver se o periodo dado á Com-

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202 ARIO DA CAMARA

panhia para compra do vinho é bastante, e depois conhecerá se lhe deve dar o mesmo, ou se convirá acabar com este sacrificio. Isto responde ao Sr. Visconde de Villarinho quanto a habilitar a Companhia para cumprir as obrigações que lhe são imposta. Sr. Pvesidente, eu vejo na outra Casa uma sequencia de Projectos para augmentar os tributos que pezam sobre a Nação, e já nesta Camara se acha a Proposta de Lei para as estradas, as quaes só se poderão fazer com grandes sacrificios, convêm por tanto que haja o maior cuidado em tudo aquillo de que possa resultar um qualquer deficit no Orçamento.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Eu concordo em que é um sacrificio, nem póde deixar de se intender assim, por que se tracta de uma quantia certa que ha de sahir todos os annos de um cofre do qual viria este dinheiro para o Thesouro; mas se nós considerarmos bem o negocio, e em dous aspectos differentes, acharemos que esse sacrifico se desvanece, ou toma realmente uma figura diversa. Estes 150 contos de réis são tirados dos direitos daquelles vinhos: se conservarmos esta agricultura teremos o direito aliás perdêmolo em segundo logar, se isto fôsse um tributo para se gastar improductivamente eu teria muito sentimento de que se impozesse e votaria contra a despeza; mas isto é um tributo productivo, tributo (se assim se lhe póde chamar) cujo fim é augmentar valores; e então a Camara na sua sabedoria póde imaginar as vantagens que d'aqui vem por todos os lados, do commmercio e lavoura, para o Thesouro Publico: e forçoso que isto se tome em consideração, por que, repito, não se tracta de gastar uma quantia improductivamente ao contrario, o fim do Projecto é dar valor a um genero que se deprecia, é crear novos valores.

Mas que ha de fazer a companhia em cinco annos= Ha de lançar as redes: ha de tentar as suas especulações, ha de explorar os mercados, ha de estabelecer depositos, n'uma palavra, ha de ir fazendo tudo o que aqui se diz nos diversos Artigos do Projecto, e o que a sua experiencia lhe fôr aconselhando, por que este commercio de vinhos não é como outro qualquer; o trigo, por exemplo, colhe-se, vende-se, e consome-se no mesmo anno, mas não acontece assim ao vinho; por tanto talvez que só no primeiro anno depois dos cinco é que poderia colhêr algum fructo e faria muito. Eu declaro que ainda tenho duvido em que, mesmo pelos quatorze annos, a Companhia se queira encarregar dos onus que lhe são impostos no Projecto, mas se lhe derem apenas cinco annos ou sete annos, desde já digo que não quererá, por que não terá tempo para nada. - Ora, a respeito de depositos, posso eu dizer á Camara que já tenho varias reclamações de alguns Consules, nas quaes pedem que se estabeleçam depositos da Companhia, e virão chegando de outras partes, suppondo eu; mas para tudo isto é preciso tempo, esta consideração do tempo junta-se com a natureza do genero de que se tracta, que depende de certa velhice, de certo preparo que não seja accelerado artificialmente, antes que possa ser levado ao mercado. De mais o Sr. Visconde de Villarinho já observou que se davam tambem onus á Companhia por quatorze annos, e se se lhe dissesse que o privilegio era sómente por cinco annos, responderia ella - pois o onus seja igualmente por cinco annos. - Repito, Sr. Presidente, que, mesmo pelos quatorze annos, eu estou em duvida que haja alguma companhia que queira tomar sobre si estes encargos.

O SR. CONDE DE LUVRADIO: - Eu não terei duvida em fazer alguma correcção na minha emenda mas desejaria saber quanto temppo seria preciso para se podêr conhecer o resultado deste favor que se vae fazer ao commercio e agricultura do Douro. O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros acaba de manifestar que não se podia admittir o prazo de cinco annos, por que o vinho carece de tempo para envelhecer; mas hoje um dos males do Douro é a abudancia, procede de estarem os armazens cheios de vinho se irão successivamente apromptando para entrarem no mercado. Ora, votando nós o subsidio por cinco annos, já isto me parece uma grande concessão, e que vêmos mesmo álem do que deveriamos fazer, por que não sei se nós podêmos votalo por mais de um anno, mas em fim, não entro agora nessa questão, e, se tanto fôr preciso, pedirei depois um bill de indemnidade por ter prestado o meu voto álem das raias da minha authoridade; em todo o caso parece-me que passados tres annos já se poderá conhecer a utilidade que se tem tirado deste auxilio, e o Ministerio, que ha de estar em contacto continuo com a lavoura do Douro e com a Companhia, póde informar as Camaras no princio de cada Sessão sobre o beneficio que elle tem produzido, por quanto poderá talvez ser ainda necessario dar um auxilio áquella cultura, e pela minha parte, uma vez que me provem é evidencia que este dos 150 contos produziu algum fructo, e que se delle não resultou toda a prosperidade que se esperava foi em consequencia da sua modicidade, eu não terei duvida de votar para que o subsidio se eleve a 300 ou 400 contos, uma vez que haja dous de os tirar, ou quem os queira dar, por que realmente não sei aonde os hão de ir buscar. Entretanto digo que 150 contos de réis me parece já um grande auxilio ao Douro, e não estou resolvido a votalo por mais de cinco annos; é tempo sufficiente para se fazer alguma couza.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANEGRISO: - Eu faço esta distincção para que- o Douro conheça desde logo. a vantagem, não ha duvida nenhuma por que basta que a Companhia principie a comprar uma porção de vinhos, a 12 e 13$00000 mil réis a pipa para que o lavrador comece a sentir os beneficios desta Lei; agora os resultados que estão para mais longe, são os da Companhia; essa é que toma o onus desde o primeiro momento, e fica esperando pelas conveniencias futuras, que hão de vir mais ou menos brevemente segundo as circumstancias e as occurrencias. Por tanto, olhado isto assim, á primeira vista, parece um dinheiro immenso a quantia a que montam 150 contos de réis, multiplicados por quatorze annos, dous mil e cem; contos; mas deve observar-se que dos direitos desse mesmo vinho é que se applica o necessario para o beneficio do Douro por que se tracta de rehabilitar uma corporação que já fez serviços a este Paiz e ao commercio, e que hoje não póde existir sem este auxilio. Mas note-se que o Governo de certo não ha de deixar ir um só real á Companhia sem saber que ella o applica em beneficio, da lavoura do Douro. Esta Companhia não é banca-roteira, como aqui se disse, e se está hoje em decadencia; todos sabem as

