70 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
O Orador: - Eu peço desculpa ao digno par, mas não tinha ouvido a sua declaração, e abstenho-me de qualificar O facto, porque me parece que é uma cousa a liquidar entre s. exa. e os demais membros da commissão; espero portanto que não tome as minhas palavras como censura. Com relação ao assumpto, insisto em que não é grave, mas o mal parece-me que está em não ter sido bem enunciado.
Não tem nada a extincção do consulado do Cabo da Boa Esperança com a creação do de Hamburgo; não se trata de substituir um pelo outro; feita esta rectificação de redacção, emquanto á primeira parte não vejo inconveniente; e emquanto á segunda tambem o não vejo, pois o governo não póde augmentar a despeza, nem passar consulados de 2.ª para 1.º classe, sem que lh'o permittam a existencia dos emolumentos.
Se as cousas corressem regularmente, haveria tres mezes no anno em que o parlamento estaria reunido, e nove em que estaria encerrado. Ora, se durante este periodo houvesse necessidade de se elevar á 1.ª classe um consulado, estaria o governo inhibido de o fazer, tendo de recorrer ao milagre, que popularmente se attribue a Santo Antonio, que dizem suspendeu no ar um homem prestes a caír, emquanto ia pedir ao guarda licença para fazer o milagre.
O governo não ha de estar á espera que o parlamento se abra para pedir auctorisação para crear os consulados de que haja necessidade; portanto não tenho difficuldade em votar esta auctorisação, tanto mais que a promptidão com que hoje mudam de face as nações, essa necessidade póde apresentar-se a cada momento.
Agora, com o que eu me não posso conformar é com a theoria que se quer estabelecer, e em virtude da qual não se póde aqui abrir boca sobre qualquer resolução da camara, que não se diga logo que se querem censurar os actos da camara.
Pois eu confesso que emquanto aqui estiver hei de reclamar, sempre que entender, contra qualquer acto da camara que me pareça injusto, preferindo que o sr. presidente me chame á ordem, a prescindir do que eu julgo um direito.
O sr. visconde de Chancelleiros, fazendo as observações que julgou a proposito sobre a resolução tomada pela camara, exerceu um direito que tem como par, e parece-me que usando d'elle não atacou os da camara, nem quiz manifestar menos consideração pelos seus actos.
Repito, eu não posso aceitar a theoria que se quer estabelecer, theoria terrivel, que ataca o que eu julgo um direito dos membros d'esta casa.
O sr. Presidente: - Vae ler-se o requerimento do sr. visconde de Chancelleiros.
O sr. secretario leu.
"Proponho que seja adiada a discussão d'este projecto até ser impresso e distribuido.
" Camara dos pares, 8 de setembro de 1871. = Visconde de Chancelleiros."
O sr. Presidente: - Os dignos pares que approvam este requerimento tenham a bondade de se levantar.
Não foi approvado.
O sr. Marquez de Sabugosa: - Sr. presidente, permitta-me v. exa. e a camara que diga mais duas palavras sobre o assumpto, porque ainda não me pude convencer de que elle seja tão pouco importante como dizem. Pelo menos para mim torna-se importante pela sua significação.
Em resposta ás explicações que o sr. ministro dos negocios estrangeiros teve a bondade de dar, direi que não me satisfizeram completamente.
Disse s. exa. que por eu não ter tido tempo de applicar a minha intelligencia ao estudo d'este projecto, é que não vi que o artigo 1.° era completamente distincto do artigo 3.°
Ora, a minha intelligencia é limitada, e póde ser que por muito tempo que eu tivesse para estudar o negocio, não o chegasse a conhecer bem. O que é certo é que eu não fiquei satisfeito com as explicações do sr. ministro dos negocios estrangeiros. Confesso que ha uma differença entre o artigo 1.° e o artigo 3.°, porque n'aquelle, ao passo que se dá baixa a um consulado de 1.ª classe, se auctorisa o governo para crear outro, n'outro logar, emquanto que no artigo 3.° se não falla senão em auctorisar o governo a crear consulados. É esta a unica differença entre os dois artigos.
Quanto á creação do consulado em Hamburgo, não vejo que se apresentem rasões que a justifiquem. Era necessario, por exemplo, apontar o movimento commercial que entretemos com aquelle porto, o numero de navios nossos que ali vão, n'uma palavra, fornecer os esclarecimentos e dados estatisticos precisos para podermos determinar bem o nosso voto.
Sr. presidente, nada mais direi sobre esta questão, e concluirei respondendo algumas palavras ao que disse o sr. Vaz Preto. Concordo com s. exa. quando assevera que se não podem censurar os actos da camara; mas no que não estou de accordo com s. exa., é em que se tenham dado casos identicos ao que hoje se deu n'esta casa. Tem-se, é verdade, muitas vezes approvado requerimentos para se dispensar o regimento; mas é a primeira vez que, declarando um membro de uma commissão que não foi convidado para dar o seu parecer sobre um negocio affecto a essa commissão e pedindo que se lhe proporcione tempo para se habilitar a entrar na discussão do assumpto, se lhe nega, approvando-se uma proposta para entrar immediatamente o negocio em discussão. Insisto n'este ponto, porque desejo que um facto tão extraordinario fique bem claramente registado nos annaes das nossas sessões.
(O orador não reviu as suas notas.)
O sr. Vaz Preto: - Começarei respondendo ao digna par o sr. marquez de Sabugosa.
S. exa. enganou-se de certo quando se referiu ás minhas palavras. Eu disse que não era a primeira vez que a camara dispensava o regimento para entrar desde logo em: discussão um projecto de lei.
O sr. Marquez de Sabugosa: - Mas não nas circumstancias especiaes em que este se acha.
O Orador: - A camara estava no seu direito dispensando o regimento como entendesse, e os dignos pares que não eram d'essa opinião tinham obrigação de respeitar a resolução tomada; e, n'esta parte, estou respondendo tambem ao digno par o sr. marquez de Niza.
Cada um tem o direito de manifestar as suas opiniões, mas tem igualmente a obrigação de respeitar as dos outros. Assim, a resolução da camara deve ser acatada; e não procurando ella saber quaes foram as rasões que determinaram os dignos pares a votar contra a dispensa do regimento, tambem elles não têem direito de perguntar por que motivos se approvou essa dispensa.
Fallou se tambem aqui em surprezas. Que surpreza houve n'este negocio? Poderá haver surpreza, tendo-se pedido a contraprova, a respeito da votação que resolvera a dispensa do regimento?! Alguns dignos pares que n'essa votação haviam ficado sentados, continuaram a conservar-se do mesmo modo por occasião de se proceder á contraprova, parecendo assim quererem demonstrar que reprovavam o procedimento do sr. visconde de Chancelleiros, pretendendo censurar a camara pela sua votação.
Agora, pelo que diz respeito á modestia com que o digno par, o sr. visconde de Chancelleiros se apresenta, declarando que a sua intelligencia é bastante limitada para poder, sem um demorado estudo, apreciar e conhecer esta questão, devo dizer a s. exa., sem querer n'este momento fazer apreciações ácerca da sua illustração, que todos os homens que estão collocados na posição em que o digno par se acha, e que tem, como s. exa., occupado importantes cargos, têem obrigação de conhecer e de ter estudado certos documentos, e entre elles a reforma do corpo consular publicada pelo sr. conselheiro Mendes Leal. N'essa reforma encontram-se marcadas as differentes categorias de cousu-