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N.º 54

SESSÃO DE 2 DE AGOSTO DE 1890

Presidencia do exmo. sr. Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel

Secretarios — os exmos. srs.

Conde d’Avila
José Augusto da Gama

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. — Correspondencia. — A camara, previamente consultada pelo sr. presidente, permitte que sejam publicadas no Diario do governo as tres representações enviadas á mesa contra o projecto dos tabacos. — O sr. Thomás Ribeiro refere-se a questões de salubridade publica, a occorrencias extraordinarias no Chire, e por ultimo pergunta se será verdadeiro um boato que dá conta de um acontecimento importante no paiz vizinho. — Responde-lhe o sr. presidente do conselho — O sr. Thomás Ribeiro agradece as explicações do sr. presidente do conselho, e insiste em rasões anteriormente adduzidas. — De novo lhe responde o sr. presidente do conselho. — O sr. Rebello da Silva apresenta largas considerações sobre a questão agricola. — Responde lhe o sr. ministro da fazenda.

Ordem do dia: continuação da discussão do parecer n.° 67, relativo ao monopolio dos tabacos. — Usam da palavra sobre o projecto em ordem do dia os srs. Augusto José da Cunha e Pinto de Magalhães. — O sr. Vaz Preto pede informações ácerca de acontecimentos graves no Chire. — Responde-lhe o sr. ministro dos negocios estrangeiros.— Trocam ainda algumas explicações sobre o mesmo assumpto o mesmo digno par Vaz Preto e o referido sr. ministro. — O sr. Cypriano Jardim manda para a mesa o parecer da commissão de guerra, que approva o projecto de lei n.° 150. Foi a imprimir. — Levanta-se a sessão e designa-se a immediata, bem como a respectiva ordem do dia.

Ás duas horas e quarenta minutos da tarde, achando-se presentes 28 dignos pares, abriu-se a sessão.

Foi lida e approvada a acta da sessão antecedente.

Mencionou-se a seguinte:

Correspondencia

Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição de lei que permitte aos actuaes pagadores das obras publicas a faculdade de se fazerem substituir em determinadas condições.

Para a commissão de obras publicas.

(Estavam presentes os srs. presidente do conselho de ministros, e ministros da fazenda e dos negocios estrangeiros.)

O sr. Presidente: — Ha sobre a mesa uma representação dos revendedores de tabaco.

Esta representação tem alguns periodos que a camara de certo não auctorisa a sua publicação.

Vae ler-se a parte da representação que póde ser publicada se a camara assim o resolver.

Foi lida.

Os dignos pai es que approvam que esta parte da representação, que acaba de ser lida, seja publicada no Diario do governo tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Vae ler-se outra representação dos revendedores de tabacos no Porto.

Foi lida.

Os dignos pares que approvam que esta representação seja publicada no Diario do governo tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Vae ler-se uma outra representação, vinda pelo telegrapho, dos revendedores de tabacos da cidade do Porto.

Foi lida.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam que esta representação seja publicada no Diario do governo, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o digno par o sr. Thomás Ribeiro.

O sr. Thomás Ribeiro: — Foram-lhe dadas, ao entrar na camara, umas noticias ácerca de factos de uma tão grande latitude e importancia que, embora vagos, deseja obter sobre ellas algumas informações por parte do governo.

Aproveita o ensejo de estar no uso da palavra para mais uma vez se referir á salubridade publica e á necessidade de remover certos focos de infecção existentes no bairro de Santa Izabel.

Vendo presente o sr. presidente do conselho, reitera o pedido que a s. exa. dirigiu quando teve a honra de apresentar uma representação de moradores daquelle bairro, representação que, mediante previa auctorisação da camara, foi publicada no Diario do governo.

São justificadas as exigencias dos moradores dos Terremotos, não só com respeito ás más condições hygienicas d’aquelle sitio, como com relação á falta de policia.

Sabendo que em Valencia recrudesceu a epidemia do cholera, e que se deram alguns casos na provincia de Badajoz, julga que urge tornar cada vez mais rigorosa a fiscalisação sanitaria.

Ouviu dizer tambem que houve no Chire acontecimentos que devem preoccupar seriamente a attenção do governo, a da camara e a do paiz inteiro.

Não pede ao governo que d~e a este respeito quaesquer informações.

O governo responderá, se entender que póde dizer alguma cousa ácerca da noticia que dá conta de occorrencias extraordinarias no Chire; e não exige informações, porque não quer aggravar uma situação que ao orador se afigura muito grave.

Usa do seu direito alludindo a esta noticia, mas deixa plena liberdade ao governo de adoptar, a respeito de quaesquer declarações, o caminho que entender mais conveniente.

Diz que constava tambem que no paiz vizinho se dera um acontecimento muito importante. Não dirá qual o acontecimento a que o boato se refere, e faz votos para que seja completamente destituido de fundamento.

Tambem não dirige a este respeito perguntas ao governo, o qual no entretanto poderá dizer, ácerca do boato a que vera de referir-se, aquillo que tiver por conveniente.

(O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Antonio de Serpa): — Disse que momentos antes de sair do ministerio do reino ouvíra o ultimo boato a que o digno par se referiu.

Tratou de colher informações em fonte que lhe pareceu melhor auctorisada, e ali lhe disseram que não havia no-

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ticias que confirmassem o boato, o qual acredita não ser verdadeiro.

Referiu se tambem o digno a acontecimentos extraordinarios no Chire. Não podo dar esclarecimentos cabaes a este respeito por não ter fallado hontem, nem com o sr,. ministro da marinha, nem com o sr. ministro dos negocios estrangeiros. Apenas a noite passada viu um telegramma da agencia Reuter que dizia pouco mais ou menos, se bem se recorda, que no Chire as forças portuguezas tinham atacado um navio inglez, e que as pessoas apprehendidas a bordo desse navio tinham sido mandados para Quelimane.

O boato que dá conta de casos de cholera em Badajoz, é, até certo ponto, infelizmente verdadeiro.

Não em Badajoz, mas na provincia, deram-se casos de doença que foi capitulada de cholera morbus.

O governo, apenas teve conhecimento deste facto, mandou pôr em execução o mais rapidamente possivel as providencias indicadas, e a estas horas já estão no cordão sanitario mais 600 praças de infanteria e alguns sapadores. Mandou abrir o lazareto de Eivas, e emquanto não esteja prompto a funccionar, será prohibida a entrada no nosso paiz aos individuos vindos de Hespanha.

Por ultimo fallou tambem o digno par a respeito de in salubridade e falta de policia no sitio dos Terremotos.

O orador explica que já conferenciou corri o sr. governador civil, e affirma que nos termos das leis em vigor serão dadas as ordens convenientes no intuito de prover de remedio aos males apontados.

(O discurso do sr. presidente do conselho será publicado na integra, e em appendice, quando s. exa. tenha revisto as notas tachygraphicas).

O sr. Thomás Ribeiro: — Confia plenamente no zêlo e na actividade do governo, e crê que fará tudo o que seja possivel para evitar que chegue até nós o flagello do cholera.

Com respeito ás fabricas de torrefacção de ossos, diz que já entregou em tempo ao sr. presidente do conselho uns documentos que demonstram que essas fabricas foram condemnadas pelas auctoridades sanitarias. Pede a s. exa. que compulse esses documentos e que avalie devidamente as indicações valiosas que elles encerram.

É forçoso que se mantenha uma inspecção cuidadosa e activa, porque a existencia d’aquelles fócos de infecção, e de outros, fazem perigar em extremo a saude publica em Lisboa.

Vem a proposito citar que nos arredores da capital ha pequenos rios, que n’esta quadra de temperatura elevada se convertem em verdadeiros pantanos.

É indispensavel remover estas causas de insalubridade, mas é necessario proceder em harmonia com as indicações da sciencia para que não succeda ficarem as povoações que demoram ao pé d’esses rios em peiores condições do que estavam antes da beneficiação.

Estimava que o boato que diz ter occorrido no paiz vizinho um acontecimento de bastante gravidade, não seja verdadeiro, e crê que neste voto acompanham o orador todos os que o estão ouvindo. (Apoiados.)

Estimará tambem que os acontecimentos do Chire não tenham a importancia que muitos lhe attribuem.

Não sabe se o navio que só diz ter sido aprisionado pela auctoridade portugueza é mercante ou de guerra. Desejaria informações a este respeito, porque entende que a qualidade do navio influe na importancia do acontecimento.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Antonio de Serpa): — O telegramma nada explica a esse respeito.

O Orador: — Agradece ao sr. presidente a sua resposta e pede-lhe que se digne transmittir aos srs. ministros dos estrangeiros e da marinha as observações que teve a honra de apresentar á camara.

(O discurso do digno par será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as respectivas notas tachygraphicas )

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Antonio de Serpa): — E para declarar ao digno par que transmittirei aos meus collegas as observações que s. exa. acaba de fazer.

O ar. Thomás Ribeiro: — Não quero levantar esta questão; desejo apenas ser informado.

O s r. Rebello da Silva: — Sr. presidente, estando já proximo a findar o periodo em que as côrtes devem concluir os seus trabalhos, e podendo o parlamento fechar-se sem que encontre outra occasião como esta, achando-se presente o sr. ministro da fazenda, aproveito este momento para chamar a attenção de s. exa. para um assumpto que considero dos mais momentosos e de mais palpitante interesse para nós todos e para o paiz inteiro.

Bem sabe v. exa. e a camara qual é a situação precaria, dolorosa e quasi intoleravel a que chegaram os nossos lavradores, ha algum tempo a esta parte esmagados por um concurso de circumstancias que até certo ponto foram attendidas pelo governo, que ha poucos mezes saiu das cadeiras do poder. O governo progressista reconhecendo quanto era insustentavel a situação dos lavradores de cereaes, promulgou a lei de l5 de julho de 1889 que tinha por fim favorecer a agricultura, defendendo-a da concorrencia esmagadora feita pelos trigos importados da America e de outros paizes.

A situação da agricultura, sr. presidente, chegou a tal ponto que os lavradores espalhados pelo paiz, que muito embora estejam presos a um trabalho arduo que não permitte o abandono facil, dos campos, das culturas e das localidades aonde os prendem a cada momento os seus vitaes interesses, vieram em grande numero a Lisboa, reunindo-se em dois congressos para levantarem bem alto os seus clamores, patenteando as tristes circumstancias em que se encontravam, e pedirem justiça e remedio para os gravames e seus verdadeiros inales que os affligiam.

O governo transacto attendeu em parte os seus clamores protegendo a lavoura com a lei de 1 õ de julho de 1889, que deu logo nos primeiros mezes a seguir os seus beneficos resultados, permittindo aos lavradores que podessem transaccionar a venda de seus productos com a independencia de homens livres, libertando-os da humilhação a que se viam obrigados d’antes de pedirem, quasi por favor com humildade e de chapeo na mão, aos moageiros e aos negociantes de cereaes lhes comprassem o trigo portuguez!

Mais tarde os moageiros entenderam dever representar ao governo de Sua Magestade allegando que não podiam continuar com a sua industria, não só pela alta do preço do trigo no mercado, como tambem pela falta da materia prima indispensavel para o seu labor, e que por consequencia, viam-se obrigados a fechar as fabricas, ou a levantarem muito o preço das farinhas.

Em vista d’isto, o governo procedeu como devia, mandando fazer uma syndicancia a fim de se averiguar até que ponto ara verdadeira esta affirmação, dos representantes da industria de moagem de cereaes.

O mercado central de productos agricolas começou por indagar qual a quantidade de trigo existente no paiz, e a resposta que o governo teve, foi que o trigo existente no paiz não era sufficiente para assegurar o abastecimento da população de Lisboa e de outros centros importantes.