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CIRCUMSTANCIAS QUE A LEVARAM A ESE ESTADO. Poderia ella acaso prever que um exercito inimigo lhe lançasse fogo a quinze mil pipas de vinho, do melhor que possuia, para evitar uma tal perda? Se ella não tivesse tido esse enorme prejuizo, poderia prestar estes mesmos serviços sem auxilio nenhum: mas depois disso, se queremos que ella faça o beneficio que póde á lavoura, é necessario tambem dar lhe algum soccorro. Por tanto, vendo-se que a Companhia ha de empregar todo esse soccorro em favor do Douro, não é exacto o dizer-se que d'ahi virá um accrescimo de despeza; é um dinheiro semeado para produzir outro dinheiro. A differença, repito, vem a ser que o beneficio para a lavoura é desde hoje, em quanto que o resultado para a Companhia é mais remoto. Ora, se lhe derem unicamente os cinco annos, torno a dizer que ela não acceita, e mesmo eplos quatorze duvido ainda, por que para se custearem vinte mil pipas de vinho são precisos 300 contos de réis, razão pela qual se não quererá encarregar deste onus. Então o Governo, não mostrando á Companhia possibilidade de interesse, posto que mais remoto, terá de organisar uma outra companhia de capitalistas para se encarrregar deste objecto; se a duração do subsidio fôr por quatorze annos, poderá haver possibilidade de se achar quem queira, mas por cinco ninguem, por isso que seria justamente no momento emq ue começasse a tirar algum interesse que ela devia acabar.

O SR, VISCONDE DE FONTE ARCADA. - A Lei de 7 de Abril de 1838 estabeleceu uma Companhia, e essa prestação que nós votámos é para beneficiar esta mesma Companhia, mas S. Ex.ª parece-me que disse, que ella podia não se querer encarregar deste onus, e por tanto o Governo procuraria formar outra...

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Se o Digno Par permitte, eu explico. - O paragrapho Unico do Artigo 18.º deste Projecto diz que - Se passado o prazo de tres mezes a Companhia não tiver satisfeito ao disposto neste Artigo, fica o Governo encarregado de organisar uma associação de capitalistas que queiram encarregar-se das obrigações declaradas nos Artigos 3.º, 10.º, e 11.º, ficando a cargo da Companhia as provas, arrolementos e guias na conformidade da Carta de Lei de 7 de Abril de 1838. - Por tanto, se a Companhia se não tiver habilitado com os fundos necessarios para dar execução á presente Lei, o Governo, só lhe continuará esta inspecção de provas, arrolamentos, e guias, conforme a Lei de 7 de Abril de 1838, e nada mais, procurando formar uma companhoa que tome sobre si o onus de comprar vinte mil pipas de vinho, e na fórma desta Lei tractará de effectuar esse negocio: por tanto digo que, se a Companhia actual não acceitar os onus da Lei em discussão, ou se não quizer encarregar da sua execução, o Governo ha de tomar as convenientes medidas para organisar uma companhia de capitalistas, e terá possibilidade de a encontrar quando o subsidio seja por quatorze annos; mas por cinco tenho uma certeza positiva, mathematica, para podªer asseverar a esta Camara, pelo conheicmento que tenho das Provincias do Norte, que ninguem tal quererá acceitar.

O SR. VISCONDE DE FONTE ARMACADA. - Bem. Eu queria dizer que o que estâmos fazendo depende de uma hypothese, que se não sabe se se dará, por que não sabemos se a Companhia a quem se pretende beneficiar acceitará o beneficio, ou então se o Governo terá de procurar outra. - Ora eu desejava que o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros respondesse á pergunta do Sr. Conde de Lavradio sobre se o Artigo 3.º da Lei de 7 de Abril de 1838 fica subsistindo álem do subsidio dos 150 contos de réis, pois que, a subsistir, a Companhia accumulará a este subsidio mais 400 réis que se lhe devem pagar por cada pipa de vinho que tiver recebido guia.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - -Ficando a Companhia com os 150 contos, está claro que não recebe o cruzado; ao menos foi este o pensamento com que o Projecto se votou na outra Camara.

O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA: - Não recebe o cruzado?

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Não Senhor.

