382 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
porque constando o artigo 39.°- de duas partes distinctas, eu approvo a primeira.
Portanto, mando para a mesa a minha declaração de voto, que é a seguinte:
(Leu.)
(S. exa. não reviu.)
O sr. V az Preto: - Sr. presidente, pedi a palavra para explicações no fim da sessão de hontem, e não usei della, porque a sessão ia bastante adiantada, e como não quizesse fatigar a camara pedi a v. exa. para me reservar a palavra para hoje. V. exa. dá-me agora a palavra e eu vou usar della para dizer á camara o motivo que me obrigou a pedi-la, e restabelecer a verdade dos factos que narrou o sr. visconde de Moreira de Rey.
Sr. presidente, na semana santa interromperam-se aã sessões desta camara e eu aproveitei esses dias para os ir passar na provincia. Infelizmente adoeci, e não pude regressar a Lisboa, como tencionava; não podendo regressar a tempo era-me impossivel assistir, como desejava, ao discurso do sr. visconde do Moreira de Rey e por isso não tive o prazer do o ouvir.
Constou-me, porem, pela imprensa, e por alguns amigos, que s. exa. se referira por diferentes vezes ao partido constituinte, de um modo pouco amavel.
Segundo as informações que tenho, segundo o .que li na imprensa e o que me disseram collegas que assistiram, parece me que s. exa. não foi exacto no que affirmou acerca do partido constituinte e da sua situação emquanto a elle pertencera. Portanto, para restabelecer os factos taes quaes se passaram, e para fazer historia verdadeira e não de phantasia, vou tambem dizer alguma cousa a este respeito, o poço ao digno par que torne nota do que eu disser, para me advertir de alguma inexactidão na exposição que eu fizer dos factos.
É possivel que elles estejam em contradição com as observações feitas por s. exa., Se o estiverem, a culpa não é minha, porque eu só affirmarei o que poder provar. Depois da dictadura do marechal Saldanha, creou-se um partido, partido que se chamou constituinte, partido que tinha por chefe o sr. Dias Ferreira e a que pertenceram o sr. Visconde de Moreira de Rey e outros. Esse partido não era o actual partido constituinte. Esse partido acabou. Durante a sua existencia nunca fiz parte d'elle.
Declaro, pois, terminantemente, que nem eu, nem o sr. Pinheiro Chagas, nem algum outro do meu grupo solicitou directa ou indirectamente a entrada para esse partido.
Em 1870, achando-me em opposição com um grupo de amigos, e o sr. Dias Ferreira com os seus, entendemos que, não satisfazendo as nossas aspirações a marcha dos governos anteriores, nem a boa administração do paiz, havia ensejo de formar uma nova organização partidaria que, quando fosse governo, estabelecesse como regra a economia, a moralidade, a justiça e o respeito a lei.
Approximamo-nos, e resolvemos effectivamente organisar-nos partidariamente n'aquelle sentido. Teve logar em fevereiro de 1879 a sessão inaugural, em que o sr. Dias Ferreira, como chefe do novo partido, apresentou as bases do seu programma.
As bases do programma d'essa parte estão exaradas no Diario da manhã de 27 de fevereiro de 1879.
Como é conveniente que se conheçam os intuitos e o fim do partido constituinte, como é conveniente que não se adulterem os seus principios e doutrinas, eu vou ler a camara todo o programma exposto pelo sr. Dias Ferreira, que eu acceito na integra:
"O Sr. Dias Ferreira, usando da palavra, disse que, perante uma assembléa tão numerosa e respeitavel, e cumprindo um dever que lhe era extremamente agradavel, alem de lhe ser imposto pela sua posição politica, descreveria a traços largos os intuitos do partido, e os principios que presidiram a sua organisação accentuando de modo bem claro, preciso e definido, qual o caminho que o partido tencionava seguir, e os fins politicos a que aspirava; que desadorava a politica nublosa, e não comprehendia as organisações partidarias, a mercê das circumstancias, sem principios definidos, e sem bandeira conhecida; que as circumstancias graves da fazenda e da administração impunham aos homens publicos a obrigação impreterivel de dizerem de modo claro e desassombrado ao paiz o que pensam, o que querem e o que desejam, para que a nação possa avaliar devidamente as differentes parcialidades politicas, e tomar-lhes opportunamente estrictas contas pela responsabilidade das suas opiniões, e pela coherencia do seu procedimento.
"Que os partidos não se improvisam, nem podiam viver à sombra de individualidades pessoaes, qualquer que fosse o respeito e a consideração a que essas individualidades tivessem direito, ou pela auctoridade do seu talento, ou pelo brilho das suas tradições. Que os partidos só podem ter um nascimento honroso, e viver vida duradoira, quando se constituem sob a base de principios firmes e definidos, e correspondem a uma necessidade real e verdadeira e um grande sentimento nacional.
"Que o paiz, que durante um largo periodo parecia preocupar-se principalmente com os melhoramentos materiaes, e com a situação da fazenda publica, hoje, sem por de parte essas questões que devem continuar a merecer os mais serios cuidados, reclama todavia reformas mais largas e mais profundas, respeitando comtudo na sua base as instituições existentes.
"Que elle orador nunca considerou a organisação da fazenda publica como bandeira politica, mas como dever ordinario e comum de todos os partidos, assim como tem a convicção profunda de que a questão de fazenda não se resolve definitivamente sem a resolução previa da questão politica.
"Que as reformas indispensaveis para equilibrar a receita com a despeza do estado, e para assentar sobre bases solidas e duradouras esse equilibrio, não podem ser realisadas vantajosamente pelos poderes publicos, sem o apoio franco e claro da nação.
"Que para chegar a esse desideratum é absolutamente indispensavel introduzir na legislação nacional e nos serviços publicos os melhoramentos necessarios para ser uma realidade pratica o systema representativo que nos rege, de modo que tenhamos o governo do paiz pelo paiz.
"Que era esta a base fundamental do nosso credo politico.
"Que a escolha dos mandatarios da nação devia representar unica e exclusivamente a vontade dos constituintes, cujos interesses aquelles tinham de zelar, sem intervenção de especie alguma de agentes da auctoridade publica.
"Que a missão das cortes era tratar dos interesses do paiz, e não dos interesses do governo, e que portanto ao paiz, e só ao paiz, com exclusão do governo, competia escolher os deputados que, de eleitos do povo, só teriam o nome, quando fossem os ministros e não os povos, quem os escolhesse.
"Que o facto de se confirmarem altas funcções do poder executivo unicamente pela investidura real, sem que os ministros estejam revestidos da auctoridade politica, que só se conquista com o apoio da opinião, e fazerem-se depois as eleições com a intervenção aberta, e as vezes criminosa dos agentes do poder, de modo que a maioria representa a vontade do governo, e não a vontade do paiz, é a sophismação completa do governo liberal.
"Que nestes casos excepcionaes o governo representativo só o nome tem de representativo, porque os eleitores, em vez de deliberarem sobre a escolha dos procuradores, a quem hão de confiar a defesa dos seus interesses, são apenas consultados pro forma, e a maioria das eleições é feita em definitiva sob a influencia dos agentes do poder.
"Que para o exercicio normal das diversas funções do