O governo, era vista d’isto, consultou os conselhos superiores da agricultura, do commercio e industria, o conselho do mercado central, emfim, todas as instancias foram ouvidas para se poder saber o que conviria fazer nestas circumstancias. É evidente que, era vista das informações officiaes, declarando não haver nos mercados trigo suficiente para o consumo do paiz, as corporações consultadas foram de opinião, como não podiam deixar de ser, que se facilitasse a entrada no paiz aos trigos estrangeiros.

A lei de 13 de março d’este anno permittiu a livre im-

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portação de trigo até 3 L de março, mediante o pagamento do direito de 16 réis por kilogramma.

Agora as colheitas estão concluidas, a escassez de hontem transformou-se agora em abundancia, e, portanto, hoje deixam de imperar as rasões que cutão levaram o governo a modificar a lei protectora da lavoura nacional.

O decreto de. 13 de março ultimo, parece-me (se me não falha a memoria), que modificou em grande parte a lei de 15 de julho de 1889, permittindo a entrada de cereaes estrangeiros, sem os certificados que provassem terem os negociantes importado o dobro de trigo nacional, e baixando o direito, sem lixar a quantidade rigorosamente determinada do trigo que poderiam importar até 31 do proximo mez de agosto.

A lei de 15 de julho de 1889 era uma lei protectora da agricultura, mas tambem determinava as circumstancias em que se poderia permittir a entrada de cereaes estrangeiros, para evitar a carestia do pão.

Se ella teve em vista proteger o agricultor, não é menos certo que não esqueceu os interesses do consumidor e o bem estar das classes pobres.

Teve em vista proteger a agricultura, porque se entendeu que era necessario e indispensavel haver um preço remunerador para o trigo; mas, ao mesmo tempo, permittia ao governo o poder obstar a que esse preço do trigo se elevasse.

Em fevereiro d’este anno verificou-se officialmente que não bastavam os cereaes para as necessidades do nosso mercado; mas o que ninguem provou, nem mesmo o relatorio da syndicancia feita ás fabricas de moagem, é que o trigo portuguez tinha attingido o preço medio de 600 réis, que havia sido considerado como o limite, alem do qual seria permittido importar cereaes estrangeiros para evitar a carestia do trigo.

Isto não se provou; mas o que se provou e verificou, não obstante as allegações em contrario dos negociantes de cereaes, e o que se póde ler nos documentos officiaes, foi que o preço do alqueire de trigo não só não excedera os 600 réis, como tambem na maior parte das fabricas não chegaram a pagal-o a mais de 580 reis!

Portanto, sr. presidente, já vê v. exa. e a camara que não se podia invocar como principio, para modificar a lei de 15 de julho, a carestia dos trigos nos mercados nacionaes.

Havia num dado periodo falta de cereaes até ás colheitas, e bastaria que a importação se fizesse em harmonia com as necessidades do consumo, determinado pela somma das medias mensaes da importação nos ultimos cinco annos.

A importancia da cultura cerealifera, sr. presidente, considero-a tão grande que, sem ella, desappareceria toda a riqueza publica!

É ella a base, o nucleo de todos os systemas de exploração agricola bem organisados; e nos paizes meridionaes como o nosso, é esta cultura insubstituivel.

Dizem que o paiz não produz cereaes sufficientes para o consumo? É verdade; mas não é menos verdadeiro tambem que já produziu quanto trigo precisavamos e até um excesso que exportavamos, e para mim é convicção profunda que o paiz póde e deve produzir os cereaes necessarios para o seu consumo.

Em justificação d’esta these reportemo-nos aos tempos remotos do passado. Segundo diz a historia, nos primeiros tempos da monarchia até aos fins do seculo XIII nós produzimos os cereaes necessarios e bastantes para o consumo da nossa população. Houve, é verdade, um ou outro anno anormal em que se fez sentir a fome, dizimando o paiz; porem, eram calamidades que igualmente se fizeram sentir em toda a Europa, como aconteceu nos annos de 1202 e 1333.

A partir dos fins do seculo XIII os cereaes começaram a escasseiar, e d’ahi as medidas violentas para compellirem os agricultores a semeiarem maior quantidade de cereaes, ou restricções violentas e improficuas que difficultavam as faceis transacções de cereaes no paiz, sem poderem evitar efficazmente que saíssem do paiz quando o lucro commercial convidasse o lavrador de uma certa localidade a exportar trigo. A falta de estradas e a difficuldade dos transportes faziam com que fosse mais conveniente abastecer Lisboa e os grandes centros, importando trigo do estrangeiro; e neste sentido a legislação d’aquellas epochas favorecia o commercio.

No fim do seculo XVI Lisboa, como a antiga Roma, vivia do trigo estrangeiro, que mandava trocar com o oiro da India aos mercados de Flandres e da Barberia.

N’aquellas epochas em que não sendo faceis os transportes e até, muitas vezes, eram impossiveis entre algumas povoações, no inverno acontecia que se morria de fome no norte do paiz, por exemplo, embora houvesse abundancia de tudo no sul.

Então era mais facil acudir á miseria com os trigos estrangeiros que entravam pelos diversos portos do paiz. De balde as leis pretenderam dominar no mundo economico para melhorar a sorte da agricultura e o marquez de Pombal com toda a sua energia, com toda a sua vasta intelligencia e com tantos conhecimentos especiaes sobre a agricultura pretendeu acabar com o nosso deficit de producção cerealifera mandando arrancar as vinhas nos terrenos apropriados para produzirem trigo.

Apesar do seu poder sem limites nada conseguiu, pois que effectivamente as medidas restrictivas para nada servem e para nada prestam, quando não são acompanhadas por grandes transformações economicas.

O grande mal da nossa agricultura cada vez se exagerava mais com as excessivas importações de cereaes que se faziam todos os annos.

Desde os fins do seculo passado até 1820 houve um periodo em que a importação foi exagerada; durante este periodo calculou-se a importação dos paizes estrangeiros em quatro mil e tantos coutos. Esta situação era a mina da agricultura. Então os lavradores reuniram; dirigiram-se aos notaveis homens publicos que então governavam o paiz, e foram attendidos por esses grandes patriotas que entenderam, e muito bem, não poder subsistir a prosperidade publica quando a agricultura agonisasse. Não receiaram a confirmação das prophecias dos negociantes economistas de então que pintavam o espectro da fome pairando com as mais negras cores sobre o paiz, e, como homens a quem a lucta ou qualquer receio nunca os acobardara, tiveram a coragem de decretar o aviso de 18 de março de 1820. O que ha de mais extraordinario, sr. presidente, é que então não havia estradas, não havia o mercado agricola, não havia telegrapho, não se podia mandar de um momento para outro um aviso.

Desde 1837 até hoje, n’esse periodo em vez da escassez e da fome, póde a influencia benefica d’esta lei, libertar-nos do onus pesadissimo de mais de 4.000:000$000 réis que dispendiamos; até então, importando cereaes, e revigorando a nossa agricultura, inspirando-lhe inteira confiança no governo, permittiu que os capitães a fecundassem, que se rasgassem novos campos com a charrua e que o solo produzisse trigo em quantidade tal que excedia as necessidades do consumo.

Se a minha memoria me não falha, durante o periodo que vae de 1820 a 1836 não houve falta de cereaes, bem que deixassemos do importar 6.000:000 de alqueires ao preço medio de 800 réis, valendo 4.800:000$000 réis.

Em 1837 começou a nossa exportação de trigo que durou dezoito annos, sendo relativamente importante a exportação de 1849 que excedeu 309:000 hectolitros.

Bem vê v. exa., sr. presidente, que o proteccionismo não foi a lei da fome, e bem pelo contrario, se lhe póde chamar a lei da abundancia, porque veiu promover a trans-

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formação cultural que tornou mais fecundo o solo patrio. Hoje ha muitos publicistas que combatem o proteccionismo, muito embora haja tambem muitos outros e igualmente auctorisados que o defendam. A verdade é que tanto no numero economico como no numero civil não ha nada. que se não transforme. Muitos principios de economia politica estão hoje profundamente modificados. Hontem temiam-se as crises da escassez, hoje não é a escassez e sim a abundancia que vem produzir grandes perturbações economicas na industria agricola de muitos paizes.

Ao grande periodo de abundancia que acompanhou o systema prohibitivo succederam uns annos agricolas de muita escassez. Em 1853 houve falta de milho no paiz e por esse motivo abriram-se as portas á importação do cereal estrangeiro, mas, emquanto ao trigo ainda em 1856, se não fazia importação.

Era 1856, sendo ministro das obras publicas o sr. Fontes Pereira do Mello, apresentou ao parlamento um projecto de lei tendente a implantar no paiz o systema proteccionista em substituição ao systema prohibitivo que até então vigorava.

N’essa epocha estavam em pleno vigor os principios do livre cambio, então as reformas economicas de sir Robert Peei tinham enthusiasmado os homens publicos da Europa em vista dos resultados brilhantes que a Inglaterra tirou da sua nova orientação fazendaria. Por isso não admira que os nossos homens publicos, dominados por aquellas idéas, empregassem os seus esforços para que se implantasse no paiz um regimen que mais se approximasse d’aquelle.

Quando em 1856, como já disse, foi ministro das obras publicas um dos homens mais prestantes d’este paiz, o sr. Fontes Pereira de Mello, aconselhando o systema proteccianista tinha em vista proteger a nossa agricultura e acabar com as incertezas de um regimen que, em vista da escassez das colheitas, obrigava a abrir hoje os portos para os fechar amanhã, obrigado umas vezes pela elevação excessiva do preço dos cereaes do mercado, compellido, em outras, pelas reclamações dos lavradores a favor da agricultura.

N’um lucidissimo relatorio, que revela tão grande patriotismo como profundo estudo, ponderava o sr. Fontes que «os cereaes eram o mais rico e valioso producto da nossa agricultura».

Calculava em 300.000:000$000 réis o valor do dominio agricola entregue a esta cultura, que entendia ser preciso proteger, e, pelos seus argumentos, chegava a conclusão de que o proteccionismo em nada vinha prejudicar os interesses agricolas.

Comtudo, este projecto do sr. Fontes não vingou.

Alguns annos depois, em 1865, o sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa, invocando os mesmos principios economicos, fazendo um estudo completo de todos os mercados do mundo, declarava tambem que não deviamos ter o menor receio que a influencia dos paizes estrangeiros podesse aniquilar a nossa cultura cerealifera.

Então, dizia o sr. João Chrysostomo: dos trigos da America não nos podemos receiar, nem o seu preço ou qualidade permittem que possam competir com os nossos trigos.

Corno os annos se encarregaram de desmentir estas previsões!

Hoje nenhuma nação da Europa póde luctar contra a concorrencia esmagadora dos trigos americanos.

A agricultura franceza e allemã queixam-se d’esta concorrencia, e os proprios lavradores inglezas e belgas, em paizes onde a agricultura está. tão aperfeiçoada, pedem o apoio do proteccionismo para não succumbirem na lucta travada contra a America.

Se as nações que caminham na vanguarda do progresso agricola, favorecidas pelo credito, por capitães baratos, por uma instrucção largamente generalisada, se declaram vencidas na lucta, o que faremos nós em um paiz pobre, falto de capitães, onde não ha credito agricola, e onde o atrazo na industria rural é geralmente manifesto?

No anno passado, lord Salisbury, invocando a opinião de um illustre escriptor inglez Hume, manifestada quando foram effectuadas as reformas de Peei, dizia: hoje convenço-me de que a prophecia desse grande publicista realisa-se completamente...

Então affirmára o illustre publicista inglez que o livre cambio seria a ruina da agricultura ingleza.

Se a Inglaterra tirou vantagens reaes d’essas reformas, e se não viu logo quanto affectaram desfavoravelmente os interesses agricolas, foi porque a sua grande industria e principal riqueza precisava de mercados que assim conquistou e que em troco lhe trouxeram grandes lucros que innundaram de riquezas o paiz, occultando o mal lento, mas gradual e progressivo que minava a agricultura.