O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA: - Pois então é necessario explicar bem isso mesmo nesta Lei.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Não sei até como isso não apparece aqui em algum Artigo do Projecto; mas posso affiançar que quando, se tractou deste objecto, houve sempre a idéa de annullar a disposição da outra Lei a respeito do cuzado. Chaçno a attenção do S. Conde de Semodães, e dos outros Dignos Pares que tem entrado neste negocio: parece-me que SS. Ex.ªs de certo não deixarão, de estar pela minha opinião, isto é, que dando-se este auxilio dos 150 contos cessava o outro.

O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA. - Então será necessario declarar nesta Lei - que o cruzado que a Companhia recebia pelos arrolamentos &c. não se pagará mais; e por isso mando para a Mesa o seguinte

Additamento

Fica,derogado o Artigo 3.° da Lei de 7 de Abril de 1838. - Visconde de Fonte Arcada.

Foi admittido á discussão. (Pausa.)

O SR. PRESIDENTE: - Não ha mais nimguem inscripto, e por tanto vou pôr á yotação os diversos objectos sobre que tem versado esta discussão.

O SR. CONDE DE LAVRADIO; - (Sobre a ordem.) Eu não custumo nunca pedir votação nominal, mas requeiro-a agora (pela primeira vez) sobre a minha emenda por que a julgo essencial. ( Apoiados.)

O SR. MARQUEZ DE PONTE DE LIMA: - Eu apoio.

O SR. MARQUEZ DE FRONTEIRA: - Eu tambem.

O SR. CONDE DA CUNHA: - E eu igualmente. Consultada a Camara, decidiu o requerimento pela affirmativa.

"E proposta logo a emenda do Sr. Conde de Lavradio, disseram = approvo = os Dignos Pares

Conde do Bomfim,

de Layradio,

de Paraty,

Visconde de Fonte Arcada,

Osorio,

Gambôa e Liz,

Tavares de Almeida,

Silva Carvalho,

Trigueiros,

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Conde de Lumiares,

Polycarpo Machado,

Duque de Palmella,

e disseram = rejeito = os Dignos Pares

Marquem de Fronteira,

de Ponte de Lima,

Conde da Cunha,

de Linhares,

da Ponte de Santa Maria,

de Rio Maior,

de Semodães,

de Villa Real,

Visconde de Laborim,

de Oliveira,

da Serra do Pilar,

de Sobral,

de Villarinho de S. Romão,

Barão de Ferreira,

de Villa Pouca,

Miranda,

Ribafria,

Serpa Saraiva,

Pessanha,

Serpa Machado.

Ficou por tanto rejeitada a emenda por 20 votos contra 13.

Acto continuo foi approvado o Artigo 12.° com todos os seus §§.

O SR. PRESIDENTE: - Segue-se a votação do additamento do Sr. Visconde de Fonte Arcada: entretanto se algum dos Dignos Pares quizer fazer qualquer observação, está ainda a tempo.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Pedi a palavra para dar uma explicação, e vem a ser, que este additamento sobre a derogação do Artigo 3.° da Lei de 7 de Abril de 1838 está aqui reproduzido pelas obrigações que se impôem á Companhia, como provas, manifestos e varejos, que todas passaram para esta Lei; por tanto quando no Artigo 12.º se diz Em compensação destes encargos são concedidos á Companhia 150 contos, fica excluida qualquer outra condição. O Digno Par que acabou de propor a emenda verá que este Artigo principia logo assim: (leu.) Depois passa ao methodo de se fazerem estas provas: (leu) o que é uma sequencia das obrigações impostas á Companhia, novas é velhas, da Lei de 7 de Abril de 1838; e diz mais: (leu.) Por tanto logicamente não se póde intender que ella haja de receber outra qualquer quantia, por isso que os encargos estão aqui todos designados, e parece-me que o Digno Par concordara em que não é necessario estabelecer-se mais nada por escripto.

O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA: - Parece-me que o additamento pelo menos aclara a Lei, e por consequencia, longe de nocivo, será util. O Artigo diz tudo quanto notou S. Ex.ª, mas não falla a respeito da outra disposição da Lei de 7 de Abril; logo póde concluir-se que não ficou revogada. Creio que o additamento tira qualquer duvida a este respeito, e por isso insisto nelle.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Aqui não ha duvida sobre a materia, por que mesmo o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros considera o imposto dos 400 réis revogado em consequencia do que se acha determinado neste Projecto, se fôr approvado; entretanto o que se apresenta é um Artigo de clareza, que eu reputo absolutamente necessario. É verdade que toda esta Lei é um monstro, na substancia e ha fórma, por que ainda não vi nada mais mal redigido nem mais confuso; não ha Artigo nenhum neste Projecto que, para se intender, não seja necessario lêlo duas ou mais vezes; todo elle está cheio de defeito, e até de erros grammaticaes, e tanto que, quando entra qualquer dos Artigos em discussão, vejo-me obrigado a lêlo ainda mais de uma vez afim de o podêr intender. A proposito disto observarei quanto é necessario que se crie nesta Camara a Commissão de redacção(que já lembrei) para dar a devida fórma aos Projectos de Lei que d'aqui houverem de sahir.

Proposto logo o additamento do Sr. Visconde de Fonte Arcada ficou rejeitado.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Sr. Presidente, mando para a Mesa a seguinte

Proposta

Proponho o addiamento: deste Projecto de Lei para depois da conclusão da Convenção com Inglaterra. - Camara dos Pares, em 3 de Abril de 1843. - Conde de Lavradio.

