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e não encontrei uma unica palavra a este respeito. A carta, sr. presidente, diz bem clara e expressamente o contrario do que pretende sustentar a commissão.

O que diz a carta? Diz que logo que o juiz tiver pronunciado, remetterá o processo á respectiva camara, isto é, á camara dos pares, se o processo disser respeito a algum digno par; á camara dos deputados, se elle disser respeito a algum deputado; e a camara decidirá se o processo deve ou não continuar, e se o par ou deputado deve ou não ser suspenso do exercicio das suas funcções: já se vê portanto que se estabelece aqui uma garantia concedida igualmente aos pares e deputados. Muito bem; quem ha de pois decidir sobre estes pontos? Está claro que é cada uma das camaras. Pois bem; supponhamos que a outra casa do parlamento, em logar de decidir que o processo instaurado contra dois dos seus membros não devia continuar, tinha decidido o contrario, isto é, que continuasse o processo; quem havia decidir se os deputados em questão deviam ou não ficar suspensos do exercicio das suas funcções? Havia de ser a camara dos deputados necessariamente, e ella não se póde constituir em tribunal de justiça.

Terá a illustre commissão a pretensão de dizer que, se a camara dos senhores deputados tivesse mandado continuar O processo dos seus membros, era á camara dos pares, constituida em tribunal de justiça, que competia decidir se elles deviam ou não continuar no exercicio das suas funcções? Sr. presidente, tanto entendeu a camara dos senhores deputados que não devia ser assim, porque o artigo 27.° da carta constitucional diz: «... a qual (camara) decidirá se o processo deve ou não continuar, e se os pares ou deputados devem ou não continuar no exercicio das suas funcções», que exigiu que a commissão desse tambem parecer sobre se os srs. deputados deviam ou não continuar no exercicio das suas funcções. Sr. presidente, se a camara dos senhores deputados póde decidir isso, a camara dos pares tambem o póde fazer, sem que seja necessario para isso constituir-se em tribunal de justiça. Como é pois que a commissão nos diz que não póde? Eu(peço ao digno relator da commissão que me explique isto. E muito facil ladear, mas negar o que tenho demonstrado é que não se póde. Ora vamos a ver se a camara póde já decidir esta questão.

Sr. presidente, eu podia pôr fóra da discussão este ponto, lendo todos os artigos do regulamento da camara, constituida em tribunal de justiça, mas quando se falla das leis fundamentaes não se deve tratar de regulamentos secundarios; comtudo, sr. presidente, vamos sempre a ver a legislação que cita a illustre commissão. Cita primeiro o artigo 4.° da lei de 15 de fevereiro de 1849; ora eu vou ter esse artigo, diz assim (leu).

Quer dizer, tratava se de fazer uma lei regulamentar sobre o modo por que devia proceder a camara constituida em tribunal de justiça, e estabelecer todas as regras que regulassem o processo, mas não se fez isso, e decidiu-se que se devia recorrer á legislação que regula o supremo tribunal de justiça. Mas para que vem isso? Para tudo que a camara tenha de decidir em tribunal de justiça, mas não diz que é para decidir sobre o artigo 27.° da carta, pelo menos isto não significa que a camara não póde decidir sobre a segunda parte d'esse artigo sem estar constituida em tribunal de justiça; esse artigo 4.° da lei de 15 de fevereiro de 1849 é só para se saber como ha de dirigir-se a camara quando estiver constituida em tribunal de justiça, portanto isto não prova nada em favor do parecer da illustre commissão.

Vamos aos outros artigos. Outro artigo que vem citado pela illustre commissão em seu favor é o artigo 820.° da novissima reforma judiciaria; quer saber a camara o que diz esse artigo? Diz assim (leu).

Póde d'aqui deduzir-se directa ou indirectamente alguma conclusão para a questão de que se trata? Ou eu esqueci completamente todas as regras da hermeneutica, ou não ha aqui uma unica palavra que confirme o que se diz no final do parecer.

Agora vou ter o n.° 5.° do artigo 20.° da mesma reforma, que é o seguinte citado pela, illustre commissão (leu).

Ha aqui alguma cousa? E preciso ter e aprender, porque não entendo que a camara não possa, senão em tribunal de justiça, conhecer d'esta garantia. Eu não vejo rasão nem sei para que viesse aqui este artigo.