A agricultura da França soffreu immenso com algumas reformas inspiradas na doutrina do livre cambio.

É um homem notavel que o declara, é uma auctoridade na sciencia economica moderna (Leconteux) quem diz que se a França, durante a lucta com a concorrencia de cereaes americanos, não tivesse recorrido ás pastagens, aos gados, para saldar com lucro n’este ramo de cultura, as contas, em que perdia cultivando trigo, teria infallivelmente succumbido.

Ora, uma nação como a nossa, situada no extremo occidente da Europa, tendo um clima quente, extremamente no estio quando a herva desapparece nos campos como se fosse crestada por uma queimada immensa, não se póde deixar de considerar que a cultura cerealifera é insubstituivel, que a ella ha de estar sempre ligada a nossa prosperidade agricola e o nosso futuro economico.

E não me digam que os cereaes não são proprios d’este clima e que o solo é mais apropriado para a vinha e para a oliveira, e que ao desenvolvimento d’estas culturas e ao estabelecimento de outras novas é que deverá ir a agricultura buscar os seus lucros, desprezando os cereaes!

Eu é que não posso acceitar tão peregrinas doutrinas.

Eu tenho percorrido o nosso paiz do norte a sul e tenho visto de perto as grandes riquezas que elle encerra. Em toda a parece se encontra a vinha como um filão aurifero vestindo as collinas e os plan’altos, mas ao lado, nos valles ferteis, nas varzeas e nos campos lá está o cereal, o trigo ou o milho a valorisar o terreno associado, muitas vezes, á cultura da oliveira.

Ainda admittindo que se podesse transformar o paiz todo em uma vinha, todos sabem que não ha maior perigo sob o ponto de vista economico, do que ter um paiz a sua fortuna ligada unica e simplesmente a uma só industria. Quando ella succumbe tudo morre com ella. O que seria do paiz, e principalmente das regiões vinhateiras, se não houvesse outra cultura senão a da vinha quando esta desapparece devastada pela phylloxera?

Eu affirmo afoutamente que a cultura cerealifera póde e deve existir entre nós, porque é insubstituivel e constitue a base da nossa riqueza agricola.

Digo isto sem receio de que me contradigam e sem me importar com as doutrinas dos que me são oppostos, sem attender as opiniões d’aquelles que entendera que as industrias que vivem da protecção estão condemnadas a morrer. Eu quando entendo que cumpro com os meus deveres e que sigo os dictames da minha consciencia, não me importo com os applausos ou com o desfavor de muitos, de grande parte da opinião publica ou ainda mesmo das multidões. Eu sou apologista do proteccionismo, porque entendo que a elle se devem grandes beneficios em todas as nações. Em theoria seria a livre troca o melhor dos systemas; aproveitar-se-iam as faculdades productivas e especiaes de cada região, os caminhos de ferro e a navegação a vapor fazendo deoapparecer as distancias, permittiriam que as nações trocassem livremente os productos de que carecem por aquelles que melhor podem produzir; mas, sr. presidente, isto

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é um ideal! Na pratica as nações querem a livre troca quando lhes convem e defendem-se com o proteccionismo. A Inglaterra defende as suas cervas contra os nossos vinhos; a America tem creado e engrandecido a sua industria com o proteccionismo, mas pretende exportar livremente cereaes, porque os tem em abundancia. Portanto, já vê v. exa., sr. presidente, que seria victima e do paiz que pretendesse guiar-se pelos principios mais bellos da sciencia economica pura!

Nós precisâmos de proteccionismo; mas tambem não precisamos menos de progresso agricola, não do espectaculoso, mas daquelle que se não mostra ostensivamente, cantado pela voz dos thuribularios; precisâmos do progresso agricola que dá mais dinheiro ao lavrador, que augmenta as producções e a riqueza publica. Eu pergunto, sr. presidente, porque não havemos nós de progredir? Pesa sobre nós algum anathema que nos isole do mundo que progride? Chegámos por acaso ao ultimo grau do aperfeiçoamento agricola?

Eu affirmo e repito que o paiz póde e deve produzir o sufficiente para o seu consumo.

Póde e deve, porque se assim não succede é porque não tem havido sufficiente protecção á agricultura que lhe permitta poder garantir bons lucros ao capital de que carece para augmentar as suas producções e alargar a area de cultura.

Durante dezoito annos produziu o trigo sufficiente para o nosso consumo, e, se durante este largo periodo a nossa agricultura póde desenvolver tão grande actividade á sombra de um systema protector verdadeiramente efficaz, nada ha que nos prove ser impossivel agora renovar esse periodo prospero, quando em toda a parte se prova que é relativamente facil arrancar do solo o dobro do que se consegue produzir pelos methodos geraes de cultura sem estrumes sufficientes pera fertilizar os terrenos.

Para comprovar a minha opinião, eu poderia ir buscar á Inglaterra, á Allemanha, á França e á Italia exemplos magnificos apresentados por homens prestimosos que pelos seus trabalhos teem demonstrado á evidencia a minha asserção.

Tratando-se, porém, de interesses portuguezes, eu julgo não carecer de ir ao estrangeiro buscar exemplos em apoio ás opiniões que professo. (Apoiados.)

Basta-me percorrer as aldeias do meu paiz e tomar nota dos melhoramentos agricolas emprehendidos por homens obscuros, mas trabalhadores, e lidos nos modernos auctores da sciencia agronomica.

Em Beja, por exemplo, região cerealifera das mais importantes do paiz, têem conseguido augmentar muito a producção do solo com fertilização, empregando adubos artificiaes, e os ensaios feitos em differentes localidades tem dado as mais concludentes provas de que o solo patrio é tão capaz de produzir abundantemente como o dos outros paizes.

Em Beja conseguiu um abastado proprietario, o sr. Joaquim Filippe Fernandes, quando as terras de primeira ordem não produziam mais de oito sementes, com applicação dos adubos chimicos, que em terras gallegas a producção fosse de vinte e sete sementes! Era vista disto será licito duvidar de que nós podiamos augmentar a nossa producção de trigo, aproveitando vantajosamente as forças productivas dos nossos terrenos empregando os processos que a sciencia e a experiencia aconselham, de harmonia com as condições economicas? Quem ousará dizer o contrario? Os factos têem confirmado em toda a parte onde se tem empregado esses meios, como se póde desenvolver facilmente a producção, com vantagem para a alimentação publica, e propriedade dos agricultores.

Não será portanto difficil admittir que, applicando-se os processos adequados e encaminhando a nossa legislação a favorecer a agricultura, a nossa producção cerealifera mesquinha como é, de cinco a dez sementes, poderia elevar-se a quinze ou dezoito sementes.

Mas, apresentemos mais alguns exemplos.

Sr. presidente, a liga regional dos lavradores do baixo Alemtejo, tem prestado, em poucos annos, grandes serviços á sua região com a propaganda sensata que tem feito de progresso agricola. Com a applicação dos adubos chimicos aos terrenos da região, tem-se conseguido augmentar a producção, em media, 9,5 sementes, sendo a minima de 7 e a maxima de 12 sementes.

A despeza media com a adubação de 1 hectar é de 22$600 réis, e como o augmento de producção de semente em trigo é de 9,õ sementes, em media teremos o lucro de 16$400 réis, vendendo o trigo a 500 réis o alqueire. Nos bons terrenos sobe este lucro a 22$400 réis para descer a 5$400 réis nos casos mais desfavoraveis.

Em outros pontos do baixo Alemtejo os resultados da adubação dos terrenos têem sido animadores e constantes, ha já alguns annos a esta parte. Em Ferreira, em Alvito, em Evora, era Alter do Chão, as experiencias na grande cultura, confirmam os factos observados em Beja.

N’esta ultima região, um lavrador o sr. J. Rodrigues Antunes, teve 25 sementes de trigo quando os seus visinhos em terrenos, similhantes apenas alcançaram 8 sementes!

Ora, sr. presidente, se nós obtivermos o augmento de producção que é permittido acceitar em face d’estes exemplos, nós poderemos satisfazer ás necessidades do consumo nacional e talvez ainda nos sobeje bastante para exportarmos.

E quaes são os meios que os poderes publicos teem ao seu alcance para habilitar o cultivador a poder seguir os processos tendentes ao desenvolvimento da producção São differentes e todos de facil applicação, mas os mais simples, efficazes e que desde já poderiam ser attendidos, são:

Um, o credito agricola; o outro, a extincção da contribuição de registo para os arrendamentos a longo praso, o ultimo a exemplificação em larga escala dos grandes resultados que se obtêem com os adubos chimicos.

O credito hypothecario já nós o temos ha bastantes annos; tem prestado grandes serviços ao paiz, e, comtudo, carrega elle com muitas culpas, que em verdade não tem.

Attribuem-lhe, em muitos casos, a ruina de muitos proprietarios, mas não se lembram que já estão perdidos com dividas e juros accumulados, nas mãos de agiotas, quando vem recorrer ao banco.

Mas, o credito hypothecario, embora preste muito bons serviços, não póde substituir o credito agricola, porque este empresta, não só sobre os instrumentos de lavoura, mas ainda sobre a producção futura, e attende ahonradez, faculdades de trabalho e bom nome do agricultor. Dizem que a 6 e a 7 por cento de juro (preço do capital no mercado), não é possivel ter credito agricola, porem, sr. presidente, lembremo-nos de que os agricultores todos os annos recorrem ao credito e vivem d’elle emquanto não vendem os seus generos, e o banqueiro da localidade, empresta aos amigos a 10 por cento, o que addicionando-lhe a decima de juros eleva o encargo a mais de 15 por cento! E isto, sr. presidente, é muito bom pois, que é geral haver emprestimos a 40, 60 e até 70 por cento ao anno. Estes factos vem confirmados n’um relatorio do banco hypothecario! Portanto, sr. presidente, um banco agricola que emprestasse a 7 por cento ao anno, não faria um grande bem ao lavrador?

O outro meio, que sem prejudicar o estado poderia permittir a formação de companhias agricolas que cultivassem pelos melhores processos e que fundassem as industrias annexas, depende simplesmente do traço de penna, depende da abolição da contribuição de registo nos arrendamentos a longo praso, de sessenta annos inclusive.

O paiz é cultivado por arrendatarios, principalmente no sul e no centro, e sem uma garantia que lhes permitta te-

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rem confiança no futuro estes agricultores não vão encorporar ao solo, que lhes não pertence, quantias importantes que só podem ser pagas, a pouco e pouco, durante longos annos.

Alem d’estes meios ha os de propaganda. Com o desenvolvimento dos estudos agricolas e com as escolas praticas póde-se attender a muitas exigencias da agricultura progressiva, comtudo, os fructos que se poderam obter por este meio, tarde e bem tarde estarão sazonados.

Eu, sr. presidente, attendo agora sómente ao que me parece pratico e immediatamente applicavel e por isso considero indispensavel e do maior alcance economico o estabelecerem-se centenares de campos de demonstração, com os quaes era certo obterem-be os vantajosos e animadores resultados praticos.

Estes campos bastaria que tivessem um ou meio hectare, estabelecidos em pleno campo de grande cultura, seria um exemplo vivo a convencer, dia a dia, o lavrador da efficacia dos adubos. Seria facil e economico estabelecel-os, dando o governo os adubos e a direcção technica e entregando ao lavrador a producção, sendo o augmento o premio, a recompensa, por ter permittido na exemplificação. Cada um d’estes campos importaria em 20$000 a 35$000 réis, e, portanto, com uma despeza maxima de 3:500$000 réis, seria facil estabelecer com campos de demonstração, com fócos d’onde irradiaria o progresso n’uma cultura decadente, nas regiões mais importantes como as de Beja, Evora, Alto Alemtejo e Extremadura.

