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744 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

em documentos officiaes, tornar bem publicos esses actos heroicos, e mostrar quaes foram os serviços prestados pelo bravo a quem me refiro, longe da patria, em regiões remotas, e onde não tremulava ha quasi meio seculo a bandeira das quinas.

Sr. presidente, v. exa. e a camara conhecem sem duvida as difficuldades constantes e invenciveis, que encontrámos no reconhecimento do nosso direito e dominio no sultão de Zanzibar.

V. exas. não ignoram que apesar do nosso direito existir de tempos remotos o sultão não tem chegado a fazer um tratado em que se definissem os respectivos limites das duas nações.

V. exas. sabem, e não ignoram, que se não temos chegado a um resultado satisfactorio é porque a Inglaterra, sempre cubiçosa e interesseira, tem impedido o sultão de concluir esse tratado.

Sr. presidente, esse tratado de limites, que de longa, data devia estar firmado, ainda se não encetou, porque algumas potencias europeas, principalmente a Inglaterra, têem levantado duvidas, e promovido difficuldades ao reconhecimento do nosso dominio sobre aquelle ponto da Africa oriental, difficuldades e duvidas que trouxeram ar guerra ao sultão de Zanzibar, para obter uma solução favoravel para Portugal, que os seus direitos e interesses exigiam.

Até á conferencia de Berlim, não tinhamos podido chegar a accordo algum com o sultão de Zanzibar.

O nosso direito punha-se em duvida, e o nosso dominio não estava effectivo n’uma parte do territorio.

Tal era a nossa situação antes da conferencia de Berlim, que estabeleceu principies e regras para o reconhecimento e validade de direitos.

D’ali para o futuro a occupação tornava-se condição essencial para tornar effectivo o dominio, e com elle o direito.

N’estas circumstancias, a perda d’aquellas regiões, que ha quarenta annos não estavamos de posse, era inevitavel, se á boa paz, ou pela força as não occupassemos de novo.

Estavam as cousas n’este estado, quando o governo de Portugal, compenetrado d’aquelle perigo eminente, pelo seu ministro da marinha, mandou ordem ao governador geral de Moçambique para que elle fizesse arvorar a nossa bandeira na bahia de Tungue na margem meridional do rio Meningane, e ao mesmo tempo que tratasse de conseguir esse resultado evitando todo e qualquer conflicto com as tropas do sultão de Zanzibar.

S. exa. o sr. ministro da marinha sabe perfeitamente como as cousas se passaram, e como as ordens do governador de Moçambique foram cumpridas pelo ex-governador de Cabo Delgado o sr. Palma Velho. Agora pergunto eu a s. exa. se é ou não verdade, que o governador de Cabo Delgado em cumprimento das ordens que recebera, arvorou a bandeira portugueza na margem meridional do rio Meningane?

Pergunto ainda se é ou não verdade estar a bandeira do sultão de Zanzibar hasteada em Macôloe territorio que de direito pertence a Portugal, na casa onde estava aquartelado o destacamento arabe que a guardava? E é ou não verdade que o ex-governador de Cabo Delgado o sr. Palma Velho desembarcou só, e desacompanhado de gente a fim de arriar a bandeira de Zanzibar e de arvorar a bandeira portugueza? Se é ou não verdade, que o governador de Moçambique mandou um telegramma ao governo do Portugal, felicitando-o pela occupação meridional de Meningane devida ao acto heroico praticado por aquelle valente militar que se tinha digna e cabalmente desempenhado da sua commissão? Se é ou não verdade que o ex-governador de Cabo Delgado foi elogiado por haver desempenhado aquella commissão pelo governador geral de Moçambique no boletim official, onde se dizia que, á sua bravura, á sua coragem, á sua serenidade de animo, e ao seu bom senso e prestigio se devia o estar arvorada a bandeira portugueza na margem sul do rio Meningane?

Tudo isto deve naturalmente constar dos relatorios que foram enviados ao sr. ministro, e effectivamente todos estes serviços bem assignalados constam dos documentos officiaes.

Pois sr. presidente, apesar de attestados pela auctoridade competente, o governador de Moçambique, até hoje ainda não foram galardoados.

O governador de Moçambique que reconhecia a alta importancia d’aquelles relevantes serviços, e as vantagens immediatas que d’ali vinham para Portugal, entendeu que aquelle illustre official devia ser galardoado condignamente e indicou ao governo vou antes propoz que se lhe desse a commenda da Torre e Espada. O governo não só lhe não concedeu o premio proposto, mas quer v. exa. saber e a camara, qual foi a recompensa que este official recebeu?

Um anno depois, e ainda não tinha acabado o seu tempo, foi demittido, sem uma palavra de louvor, e o que é mais, sem que ao menos no decreto se empregassem as palavras tabelliôas que é uso empregar, «serviu a meu contento»!! Disse-se que a rasão por que elle foi demittido, foi porque tendo sido promovido a coronel, lhe pertencia o posto de general, se continuasse a desempenhar aquella commissão, á qual não pertencia aquelle posto. Mas isto não é assim, porque o posto de accesso, só lhe pertencia se elle requeresse para ficar no ultramar; do contrario não, e por isso a rasão que se allega, não colhe.

Sr. presidente os serviços d’este digno official dividem-se em duas epochas, os que elle prestou como governador do Cabo Delgado, e os que prestou depois de demittido.

Sr. presidente, estes que acabei de narrar referem-se á primeira epocha. São estes serviços prestados pelo governador de Cabo Delgado durante o seu governo.

Por decreto de 4 de janeiro de 1886, concebido nos termos que acabei de expor á camara, foi demittido aquelle brioso e intelligente militar; mas o que é mais curioso é que, tendo o sr. Henrique de Macedo, b antecessor do actual sr. ministro da marinha, dado ordem para a tomada da bahia de Tungue e Meningane, e havendo já dois mezes que o sr. Palma Velho tinha sido demittido do cargo de governador de Cabo Delgado, o sr. governador geral de Moçambique entendeu que não tinha outro official mais competente do que aquelle illustre militar para desempenhar tão difficil missão, e mandou-lhe pedir para tomar o cominando das forças.

O papel que desempenhou o sr. Palma Velho competia ao seu successor; não obstante, o governador geral de Moçambique não o deixou tomar posse do governo, nem o encarregou da difficil missão de tomar Meningane e Tungue. Este acto do governador de Moçambique é altamente significativo, é o reconhecimento da injustiça feita pelo sr. ministro da marinha, e a maior demonstração de apreço e de consideração dada ao sr. Palma Velho.

Valham ao menos ao sr. Palma Velho, no meio de tanta ingratidão e injustiça, estas valiosas demonstrações que, firmadas em documentos officiaes, ficam archivadas de modo que possam attestar aos vindouros os serviços prestados em paragens remotas e longinquas, por portuguezes não degenerados, que sabem arriscar a vida e derramar o sangue na defeza da patria, o em honra de Portugal.

O bravo official immediatamente correu ao chamamento do governador de Moçambique, e tanto foi a pressa que se deu, que o hiate em que ía soffreu um rombo e naufragou. O tempo estava borrascoso, e por isso as difficuldades tornaram-se maiores.

Como a maré descesse, o hiate encalhou e poderam todos salvar-se e a pequena embarcação, e assim continuaram a viagem até chegarem ao seu destino.

Foi então encarregado da difficil missão de tomar Meningane e Tungue. Elle, sempre tão modesto como valente, offereceu-se para tomar parte na expedição como simples toldado. O governador de Moçambique, que tinha n’elle