Vamos a ver agora o artigo 765.º (leu).

Tambem aqui não ha nada, é necessario entender o que dizem as palavras. Diz aqui (leu).

O que quer isto dizer? O supremo tribunal de justiça conhece dos crimes dos seus membros, nomeia o juiz relator, este inquire as testemunhas, se não são de longa distancia, e depois de preparado o processo, leva-o ao supremo tribunal e este decide se ha de ou não proceder a accusação, o que quer dizer que esta decisão do supremo tribunal equivale á decisão de um juiz de primeira instancia, e aqui se, vê que quem pronuncia é o supremo tribunal, julgando procedente a accusação.

Agora vamos ao artigo 778.° (leu).

Este tambem não diz nada.

Ora vamos ao novo regulamento que rege a camara constituida em tribunal de justiça. A illustre commissão cita os artigos 7.°, 8.°, 9.° e 11.° do regulamento de 11 de agosto de 1861.

Vamos a ver o que elle diz (leu).

Não falla na outra garantia (leu).

Vamos agora ao artigo 9.° (leu).

Tambem aqui não ha nada; mas aonde o ha é nos artigos 11.° e 12.°, porque n'esses artigos lá se diz o que a camara deve fazer depois de declarar procedente a accusação. O artigo 11.° diz (leu).

Aqui esta o que vem no artigo 11.°; ora o 12.° diz que (leu).

Quer dizer depois que a camara determinou que o processo continue, só deve fazer o que manda o regulamento; mas emquanto ao digno par processado ficar ou não suspenso, emquanto a isso não diz nem uma palavra; o que diz é que, depois de julgada procedente a accusação, a camara se deve constituir em tribunal de justiça; mas a respeito d'aquella garantia, repito, não diz cousa alguma; póde-se dizer que essa garantia se julga já satisfeita quando o processo vae á camara, e ella determina se deve ou não continuar.

Sr. presidente, duas são as garantias da carta constitucional; uma que póde decidir como camara, e outra como tribunal de justiça. Ora, ouvirei o que os dignos pares dizem, e por isso não direi por agora mais nada, e mando para a mesa uma proposta que passo a ter (leu).

Quem apresenta uma proposta d'estas não tem capricho algum para que este negocio fique parado; é necessario acabar com isto, porque o digno par pronunciado se acha n'um estado verdadeiramente insupportavel; é necessario declarar que póde ou não continuar no exercicio das suas funcções, ou então constituir-se a camara em tribunal de justiça. Ha uma regra que os jurisconsultos devem seguir, que é— a justiça seguir de perto o criminoso e a pena o mesmo crime.

Portanto, sr. presidente, eu entendo que a camara deve ou declarar que o diguo par póde continuar ou não no exercicio das suas funcções, ou formar se em tribunal de justiça. Mas quando é que a camara se poderá formar em tribunal de justiça? Póde ser ámanhã, póde ser no fim da sessão, ou póde ser mesmo depois d'ella fechada. Ora, sr. presidente, isto é ter o digno par pronunciado n'um estado insupportavel.

O sr. Presidente: — Vae ler-se a proposta do digno par o sr. Ferrer.

O sr. secretario leu.

«Proponho que a camara decida immediatamente que o digno par pronunciado possa continuar no exercicio das suas funcções, ou que a camara quanto antes se constitua em tribunal de justiça. = Ferrer. »

Foi admittida á discussão.