Alem d’estes meios de immediato progresso agricola ha um outro que infelizmente já me ia esquecendo, e que todavia é o cancro que corne o coração do paiz; vou referir-me ao aggravamento dos impostos.

Sr. presidente, V exa. e a camara sabem que a classe agricola é a que mais paga, mas tambem por isso é a menos protegida. Ao mesmo tempo que se protegem todas as outras industrias eu não vejo a igualdade do espirito da lei exercendo os seus benéficos influxos sobre a lavoura nacional; eu vou confirmar a proposição que avanço, e confirmo-a com testemunhos que não são meus, e que, por isso mesmo, são insuspeitos.

N’um dos ultimos congressos agricolas o sr. Margiochi dizia o seguinte:

«A percentagem da contribuição predial, comparada com a que pagam a industria e o commercio é enorme, pois que, comquanto estas pagam 1 ou 2 por cento, a proprio dade rural paga 20, 25 por cento o mais, do rendimento collectavel. Aos que dizem que a propriedade e a agricultura não pagam o que devem, outras exemplos corroboram o que haviamos affirmado, e dos quaes se vê que em Lisboa ha casas commerciaes, tirando um lucro liquido de 30:000$000. 50:000$000 e até 80:000$000 réis, e entretanto, em 1875, não havia um negociante, um banqueiro, que pagasse mais de 2:000$000 réis!»

Ainda ha mais, sr. presidente, o rendimento collectavel da propriedade portugueza, ha poucos annos era de 30.000:000$000 réis, e pagava:

1.° 3.267:000$000 réis inscriptos no orçamento de 1888-1889.

2.° Outros 3.267:000$000 réis de addicionaes para o estado, e para as corporações locaes, camararias, parochiaes, etc.;

o.° Approximadamente 500:000$000 réis de decimas de juros e sem addicionaes;

4.° Cerca de 831:000$000 réis (metade do imposto do sêllo, inscripto no orçamento já citado);

5.° Cerca de 2.000:000$000 réis de contribuição de registo e addicional de 6 por cento;

6.° Cerca de 2.056:000$000 réis do real de agua, e impostos indirectos locaes.

Portanto, o encargo total que pesa sobre a propriedade é de 12.000:000$000 réis, ou 40 por cento do rendimento!

E ainda ha quem diga, sr. presidente, que a propriedade não paga o que deve!

Sr. presidente, quando os tributos ferem d’este modo, desigualmente lançados esmagam a propriedade, quando as matrizes são feitas pela maneira como ainda ha dias o acabei de dizer n’esta camara, não me parece justo que se peçam á agricultura novos sacrificios.

Sr. presidente, nós temos grandes defeitos na legislação que impedem os grandes emprehendimentos que se podiam realisar no nosso paiz.

Ne s sabemos que é impossivel melhorar uma propriedade quando embora haja algum capital não possamos garantir o seu emprego na terra por meio de um contrato facil e pouco oneroso.

Emquanto a propriedade for carregada d’este modo com tributos, é impossivel progredir livremente a agricultura.

Sr. presidente, sem mercados e preço remunerador, não póde viver nenhuma industria.

A carta de lei de 15 de julho de 1889, fui um titulo de gloria para o sr. conselheiro José Luciano de Castro, porque aos seus esforços se deveu a promulgação d’essa lei, verdadeiramente protectora da lavoura nacional, e sabiamente inspirada nos bons principios de administração publica, pois que garantindo a compra e fixando os preços de trigo, permittindo em determinadas circumstancias? abertura dos nossos portos aos cereaes estrangeiros, obstava á elevação do preço do pão e ao aggravamento das classes menos favorecidas da fortuna.

Sr. presidente, ha pouco tempo os negociantes de cereaes recebiam com desprezo os lavradores que pediam para lhes comprarem os seus trigos, respondendo-lhes franca e abertamente: Nós temos trigo da America, melhor e mais ha rato; ninguem nos obriga a comprar outro mais caro e de moagem mais difficil; nós somos commerciantes e não lavradores. Ora, sr. presidente, o lavrador está hoje em iguaes condições ou peiores do que estava antes, da lei de 15 de julho, mas tambem o lavrador sabe perfeitamente que no uso pleno do seu direito, póde reclamar aos poderes publicos protecção para a sua industria. Ora, se a lei de 15 de julho de 1889 não for restabelecida, eu receio muito que se compliquem os factos que tão estrondosamente foram manifestados nos congressos agricolas. Receio muito que elles sejam fataes para a maioria dos lavradores e tragam a ruina d’uma grande riqueza nacional, porque sem as restricções sabiamente pensadas e impostas, pela lei a que mo referi, os negociantes de cereaes vão sendo obrigados a apresentar certificados, quando pretenderem comprar uma certa qualidade de trigo estrangeiro, ninguem os póde obrigar a que façam avultadas compras do trigo nacional.

Sr. presidente, desde a publicação da lei de 13 de março deste anno, a importação tem sido espantosa. Eu posso ler á camara uma noticia publicada n’um jornal, pela qual se vê que a importação até ao fim do mez passado foi de 70.000:000 de kilogrammas.

A necessidade do consumo em oito mezes, attendendo á media dos ultimos cinco annos da nossa importação de cereaes, é de 68.000:000 de kilogrammas.

A lei de 13 do março teve em vista tambem proteger a agricultura e attender a uma necessidade publica, que era a falta de cereaes, comprovada oficialmente pelo mercado central de productos agricolas; mas as colheitas estão concluidas, os lavradores têem o trigo nos celleiros e precisam vendel-o, e, com franqueza, duvido que as disposições do decreto de 13 de março ultimo sejam bastante efficazes para garantirem á lavoura um preço remunerador para o trigo.

A fiscalização das farinhas moidas nas fabricas parece-me difficil e despendiosa, para não dizer inexequivel.

Parece-me, pois, que seria mais simples restabelecer a lei de 15 de julho, lei que já deu provas bem manifestas de que é utilitaria, lei que provou bem evidentemente que não veiu alterar as circumstancias economicas do nosso

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mercado, e que não póde ser; por esse motivo, condemnada.

Ha, porém, um facto importante para todos nós, para o sr. ministro da fazenda, para todos os homens publicos que se interessam pelos rendimentos do thesouro, facto que já tem tido varias explicações na imprensa e até no parlamento. Refiro-me á falta de importação no ultimo anno agricola.

É claro e evidente que o paiz consome todo o trigo produzido; comtudo, a promulgação da lei de 15 de julho de 1889, parece que deu em resultado um retrahimento do commercio de cereaes estrangeiros de tal ordem, que elles deixaram de entrar pelos portos do reino.

Todavia as fabricas trabalharam sempre, a producção não augmentou prodigiosamente de um momento para o outro, não me consta que houvesse um anno excepcionalmente productivo, o consumo não diminuiu, e o que não se póde contestar é que o trigo consumiu-se todo; mas não entrando pelos portos do paiz, do alguma parte havia de vir, e, n’esse caso, veiu concorrer, por contrabando, deslealmente com o trigo nacional, veiu dar grandes lucros aos industriosos e desfraudar os interesses do estado que se vê obrigado a pedir aos homens honestos que paguem o que é preciso para que o paiz satisfaça aos seus encargos.

O sr. Fuschini disse na camara dos senhores deputados que lhe parecia conveniente, para dar satisfação a uma parte da opinião publica, que se adoptassem algumas medidas attinentes ao mesmo fim de obstar ao contrabando e que foram apresentadas á commissão que elaborou o regulamento da lei de 15 de julho de 1889.

Eu entendo que era necessario dar esta satisfação á opinião publica, e procurar descobrir as causas d’este facto anormal, que prejudica os interesses da fazenda.

Esta doutrina não é nova; já em tempo, o fallecido dr. Rodrigo Moraes Soares, distincto cavalheiro e notavel director geral que foi do commercio e industria, julgava indispensavel o estabelecimento de uma zona fiscal na fronteira, que obstasse ao contrabando.

Pois se não ha contrabando que importa1 que se estabeleça a tal zona fiscal que a ninguem prejudica? Que rasão ha para lhe fazerem guerra? Quem não deve não teme, diz o adagio!

Mas, d’este modo dava-se satisfação a essa parte da opinião publica que clama contra o contrabando e poderia até provar-se ser isto uma lenda, mostrando-se então d’onde veio ou d’onde vem o trigo que se consome, que não sáe dos nossos campos e não paga direitos. Será possivel então haver meio de se achar a incognita da equação, de tão difficil resolução.

É uma cousa tão complicada que eu pediria ao digno par, o sr. Augusto José da Cunha, que me auxiliasse com os seus profundos conhecimentos mathematicos a achar esta incógnita.

Eu entendo que se deve regulamentar a lei ou modifical-a do maneira que se de uma satisfação á opinião publica, e que se não prejudiquem de modo nenhum os interesses do thesouro, sem vantagem para a agricultura, e sómente em proveito dos exploradores de vil especie.

Sr. presidente, eu tenho-me explanado mais do que desejava, por ser um assumpto que é para mim extremamente sympathico. Vou terminar para não roubar mais tempo á camara.

Eu, sr. presidente, vivi largos annos numa aldeia, fui lavrador, e pude apreciar o que vale e o que soffre a agricultura. Não ha nada que mais me encante, do que estes assumptos.

Concluindo, peço á camara que attenda ás circumstancias altamente criticas da nossa agricultura e que tendem a aggravar se.

Eu que tenho defendido os interesses do lavrador que cultiva trigo, pedindo para que se lhe garanta um preço remunerador ao seu producto, venho agora pedir, ampla liberdade de importação para o milho.

Bem sabe v. exa. sr. presidente que dois terços da população de Portugal alimentam-se de milho e que este anno houve uma colheita excepcionalmente má. A escassez foi enorme e os preços foram augmentando successivamente, accentuando-se a ponto de se venderem 15 litros de milho por 700 ou 800 réis!

Ora, um trabalhador que recebe um salario de 280 ou 300 réis, quando recebe, não póde comprar milho a 800 réis. A fome é a consequencia d’este estado de cousas anormal.

É preciso garantir um preço remunerador ao milho nacional, mas attender da mesma maneira como se legislou para proteger o trigo, que em epochas de carestia ou de escassez possa vir o milho do estrangeiro com a maior facilidade.

Eu entendo que n’estas circumstancias o proteccionismo deve affrouxar ou baixando-se os direitos ou abrindo-se os portos de entrada ao milho exotico.

Tenho dito.

(O orador foi comprimentado por alguns dignos pares.)

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): — Não se levanta para responder minuciosamente ao discurso pronunciado pelo sr. Rebello da Silva, não só porque os assumptos a que s. exa. se referiu dizem principalmente respeito á pasta das obras publicas, mas tambem porque, estando a hora adiantada, e não se tendo ainda passado á ordem do dia, é dever seu não retardar a marcha dos trabalhos parlamentares.

Dirá, pois, poucas palavras em relação á lei dos cereaes.

Afigura-se-lhe que o digno par, a quem responde, labora n’um equivoco, pois que a lei de 15 de julho do anno passado refere-se a duas epochas perfeitamente distinctas. A primeira epocha começa no principio do anno cerealifero. Emquanto existe a producção d’esse anno a lei vigora em todas as suas disposições, isto é, a importação do trigo estrangeiro só é permittida na proporção de 1 para 2 de trigo nacional, importação que, aliás, só se realisa mediante a apresentação do respectivo certificado; mas como a producção nacional não chega para o consumo, a lei diz que, ou no caso da falta, ou quando o preço do nosso cereal exceda a media de 600 réis, a importação do producto estrangeiro é consentida sem nenhuma restricção.

Foi, pois, n’esta ultima circumstancia que determinou a publicação do decreto de 13 de marco ultimo.

