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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 5 DE AGOSTO.

PRESIDENCIA DO EXMO. SR. VISCONDE DE LABORIM,

VICE-PRESIDENTE.

Secretarios, os Srs. Conde de Mello

Conde de Peniche.

(Assistiram desde o começo da sessão os Srs. Ministros da Marinha e Obras Publicas.)

As duas horas e meia da tarde, estando reunido numero legal, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da precedente sessão que se julgou approvada, por não haver reclamação em contrario.

Deu-se conta da seguinte correspondencia: Um officio do Ministerio da Justiça remettendo 60 exemplares das contas do mesmo Ministerio, da gerencia de 1856 a 1857, e do exercicio de 1855 a 1856.

Mandaram-se distribuir.

—da Camara dos Srs. Deputados enviando uma proposta de lei, sobre serem elevados os vencimentos de alguns empregados da Universidade de Coimbra.

À commissão de administração publica.

—da mesma Camara, remettendo uma proposta de lei, para serem elevados os vencimentos dos archeiros da Universidade de Coimbra.

Á commissão de fazenda.

—da mesma Camara, enviando uma proposta de lei, sobre serem elevados os ordenados dos dois officiaes da bibliotheca da Universidade de Coimbra.

A commissão de fazenda.

—da mesma Camara, enviando uma proposta de lei, sobre abonar-se mais 50 por cento aos officiaes das guarnições dos navios de guerra empregados nos cruzeiros da costa d'Africa. — Á commissão de marinha.

—da mesma Camara, remettendo uma proposição de lei, sobre a fixação da força de mar para o anno economico de 1858 a 1859.

À commissão de marinha.

—da mesma Camara, remettendo uma proposta de lei, sobre ser convertido em lei o Decreto de 15 de Maio de 1858.

A commissão do ultramar.

—da mesma Camara, mandando uma proposta de lei, sobre ser o Governo auctorisado a conceder o subsidio animal de 90$000 réis ao Collegio das recolhidas de Nossa Senhora do Carmo em Villa Viçosa.

A commissão de fazenda.

—da mesma Camara acompanhando uma proposta de lei, sobre ser concedido á Camara municipal da Figueira um armazem pertencente á fazenda nacional.

A commissão de fazenda.

O Sr. C. de Linhares—Sr. Presidente, achando-se hoje reunida esta Camara para discutir um projecto importante, por isso que diz respeito a um novo imposto; não é minha intenção desviar por muito tempo a attenção de VV. EE. deste para outro objecto. Pedi a palavra para enviar para a mesa um requerimento e uma proposta, que não é mais do que a conclusão natural do requerimento que vou lêr (leu).

Não sei, Sr. Presidente, se a auctorisação que concede ao Sr. Ministro a faculdade de reformar as repartições da marinha já foi remettida da Camara dos Srs. Deputados para esta; mas, se não foi, é natural que brevemente seja para aqui enviada, e discutida. Poucos mezes (apenas dois) devem mediar entre esta e a proxima sessão legislativa: estou pois certo que o Sr. Ministro da Marinha, pedindo similhante auctorisação, com tanta impaciencia que nem póde esperar os mencionados dois mezes, tem promptos, e até classificados todos os trabalhos preparatorios necessarios, indispensaveis para tão grave refórma (pois que a auctorisação é geral para reformar todas as repartições da marinha); já se entende que além disto S. Ex.ª tem de certo ideias suas, profundamente meditadas, para levar a Um feliz resultado um complexo de medidas que formam o novo systema de refórma da marinha portugueza.

