738 DIABIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
cante, e está bem longe de ser condigna recompensa para tão distincto feito de armas.
Eu devo dizer a v. exa. e á camara que a promoção d’aquelle guarda marinha a segundo tenente dependeria apenas demais, cinco ou seis mezes que lhe faltam para completar os tres annos de tirocinio a que é obrigado, e, portanto, a vantagem, que se lhe concede consiste apenas em ficar á direita de outros seus camaradas, poucos em numero, e ser dispensada do exame pratico para o posto de segundo tenente, segundo a legislação em vigor.
Demais este official começa agora a sua carreira e tem muito tempo para embarcar e fazer largo tirocinio a bordo.
Todos os officiaes da marinha portugueza passam muitos d’elles grande parte da sua vida no mar; portanto esta excepção em nada vae prejudicar a instrucção pratica d’este official,
Alem, d’isso elle acaba de demonstrar que no commando dos seus subordinados, combatendo, é energico e ousado.
Declaro, pois, por parte da commissão de marinha, que não podemos acceitar a emenda do digno par o sr. Coelho de Carvalho.
O sr. Coelho de Carvalho: - Sr. presidente, eu creio que não, tive a felicidade de me fazer comprehender, cansando-me em demonstrar á camara que não barateava por fórma alguma a recompensa imerecida, por este brioso official.
O que eu disse e repito é que com relação ao tirocinio de embarque, qualquer que seja o tempo que lhe falte, um mez que fosse, para o concluir, eu não concordava em que o official fosse dispensado, de o concluir, e porque entendo que é essencial, que é indispensavel, essa habilitação a qualquer official da armada que a bordo tem serviço de maior responsabilidade, para desempenho do qual não basta a habilitação do estudo, nem a coragem provada.
E direi mesmo que como recompensa, nem a dispensa do tirocinio, nem mesmo, a promoção, são dignas do acto que se vae recompensar, visto que em pouco tempo o guarda marinha teria, de ser promovido, a segundo tenente. Acho o premio insignificante e desejaria que se lhe desse outro mais valioso.
Sinto a maior admiração e respeito pelo valor d’este official, a sua valentia e presença de espirito estão provadas á evidencia; mas do que não tenho prova é de que não faça falta á sua aptidão nautica o tempo do tirocinio de que é dispensado pelo projecto, que se discute.
Este, precedente não queria eu ver estabelecido, de poderem, em consequencia de promoções d’esta ordem dar, logar a ter a direcção de um navio com toda a grandissima responsabilidade d’esse cargo, officiaes que não tenham completados seu indispensavel tirocinio.
Concluo, accentuando, bem que não pretendo desvirtuar a bravura d’aquelle official, o alto merito da sua acção; sómente não concordo na fórma d’esta recompensa e, repito, muito desejára que elle tivesse recompensa ainda maior, pois reconheço quanto a merece, e entendo que a nação até pelo seu interesse e não somente pela sua dignidade não deverá nunca tardar a honrar com premio justo aquelles que com serviços d’esta ordem souberam honral-a.
(O digno par não reviu o seu discurso.)
O sr. Franzini (relator) - Sr. presidente, só desejo ponderar á camara que attente bem em. que o acto praticado por aquelle official é tão heroico, sobresáe tanto ao commum, que não me parece que seja mesmo conveniente discutir aqui se este brioso official está ou não está habilitado a seguir a sua carreira, dispensando-lhe o exame pratico. (Apoiados.)
Parece-me, pois, que a resolução mais conveniente era ter votado este projecto sem discussão e, por acclamação. (Muitos apoiados.)
O sr. Vaz. Preto: — Sr. presidente, eu estou completamente de accordo com a moção ha pouco apresentada pelo meu illustre amigo e correligionario o sr. Coelho de Carvalho, e entendo como elle que a experiencia e a pratica não se deve dispensar nem aos officiaes de marinha nem aos do exercito.
Pedindo, porém, a palavra não é meu intuito deprimir, o merecimento nem o valor dos actos praticados pelo guarda marinha ferido, nem tão pouco pôr em duvida a sua bravura e coragem. Não é mesmo para combater na generalidade o projecto em discussão.
O meu fim, o meu intento é accentuar bem que não se arrisca a vida de graça, e que sem premios condignos não ha incentivo para, os feitos gloriosos.
O meu fito é obrigar o governo, não só a premiar aquelles a que se refere o projecto em discussão, mas outros que fizeram serviços relevantes, que até hoje ainda não foram galardoados.
O meu, fito é conseguir que os serviços prestados, e muito principalmente, os prestados em Africa, sejam condignamente galardoados.
Estou de accordo com o sr. ministro da marinha, e com as doutrinas que s. exa. aponta no seu relatorio de que devem ser premiados todos aquelles que se distinguem, por qualquer feito, nas nossas possessões africanas; mas com o que eu não estou de accordo é na applicação, é em que fiquem no esquecimento aquelles que têem prestado serviços heroicos e a quem o paiz deve immenso.
Sr. presidente, eu desejaria antes de continuar as minhas considerações, que o sr. ministro me respondesse ao seguinte: Qual era é premio que s. exa. daria a este guarda marinha, se em vez de ter a infelicidade de ser immediatamente ferido, n’uma emboscada, á primeira descarga, elle nada tivesse soffrido e carregando sobre o inimigo, fizesse fugir, tomasse a palissada; e fosse em continente libertar o capitão que estava cercado? Qual era o premio que dava a este guarda marinha que satisfez completa e gloriosamente ao objectivo a que visava, e cumpriu dignamente a commissão de que tinha sido encarregado?
Eu desejava ainda que o sr. ministro me respondesse, me dissesse, se este guarda marinha, que teve a infelicidade de ser ferido, em logar de retirar como retirou, tivesse sido levado nos braços commandando a força até ao ponto onde estava cercado o capitão e o libertasse, qual era o premio que s. exa. lhe dava?
Tambem desejava saber se s. exa. tem o relatorio do governador de Moçambique dando parte d’estes acontecimentos, e se foram simplesmente estas forças que atacaram, ou se foi mais alguma força?
Depois de ouvir as respostas do sr. ministro, peço a a v. exa. que me dê novamente a palavra.
O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros e interino da Marinha (Barros Gomes): — A par do sr. relator da commissão teria eu desejado que este projecto fosse approvado pela camara, como simples expressão de um sentimento generoso de homenagem prestada a estes benemeritos representantes da armada, os quaes longe da patria arriscaram a sua vida, pugnando pela honra da bandeira nacional; mas estou certo que tal sentimento brotará espontaneo em todos os corações de s. exas logo depois de ouvirem ler alguns dos eloquentes trechos dos relatorios officiaes que tenho aqui presentes.
Um d’esses relatorios, por exemplo, é o assignado pelo primeiro tenente da armada Miravante Tavares, que foi quem dirigiu a operação, e n’esta parte respondo ao digno par o sr. Vaz Preto.
Entre outros trechos d’esse documento, que todos teriam interesse para a camara, encontro eu o seguinte:
«Muito proximo de Chabada, encontraram nova trincheira muito forte, no local onde o arvoredo é muito alto e fechado de um lado e outro. Quando começaram a tentar demolir a referida trincheira, rompeu o fogo por detrás d’ella e pelos lados, ficando as forças envolvidas. Aos primeiros tiros foi ferido n’uma perna o guarda marinha Ferreira que commandava a força de marinhagem. Ao acudir-