O digno par a quem responde, labora, como o orador acaba de demonstrar, n’um perfeito equivoco, pois que a lei de 15, dos cereaes, volta a ter execução logo que tenham desapparecido as causas que motivaram a suspensão temporaria do algumas das suas disposições.

(O discurso do sr. ministro será publicado na integra e em appendice, quando s. exa. tenha revisto as respectivas notas tachygraphicas.)

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do parecer n.° 67 relativo ao monopolio dos tabacos

O sr. Presidente: — Passa-se á ordem do dia.

Tem a palavra o digno par o sr. Augusto José da Cunha.

O sr. Augusto José da Cunha: — Vê que o projecto que se discute é o segundo capitulo do plano financeiro do actual sr. ministro da fazenda.

Permitia a camara que o orador diga que, tanto este capitulo como o anterior, não correspondem por fóma alguma ao que o paiz tinha direito a esperar das elevadas faculdades do membro do governo a quem se dirige.

O projecto dos addicionaes de 6 por cento ás contribuições do estado, já sanccionado pela camara, é um expe-

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diente vulgar ao alcance de todas as intelligencias, e. para o apresentar ao parlamento, não teve o sr. ministro necessidade de entregar-se a lucubrações profundas.

Admira-se o orador de que o nobre ministro quizesse entrar na administração do thesouro publico por uma porta tão acanhada e tão estreita.

Quanto ao projecto que está em discussão, já foi classificado pelo seu auctor, como o expediente mais grosseiro de que um estadista podia lançar ralo a fim de obter dinheiro para o thesouro.

O projecto dos 6 por cento addicionaes, produziu no espirito do orador uma impressão desagradavel, porque esperava, e ainda hoje espera, muito mais do grande talento do nobre ministro, mas o actual projecto enche-o de assombro e tristeza por ver que um homem novo nos annos e na carreira politica, estimulado por justissimas aspirações e com um larguissimo horisonte diante de si, não hesita em vir abjurar das suas convicções, advogando e defendendo hoje acaloradamente nas cadeiras do poder, o que com. enthusiasmo e vehemeucia combatia hontem nos bancos, da opposição.

É realmente curioso ver dimanar este projecto da iniciativa de um governo, cujos principaes membros, a começar pelo nobre presidente do conselho, se pronunciaram com tanta acrimonia contra o monopolio dos tabacos.

Sabe o orador que o ministro da fazenda tentou hontem justificar esta contradição, que s. exa. diz apparente, o que o não surprehende, porque tudo se explica ou tudo se sophisma; porem, o certo é que este reviramento de opinião, repetido, j ouço fundamentado e muito rapido, esta incoherencia de todos os dias, esta semceremonia com que os nossos homens publicos vem affirmar hoje, com toda a força da sua convicção, que é preto aquillo que hontem era branco, que uma medida, que classificaram hontem como o expediente mais grosseiro é hoje a concepção mais fina e mais apurada; estas contradições, emfim produzem uma nefasta influencia no sentimento publico e semeiam o indifferentismo e a descrença que são um pessimo symptoma na vida das nações.

Deixemos, diz o orador, as contradições do sr. ministro, que foram hontem justamente apreciadas pelo sr. Thomás Ribeiro em phrases inspiradas por um nobilissimo coração, e tratemos do projecto que está em ordem do dia. Discutirá a questão pelo lado financeiro, mesmo porque é por este lado que o sr. ministro e o illustre relator o encaram e lho attribuem importancia.

Fazendo historia antiga, contemporanea e moderna ácerca do regimen dos tabacos, o parecer exhibe uma rasão unica pela qual a commissão julga que o projecto deve merecer a approvação d’esta camara, e essa rasão é que o monopolio do tabaco dá ao thesouro muito maior receita do que a régie.

O sr. ministro da fazenda, disse hontem aqui uma e muitas vezes, que o monopolio vinha dar ao thesouio réis 4.250:000$000 annuaes e 7.200:000$000 por uma só vez, sem encargo nenhum, emquanto que a régie não tinha ultrapassado uma receita de 3.800:000$000 réis, e acrescentou que em presença da eloquencia d’estes algarismos não podia haver a minima hesitação sobre qual o regimen a adoptar.

Tratará a questão, como já disse, no campo financeiro. Neste campo a questão reduz-se a um simples problema de arithmetica, mas problema que se não enuncia com a singeleza com que o sr. ministro da fazenda hontem o enunciou por mais de uma vez.

S. exa. comparou as cifras, e disse que ellas indicavam claramente o caminho a seguir.

Pois n’este contrato, diz o orador, não ha mais do que aquillo que o sr. ministro nos disse?

Pois por este contrato não se vão dar enormes vantagens ao monopolista, que foram sempre recusadas á régie? Pois não diz este contrato, por exemplo, que o monopolista ha de receber no fim de dezeseis annos o valor de 15 toneladas de tabaco ao preço que marca a cotação d’essa epocha?

Pois isto não modifica sensivelmente o enunciado do problema?

Não dá este contrato ao concessionario a vantagem de augmentar até 20 por cento o preço da veada dos tabacos?

Pois o concessionario não recebe gratuitamente as fabricas, os machinismos e utensilios e todo o tabaco, quer o que esteja em rama, quer o que se encontre em manipulação?

Na opinião do orador deviamos tratar de averiguar se a régie, tendo as vantagens indicadas no projecto em discussão, não produziria tanto como o monopolio.

É com este confronto que a questão deve ser debatida, isto é, devem-se apreciar os algarismos exactos para que se chegue a resultados em tudo conformes á verdade. Em primeiro Jogar não lhe parece que possa tomar-se para base do calculo o rendimento da régie no primeiro anno da sua installação, porque ella teve de luctar com circumstancias, excepcionaes, que certamente se não reproduziriam nos annos subsequentes.

Vem depois a condição 5.ª do contrato que obriga o governo a receber do concessionario, no dia em que findar a concessão, l:000 toneladas de tabaco ao preço corrente d’essa epocha.

Calculando em 3$401 réis o preço do kilogramma de tabaco e addicionando-Jhe os 20 por cento que o concessionario póde augmentar, achamos a cifra de 4$141 réis. Deduzindo desta metade os 15 por cento para commissões aos vendedores, ficam 3$520 réis. Entre estes 3:520, que é o preço por que o kilogramma do tabaco póde ser vendido ao governo e o custo real. ainda numa hypothese desfavoravel, de l$079 réis. vê-se que o concessionario ganha a differença de 2$441 réis em kilogramma, ou seja na totalidade das 1:500 toneladas um lucro de 3 661:000$000 réis, aos quaes devem ser addicionados os 2.700:000$000 réis, quantia em que é computada a differença entre o activo e o passivo no dia em que tiver logar a posse do concessionario.

Da exposição d’estas cifras averigua-se que o concessionario alcançará um lucro de 6.361:000$000 réis.

Ha a ponderar os encargos do concessionario, que são o pagamento de 7.200:000$000 réis, e os 4:250:000$000 réis annuaes, mas apreciando o rendimento da régie, que, aliás, foi escasso pela circunstancia extraordinaria que acompanha sempre o inicio de uma empreza, e tendo em consideração que o consumo tende a augmentar, vê se facilmente que o concessionario fica collocado n’uma posição vantajosa, isto é, que ha de auferir lucros valiosos, que podiam ficar na posse do estado se continuássemos no systema que o projecto em discussão pretende alterar.

O orador quer admittir que o concessionario não onero o custo do tabaco com o maximo dos 20 por cento pelo receio de que a introducção clandestina do genero lhe diminua o lucro; mas poderá augmentar francamente 10 por cento, differença esta que não seduz o contrabandista, ou realisar o acrescimo de uma maneira um tanto insensivel para o consumidor, diminuindo o peso do tabaco vendido, sem temer em caso nenhum que o consumo diminua, pois que nenhum fumista abandonará o habito de fumar pela circumstancia de ter de pagar o tabaco um pouco mais caro.

Se, pois, não ha receio de que o consumo diminua, tirem esta condição do contrato, que talvez o orador o approve.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branca): — Tirando esta condição que está no contrato, v. exa. approva-o?

O Orador: — Dava-lhe a minha approvação se s. exa.

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permittisse que se fizesse esta experiencia do augmento com a régie.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): — Mas s. exa. disse que eliminada esta condição approvava o contrato.

O Orador: — Esta e outras; porque está convencido elle que a régie lucraria muito, caso lhe fosse permittido augmentar em 10 por cento o preço do tabaco.

Se, pois, se addicionar ao eu até actual do tabaco 10 por cento, e se tomarmos em linha de conta a venda das 1:000 toneladas de tabaco ao fim dos dezeseis annos, vemos que o concessionario aufere logo no primeiro anno um lucro de 2:000$000 róis, que é a differença que existe entre a quantia que elle tem de entregar ao estado e os 4.641:000$000 réis que lhe resultam da exploração.

Vê que o sr. ministro da fazenda se sorri a estes calculos, mas se s. exa. os mandar fazer pelos seus empregados achará que são exactos.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): — V. exa. deve fazer-me a justiça de acreditar que eu não redigia um projecto desta ordem sem ter procedido aos convenientes cálculos. De resto o sr. Moraes Carvalho já teve occasião de provar que v. exa. é tão excellente mathematico na sua cadeira de lente, como o é mau nos bancos parlamentares.

O Orador: — Parece lhe que tem mais direito a rir-se dos calculos de s. exa. e dos do sr. Moraes Carvalho que s. exas. a rirem se dos seus.

O rir. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): — É a opinião de v. exa., mas não é a minha.

O Orador: — Não tem a minima duvida em fornecer os seus calculos a quem tenha competencia para os avaliar, porque tem a certeza de que não podem ser justificadamente atacadas as bases d’elles.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): — Nem eu contesto que v. exa. saiba fazer operações

O Orador: — Para fazer uma simples operação arithmetica não é preciso ser um grande mathematico.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): — V. exa. deseja que lhe provem que as bases dos seus calculos estão erradas? N’esse ponto estou de accordo.

O Orador: — Estimará muito ouvir combater as bases que teve a honra de apresentar á camara; isto é, declarar-se-ha satisfeito se alguem lhe provar que o concessionario não póde ganhar pela condição 5.ª 3.661:000$000 réis, alem dos 2.700:000$000 réis em que se fixa a differença entre o activo e o passivo.

Se o sr. ministro lh’o consente, o orador continuará nos seus calculos errados e grosseiros.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): — Peço perdoo, mas eu não empreguei esses adjectivos. Se v. exa. quer applicar esses adjectivos aos seus cálculos, está no seu direito: mas eu não os qualifiquei de grosseiros.

O Orador: — Sabe que um illustre membro da outra casa do parlamento apresentou esta asserção que não foi rebatida pelo sr. ministro.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): — Não disse que os calculos de v. exa. eram grosseiros. Contra essa asserção protesto eu.

O Orador: — Estimará muito que o sr. ministro prove que esses calculos que o orador tem apresentado são inexactos, mas está intimamente convencido de que são verdadeiros, e de que o concessionario, logo no primeiro anno se vê livre dos seus encargos e ganha ainda 2:000$000 réis.

Se o augmento do consumo em cada anno se póde calcular em 2 por cento, temos que o concessionario, mesmo depois de feitas as reducções que o projecto indica, auferirá no fim de dezeseis annos um lucro de réis 5.726:000$000, ou seja uma media annual de 358:000$000 réis, isto na hypothese de que o augmento no preço do tabaco seja só de 10 por cento e de que seja de 1$079 réis o custo fabril de cada kilogramma.

Se. porém, diz o orador, tomarmos por base do calculo uma elevação de preço superior áquelles 10 por conto, e se computarmos com 847 réis o custo fabril de cada kilogramma, cifra esta indicada pelo sr. Oliveira Martins no seu relatorio, os lucros ascenderão a uma somma realmente fabulosa.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): — Com essas supposições, talvez.