O sr. Visconde de Gouveia: — Discorda da opinião do seu illustre mestre e sempre amigo, o sr. Vicente Ferrer. Entende que o regimento da camara quando constituida em tribunal, é o seu codigo de processo, e por elle deve reger-se, não sendo licito altera-lo na presença de um julgamento. Entende que a carta, estabelecendo genericamente o fôro especial dos srs. deputados e dos dignos pares em materia criminal, nada estatue emquanto ás fórmas do processo. Julga pouco curial que a camara por uma simples votação, sem se constituir em tribunal, e sem o exame judicial das provas, resolva uma questão tão grave, que é nada menos que uma ratificação de pronuncia. Acompanha o digno par nas suas considerações sobre o duello, e vae mais longe, pois o considera uma fatal necessidade das sociedades modernas. Disse que os padrinhos eram uma especie de tribunal de honra, ou de juizes árbitros ou de equidade; que o mesmo codigo penal reconhecia esta doutrina, não classificando como assassinato a morte em duello, impondo-lhe uma pena diminutíssima, e punindo o facto de ser padrinho com simples pena correccional; que o mesmo digno par, referindo-se ao pundonor do cavalheiro de que se trata, e á circumstancia de fugir a uma recusa infamante, ía de accordo com estes principios. Que entendia portanto que deviamos ter toda a contemplação com o par accusado; mas que apesar d'isto respeitaria a lei escripta, e como juiz não se afastaria da sua rigorosa e estricta applicação. E fazendo varias outras considerações n'este sentido, terminou pedindo desculpa de se oppor ás idéas do seu antigo mestre, que respeitava, votando portanto pelo parecer da commissão.

O sr. Ferrão: — Se o digno par, o sr. Barreiros, não concorre ás sessões d'esta camara será porque não quer ou porque não póde: será por effeito do seu melindre, em presença das circumstancias em que se acha, mas nunca porque dependa o seu comparecimento de uma resolução da camara.

Observarei mais ao digno par, o sr. Ferrer, que s. ex.ª deve saber muito bem qual a differença que a legislação estabelece entre indiciação e pronuncia; entre pronuncia incompleta ou completa; entre pronuncia e ratificação de pronuncia; que n'estes casos sómente se verifica depois de constituida a camara em tribunal de justiça; portanto o sr. Barreiros esta pronunciado ou indiciado, mas no rigor do direito ainda o não esta completamente.

A suspensão do exercicio das funcções só póde vir ou não vir depois de ratificada a pronuncia, o que ha de ter logar quando esta camara, constituida em tribunal de justiça, julgar em primeira e ultima instancia se deve ou não ter logar o processo da accusação.

Nós temos para estes casos a lei de 19 de fevereiro de 1849, que tem tanta força como a carta, pois que é regulamentar dos respectivos artigos da mesma carta, e n'essa conformidade as disposições de um regulamento especial que esta camara constituida em tribunal de justiça tem de observar.

Nos legem habemus.

Quanto á distincção de camara constituida ou não constituida em tribunal de justiça, é a carta que a estabelece, e mais explicitamente a lei e o regulamento a que já me referi.

São duas entidades distinctas, e tanto que para se reunir o tribunal, com quanto aqui estejamos reunidos, é preciso dirigir convocatorias a todos os dignos pares, não só presentes, mas que estiverem no continente do reino.

Eu, no caso do digno par indiciado, não desejaria sujeitar-me a uma decisão da camara, porque me consideraria no uso de um direito proprio, emquanto pela camara, tribunal de justiça, não fôsse tomada uma resolução em contrario, em presença da lei fundamental e das disposiçoes da novissima reforma judiciaria a que a lei especial se refere.

Repito, o digno par, o sr. Barreiros, está na actividade constitucional de suas funcções; e conseqüentemente não carece da decisão da camara para podér comparecer, emquanto a pronuncia não for ratificada nos termos da lei: e não devemos querer tomar uma resolução sobre este ponto, porque assim como póde ser affirmativa, póde ser negativa, e assim offensiva dos direitos politicos do mesmo digno par. O sr. Silva Cabral: — Sr. presidente, se o digno par, que encetou este debate, tornar a usar da palavra, então eu responderei apresentando as rasões que tenho para sustentar o parecer da commissão; mas depois do que disseram os dignos pares, os srs. visconde de Gouveia e Ferrão, como relator da commissão, e não desejando eu fazer ostentação de sciencia, porque a não tenho, não posso querer estar a marchar no mesmo terreno, que acabara de percorrer os meus dignos collegas, emquanto não haja alguma cousa de novo a que tenha de responder. Portanto cedo agora da palavra, e reservo-me para depois.

O sr. Presidente: — Então tem a palavra o sr. Ferrer.

O sr. Ferrer: — Sr. presidente, desejava ouvir o sr. Silva Cabral, porque ou elle me tirava do erro em que estou, e cedia immediatamente da palavra, ou não me convencia, e teria occasião de responder aos argumentos de s. ex.ª, pois receio que V. ex.ª não me dê a palavra terceira vez, ainda que eu sou o auctor da proposta que tambem está em discussão.