Está pois, Sr. Presidente, a minha consciencia no mais perfeito descanço em quanto a este meu requerimento não demorar por fórma alguma o bom andamento e rapidez dos negocios da marinha, pois devo suppôr que os trabalhos que hoje peço, e que certamente serviram de base á illustrada opinião do Sr. Ministro, por elle estudados, modificados e classificados, formam a base da projectada refórma, e podem, sem algum inconveniente, ser remettidos para esta casa, afim de darem aos Dignos Pares uma idéa do zêlo que existe na realidade em fazer boas e uteis reformas. Entende-se sem que eu o diga, Sr. Presidente, que não quero saber os segredos, ou mesmo a chave do systema de S. Ex.ª, peço simplesmente os trabalhos, aos quaes necessariamente se procedeu em vespora de uma refórma geral; repito, refórma geral de todas as repartições da marinha. Sem entender eu que haja vantagem em conservar mysterioso o systema do Sr. Ministro, admitto que seja possivel, mas unicamente naquillo que é propriamente propriedade do homem, isto é, a sua idéa ou a sua intenção em

quanto aos trabalhos que lhe deram logar ao systema; desejo, conhecel-os, e creio disto ter o direito, assim como a Camara. Acredito tambem não demorar, como já disse, o andamento dos negocios, porque peço. trabalhos que estão de certo promptos, e porque os peço com a necessaria antecedencia, á discussão da auctorisação.

Terminarei, Sr. Presidente, mandando para a mesa uma proposta, consequencia logica do meu requerimento (leu). Sr. Presidente, está claro que não deve ser dado para ordem do dia este projecto antes da remessa dos papeis que pedi, se a Camara approvar o meu requerimento, e julgar conveniente a dita remessa.

O requerimento e proposta a que o Digno Par se referiu são os seguintes:

«Requeiro que, pelo Ministerio da Marinha, sejam remettidos, com urgencia, para esta Camara todos os projectos, pareceres de differentes commissões, e trabalhos que existam, e devam servir de bases ás reformas das diversas repartições da Marinha, para as quaes o Ex.mo Ministro pede uma auctorisação ás Côrtes. Camara dos Dignos Pares do Reino, 5 de Agosto de 1858. = Conde de Linhares, D. Rodrigo, Par do Reino.»

«Proponho que não seja dada para ordem do dia a discussão da proposta de lei, vinda da Camara dos Senhores Deputados, e que concede uma auctorisação ao Ex.mo Sr. Ministro da Marinha para reformar as repartições a seu cargo, sem que previamente tenham sido remettidos para esta Camara todos os documentos, que devem servir de base á projectada refórma, e que necessariamente devem estar promptos, e classificados na Secretaria de Marinha, os quaes peço hoje com urgencia, para serem devidamente examinados pelos Dignos Pares, membros desta Camara. Camara dos Dignos Pares do Reino, 5 de Agosto de 1858. = Conde de Linhares, D. Rodrigo, Par do Reino.»

O Sr. Margiochi—Sr. Presidente, deve começar hoje a discutir-se nesta casa um parecer da commissão de fazenda, relativo ao projecto de lei, vindo da Camara dos Senhores Deputados, que tem por objecto votar ao Governo 1:800 contos de réis para obras publicas; quando se tractar da discussão desse parecer, darei a razão por que o assignei com declarações; como, porém, nesse projecto de lei se pedem novos impostos á nação, é justo, é indispensavel que tractemos de examinar previamente o modo porque, na repartição a cargo do Sr. Ministro das Obras Publicas, são geridos os fundos postos á sua disposição.

Vi nos jornaes publicados nesta capital graves accusações ao administrador geral interino do caminho de ferro de leste. Por ellas parece inferir-se que este funccionario introduziu empregados na administração a seu cargo unicamente com o fim de satisfazer empenhos de diversas pessoas que julgava influentes, ou com quem tinha relações de amizade. Li que os vencimentos desses empregados, arbitraria e illegalmente admittidos, importavam em 15 contos de réis annuaes. Desejo, pois, saber se o Sr. Ministro das Obras Publicas tem já tomado algumas providencias, para verificar se é verdadeira esta accusação, que, se o fôr, como se diz, importa uma verdadeira delapidação da fazenda publica. Por informações que tenho, consta-me que o administrador daquelle caminho mandava admittir fôra do quadro homens invalidos, dizendo que era preciso dar-lhes occupação, para que não morressem de fome. Peço, portanto, que o Sr. Ministro das Obras Publicas me declare se a administração do caminho de ferro de leste se converteu em Asylo de Mendicidade, e quaes são as medidas que S. Ex.ª tem tomado para verificar se estas gravissimas imputações, feitas aquelle administrador, são verdadeiras, porque, se o forem, importam um roubo feito á fazenda nacional.