O Orador: — Supposições que se hão de realisar.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): — Oxalá que se realisem.

O Orador: — Mas o certo é que vamos entregarão concessionario 5.726:000$000 réis que podiam ficar na posse do estado.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco):— Quod erat demonstrandum.

O Orador: — Exactamente, quod erat demonstrandum.

Pois póde alguem negar o augmento constante do consumo dos tabacos? A verdade é que a proposta que se discute significa um esbanjamento. (Apoiadas )

Temos o caso do fidalgo dissoluto e dissipador que hypotheca as suas propriedades, que compromette o futuro de seus filhos, sem se importar com o dia de amanha, ou sem se importar com que depois d’esse dia venha o diluuio, (Apoiados.)

Pede ao sr. ministro que considere bem o que vae fazer, e que não abandone uma fonte de receita que em todos os paizes e considerada importantissima.

Na Italia em 1876, o regimen do monopolio produziu 76.000:000 de liras e em 1883, seis annos depois, o systema da regie deu ao estado 110.000:000 de liras, o que representa quasi um augmento de 50 por cento.

Todos sabem que a França procedeu a um grande inquerito para saber se convinha ou não mudar o regimen dos tabacos, e d’esse inquerito concluiu que era de toda a conveniencia continuar com a regie embora por um praso limitado, mas a verdade é que este tempo tem sido prorogado, e ainda em 1883 o foi por dez annos, isto é, decidiu-se que o mesmo regimen continue a vigorar até 1893, porque se entendeu que se tratava de uma receita valiosa.

Pois não seria conveniente, diz o orador, continuarmos a ensaiar a regie por mais uns dois annos? De certo que sim, porque o curto praso da experiencia feita não póde conduzir a resultados evidentes.

Comprehende que um governo aggrave os impostos, mas não para os metter na bolsa de qualquer argentario, ou para realisar despezas inuteis, como monumentos, obras faustosas e organisação de musicas regimentaes.

Não contesta a utilidade da creação do ministerio de instrucção publica, mas não lhe parece que seja ocasião azada pare um tal melhoramento aquella em que se decretam novas tributações.

O orador apresenta ainda algumas considerações e conclue dizendo que está prompto a retirar quaesquer palavra que porventura tenha podido magoar o sr. ministro da fazenda, com cuja amisade se honra, e a quem pede em nome da mesma amisade, que não commetta a imprudencia de tirar ao estado um rendimento, que é já hoje consideravel, e que tende a augmentar de anno para anno.

O orador foi muito cumprimentado.

(O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, guando s. exa. haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Pinto de Magalhães: — Sr. presidente, como relator da commissão que examinou o projecto em discussão, cabe-me o espinhoso encargo de responder ao discuro do illustre mathematico e digno par. o sr. Augusto José da Cunha.

Sr. presidente, farei toda a diligencia por responder só

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á parte financeira do discurso de s. exa.; não acompanharei o digno par nas considerações politicas que apresentou, deixando esse encargo ao governo.

Com effeito, s. exa., a par da parte financeira do projecto, tratou de variadissimos assumptos, e muitos a que eu de certo não poderia responder, porque de todo os desconheço, como por exemplo, quanto custa a musica ou banda da guarda municipal de Lisboa, assumpto que realmente não vem muito a proposito, tratando-se do monopolio dos tabacos.

Porém, antes de mais especialmente responder ás considerações e calculos de s. exa., permitta-mo v. exa. e a camara que eu diga alguma cousa em defeza do relatorio da commissão, visto que elle tambem, foi atacado pelo digno par a quem estou respondendo.

Quem me diria, sr. presidente, que, quando em 1804, coutando eu já oito annos de vida publica na repartição onde hoje ainda me conservo, que tanto exultei pelo acabamento do monopolio dos tabacos, então chamado contrato do tabaco, e pelo estabelecimento de liberdade de industria, actos que muito honravam a iniciativa do illustre estadista e digno par, o sr. condo de Valbom, e por cerco é uma das paginas mais gloriosas da sua larga carreira publica; quem me diria, repito, sr. presidente, que vinte e seis annos depois me havia de caber o encargo de defender o monopolio, e que o faria persuadido em minha con sciencia que presto um bom serviço á administração do es tado e ao restabelecimento das finanças, remediando se, tanto quanto é possivel, a situação e as despezas produzidas pelo systema actual!

O que o governo desejava, como hontem o manifestou á camara o illustre ministro da fazenda, era o restabelecimento do antigo systema, a liberdade de industria; a commissão, como referiu no seu relatorio, desejava o mesmo.

S. exa. o ministro, hontem, disse aqui com a clareza e nitidez com que expressa sempre as suas opiniões, os prin cipaes motivos por que não tinha tomado esse caminho.

A commissão igualmente reconheceu que, depois de ter creado um encargo para o estado equivalente á quantia de 8.447:000$000 réis despendidos por causa do estabelecimento do exclusivo do estado, e não 7.200:000$000 réis como se tem referido; pois a esta ultima quantia ha aaddicionar 794:000$000 réis de letras que ficaram por pagar do systema do gremio, 406:000$000 réis que se pagaram aos antigos contratadores do tabaco e 47:000$000 réis de indemnisações ás fabricas, depois de creados encargos tão onerosos, e se ter creado um regimen pelo qual os operarios ficaram sendo funccionarios do estado com direito a vencimentos vitalicios, foram ainda augmentados os salarios a grande numero, diminuidas as horas de trabalho, sendo finalmente os operarios em numero tal que excedem as necessidades de fabricação, toda manual, em tal quantidade, que é preciso dispensar em cada dia 1:050 garantindo-lhes dois terços dos seus salarios, habituando-os assim á ociosidade.

Depois de estabelecido todo este systema, mais ou menos anarchico e inconveniente, pelo que diz respeito á parte industrial e economica, não se poderá de certo, sem grandissimo sacrificio para o thesouro, passar para o systema de liberdade industrial,

E como sair da difficuldade?

Depois, sendo certo que, para o acrescentamento das receitas do estado não tem contribuido o monopolio dirigido pelo estado, como ao diante provarei, e antes pelo contrario a receita desta origem diminuiu sensivelmente produzindo menos que no tempo em que a industria da fabricação dos tabacos era livre, era preciso prover do remedio a este facto importantissimo, quando pelo estado actual da fazenda publica era. urgente avolumar os seus redditos, rasão ainda que decidiu a commissão a condemnar o systema actual.

Contestados os factos referidos, ainda a commissão não concorda com o systema actualmente estabelecido, que entende não é funcção do estado o dirigir qualquer industria, devendo deixar livre a sua exploração á actividade dos cidadãos.

De facto, o estado, quando industrial, produz sempre mais caro e peior que a industria particular, e isto por muitas rasões que são obvias.

Quem desconhece que quando o estado explora qualquer industria, tudo concorre para o que acabei de affirmar, numeroso pessoal de empregados, exigencia de menor esforço de trabalho, processos complicados de burocracia, emfim, menor interesse pessoal e directo. Interesse pessoal que nenhum sequer iguala e que faz com que seja o particular mais capaz do que o estado de fazer prosperar a industria que dirige. (Apoiados.)

Assim é, sr. presidente, e visto que o digno par se referiu á régie franceza, dir-lhe-hei que tal systema não se póde comparar ao exclusivo do estado, que existe entre nós, porque aqui temos só o exclusivo da fabricação, emquanto que em França a régie tem o monopolio da fabricação e o da venda, sendo n’este ultimo, que tira maior proveito.

O sr. Gusmão: — Então, tome o governo o monopolio da venda.

O Orador: — Por que o não fez o partido do digno par?

Ora, os homens que apoiam em França o monopolio do estado, dizem que a unica vantagem do systema está em o estado, como grande capitalista poder melhor que qualquer em preza particular comprar as machinas e utensilios mais proprios para se obter uma producção mais perfeita e em condições de grande barateza e economia.

Mas d’esta vantagem unica, concedida ao estado, como explorador desta industria, fica elle privado em Portugal, o que se prova lendo no relatorio do zeloso administrador dos tabacos o sr. Oliveira Martins:

«Cá, com 5:226 operarios e jornaleiros ou mais do duplo necessario para o trabalho, sendo manual.»

Ora, sendo assim, como é que o estado poderia gosar a vantagem de adquirir machinismo para produzir mais e mais barato?

O sr. Gusmão: — N’esse caso, o monopolista terá de despedir os operarios.

Peço a palavra.

O Orador: — Tem a administração do estado de se cingir ao trabalho manual ainda por muito tempo, pois sendo o pessoal operario reduzido á metade, isto é, tendo desaparecido 2:613 operarios, ainda a industria tinha de servir-se dos processos manuaes, que produzem caro e menos perfeitamente.

Para condemnar o monopolio do estado não tinha tenção de se servir de argumentos da auctoridade, e da auctoridade incontestavel, para todos e muito mais para o digno par o sr. Gusmão, que me está interrompendo. Não resiste porem a citar a opinião de um eminente estadista, por quem professa a maior consideração, o sr. conde de Valbom, que no relatorio que precedeu a sua proposta disse:

«A régie, para quem reflectir maduramente, é o systema menos admissivel entre nós, a que nos proporcionaria para B, maior decepção pelos seus resultados nocivos ao publico e ao estado, não teria nem as excellencias da liberdade, nem os proveitos do monopolio.»

Ora veja a camara, em 1864 já s. exa. previa o que havia de acontecer se creassemos a régie, essa decepção, que o digno par previa, deu-se, e por isso estamos agora a defender o monopolio particular. Dizia s. exa. isto com que eu concordo absolutamente, e n’essa epocha firme em condemnar o systema actual. S. exa. acrescentava: pretendendo provar a dificuldade, que havia em se estabelecer a régie.

«Duvidava passar do monopolio á régie, porque o esta-

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do teria de se sujeitar ao sacrificio do emprego do capital de 600:000$000 réis, para a acquisição da fabrica, e réis 400:000$000 para a administração, fiscalização, venda, etc.»

S. exa. oppunha este argumento, convencido de que toda a gente, diante desta somma de 1.000:000$000 réis, nem poderia ouvir fallar em administração por conta do estado. E no emtanto, os amigos de s. exa., entre os quaes se conta o digno par a quem estou respondendo, não tiveram receio algum nem duvidas em empregar réis 8.447:000$000, para termos esta decepção!

(Interrupção do sr. Vasconcellos Gusmão.)

Mas ha mais, a commissão d’esta camara d’essa epocha, toda composta de cavalheiros respeitabilissimos, commissão numerosa, porque não só a de fazenda foi ouvida, mas tambem a de administração, disse:

«O governo rejeitou absolutamente o pensamento de que a administração lhe fosse confiada, e as commissões igualmente, porque sabe que resultaria do governo ir tomar na acção publica uma parte exagerada, que junta á ceutralisação que já existe, faria perder o equilibrio de legitimas influencias que o governo e a opinião devem ter nos paizes livres. Ainda reconheceram as commissões que, como meio de administração fiscal, este era o péssimo de todos os systemas.»

Já o digno par vê que as opiniões dos seus partidarios eram então positivamente contra este svstema.

O que pretendeu o governo transacto, vindo em 1887 á camara propor o gremio livre, caso não vingasse o gremio livre passar para o monopolio, como este que discutimos, e só em ultimo caso a régie, ou o monopolio por conta do estado, e em 1888, rejeitando o que propozera, apresentando o monopolio por conta do estado? O que pretendeu foi unica e simplesmente avolumar a receita publica; foi unica e exclusivamente tirar d’esta fonte maior receita, allegando que as fabricas contituirão um monopolio pratico.

Acreditando em que foi unica e exclusivamente esse o pensamento d’esse gabinete; e que a medida não obedeceria a intuitos politicos, pergunto agora: que conseguiu?

