598 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
mento mais urgente e mais necessario é regular a nossa situação financeira, de maneira que a nossa receita se ponha, n'um futuro proximo, em harmonia com a despeza.
Estou persuadido que a uniformisação da moeda da ilha da Madeira com a do continente do reino foi uma boa modida; todavia, deve-se dizer que nem todos os habitantes d'aquella parte da monarchia portugueza a consideraram como tal; quer dizer que esta medida, embora de vantagem, não foi tão geralmente bem recebida na Madeira como talvez muitos supponham, e não o foi principalmente da parte d'aquelles que tiveram de soffrer prejuizos e fazer sacrificios em resultado da referida uniformisação de moeda. E necessariamente factos d'esta ordem trazem sempre, a par de vantagens mais ou menos geraes, inconvenientes para muitos individuos.
Por exemplo, a fixação de um valor mais elevado dado á moeda circulante, traz comsigo prejuizo para aquelles que por causa das suas transacções commerciaes tiverem de importar moeda para os seus pagamentos.
Comtudo, estes e outros inconvenientes não são de natureza a fazer suppor que não haja grande vantagem na unidade da moeda em todo o paiz. O que é preciso é ver se esse incontestavel melhoramento se póde realisar em todas as occasiões, porque na verdade traz encargos para o thesouro que convem não deixar de ter em attenção. Vejo que a Inglaterra, que não é pobre, ainda não conseguiu modificar o meio circulante da India.
E tanto era justificada a modificação do meio circulante na India ingleza, que no seu actual estado o agio traz comsigo a perda de 3.000:000 libras esterlinas por anno áquelia possessão da Inglaterra.
Eu creio, pois, que o governo, por este projecto mostra desejos de proceder de maneira tal, que desappareçam os inconvenientes resultantes da differença entre a moeda que corre nos Açores e a que corre no reino.
O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): - Sr. presidente, até certo ponto o digno par, o sr. Carlos Bento, preveniu mo no que eu tencionava dizer.
Não posso, comtudo, deixar de declarar ao digno par, o sr. Antonio de Serpa, que eu applico toda a minha solicitude a este assumpto; reconheço que é de toda a importancia que se harmonise, com o do reino, o systema monetario das ilhas dos Açores, e concordo com s. exa. em que seria conveniente praticar para com os Açores com se praticou já commissação á Madeira.
Estes assumptos referentes ao meio circulante são dos que mais naturalmente preoccupam a attenção de quantos se dedicam ao estudo e á pratica dos problemas financeiros e das questões economicas; e de v. exa., sr. presidente, muito particularmente são elles conhecidos, porque não só collaborou de modo tão notavel na legislação de 1854, mas mais tarde fez parte de um congresso internacional, cujo fim era estudar a conveniencia e a maneira de harmonisar a moeda, havendo-se v. exa. com tanta distincção n'esse congresso, que ainda hoje as suas opiniões ali proferidas sobre este assumpto são citadas com respeito por todos que d'elle se occupam.
Voltando, porém, ao que se praticou para com a Madeira, lembrarei que se deram ali circumstancias especiaes que fizeram com que se tornasse urgente a realisação d'aquellas providencias a que alludiu o sr. Serpa. A ilha da Madeira vira então quasi aniquilado o seu unico elemento de exportação que era o vinho; em taes condições, sem generos de exportação, nem moeda com que podesse pagar o que importava, porque a que circulava na ilha se achava depreciada pela baixa no valor da prata, proveniente da exploração das minas de prata dos estados americanos; n'estas circumstancias, repito, o cambio baixou na ilha, a ponto de se tornar abertamente impossivel, na praça do Funchal, obter, sem um premio fabuloso saques, quer sobre Portugal, quer sobre o estrangeiro. Foi por isso que o governo propoz então, e levou a bom termo, a transformação da moeda d'aquella ilha.
Comtudo, sr. presidente, v. exa. sabe que similhante transformação importou em 27:000$000 réis, e alem d'isso para a effectuar viu-se o governo na necessidade de reter nos cofres approximadamente 1.000:000$000 réis, durante seis mezes; e como a posse d'esta quantia levantada por divida fluctuante representa um prejuizo igual ao juro que por ella se pagou, isto é, approximadamente uma somma da 15:000$000 réis; esta cifra, sommada com a dos réis 27:000$000 já referidos, eleva o despendia que o estado fez com a transformação referida á somma de 42:000$0OO réis. Ora, podemos imaginar que a, moeda que circula nos Açores importaria no dobro da que circula na Madeira; teriamos, pois, que n'essas condições o estado sofreria, para operar essa transformação, um prejuizo de nada meros do que 80:000$000 réis. Ora, como o governo está tratando de, por agora, se limitar quanto possivel ás despezas impreteriveis, procurando ao mesmo tempo, por varias providencias legislativas, fazer crescer a receita, para o que está pedindo sacrificios ao paiz, entendi que não era agora a occasião opportuna de propor uma tal medida. Limitei-me, unica e exclusivamente, a propor a presente proposta de lei para acudir ás difficuldades provenientes da falta de trocos.
Não me são estas materias desconhecidas, e até já tive occasião de elaborar um pequeno escripto sobre o nosso systema monetario, quando o governo dos Estados Unidos, projectando reassumir o pagamento em especie, solicitou a proposito d'isso informações a todas as potencias.
Por essa occasião tive ensejo de demonstrar que, subindo a uns 2.000:000$000 réis a importancia da moeda de cobre e bronze, que existe no paiz, dava-se o facto anomalo de que uma quarta parte d'esta moeda estava armazenada em um estabelecimento bancario da capital, que eu tinha a honra de dirigir, emquanto que nas provincias do norte havia grande falta da mesma moeda.
Estou convencido que a sua transformação em moeda mais commoda, dada a hypothese de se poder enviar uma boa parte d'ella para as provincias do norte, teria muito conveniente; mas, ainda assim, haveria desfalque grande para o thesouro, se não se podesse, o que me parece impossivel, emittir o dobro da que existe actualmente, porque a maior parte d'essa moeda é em patacos, e o bronze, como se sabe, não tem hoje applicação, a não ser em uma escala diminutissima. Foi esta a rasão por que não tratei de resolver este assumpto na actual sessão legislativa, e que talvez me obrigue a proceder do mesmo modo no proximo anno.
O sr. Mathias de Carvalho: - Ponderou que a nossa moeda de cobre e bronze não possuo nenhuma das qualidades que deve ter esta especie de moeda para preencher devidamente o fim a que é destinada; e affirmou que ninguem pôde, com fundamento, contestar a necessidade do uma refundição, a qual, se fosse desde já começada e proseguida com trabalhos desenvolvidos, ainda assim exigiria alguns annos para ser levada a termo.
Observou que se esta operação principiar pela moeda de cobre, não é licito suppor que n'esse primeiro periodo haja sacrificios para o thesouro; e fez varina considerações para mostrar que os encargos que a substituição da actual moeda de bronze possa occasionar, serão compensados pelas maiores exigencias de moeda na nova circulação, facto constante em todos os paizes que têem precedido á refundição da sua moeda auxiliar inferior.
Terminou recommendando á consideração do sr. ministro da fazenda este importante assumpto que, resolvido convenientemente, interessa muito ao paiz.
O sr. Conde de Valbom: - Abunda nas idéas do orador precedente.
(O discurso do orador será publicado na integra quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)