Sei, Sr. Presidente, que a admissão de empregados nessa repartição se tornou tão escandalosa, que o Sr. Almeida, administrador da exploração, não tendo era que os occupasse, para lhes dar alguma cousa que fazer, encarregou um de deitar abaixo as teias de aranha do edificio; collocou outro, que vence 180000 réis annuaes, em guardar a mobilia, avaliada em 30000 réis, de uma casa da estação de Santa Apolonia. O administrador geral é igualmente accusado da compra de objectos desnecessarios, ou por valor excessivo, a fim de captar a protecção de alguem. É accusado de ter feito suspender a escripturação, para que se não podesse conhecer a sua pessima e arbitraria gerencia; e de ter depois declarado ao actual Sr. Ministro das Obras Publicas, que o atraso da escripturação provinha de falta de zêlo do empregado encarregado della, quando este digno empregado, em outro tempo, sendo unicamente coadjuvado por outro empregado, linha a sua escripturação e balanços em dia, e regularmente escripturados, havendo então muito mais que fazer, em quanto actualmente tem mais sete empregados, despachados illegalmente pelo Sr. João Chrysostomo.

Peço, portanto, ao Sr. Ministro das Obras Publicas, que me dê explicações cathegoricas a este respeito, porque desejo saber o que S. Ex.ª tem feito, quando este empregado é accusado de delapidar e roubar a fazenda publica, porque não é possivel que S. Ex.ª deixe assim correr á revelia os dinheiros da nação, cuja boa aplicação nos cumpre zelar.

O Sr. Ministro das Obras Publicas lamenta que o Digno Par na occasião de exercer o mais respeitavel de todos os direitos, empregasse alguns termos que lhe parecem demasiado fortes para a qualificação do procedimento de um homem que póde ter todos os defeitos como administrador, mas que elle orador póde declarar que é um homem de bem; assim como está persuadido que o são os empregados que entenderam dever dar a sua demissão.

Este caminho de ferro não tem sido modelo de boa administração, e nem isto deve admirar, porque em nações adiantadíssimas, aonde esta exploração dos caminhos de ferro é feita por conta do Estado, todos os annos ha graves accusações,

que dão logar a grandes discussões nas casas do Parlamento. Na Belgica succede todos os annos o mesmo, mas o que lá tem acontecido é nomearem-se commissões de inquerito. Elle orador é o primeiro a pedil-as depois do facto que S. Ex.ª apontou; e é de esperar que esta Camara a nomee, a fim de examinar o estado eu, que está a. administração do caminho de ferro de leste.

Este dever que o orador entende assistir á Camara, depois das accusações feitas, póde comtudo asseverar que não foi descuidado pelo Governo.

Este Governo, e todos os outros, teem tido uma desculpa de não terem tomado medidas mais efficazes sobre este objecto, porque se tem estado, na esperança de que o caminho passe para uma companhia devidamente organisada; mas, chegou-a occasião em que tal systema não póde progredir mais, porque, quaesquer que sejam as esperanças que possa haver, entende que se deve procurar demonstrar que, no nosso paiz, os caminhos de ferro podem render sendo administrados por conta da nação. Affiança ao Digno Par que o individuo que alli se achava, e a quem se fazem referencias, pediu ser suspenso, e tambem a no meação de uma commissão que examine com imparcialidade rigorosa as accusações que lhe teem sido dirigidas.

Não sabe se o Digno Par exije já resposta a cada um dos capitulos de accusação. Comtudo, parecia-lhe mais conveniente que se não entre nesta questão desde já, e se proceda antes á nomeação, de uma commissão de inquerito, que explicará, todos os pontos no seu relatorio, porque o caminho de ferro está completo, e a sua historia não pertence a uma época só.

Espera que a Camara e o Digno Par se decidam pela nomeação da commissão de inquerito, porque, em presença dos factos que S. Ex.ª apontou, parece-lhe ser essa a decisão mais rasoavel. que a Camara possa adoptar, não se dando as accusações como factos consummados, porque então tornar-se-ia muito difficil a posição da commissão.