Conseguiu avolumar ou fazer crescer as receitas publicas como desejava?

Affirmo que não.

E que declarou o governo transacto, que faria, caso a régie não produzisse augmento na receita dos tabacos?

Eu vou dizer á camara o que elle dizia.

Na sessão de 12 de maio de 1888 dizia o governo, em resposta áquelles que duvidavam da proficuidade do systema da régie, no sentido de produzir augmento de receita:

«Mas, dada a hypothese de não poder o estado auferir por meio da régie os lucros que imaginava, adverte que era tal caso era-lhe facultado fazer o mesmo que a Hespanha; a todo o tempo, pois, tinha uma alternativa a que soccorrer-se.»

Oh, senhores! E podem agora criticar por que nos soccorremos exactamente do mesmo expediente que s. exas. declararam que adoptariam?

Provado que a régie ou administração por conta do estado não só não augmentou a receita, mas que a diminuiu por tal modo que tem prejudicado em muito o thesouro, não lhes é licito criticar o governo, por lançar mão do mesmo meio que declaravam adoptariam, da alternativa a que se soccorriam.

Assim, para que os dignos pares que fazem opposição ao projecto o approvem, o que é necessario é provar que o systema actual tem sido prejudicial para a receita do estado, é o que vou passar a provar, respondendo ao digno par, o sr. Cunha, não com dados hypotheticos, mas com os dados officiaes.

Mas os dados officiaes que possuo, em nada combinara com áquelles calculos que s. exa. apresentou.

Pelo que diz respeito ao anno de 1889-1890, a administração da régie, em officio que dirigiu ao governo, diz não poder mandar esclarecimentos, porque não estando ainda ultimada a escripturação do anno, e depois d’ella ultimada, ainda o conselho de administração teria de determinar a fórma do encerramento d’essas contas.

Isto dizia a administração da régie em officio que tem a data de 26 de julho proximo passado.

Assim, em relação ao anno de 1888 a 1889 e ao de 1889 a 1890, só temos como elementos das vendas realisadas, rendimentos brutos; no emtanto o governo no sentido de averiguar com dados mais positivos, encarregou um funccionario da sua confiança de ír obter na administração da régie, e em vista da sua escripturação, qual o rendimento liquido do primeiro semestre do anno de 1890; temos, pois, contastado officialmente um dado importante ao qual adiante me referirei.

Vejâmos primeiro as contas do rendimento bruto, e desde já declaro que os calculos que apresento não são hypotheticos.

Pelo que diz respeito aos annos de 1888 a 1889 e o de 1889 a 1890, comparado o rendimento bruto pelas vendas realisadas, temos:

1888-1889 – Toneladas 1889-1890 – Toneladas A mais em 1889-1890 - Toneladas
Venda ordinaria 1:808,8 1:755,0 22,3
Venda official » 75,6 22,3
Venda na zona 35.6 86,3 50,7
Venda nos Açores 8,5 17,7 9,2
Venda no ultramar 20,2 66,0 45,8
1:872,6 2:0000,6 128,0

Recambios 30,2 13,4 16,8
Total 1:842,4 1:987,2 144,8

A equivalencia era dinheiro d’estas quantidades dào, segundo os preços medios approvados pela administração, a seguinte:

Toneladas Contos de reis
Anno de 1888 a 1889 1:842,4 = 6:358
Anno de 1889 a 1890 1:987,2 = 6:610
A mais em 1889 a 1890 252

Antes, porém, de considerar, se estes 252 contos, em vez de augmento e lucros para o estado, se deve reputar, ao contrario, prejuizo, convem desde já advertir, que em presença da asserção constante do relatorio do sr. administrador geral dos tabacos, em que se affirma que o anno de 1889 a 1890, alem ide ser o de aprendizagem e experiencias, teve de prejuizo causado pelo excessivo preço, por que foram adquiridas para estado, o tabaco em rama e o manipulado, quantia não inferior a 400 ou 500 contos de réis, claro está que esta quantia devia ser addicionada ao rendimento do anno de 1888 a 1889, e sendo assim, o de 1889 a 1890 teria dado grande prejuizo.

Não tenho, porém, em linha de conta este facto, e vejamos agora de que resultaram os argumentos que se deram no anno de 1889 a 1890, e para este ponto peço a attenção da comara.

Estas questões financeiras, em que é necessario recorrer a algarismos e citar factos muito especiaes, são enfadonhas; mas eu não tenho outra fórma para poder evidenciar quanto o monopolio administrado pelo estado tem sido prejudicial ao thesouro, e assim rebater os argumentos do digno par a quem respondo.

Assim, primeiro, vimos que na zona a venda no anno de 1889 a 1890 foi a mais 50,7 toneladas.

A relação em que o consumo na zona está para a sua

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população, dá que o consumo por habitante foi de 2,152 grammas por individuo, a capitação no resto do paiz é. de 450 por habitante, isto é, a da zona quasi cinco vezes mais.

Escuso de tirar a conclusão do que acabo de referir, por isso que o tabaco na zona é vendido por preço inferior a menos de metade d’aquelle por que se vende no resto do paiz, a differença que resulta de 2,152 a 450 grammas representa o descaminho que da zona se faz do tabaco para o interior do paiz.

Este facto está ainda contastado pelas numerosas apprehensões que se têem realisado de tabacos em descaminho, saídos da zona.

Eis o que vale o augmento d’esta proveniencia; os resultados, em vez de positivos para as receitas do thesouro, são negativos e o prejuizo produzido importante.

Para não continuar este estado prejudicial já o sr. ministro acabou com a zona fiscal da raia do Guadiana.

Custa a guardar a raia do contrabando estranho, quanto mais da que no interior se podia realisar de um ponto do paiz para o outro!

Passo agora a considerar que importancia teve a differença que houve na venda para as ilhas, e que referi foi de mais 9,2 toneladas no anno de 1880-1890.

Alem das promessas feitas pelo governo transacto perante as camarás, de que nunca affrontaria a industria açoriana, com os tabacos do continente, é preciso referir que por despacho especial de 10 de setembro de 1888 se ordenou que o tabaco chamado Breva e que e manipulado, tabaco que tem grande consumo nos Açores, fosse importado pela administração dos tabacos livre de direitos, emquanto que os particulares, quando o despachavam, continuavam a pagar 4$000 réis por cada kilogramma. Esta excepção e lavor concedido á régie, foi para que esta importando livre de direitos este tabaco manipulado, o mandasse para os Açores, fazendo concorrencia nociva á industria d’aquellas ilhas, com grave prejuizo das receitas aduaneiras, porque sendo expresso no § 1.° do artigo 1.° da lei de 18 de agosto de 1887 que o tabaco manipulado, que do continente entrar nas ilhas e reciprocamente, pague direitos, como se fosse estrangeiro, do tabaco enviado pela régie para as ilhas não restituindo os direitos á régie.

Quo representa assim aquelle proposto augmento, desfalque no rendimento das alfandegas dos Açores, igualmente diminuição no rendimento da alfandega de Lisboa, ataque á industria fabril dos tabacos nas ilhas e prejuizo para os importadores de tabacos no continente.

Quantas irregularidades, que não podem ser contestadas, só para produzir augmento de receita da régie, para elle sedar, resultou diminuição n’outras receitas do estado: quer dizer, foram augmentos artificiaes.

Assim tambem o augmento de 45,2 toneladas para o ultramar, o que significa e como se realisou.

A régie, importando folha de tabaco, picava-o e enviava-o para o ultramar; assim consegue que este producto tenha diminuição de direitos nas alfandegas das nossas possessões, de 30 por cento ou 50 por cento, conforme os pontos a que e destinado, favor este concedido aos productos da metropole.

O augmento de receita da régie n’esta parte, significa a diminuição do rendimento das nossas alfandegas ultramarinas.

Destruido assim todo o augmento de receita protegido no anno de 1889 a 1890, com excepção das 22 toneladas resultantes da venda official, o que corresponde em numerario a 62:000$000 réis, é preciso que diga o que é esta venda official.

Chama assim a régie a venda que é realisada pelas auctoridades da fazenda encarregada da collocação dos productos da régie nos differentes concelhos; ora, das 22 toneladas a que me referi, póde certa porção existir ainda em ser e por vender em poder d’esses intermediarios; mas suppondo que todo foi vendido, temos que 62:000$000 réis em relação a 6.610:000$000 réis representa augmento inferior a 1 por cento.

Durante o regimen da liberdade de 1865 a 1886 o augmento do consumo de anno para anno é representado pela percentagem de 2,8, já se reconhece que augmento negativo houve depois de estabelecido o regimen actual.

Passo agora a referir qual a receita liquida da régie no primeiro semestre de 1890, conforme se deduz dos documentos officiaes, e não de hypotheses mais ou menos perfeitamente architectadas. Dados, como disse, apurados em vista do balanço dado por empregado nomeado pelo governo, e em vista da escripturação respectiva.

A venda no primeiro semestre do 1890 foi de 1:001 toneladas ao preço medio de 3$326 réis, o que perfaz a quantia de 8.329:900$000 réis. Tirando d’esta somma a despeza com a manipulação e gastos, ou 1.534:000$000 réis ficam liquidos 1.755:90$000 réis. Ha a juntar a esta soca ma o producto de rendas de predios alugados pela administração geral dos tabacos ou 1:700$000 réis.

Temos, pois, que a receita liquida no primeiro semestre do anno de 1890, foi de 1.797:600$000 réis; computando que o secundo semestre dará tanto como o primeiro é de 3.595:200$000 réis a receita liquida da régie no anno de 1890.

Será esta a receita da régie em 1890, e note-se que ou não menciono aqui uns certos encargos que ainda poderão fazer diminuir muito a receita do segundo semestre.

(Interrupção que não se ouviu.)

Eu creio que não dará o mesmo no segundo semestre, peles seguintes motivos.

Porque a zona acabou e assim o excesso de venda que ali se dava, e ainda a. diminuição de receita, que póde resultar das commissões de venda, que foram augmentadas pela administração da régie, exactamente depois do primeiro semestre.

Ora, realmente passar o estado a receber só réis 3.355:200$000 quando o rendimento era 1887, estando em vigor o regimen da liberdade, foi de 3.887:000$000 réis, isto é, agora menos 532:000$000 réis, e não quero referir-me ao rendimento que o governo transacto assegurava logo no primeiro anno, como consta do relatorio de fazenda de 1888, estava calculado em 4.810:000$000 réis ou mais 1.455:000$000 réis do que aquillo que dará no segundo anno da régie.

Sendo d’este modo a diminuição tão importante do rendimento dos tabacos, não me parece este o melhor meio de equilibrarmos as nossas finanças.

Quanto a mim a experiencia da régie está feita, experiencia que foi sufficientemente cara.

Sendo approvado o projecto em discussão não ha a menor duvida de que o governo recebe annualmente réis 4.250:000$000 e mais 7.200.000$000 réis, metade dos quaes na occasião da assignatura do contrato e a outra metade seis mezes depois; cessando por este facto o encargo para o estado de 432:000$000 réis annuaes por setenta e cinco annos; logo em vez de 3.355:000$000 réis, quero mesmo de 3.800:000$000 réis, para dar toda a margem a favor dos que impugnam o projecto, receberá logo o thesouro 4.250.000$000 réis, mais 432:000$000 réis, isto é, em cada anno 4.682:000$000 réis, mais 882:000$000 réis;, isto na hypothese do monopolio ser dado pelo minimo, e do thesouro não ter partilha nos lucros. Esta é a defeza do projecto.

Sr. presidente, está a hora de fechar a sessão a soar, eu não quero de modo algum levar a palavra, como é costume dizer-se, para casa.

Defendi o parecer da com missão, e disse em resposta ao digno par que me precedeu, e para oppor aos seus calculo os que se derivam de documentos officiaes que serviram para o estudo da questão por parte do governo e da commissão.