O SR. PRESIDENTE: - É preciso que o Digno Par declare se esta Proposta significa que a discussão fique addiada agora, ou que se suspenda o destino que deve ter o Projecto no caso de se approvarem todos os seus Artigos.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Depois de approvados todos já não está no arbitrio da Camara o demoralo, mas deve elevar o Projecto á Sancção Real: por conseguinte a minha Proposta é no sentido da primeira dessas alternativas.

Foi admittida á discussão.

O SR. CONDE DE VILLA REAL: - Sr. Presidente, pouco tempo tomarei á Camara. Admitti está Proposta á discussão sómente para se podêr discutir, e eu dizer sobre ella algumas palavras. Em primeiro logar, hão me parece muito decoroso que se faça a approvação desta Lei dependente de negociações; em segundo logar, direi (e perdôe-me o Digno Par meu amigo) que a Proposta foi apresentada (como junto a mim ouvi dizer) como a extrema-uncção que se quer dar a esta Lei.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Bem longe estou de querer dar a extrema-uncção a esta Lei; antes, pelo contrario, o meu desejo é dar-lhe vida. Em quanto a dizer-se que não é decoroso fazer a approvação desta Lei dependente de negociações, respondo que não sei que seja falta de decoro o addiar um Projecto por algum tempo quando assim pareça conveniente por qualquer circumstancia. Ora, tanto pelo que disse o Governo como o illustre Negociador, que nos preside, sabe-se que essas negociações estão muito adeantadas, que devem terminar promptamente, portanto a demora será momentânea, e o resultado ha de ser muito proficuo a este mal que queremos remediar: então esperemos; são mais tres, quatro, ou cinco dias que o Douro tem de soffrimento, e não ha de ser certamente por tão pequena demora que lhe ha de vir grande mal. O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros já disse nesta Camara que nos havia de communicar, não só o Tractado ou Convenção, mas todos os documentos relativos a essa negociação: reservêmos para então o concluir a discussão do Projecto, por que o faremos

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DOS PARES. 205

com mais conhecimento de causa, e veremos se será conveniente reformar algumas das resoluções já tomadas.

O SR. VISCONDE DE VILLARINHO DE S. ROMÃO: - Neste negocio ha uma couza certa, e outra duvidosa; o que é certo é o estado em que se acha o Douro, a sua imminente ruina, o deposito enorme de vinho que ha ho Porto, e a expectação em que todos se acham deste Projecto: a duvida porêm é a esperança que devemos ter em consequencia da conclusão do Tractado; mas não sabemos se elle se concluirá ou não, e se, em logar de bom, será máu para o Douro. Esta negociação dura vae por dous annos, e não temos fundamentos para dizer que ella não durará ainda outros dous. Sr. Presidente, muito ne admira que, depois de vencidos já os mais importantes Artigos do Projecto, appareça agora ainda este embaraço! Realmente não posso comprehender que vantagem se possa tirar desta demora. E como é que o Digno Par póde saber que a Convenção se concluirá d'aqui a quatro ou cinco dias? S. Ex.ª terá essa esperança, mas eu não a tenho. A Convenção póde demorar-se ainda muito, e entretanto quem ha de occurrer á ruina do, Douro? O addiamento proposto não tem logar, por que se funda n'uma esperança, ou n'uma conjectura que é bem possivel falhar.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Demora não é de presumir que a haja, em consequencia das declarações feitas tanto pelo Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros como por V. Ex.ª mesmo, Sr. Presidente. Disse-se aqui, e em outro logar, que a conclusão das negociações não podia já ter demora: - não se disse como haviam de ser concluidas (nem nós o perguntámos), mas ficámos na certeza de que, ou de um ou de outro modo, as negociações estavam a terminar de momento para momento, ou com muita brevidade. Por conseguinte não devemos temer que haja grande demora; e se assim não fôsse, e o Governo manifestasse qualquer circumstancia contra a minha opinião, eu seria o primeiro a desistir da Proposta, do addiamento: mas, segundo considero, a demora não póde ir áletn de quinze dias, e talvez que nem chegue a oito...