Sr. presidente, confesso que fiquei maravilhado cora as observações apresentadas pelo sr. visconde de Gouveia, e como s. ex.ª teve a bondade de se declarar n'esta casa como meu antigo discipulo, ha de permittir que o mestre lhe diga que nunca ensinou a doutrina de que o duello é licito. Similhante doutrina nunca eu ensinei, nem esperava que se sustentasse n'este logar.

Eu sei a historia do duello. Sei que principiou nos barbaros do norte, e que é um legado que nos deixaram os nossos maiores. Sei que quando foi introduzido na Europa, foi com a melhor intenção, para evitar os assassinatos ás esquinas e para que não continuasse o uso do punhal; mas estamos hoje nas circumstancias de julgar necessario o digno de approvação o duello, para evitar os assassinatos nas estradas e os ataques ás casas, como acontecia quando elle foi introduzido na idade média?!

Uma instituição, que ataca todos os principios da moral e do direito, não se póde sustentar, muito principalmente na presença das leis do paiz que declaram crime o duello. (O sr. Visconde de Gouveia: — Peço a palavra.) Não estou agora para fazer uma dissertação sobre 08 argumentos com que se prova que o duello é immoral.

Sr. presidente, convidei expressamente os meus adversarios, e sobretudo o illustre relator da commissão, para me dizerem quem é que ha de julgar a pronuncia? Quem é que ha de decidir se ficam ou não suspensos os srs. deputados, no caso de se mandar continuar o processo?... Se ha de ser a propria camara, segundo a disposição da carta; pois diz esta que o juiz que pronunciou remetterá á respectiva camara o processo dos pares ou deputados, a qual decidirá duas cousas: primeira, se o processo deve continuar; segunda, se o pronunciado deve ou não ser suspenso no exercicio das suas funcções?... Não é só a camara dos deputados, é a camara dos pares e a dos deputados.

Isto é tão claro que pareço impossivel deixar de se metter pelos ouvidos de alguem.

A camara é muito illustrada, mas n'esta materia permitta me lhe diga, sem que com isto haja de a offender, que eu fallo com jurisconsultos, não só dos que estão sentados n'esta casa, mas com outros lá de fóra.

Nós, os homens de lei, temos uma certa responsabilidade por aquillo que dizemos aqui, relativamente á nossa profissão; não é só a responsabilidade moral como legisladores, que esta todos temos, mas é tambem a responsabilidade como jurisconsultos.

Sr. presidente, acabo de ouvir dizer ao digno par, relator da commissão, que o digno par, o sr. Barreiros, não esta suspenso, e que póde vir a esta camara!

Confesso que fiquei pasmado quando ouvi isto, porque a doutrina corrente é o contrario—que elle esta suspenso, que não póde vir aqui. Eu vou citar toda a legislação a este respeito.

Que diz aqui quanto aos effeitos da pronuncia? Diz (leu).

Mas, segundo a nossa legislação politica, esta tambem suspenso, e eu lhe vou provar claramente.

No processo eleitoral diz-se, que o que está pronunciado não póde votar, e por consequencia não póde ser eleito deputado.

Agora pergunto eu: qual é a rasão por que a lei diz que o que esta pronunciado não póde ser deputado? E porque a pronuncia suspende os direitos civis, e sendo já deputado não póde continuar no exercicio das suas funcções.

Mas ha mais, não é só a lei eleitoral; a portaria de 6 de janeiro de 1865 diz claramente (leu).

O sr. Ferrão: — Isso não faz lei.

O Orador: — Não faz lei?! Veja o digno par o codigo administrativo, que diz claramente que o que estiver pronunciado não póde ser eleito vereador, e o que for pronunciado não póde continuar a exercer as suas funcções, porque tem os direitos politicos suspensos. Esta é que é a legislação, e por isso é que a carta constitucional diz expressamente— a camara decidirá.

Quer V. ex.ª saber as consequencias que se seguem da doutrina da commissão? Se seguisse a opinião da illustre commissão ficava inutilisada completamente a garantia. Eu o vou mostrar, e praticamente.