O Sr. Marquez de Ficalho julga do seu dever tomar a palavra nesta occasião, porque foi durante alguns annos um dos directores do caminho de ferro de leste. Esta circumstancia torna, melindrosa para elle orador a questão de que actualmente se occupa a Camara, porque se tracta de amigos seus e pessoas capacíssimas, um delles que foi seu collega, e outros subordinados. Não póde por isso deixar de aproveitar esta occasião para fazer justiça a esses empregados declarando, que em todo o tempo em que esteve, alli, elles cumpriram com o seu dever, e prestaram bom serviço.

Não póde tambem deixar de dizer nesta occasião, que é dever de todo o Governo evitar que se levantem condidos; e quando os não possa prevenir deve acudir-lhe a tempo, para que não progridam, porque do contrario hão de sempre resultar graves inconvenientes. De não proceder assim o Governo tem resultado o estarem hoje no caminho de ferro de leste brigando uns contra os outros e injuriando-se. E quando se levantou esse conflicto,? Quando se citavam certos empregados para darem as suas contas em vinte e quatro horas, homens esses que durante quatro annos tinham tido uma gerencia tão complicada: e vendo elles que não era possivel confecciona-las em tão limitado prazo, e reputando por esse facto terem perdido a confiança do Governo, dimittiram-se.

Tambem elle orador, quando estiver n'uma administração quatro annos, e se lhe disser, apresentai as vossas contas dentro de vinte e quatro horas, de repente, julgar-se-ha offendido. Quando n'uma sessão desta Camara o Digno Par o Sr. Conde da Taipa proferiu certas palavras, que importavam uma allusão. levantando elle orador a sua voz nesta Casa, disse «desde este momento já não sou mais membro da direcção do caminho de ferro de leste» e logo pediu de facto a dimissão, porque não está no costume de avançar uma proposição que a não leve logo a effeito. A isso seguiu-se tambem a nomeação de uma commissão de inquerito. Sendo na actualidade emprezario o Governo, parecia-lhe que logo que se levantou o condido, devia acudir-lhe, a fim de evitar que progredindo viessem certos inconvenientes. Era este o dever do Governo, e por isso devia o Sr. Ministro das Obras Publicas correr logo á estação de Santa Apolonia acompanhado de homens competentes e habeis naquella especialidade, exigir a apresentação dos livros, e em vista delles, e do seu exame julgar-se o negocio em familia, antes de vir a publico, para não apparecerem na imprensa taes escandalos, que ate se classificam de roubos. Mas visto que se lhe deu publicidade, já se não póde acabar bem este negocio. Diz portanto, que a verdadeira commissão de inquerito devia ter sido o Sr. Ministro das Obras Publicas, e não é tão longe o escriptorio da direcção e administração do caminho de ferro, que S. Ex.ª não podesse ir alli uma e mais vezes. É pois necessario ser Governo, e ser Governo quer dizer velar sobre tudo isto, e acudir logo, porque depois é sempre tarde (apoiados): e não esquecer, que em quanto o caminho de ferro teve directores, era sobre elles que pesava, a responsabilidade; mas hoje o Governo é a companhia, e então as cousas variaram.

Deve tambem dizer, que este caminho de ferro, precisa ter uma administração muito rigorosa, grande pessoal, e bem pago; porque a boa administração do caminho de ferro pede. que assim se proceda. Mas, se como se diz, o caminho de ferro tem hoje 150 empregados a mais e que são incapazes de tudo, a nação fica roubada, porque o distrahirem-se assim fundos que pertencem e se destinavam para o caminho, importa um roubo feito aos particulares.

Se o Sr. Ministro lhe tivesse pedido conselho antes de chegar neste ponto a publico a questão, seria este o que lhe haveria dado; mas hoje dir-lhe-ía que chegando as cousas a tão máo ponto era dever do Governo o mandar tudo para a Boa Hora. Isto seria porém desacreditar a adminis-,