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - O Digno Par ha de perdoar, mas resuscitou uma questão que já aqui foi ventilada quando se tractava de admittir os 150 contos, ou a especie, nova da diminuição dos direitos por essa mesma consideração; porêm a Camara resolveu então que não se addiasse o Projecto: agora vem outra vez essa questão. Eu temo della, ainda que venha com visos de conveniencia; e cada vez, declaro, vou aprendendo mais, vendo que somos nós mesmos que vâmos pôr nas mãos dos estrangeiros as armas com que nos hão de atacar. (O Sr. Conde de Lavradio: - Protesto contra isso.) Eu tambem, mas este é o resultado; e o Digno Presidente, que é o Plenipotenciario deste. Tractado, ha de concordar comigo que são Portuguezes os que; se tem conspirada contra nós... (O Sr. Conde de Lavradio: - Peço a palavra.) Escusam de estar com receio, porque tracto do effeito que póde ter esta moção: por exemplo, rompia-se o Tractado; n'um dia de Paquete appareciam os negociantes. Inglezes com archotes accèsos por esse meio dia gritando "estais perdidos, não fazem o Tractado, que era todo para vosso beneficio; não vendereis mais os vossos productos, não valerão nada as vossas terras;" e os Portuguezes:, se haviam de fazer o mesmo alarido em sentido cantrario, se haviam de dizer-lhes "não quizestes o Tractado, desprezastes as condições, vantajosas que vos offereciamos; vendereis d'aqui em diante menos bacalháu, menos tecidos d'algodão, menos ferragens," diriam, a seguir este bello exemplo, "Governo faz o Tractado, e quanto antes, se não estamos todos arruinados," e assim collocariam o Governo na mais impossivel posição. É claro pois que os nossos Portuguezes é que estão augmentando os argumentos dos estrangeiros; addiemos agora este subsidio de 150 contos, ponhâmos mais esta arma na mão dos negociadores estrangeiros, que a cada nova redacção a que nos queiram obrigar argumentarão com esta idéa: dirão = não tenhais duvida nisto, por que vós ides lucrar 150 contos. = Dizendo estas palavras, ratifico o que já disse em uma Sessão passada - que é muito bom que façamos as nossas Leis sem referencia a transacções que dependem de estranhos: (O Sr. Marques de Ponte de Lima: - Apoiado.) para tractarmos com vantagem, e necessario antes de tudo collocarmo-nos em bom terreno; e esta uma consideração digna de attenção: por tanto não nos mettâmos, nós mesmos em uma difficuldade, em uma dependencia que para o futuro poderia causar-nos males extraordinarios; lembre-se a Camara de que o precedente póde ser-nos funesto.

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Não tractarei de me defender de querer dar armas aos estrangeiros contra o nosso. Paiz; (O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: - Apoiado.) com tudo parece-me dever dizer nesta occasião que nunca na minha vida fui dominado pelos estrangeiros: nem na qualidade de Ministro, nem como Plenipotenciario, me achei jamais dominado de outro sentimento que não fôsse o de verdadeiro Portuguez; e aecrescento que não ha estrangeiro nenhum, que nem todos juntos, seriam capazes de me corromper. Se resuscitei está idéa foi unicamente para que a Camara podesse progredir melhor na discussão, do soccorro que desejâmos prestar ao Douro, e não por que quizesse dar armas aos estrangeiros. Ignoro completamente o que se tem feito; não sei quaes as concessões offerecidas pelo Governo Inglez nem tão pouco áquellas que está prompto a fazer o Governo Portuguez; devo porêm suppôr que estas serão justas, por que me inspira muita confiança o nosso illustre Negociador, e estou convencido de que hão de ser todas no interesse deste Paiz; mas não as conheço; segundo ouço dizer, a todos, e mesmo a S. Ex.ª, tem entrado em linha de conta animar,a agricultura e o commercio dos vinhos do Douro: por tanto, se esta e uma das partes essenciaes da negociação, se nós estâmos fazendo uma Lei que tende a esse mesmos fins, por que não procuraremos rodear-nos, de todos os elementos necessarios para que a Camara delibere com perfeito conhecimento de causa sobre tão importante assumpto? Parecia-me que assim procederiamos razoavelmente, e muito mais quando o prazo que proponho é tão curto.

(O Sr. Presidente deixou a Cadeira, e foi occupada pelo Sr. Conde de Villa Real.)

Eis aqui as minhas vistas; eis os motivos por que apresentei a moção de addiamento: não creio que

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o exito da negociação corra assim risco algum, e menos ainda que se dê vantagem ao negociador da parte adversa. Confio tudo das qualidades do nosso nobre Negociador; mas se pôr desgraça me enganasse, no alto conceito que S. Ex.ª com tanta razão me merece, se fôsse possivel que elle procedesse com esquecimento dos interesses nacionaes, eu seria o primeiro a vir aqui atacalo com todas minhas as forças.

O SR. DUQUE DE PALMELLA: - Tem-se feito aqui allusão mais de uma vez a negociação; pendente com a Gram-Bretanhà, pelo que julgo conveniente dizer alguma couza a tal respeito. Observarei em primeiro logar que, sem faltar aa meu dever, e sem entrar de maneira alguma em explicações, quer sobre o estado actual da negociação, quer sobre os seus resultados provaveis, é obvio, e todos podem conhecer Tjne no caso de se concluir o Tractado com a Gram-Bretanha, esse Tractado ou Convenção ha de proporcionar algum favor ao commercio dos nossos vinhos; agora se este favor será de tal natureza que baste para reanimar esse commmercio, e até para tornar desnecessaria a medida que se está discutindó, é o que eu não sei. Entretanto é possivel; e invocar a candura de todos os Membros presentes, e mesmo dos Srs. Ministros, para que digam se não seria mais para desejar que, antes de promulgar-se esta Lei, se soubesse o resultado da negociação? Por outro lado, tambem é verdade que ha algum inconveniente em suspender ou interromper a discussão de um Projecto pelo qual estão esperando anciosamente os negociantes do Douro, e talvez que alguns delles illudidos accreditem no que ainda ha pouco aqui se indicou, isto é que se pretende dar o garrote a este negicio, o que de certo não é exacto.

Acho-me por tanto vacillante, hão só no voto que hei de dar, como no que hei de dizer. Confesso que por convicção tenho sustentado, prestado o meu apoio, fraco como é, á Administração actual; e não é sem repugnancia que eu voto - ou fallo em sentido contrario do que vejo ser o seu empenho em negocio de tanta monta.