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Agradeço á camara a attenção que me dispensou e peço desculpa do tempo que lhe tomei; como hei de no decorrer da discussão, porventura de usar mais vezes da palavra, como relator da commissão, então responderei a mais alguns dos argumentos apresentados pelo digno par o sr. Cunha, o que por falta de tempo agora não faço.

Tenho dito.

O sr. Presidente: — Como alguns dignos pares pediram a palavra ao mesmo tempo, vou ler a inscripção para saber se s. exas. se conformara com ella.

(Leu.)

O sr. Vaz Preto: — Sr. presidente, como tenho hoje a satisfação de ver aqui o sr. ministro dos negocios estrangeiros, aproveito o ensejo para pedir a s. exa. que informe a camara ácerca dos boatos que têem corrido e correm, referentes ao procedimento do tenente Coutinho no Chire.

O sr. presidente do conselho ainda ha pouco disso ser verdade correrem esses boates e o ter recebido um telegramma da Reuter, mas que cousa alguma podia affirmar de positivo porque ainda não tinha fallado com os seus collegas- dos estrangeiros e da marinha.

Em vista d’estas declarações, como o sr. ministro dos estrangeiros está presente, peco-lhe que esclareça a camara, dando-lhe parte do que official e extra-officialmente sabe, e peço a v. exa., sr. presidente, que me referve a palavra para depois das explicações do sr. ministro.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Hintze Ribeiro): — Diz que effectivamente chegaram ao conhecimento do governo noticias, que dizem que uma força portugueza, sob o commando do tenente Azevedo Coutinho, tinha apprehendido com violencia, ao norte do Ruo, um navio inglez; que a tripulação d’esse navio tinha sido enviada debaixo do prisão para Quelimaue,e que a referida força fizera uma incursão no territorio contestado.

Como o digno par sabe, o governo portuguez assumiu em 11 de janeiro o compromisso de fazer retirar as suas forcas para aquem da confluencia do Ruo com o Chire.

Para a execução d’este compromisso deu em diferentes occasiões ordens expressas e terminantes ás suas auctoridades de Africa, para que não passassem alem da confluencia do Ruo, para que não entrassem nos territorios em litigio, e para que se abstivessem de praticar qualquer acto de violencia para com subditos estrangeiros, que podesse embaraçar ou prejudicar a acção diplomatica havida entre os dois governos para a resolução das questões pendentes.

Sendo estas as ordens do governo e as suas instrucções reiteradas, é evidente que se alguma auctoridade subordinada ao governo as infringiu, assumiu por esse facto uma grave responsabilidade. (Apoiados.)

Estando pendentes negociações com o governo inglez, cuja solução o orador espera que tenha logar dentro de pouco tempo, será para sentir que se confirmem as noticias a que vem de referir-se.

O governo ordenou ao governador geral de Moçambique que fosse a Quelimane inquirir dos factos, e aguarda as respectivas informações.

Seria para lastimar, repete, que essas noticias se confirmem; mas a apurar-se que suo verdadeiras, o facto a que ellas se referem é grave e a responsabilidade tornar-se-ha definitiva a quem ella pertença; pois que o governo precisa a sua acção desembaraçada para levar a bom termo as negociações em que anda empenhado.

(O discurso do sr. ministro será publicado na integra, e em appendice, quando s. exa. tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Vaz Preto: — Ponhamos a questão como ella é. O que precisâmos saber é se o tenente Coutinho cumpriu ou transgridiu as ordens do governo.

A camara acaba de ouvir o sr. ministro. S. exa. declarou que o governo tinha dado ordens terminantes ás suas auctoridades no Chire para que conservassem o statu quo ante, isto é, que não passassem o Ruo, e não aggredissem.

Portanto, o que precisâmos saber é se o tenente Coutinho aggrediu ou foi aggredido. O que precisámos saber é se o tenente Coutinho foi aggredido em territorio portuguez, e se os inglezes passaram o Ruo para o atacarem. Se elle então repelliu a força com a força, e passou á sua vez o Ruo, fez o que devia, cumpriu o seu dever o brioso official portuguez, e eu, em vez de o censurar, louvo-o por manter altiva e respeitada a bandeira portugueza.

Sc porém o tenente Coutinho se deixou arrastar por impetos de patriotismo, e menos pensadamente passou o Ruo, e aprisionou a tripulação do vapor inglez, n’esse caso, posto que sejam nobres e elevadas as suas intenções, teem verdadeira responsabilidade.

Sr. presidente. Sem se saber clara e precisamente o que se passou, e como os factos se deram, o governo nada póde fazer. E é inconveniente que proceda.

É necessario conhecer bem minuciosamente os acontecimentos, para se poder tornar effectiva a responsabilidade a quem a tiver. Já que Cotou com a palavra, a proposito dos acontecimentos do Chire ser-me-ha licito fazer nesta occasião uma pergunta ao br. ministro dos estrangeiros.

Eu desejava saber se o governo obteve uma reparação ou satisfação completa por parte da Inglaterra na reclamação dos dois sipaes fuzilados. E desejava tambem saber se o sr. ministro que se apresenta tão presuroso para dar satisfação á Inglaterra de factos que não conhece, tem desenvolvido o mesmo zêlo e fervor para obter da Inglaterra uma satisfação de factos bem conhecidos, que nos é devida pelos principies humanitarios e pelo direito das gentes.

E possivel, provavel até que o tenente Coutinho, provocado, aggredido, e recordando-se com horror do fuzilamento brutal e barbaro dos sipaes passasse o Ruo e obtivesse o desaggravo que o illustre ministro dos estrangeiros tinha obrigação de obter. Se assim o fez cumpriu o seu dever desaggravando a honra e dignidade de Portugal. E esta a minha opinião.

Entendo que é mais honroso morrermos esmagados pela força, do que servil, e humilhantemente comprazer-nos com os caprichos aviltantes e estorsões ignominosas da Ingla-glaterra.

Mande o governo immediatamente syndicar, conhecer dos factos, e só depois de saber como elles se passaram poderá elogiar ou censurar o procedimento do tenente Coutinho. Antes d’isso não. Todo o seu procedimento será leviano e bajulador.

Lembre-se que pediu explicações ao governo inglez do fuzilamento dos cipaios, e que de lá da Inglaterra lord Salisbury lhe respondeu que nada sabia!!

Até hoje nada soube aquelle lord, e nada sabe o governo inglez! O sr. ministro dos estrangeiros contenta-se com esta evasiva, e parece querer mostrar que tambem nada sabe!!

Se o governo inglez nada sabe ou quer saber dos cipaios fuzilados, tambem nada nós devemos querer saber da tripulação aprisionada.

Responda, pois, o sr. ministro a lord Salisbury como elle lhe respondeu. Pelo mesmo caso que se faz a pergunta se dá a resposta.

Em resumo. O governo deu ordens para se conservar e respeitar o statu que ante. Para conservar essa situação era necessario que as auctoridades portuguezas e inglezas estivessem de accordo no cumprimento das ordens dos seus governos.

Se não cumpriram as ordens, o accordo rompeu-se. O statu que ante foi violado e rompido. Dado, pois, este acontecimento é nesessario saber quem teve a culpa, e quem é o responsavel. Emquanto não se conhecerem os factos todo o procedimento do governo será precipitado e leviano.

Tenho dito.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Hin-

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782 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

tze Ribeiro): — Crê ter dito ao digno par que o governo mandou proceder a averiguações. Não se torna effectiva a responsabilidade a ninguem sem que haja perfeito conhecimento dos factos. (Apoiados.)

O que póde dizer ao digno par é que o governo trata de averiguar, e procederá em harmonia com essas averiguações.

(O discurso do sr. ministro será publicado na integra, e em appendice; quando s. exa. tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Vaz Preto: — Sr. presidente, a questão reduz-se a pouco como já disse. Reduz-se simplesmente a saber se o tenente Coutinho foi atacado, aggredido ou provocado, ou se foi elle que atacou aggrediu ou provocou.

Se o tenente Coutinho ou as auctoridades portuguezas foram aggredidas, fizeram muito bem em repellir a aggressão pela força. Cumpriram o seu dever.

Queria talvez o sr. ministro que se entregassem de braços cruzados e manietados á brutalidade e cubica dos inglezes? Isso seria demasiada abnegação evangelica!

Se, porém, não foram aggredidas, se foram ellas que provocaram, n’esse caso são responsaveis pelos seus actos, e ao governo cumpre-lhe proceder como for de justiça.

Sr. presidente, posto de parte este incidente, eu desejava, esperava, e n’este ponto insisto, que o sr. ministro dos negocios estrangeiros dissesse á camara qual tinha sido a reparação dada pela Inglaterra relativamente ao fuzilamento dos dois cipaes.

A este respeito s. exa. guardou completo silencio; nem uma unica palavra nos disse! Pois é necessario que falle e que se explique.

É necessario, sr. presidente, que a Europa conheça o procedimento brutal e despotico da Inglaterra, para que não se repitam factos iguaes a este a que me referi.

Nóá, apesar de pequenos, não devemos consentir, sem um solemne protesto, que as grandes potencias nos esmaguem e deixem de respeitar os nossos direitos.

A Inglaterra que se dizia nossa antiga a fiel alliada, em logar de nos dar a força, que tinhamos direito de obter della não tem feito outra cousa mais do que abusar da sua fé mentida amisade para nos explorar em seu proveito.

As suas allianças têem-lhe servido para se ir apossando das nossas melhores possessões na Asia e agora na Africa, e não descansará emquanto não nos arrancar a camisa do corpo.

É preciso que se diga isto bem alto, para que todos fiquem sabendo qual tem sido e continua a ser o procedimento da Inglaterra para com Portugal.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Hintze Ribeiro): — O governo, repete mais uma vez, só procederá depois de uma severa averiguação dos factos.

Referiu-se o digno par a uma noticia vinda de Moçambique, relativa á morte de dois sipaes.

A este respeito tem a dizer que o governo inglez não confirmou aquella noticia.

(O discurso do sr. ministro será publicado na integra e em appendice a esta sessão quando s. exa. o restituir.)

O sr. Cypriano Jardim: — Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra que approva o projecto de lei n.° 100, vindo da outra camara.

Foi a imprimir.

O sr. Presidente: — A primeira sessão terá logar na segunda feira 4, e a ordem do dia a continuação da que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e dez minutos da tarda.

Dignos pares presentes na sessão de 2 de agosto de 1890

Exmos. srs.: Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel, Antonio José do Barros e Sá; Marquez de Vallada; Condes de Alte, da Arriaga, d’Avila, de Carnide, da Folgosa, de Gouveia, de Lagoaça, de Thomar, de Valbom; Viscondes de Alemquer, da Azarujinha, de Paço de Arcos, de Soares Franco, de Villa Mendo; Moraes Carvalho, Sousa e Silva, Sá Brandão, Antonio J. Teixeira, Serpa Pimentel, Pinto de Magalhães, Costa Lobo, Cau da Costa, Ferreira Novaes, Augusto Cunha, Neves Carneiro, Bernardino Machado, Bernardo de Serpa, Cypriano Jardim, Firmino João Lopes, Margiochi, Barros Gomes, Jeronymo Pimentel, Baima de Bastos, Alves de Sá, Calça e Pina, Coelho de Carvalho. Gusmão, Gama, Bandeira Coelho, Baptista de Andrade, José Luciano de Castro, Mello Gouveia, Sá Carneiro, Mexia Salema, Bocage, Luiz de Lencastre, Rebello da Silva, Hintze Ribeiro, Camara Leme, Pessoa de Amorim Vaz Preto, Marçal Pacheco, Franzini, Cunha Monteiro, Placido de Abreu, Rodrigo Pequito, Thomás Ribeiro.

O redactor= Carrilho Garcia.

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