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396 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Quanto á politica, parece-me que a dos membros do gabinete é bem conhecida para que eu demore a camara fazendo a exposição da que tentâmos seguir.

E finalmente, pelo que respeita ás questões pendentes, é de toda a conveniencia que se resolvam quanto antes, por isso que a sessão acha-se bastante adiantada, e é necessario que, quanto antes, certas providencias se convertam em leis do estado, e sejam postas em execução.

O sr. Marquez de Sá: - Sr. presidente, é costume, quando um ministerio se retira, dizer o motivo que teve para isso. É o que passo a fazer em poucas palavras. O ministerio de que tive a honra de fazer parte, tinha apresentado uma proposta de lei na camara dos senhores deputados para se dar a quantia de 47:000 libras esterlinas á empreza dos caminhos de ferro de sueste, e por este meio acabar com todas as transacções com esta empreza. O governo, auctorisado por lei, tinha feito um contrato de emprestimo com a casa ingleza Stern, e esperava, em rasão d'este contrato de emprestimo, poder pagar no dia 17 do corrente uma letra de 574:000 libras esterlinas que se acha em poder da casa Goschen, contando para isso com algum adiantamento de dinheiro feito pela casa Stern; esta casa porem poz a condição sine qua non, de se terminarem os pagamentos á companhia do caminho de ferro de sueste, para fazer qualquer adiantamento e fornecer o dinheiro não só para o pagamento a Goschen, como de outras letras que se vencem até ao fim do corrente mez, n'um total de 900:000 libras, alem de outras letras que se vencem mais tarde.

Por consequencia é indispensavel habilitar se o governo até ao dia 17 com fundos para satisfazer a letra a Goschen; e se o não fizer, a letra protesta se, e em consequencia d'isso serão vendidas as inscripções, que são penhores da quantia representada n'aquella letra, o que estão em poder da casa Goschen. Esses penhores andam por 10.000:000$000 réis nominaes, porque parte das inscripções estão a 25 por cento, e outras a 20, quando em Londres o curso dos nossos fundos é de trinta e tres e tanto.

Protestada esta letra, e vendidos os penhores pelo preço por que estão hypothecados, seria a perda para o paiz de mais de 1.300:000$000 réis. Mas não é só isto o que haverá a receiar; haverá mais, haverá a bancarota completa, porque, proteatada a primeira letra, todos os outros portadores de letras sobre o thesouro de Portugal protestarão as que têem em sua mão, e d'ahi resultará a venda dos penhores que os garantem e que andam por 23.000:000$000 réis, e que entrando em praça produziriam a completa ruina do nosso credito, e impedirá que Portugal possa fazer qualquer transacção.

Ora, sr. presidente, na camara dos senhores deputados passou a proposta do governo a que me referi, para se darem 47:000 libras á empreza do caminho de ferro de sueste, e já se acha na commissão de fazenda d'esta camara. Mas passou com quatro votos, incluindo os de dois ministros, sendo por consequencia o resultado que o governo n'aquella votação teve apenas dois votos de maioria.

O governo, pelo que se tinha passado n'esta casa, não podia ter a certeza de que o projecto que veiu para esta camara fosse depois aqui approvado, e sem esta certeza achava-se nas circumstancias de poder esperar o não pagamento da letra em Londres, e por consequencia a banca rota geral.

(Pedem a palavra os dignos pares Vaz Preto e marquez de Vallada.)

Então o governo tomou a resolução de apresentar a corôa a sua exoneração, porque, em consequencia da pequena maioria que teve na outra capa do parlamento, não era occasião de poder recorrer ao poder moderador, a fim de modificar, se julgasse conveniente, a maioria d'esta casa, e effectivamente pediu o ser substituido antes mesmo de saber o resultado da votação do projecto n'esta camara, porque o que tinha em vista era segurar o pagamento dos creditos de Portugal, para nos evitar portanto a bancarota.

Apresentou-se pois ao chefe do estado, logo em seguida aos acontecimentos parlamentares, para dar tempo a que nos poucos dias que restam até ao fim da presente semana se podesse organisar uma nova administração, que se considerasse habilitada a salvar o credito da nação da ruina que estava imminente.

Foi um acto que me parece dever merecer a approvação da camara.

Agora perguntarei aos srs. ministros se se julgam habilitados a fazer o pagamento d'esta letra, no valor de 574:000 libras, para o dia 17 do corrente?

Ao mesmo tempo, tendo recebido uma communicação official para comparecer no conselho d'estado ámanhã ás dez horas, a fim de se tratar da prorogação das côrtes, devo perguntar a s. exas. se, não tendo logar a prorogação das côrtes, o governo se considera habilitado a continnar os pagamentos, e se, feita a prorogação, póde ser já votado o orçamento que o governo anterior se tinha compromettido a fazer passar?

Em todo o caso, terminado o direito de exigir certos tributos depois do dia 31 do mez passado, como entende o governo poder satisfazer aos encargos publicos, emquanto não for auctorisado a receber os tributos ainda não votados?

São estas as perguntas que tenho a fazer.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o digno par, o sr. Vaz Preto, mas como tambem a pediu depois o sr. ministro da fazenda, na conformidade do regimento, preferem os membros do governo.

O sr. Ministro da Fazenda: - Eu pedia licença para fallar depois do digno par.

O sr. Presidente: - N'esse caso tem a palavra o digno par.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, com o mais subido pezar e profunda magua acabo de ouvir as declarações feitas pelo ex presidente do conselho de ministros, o digno par sr. marquez de Sá, e digo com subido pezar e profunda magua, porque s. exa., pela exposição que a camara ouviu, não fez mais do que condemnar a administração de que fazia parte, justificando ao mesmo tempo a opposição tenaz que lhe foi feita por esta camara. O digno par teria andado politicamente, teria acatado os verdadeiros principios constitucionaes, teria prestado homenagem ao systema representativo e á camara, de que tem sido e é um ornamento, se curvado diante da sua votação declarasse que, em virtude d'ella, tinha s. exa. com os seus colegas largado aquellas cadeiras, sem duvida teria procedido como lhe competia, e por certo teria feito muito melhor do que declarar que a sua saida do ministerio havia sido originada pelo estado deploravel em que se acham as nossas finanças, Sr. presidente, se alguem tivesse ainda alguns escrupulos por ter votado a moção de censura, a sua consciencia ficára immediatamente tranquilla depois de ouvir a singular e extraordinaria declaração do sr. marquez de Sá. Sinto do coração que s. exa. não desse o valor áquella moção, valor que ninguem melhor do que s. exa., pela sua elevada instrucção, lhe podia dar. N'este caso cumpre me fazer aqui uma breve exposição dos principios seguidos em direito publico.

Sr. presidente, a verdadeira doutrina, aquella que geralmente é seguida e defendida por todos os publicistas, é que nos paizes regidos pelo systema representativo, e onde existe por necessidade uma segunda camara para moderar os excessos da camara dos deputados, e conservar as liberdades patrias e instituições convenientes, para que a facção não produza os seus desentoados effeitos, e sem a madura circunspecção sejam votadas leis que não convem ao esta do de civilização e progresso do paiz, e note-se que fallando da segunda camara refiro-me não só á camara dos senadores, cuja eleiçào é popular, como á camara dos pares, cuja nomeação é regia; embora esta camara seja hereditaria, vitalicia ou nomeada por categorias n'um ou n'outro