Repito que reconheço algmn inconveniente na approvação da Proposta, ao mesmo tempo que me parece muito rasoavel na sua essencia; e então desejaria que de alguma maneira houvesse uma transacção entre as considerações oppostas, e que esta transacção fôsse, da parte do Governo, uma promessa ou declaração de que se não apressará a aconselhar a S. Magestade a Sancção da Lei. É natural que sem grandedifficuldade se possa demorar esta Sancção por alguns dias, e assim ficam conciliadas as opiniões.

Quanto a observação, relativa ao dêcoro nacional, feita por um Digno Par, não me parece fundada, por que de facto póde considerar-se que a medida seja mais ou menos necessaria, conforme o exito da negociação; e neste caso nãi se tornará dependente de um governo estrangeiro, mas de um acontecimento no qual deve ter parte não só ell, como tambem o nosso. Se fôssem necessarios exemplos analogos de outros paizes, elles não faltariam, mesmo recentes, e de parte do governo com o qual hoje tractâmos, por que o Presidente do gabinete Britanico declarou na ultuma sessão do Parlamento que estava disposto a fazer alguma alteração nas pautas masque a não effectuaria sem concluir a negociação pendente, tornando por conseguinte inteiramente subjeitas ao exito da negociação essa alteração que estava na idéa de fazer sobre certos objectos da producção do nosso Paiz.

Não é necessario defender ou justificar o Digno Par author da proposta de addiamento, nem nenhum Membro desta Camara, nem mesmo qualquer dos Srs. Miniatros, da increpação de sacrificarem os interesses do Paiz a estrangeiros, por que similhantes increpações são todas injustas, mal fundadas e filhas da malevolencia mais infame; a ninguem enganam, por que todos conhecem que nem nas Camaras, nem no Governo, ha quem seja capaz de sacrificar é seu mais sagrado dever a interesses vis e anti-nacionaes.

Em conclusão, não posso deixar de manifestar que péza mais no meu espirito o mau effeito que produzirá o addiamento do Projecto do que o receio de que se conceda por elle um favor que se tornará menos preciso se o Tractado com a Inglaterra trouxer uma vantagem consideravel ao commercio do vinho do Douro, porquanto estou convencido de que o Governo tem a faculdade, e a intenção de evitar que esse inconvehniente se realise. Desta maneira se poderia pois conciliar a satisfacção que se quer dar á situação afflictiva em que se acham agora os negociantes do Douro com a conveniencia que deverá esperar-se da conclusão do Tractado.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Posto que eu seja partidista do Tractado com Inglaterra, como sabe o nobre Duque, desejo toda destruir uma idéa que nos tem sempre causado muito damno, quero dizer, que o eommercio dos vinhos do Porto depende todo do Tractado: estou sim persuadido de que esse commercio ha de ser beneficiado pelo Tractado, mas intendo que o seu desinvolvimento depende essencialmente da melhor organisasção que se der a esse ramo. Quem ha de receber mais beneficios do Tractadó. (ao menos em minha opinião) é talvez a Provincia da Extremadura, e tambem o sul do Douro. Digo por tanto que não desejaria se fôsse dar mais força, com este addiamento, á idéa que tem o governo Ingles, e como elle muitos dos seus subditos, de que só um Tractadó com Inglaterra póde fazer com que se vendam os vinhos do Douro. A experiencia de muitos annos mostra que, não obstante a variação dos direitos naquelle paiz, a exportação do nosso genero tem sempre sido a mesmo com pequenas differenças.

Eu não faço declaração nenhuma por parte do Governo; não a posso fazer, por que não estou authorisado para isso: entretanto, se se precisasse de alguma providencia, bastava olhar para o Artigo 18.º do Projecto para ficar sem receio algum. Ahi se diz - que a Companhia fica obrigada a provar, dentro de tres mezes, que está habilitada com fundos necessarios para cumprir as obrigações que lhe são impostas; - accrescentando-se, no paragrapho unico, que - se passado esse prazo, ella não tiver satisfeito ao disposto no Artigo, fica o Governo encarregado de organisar uma associação de capitalistas que queiram encarregar-se das obrigações declaradas &c. - Á vista das disposições que acabo de referir, acho que todas estas cautelas são desnecessarias, só se absolutamente se quer suppôr que o

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DOS PARES. 2O7

Podêr Executivo é nada em Portugal, que tudo deve depender das Camaras, e que do Governo só ha a esperar o que seja mais nocivo aos interesses do Paiz; mas esta idéa é absurda, pois não concebo Administração alguma que não tenha em vista a prosperidade publica. N'uma palavra, a Proposta do Sr. Conde de Lavradio, ainda mesmo modificada, como foi pelo Digno Par Presidente desta Camara, poderia levar-nos a conclusões que de fundo nenhum reputo admissiveis.

