DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 637
proposta por este illustre general, que deixou de ser levada a effeito, sem que o sr. marquez de Sá, que era um homem de grande iniciativa, se désse por offendido no seu amor proprio. Não foi só a escola de cavallaria que s. exa. viu acabar.
A escola dos filhos dos soldados, que foi outra medida que resultou da sua infatigavel iniciativa, tambem foi abolida, sem que tambem aquelle illustre general se escandalisasse com isso; mas é que elle tinha bastante patriotismo para reconhecer a necessidade de se não levarem por diante certas instituições que s. exa. tinha fundado, por isso que a experiencia tinha demonstrado que a sua permanencia não se tornava recommendada pelas circumstancias que depois se apresentaram.
Estou convencido, pois, que o sr. marquez de Sá teria applaudido a substituição da escola dos filhos de soldados por escolas para os paes desses filhos. (Riso.) Effectivamente aquelles precisam muito de instrucção, que é uma das melhores garantias que se póde dar ao exercito. N'este ponto seja-me permittido repetir uma phrase que se tem dito muitas vezes, mas que por isso não perde de valor, e é, que o professor de primeiras letras foi quem venceu em Konigsgräetz, como dizem os allemães, e em Sadowa, como dizem os francezes. Todos sabem que ha poucos annos o ministro da guerra em França disse que todos os analphabetos que entravam no exercito, saiam das fileiras sem ter instrucção primaria, e os individuos que entravam sabendo já instrucção primaria, não saiam das fileiras sem saberem instrucção secundaria.
Na Austria nomeou-se não ha muito uma commissão de officiaes distinctos, que disseram que a arma mais aperfeiçoada que se póde dar a um soldado é a cultura da sua intelligencia, e essa commissão de officiaes occupou-se seriamente da reforma, debaixo d'este ponto de vista.
Na Italia, paiz que nos deve ser grato por todos os motivos, tambem se tratou da instrucção primaria do soldado com todo o afinco; e não ha muito que um general publicou um relatorio, no qual dizia, que 50 por cento dos individuos que entravam para o exercito não tinham instrucção primaria, e que só 5 ou 6 saíam sem essa instrucção, e aos que se habilitavam com ella, era-lhes contado menos tempo de serviço.
Sr. presidente, se esta idéa, que me parece dever merecer a attenção do sr. ministro da guerra, mas a qual s. exa. entende que no momento actual não se póde effectuar, póde ser adiada para o futuro, tambem de certo este projecto póde ser igualmente adiado.
Eu já declarei que o projecto que se discute traz comsigo augmento de despeza, que é fixada em 6:000$000 réis quanto ao estabelecimento, mas se dermos importancia ao relatorio apresentado em 1869, pelo sr. Maldonado, vê se que só com despezas extraordinarias se poderá tirar algum resultado d'essa escola.
Ora, 6:000$000 réis para a installação é realmente uma despeza pequena, mas regularmente estes projectos recommendam-se quasi sempre pela modestia da sua apresentação, a fim de não ser regateada a despeza com serviço d'esta ordem.
Mas, sr. presidente, no fim de tudo, estou persuadido que o adiamento d'este projecto não prejudica os interessei do exercito, mesmo porque tenho ouvido a officiaes, muito distinctos, duvidarem das vantagens da sua adopção.
Eu não posso deixar de convergir a minha attenção par as necessidades financeiras da nossa epocha. As receitas que temos votado estão muito longe de corresponder ás despezas igualmente votadas, e mais longe ainda pela difficuldade de se poderem pôr em execução alguns dos projectos mais importantes que se têem approvado.
Eu devo declarar que o governo neste ponto, e é preciso que se diga isto francamente, procura o apoio nos emprestimos para fazer face ás grandes despezas quando não se apresentam receitas para ellas.
Ora, este recurso do emprestimo disfarça para muita gente o ónus do encargo da despeza, mas acho que a mais deploravel de todas as illusões é aquella que suppõe, que emprestimo ha de occorrer á salvação das nossas finanças.
E por esta occasião lembrarei ao sr. presidente do conselho que, sendo s. exa. ministro da fazenda, não ha muito tempo, n'uma administração em que era tambem ministro da guerra, prova isto que se póde ser ministro da fazenda economico sem prejudicar os interesses do ministerio da guerra, o sr. presidente do conselho foi o mais severo possivel nos seus relatorios, como ministro da fazenda, em stygmatisar a existencia do deficit.
S. exa. não poupou nenhuma phrase severa para nos não conciliar com a existencia do deficit, a quem chamou o peior de todos os impostos.
Infelizmente, porém, é com o peior de todos os impostos, servindo-me da phrase de s. exa., que se procura fazer face ás despezas publicas, aggravando-as todos os dias. Demais, sr. presidente, não se diga que esta questão se não liga com a questão de fazenda.
Todos sabem, sr. presidente, que em 1876 a commissão de fazenda d'esta camara, composta de homens que não podem ser suspeitos para o actual governo, commissão de que era presidente o sr. conde do Casal Ribeiro e relator o sr. conde de Valbom, declarou no relatorio, que precedia a sua proposta de orçamento, que, apesar do deficit ter diminuido a 1.000:000$000 réis, a situação era grave.
Ora, sr. presidente, se a situação em março de 1876 era grave, financeiramente fallando, com a presumpção de um deficit de 1.000:000$000 réis, será uma situação lisonjeira, financeiramente fallando, aquella em que, segundo um orçamento rectificativo apresentado aqui, não discutido mas votado, esse deficit passa a 4.000:000$000 réis?
O sr. conde de Valbom e a commissão de fazenda d'esta casa consideravam grave um deficit de 1.000:000$000 réis, e esse deficit ascende já hoje a 4.000:000$000 reis! Como devemos nós, pois, considerar a situação actual?
Ora, com um deficit de 4.000:000$000 réis, que não é de certo a ultima palavra em questão de deficit, não é de certo para estranhar, que olhemos com a maxima seriedade para os assumptos financeiros, que assoberbam todos os outros.
Como muito bem disse o illustre relator do projecto de resposta ao discurso da coroa, o sr. conde do Casal Ribeiro, a questão de fazenda domina muitas vezes todas as outras, e de facto nas nossas condições financeiras a questão de fazenda tem direito a ser ambiciosa.
Sr. presidente, as apprehensões do illustre relator da commissão, o sr. conde de Valbom, quando o déficit estava computado em 1.000:000$000 réis, vem muito a proposito citar-se, pois dava conselho prudente e muito para seguir-se.
Eu bem sei que se produzem muitos argumentos em defeza da nossa divida, mas por mais que se diga, o que se não póde nunca tirar é a importancia d'essa divida.
E note-se, que não foi só o illustre relator da commissão de fazenda que declarou a gravidade das nossas circumstancias, o proprio sr. ministro da fazenda, e meu amigo, o sr. Serpa, em um relatorio, creio que em 1873, mostrou a gravidade da nossa situação, dizendo que, mesmo depois de realisar o equilibrio entre a receita e a despeza do estado, era necessario todo o cuidado em que por um exagerado optimismo se não tratasse de augmentar consideravelmente a despeza.
Ora, se era muito importante, mesmo depois de realisar o equilibrio entre a receita e a despeza do estado, tratar de regular o augmento da despeza, não seria importante, antes de chegar a esse equilibrio, tomar providencias para que se obtenha o que effectivamente se deve ter em vista? Eu peço licença para ler as palavras que vem no relatorio