O SR. DUQUE DE PALMELLA: - Peço licença para observar ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros que as suas conclusões é que me não parece que estejam completamente de accôrdo com as premissas que estabeleceu. S. Ex.ª apresentou razões, que disse fundadas na experiencia, para induzir esta Camara a recear que a conclusão de um Tractado com Inglaterra, em que se concedam vantagens aos nossos vinhos, não melhorará muito o commercio dos do Douro, e será antes mais proficuo aos da Extremadura. Eu espero que as vantagens sejam proporcionaes para uns e para outros, por que em nenhuma das alternativas, que até aqui tem havido nas nossas relações com Inglaterra, se póde dizer que hajam variado muito os direitos de entrada dos vinhos Portuguezes naquelle paiz entretanto, se agora variassem consideravelmente é claro que alguma differença favoravel havia de produzir o menor preço por que os nossos vinhos ficariam em Inglaterra. Não concordo porêm com o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros em que estas considerações apresentadas na Camara possam servir de armas contra nós: já agora, e no estado a que chegaram as negociações, qualquer resolução que se torne nesta Casa, não poderá influir muito para o seu desenlaçe; nem creio que os inconvenientes provaveis de similhante resolução teriam paridade com aquelles que (como judiciosamente observou S. Ex.ª) tem resultado, e poderão ainda resultar, da inquietação, da auxiedade, em que os diversos interesses se acham entre nós, e da maneira por que se tem manifestado. Não fallarei das denuncias, nem das muito despreziveis injurias dos periodicos sobre as intenções do Governo e dos Negociadores, pois que essas não merecem resposta; mas é certo que as imprudentes reclamações dos proprios interessados poderão causar-nos algum prejuizo, por que podem ter feito imaginar ao Governo do outro paiz que, da nossa parte, ha uma necessidade absoluta, e por isso um decidido empenho de concluir negociação, e que tudo perecerá em Portugal se ella não se concluir quanto antes: ao menos seria essa a illação que se deveria tirar a dar credito a algumas representações feitas em nome de associeções muito respeitaveis das Provincias do Norte; segundo estas, seria forçoso annuir a quaesquer condições, com tanto que mediante a acceitação dellas fôssem favorecidos os direitos que pagam os nossos vinhos em Inglaterra; por outro lado, os interessados em fabricas e outros ramos de industria, tem bradado (com a maior sem razão) que vão see sacrificados se se fizer qualquer diminuição nos direitos protectores, sustentando que tudo quanto tender a abrir a porta aos productos da industria estrangeira será golpe mortal na deste Paiz. O contraste de taes solicitações, esta divisão de opiniões em negocio que devia ser reputado inteiramente nacional, póde ternos sido muito prejudicial; sobre tudo é bem censuravel que o espirito de partido se insinue n'uma questão em que só deve considerar-se o interesse de todo o Paiz, e não o triumpho da opinião de um ou de outro individuo, de uma ou de outra classe. Não creio porêm que um acto de prudencia por parte das Camaras, e do Governo, anticipando o proximo resultado de uma negociação pendente, possa ter os mesmos inenivenientes.

Não sei por tanto conciliar à exigencia que se reclama com o que disse o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, quando observou que seria necessario o prazo de tres mezes para se concluirem os arranjos dependentes desta Lei, por que essa observação de nada serve, a não ser com a resrricção mental de que, no caso de se reconhecer que durante esse espaço de tempo, ou antes delle findar, se não torna indispensavel a Lei, ella não será sanccionada.

Não peço declarações explicitas; basta me ter chamado a attenção do Governo, que aliás não precisaria ser despertada, sobre esta circumstancia, e haver manifestado em publico, que a opinião dominante nesta Camara é que o sacrificio pecuniario que se vae fazer não se realisaria senão fôsse julgado absolutamente indispensavel.

O SR. VISCONDE DE FONTE ARCADA: - O Sr. Ministro manifestou que estes Regulamentos levariam tres mezes a fazer: mas, pergunto eu, intende S. Ex.ª que elles devem ser feitos antes; ou depois da Lei sanccionada? Acho que o não podem ser antes, e só sim depois. E então julga-se Ministerio com àuthoridade para embaraçar a execução da Lei? De certo que a não tem. A Lei póde ser demorada na Sancção, mas logo que esteja sanccionada o Governo não tem a faculdade de estorvar a sua execução. Isto acho eu que são as formulas do governo representativo. Por tanto parece-me que o mais prudente seria não deixar uma Lei destas dependente da vontade do Governo, por que, quando mesmo eu tivesse confiança nos Srs. Ministros actuaes, póde acontecer que dentro em pouco venham outros, e uma Lei, depois de promulgada, por caso nenhum deve ficar no arbitrio de alguem o não se executar.

O SR. MINISTRO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS: - Simplesmente desejo dar uma explicação. - Eu fiz as minhas considerações debaixo da apprehehsão de que discurremos de um modo tal, para facilitar a negociação, que só póde produzir o effeito contrario; ainda digo mais. Ahi vem uma deputação para se apresentar ao Governo, a pedir-lhe que conclua o Tractado, seja de que modo fôr, ou uma couza assim. Já não basta as representações por escripto, é necessario o apparato das deputações! Agora juntemos a tudo isto a suspensão desta Lei, e vejâmos qual será o resultado. O que eu disse a respeito dos termos da Lei, era escusado dizêlo; por que é bem conhecido de todos; digo que ha de haver Regulamentos, que ha de haver outras disposições: e será isto novo para alguem?!

Eu fallo a verdade, assim não intendo governo representativo: que se discuta uma Lei inteira, e depois se diga -- addiemos esta discussão - o que isto quer dizer é que ficâmos com a Lei subjeita á chancellaria estrangeira.

O que eu sei é que, nestes debates legislativos,

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208 DIARIO DA CAMARA

o Governo tem direito a ser prevenido anlicipadamente, pelas pessoas que o apoiam, das alterações que se pretendem fazer nas Leis propostas por elle; é o que eu ouço que se faz em toda a parte: mas apparecer uma Proposta da opposicão, e ver que oram a favor della os proprios Dignos Pares que apoiam o Ministerio, é isto sem o avisar previamente, sem tomar o seu accôrdo, deste modo não sei como os Ministros se hão de conduzir no Parlamento, e confesso que me vejo muito embaraçado em similhante situação. (Vozes: - Votos. Votos.)

O Sr. Pice-Presidente poz á votação a Proposta do Sr. Conde de Lavradio, e foi rejeitada. - Disse então

O SR. VICE-PRESIDENTE: - A Ordem do dia para Quarta-feira, 5, é a continuação da discussão especial do Projecto de Lei sobre os vinhos do Douro. Previno os Dignos Pares de que, segundo a resolução da Camara, a reunião é ao meio dia. - Está fechada a Sessão.

Eram quasi cinco horas.

N.° 53. Sessão de 5 de Abril. 1843.

(PRESIDIU O SR. CONDE DE VILLA REAL - E DEPOIS O SR. VISCONDE DE SOBRAL.)

TENDO dado meio dia, foi occupada a Cadeira pelo Sr. Conde de Villa Real.

Feita a chamada, verificou-se estarem presentes 9 Dignos Pares - a saber: os Srs. Marquez de Ponte de Lima, Condes de Lavradio, de Lumiares, e de Villa Real, Viscondes de Oliveira, e de Villarinho de S. Romão, Osorio, Silva Carvalho, e Polycarpo José Machado.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - Como só estão na Sala nove Dignos Pares, suspende-se a Sessão.

- Passados tres quartos de hora, tomou a Presidencia o Sr. Visconde de Sobral: e sendo novamente feita a chamada, acharam-se presentes (álem dos acima referidos) os Dignos Pares - Srs. Marquez de Fronteira, Condes do Bomfim, da Cunha, do Farrobo, de Paraty, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, e de Semodães, Viscondes de Fonte Arcada, de Laborim, de Sá da Bandeira, da Serra do Pilar, e de Sobral, Barões de Ferreira, e de Villa Pouca, Barreto Ferraz, Miranda, Ribafria, Gambôa e Liz, Ornellas, Serpa Saraiva, Margiochi, Giraldes, e Serpa Machado. - Tambem esteve presente o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.

Foi lida a Acta da Sessão precedente, e ficou approvada.

Logo depois disse

O Sr. VISCONDE DE LABORIM: - Sr. Presidente, eu não me achava ainda na Sala quando ante-hontem se votou a Proposta do Sr. Conde de Lavradio relativamente á ordem dos nossos trabalhos; mas, pela leitura da Acta, que se acaba de approvar, vejo qual foi a resolução da Camara. Desejava com tudo ser esclarecido sobre se essas quatro horas, que se designaram para a duração das Sessões, são contadas desde o meio dia, ou se tem pontos indeterminados, isto é, se, não podendo abrir-se a Sessão ao meio dia pela falta dos Dignos Pares que então não comparecerem, as quatro horas serão contadas somente desde o momento em que a Camara venha a estar em numero sufficiente? Faço esta pergunta por me parecer que, a prevalecer a ultima hypothese, a consequencia será que as prorogações hão de reverberar naquelles Membros que fôrem pontuaes. (Apoiados.)

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - O sentido com que se apresentou a Proposta foi que as Sessões durassem quatro horas contadas do momento em que ellas se abrissem.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - A Camara votou que se abrissem as Sessões ao meio dia, e que durassem quatro horas; por conseguinte determinou tambem implicitamente que ellas se fechassem ás quatro horas da tarde: tudo o mais é impossivel, quero dizer, não cabe nas nossas forças o estar aqui seis, sete ou oito horas; pelo menos eu declaro que as minhas não chegam para tanto, e penso que mais alguns Membros desta Camara estarão no mesmo caso. (Apoiados.)

O SR. CONDE DE LAVRADIO: - Peço que se lance na Acta que o author da Proposta, a que se refere esta conversação, já estava hoje aqui antes do meio dia.

O SR. BARRETO FERRAZ: - A intelligencia que V. Ex.ª acaba de dar á votação de que se tracta, parece-me que é a que está no pensamento de todos os Dignos Pares; mas eu desejava que esta materia se designasse explicitamente, e se ficasse sabendo que a Sessão se abriria á uma hora e se fecharia ás quatro horas: se para esse fim parecer necessario mandar uma proposição para a Mesa, eu o farei.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - A experiencia parece-me que está feita; ao meio dia quasi nunca ha numero para abrir a Sessão.

O SR. VISCONDE DE LABORIM: - Segundo collijo, parece-me que fica por decidir a duvida que expuz, mas eu desejava que a Camara decidisse alguma couza a este respeito. Acho muito bem intendido que a hora da abertura seja ao meio dia. Talvez que V. Ex.ª com justificados motivos, nem sempre possa estar aqui a essa hora; mas eu que não soffro (assim como não soffrem muitos Dignos Pares que creio chegarão: ao numero legal) protesto que hei de estar aqui ao meio dia, e senão estiver, quero que a Camara me reprehenda por faltar a este dever. Peço por tanto que se consulte de novo a Camara sobre se as nossas Sessões devem principiar ao meio dia e durar até ás quatro horas.

O SR. VICE-PRESIDENTE: - Vou perguntar a Camara se as quatro horas de Sessão devem ser contadas desde o meio dia.

O SR. GIRALDES: - O caso não está em que a Sessão comece ao meio dia, nem á uma, nem ás duas horas; o remedio consistia em acharmos o meio de fazer com que os Dignos Pares estivessem aqui á hora marcada: mas isto não se póde fazer.

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