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CAMARA DOS DIGNOS PARES.
EXTRACTO DA SESSÃO DE 18 DE MAIO DE 1859.
presidencia do ex.mo sr. Visconde de Laborim, vice-presidente.
Conde de Mello, Secretarios, os Srs. D. Pedro Brito do Rio
Pelas duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 26 Dignos Pares, declarou o Ex.mo Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta da antecedente que não teve reclamação.
Deu-se conta da seguinte correspondencia:
Um officio da Camara dos Srs. Deputados, enviando uma proposição de Lei, sobre a repressão do crime do moeda falsa.
A commissão de legislação.
O Sr. Presidente — Apresso-me, attenta a importancia do assumpto e a necessidade urgente de adoptar uma medida que castigue o crime de moeda falsa, a convidar a commissão de legislação a dar com toda a urgencia o seu parecer sobre o projecto de Lei, que acaba de chegar da Camara dos Srs. Deputados.
Um officio da mesma Camara, remettendo um projecto de Lei, sobre a concessão de um credito extraordinario ao Ministerio da Guerra para a compra de novas armas de fogo.
À commissão de guerra e fazenda.
— da mesma Camara acompanhando um projecto de Lei, sobre ser elevada a seis contos de réis a verba de tres contos de réis das despezas eventuaes inscripta no orçamento do Ministerio do Reino para auxiliar a publicação das obras que se recommendarem pela sua utilidade.
Às commissões de instrucção publica e fazenda.
O Sr. Visconde de Castro — Mando para a Mesa o parecer n.º 133 da commissão de fazenda (leu-o).
Continuando com a palavra disse: — Este projecto é em parte já uma Lei do paiz, pois que já se deu esta auctorisação, se não para 300 contos, ao menos uma igual para 240 contos, por consequencia attendendo a esta circumstancia, e ao avançado da sessão, parece-me que se poderá dispensar no regimento para se discutir e ser votado o projecto hoje mesmo (apoiados).
O Sr. Presidente — Vou consultar a Camara sobre a dispensa do regimento.
Approvada a dispensa.
O Sr. Presidente — Antes de se lêr na Mesa o parecer, vou dar a palavra ao Sr. Conde de Linhares, que a pediu para antes da ordem do dia.
O Sr. Conde de Linhares — Sr. Presidente, tendo aqui sido ha poucos dias reconhecida a necessidade de se proceder ao recrutamento de força de mar, mostrou-se que a legislação que existe a esse respeito é de 22 de Outubro de 1851, e que a Administração passada, desejando harmonisar a Lei do recrutamento para a Marinha com a Lei do recrutamento para o Exercito tinha apresentado na outra Camara uma proposta de Lei, que
chegou a ser alli approvada, e que existe hoje na commissão de marinha desta Casa; mas como depois se reconhecesse tambem que a Lei do recrutamento para o Exercito não satisfazia completamente, o Governo apresentou algumas modificações a essa mesma Lei de recrutamento do Exercito, sendo por conseguinte necessario agora modificar nesse sentido o projecto vindo da Camara dos Srs. Deputados sobre recrutamento maritimo, do mesmo modo que o está sendo para o Exercito, isto no caso de se querer conseguir harmonia entre uma e outra Lei, como diz o relatorio do Governo: nestas circumstancias conviria pois, que o Sr. Ministro da Marinha dissesse, se, attendendo principalmente ás circumstancias em que estamos de adiantamento da sessão, elle Ministro julga que com a legislação actual, que é a de 1851, que já citei, póde proceder ao recrutamento indispensavel.
Eu estou inclinado a crer que S. Ex.ª póde fazer obra por essa Lei, entretanto, se S. Ex.ª não o entender assim, desejo ponderar-lhe quanto se torna necessario e urgente que S. Ex.ª concorra á commissão para dizer quaes são as modificações que julga indispensaveis no projecto affecto á mesma commissão, e que o tornem em harmonia com as modificações que estão propostas na outra Camara á Lei do recrutamento do Exercito. Entretanto, e repito, julgo que muito se ganharia em tempo se o Sr. Ministro da Marinha nos declarasse francamente que julga ser possivel o recrutamento da Marinha pela Lei actual, ou que carece, absolutamente que o projecto que existe na commissão de marinha seja ainda approvado nesta sessão. Peço a V. Ex.ª que logo que o Sr. Ministro da Marinha se ache presente me conceda a palavra, para dirigir neste sentido as convenientes perguntas a S. Ex.ª
O Sr. Presidente — Eu inscrevo o nome de V. Ex.ª para lhe dar a palavra quando estiver presente o Sr. Ministro da Marinha.
Recommendo novamente á commissão de legislação a maior urgencia no seu parecer sobre o projecto relativo á moeda falsa. É um negocio em que está empenhada a honra e a dignidade desta briosa nação (apoiados).
Agora vai ler-se o parecer apresentado pelo Digno Par o Sr. Visconde Castro.
Leu-se; é o seguinte:
parecer n.º 133.
Á commissão de fazenda foi presente o projecto de Lei n.º 132 da Camara dos Srs. Deputados, que tem por fim auctorisar o Governo a levantar um emprestimo de 300:000$000 réis com applicação á construcção de uma Alfandega na cidade do Porto.
A necessidade desta edificação é tão geralmente sentida, que a commissão não hesitou um momento em se conformar com a proposta.
O unico ponto que mereceu a sua particular consideração foi o da escolha do local, por entender que della dependia assim a maior segurança para a fazenda publica, como a maior conveniencia para o commercio daquella populosa cidade.
Como porém o Sr. Ministro da Fazenda declarou na commissão, que havia de mandar examinar pela Repartição competente, com os planos a que fez proceder, todas as differentes informações, planos e arbitrios que se tem offerecido até hoje sobre tão grave negocio, e que alem disso era sua intenção ouvir opportunamente o Corpo do commercio da cidade do Porto; a commissão é de parecer que o projecto de lei deve ser adoptado para ser admittido á Real Sancção.
Sala da commissão, 17 de Maio de 1859. = Visconde de Castro — Felix Pereira de Magalhães
— Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão. = Tem voto o Sr. Visconde de Castellões.
projecto de lei n.° 132.
Artigo 1.º É auctorisado o Governo a realisar um emprestimo até á somma de tresentos contos de réis pelo modo que julgar mais conveniente, comtanto que os encargos desta operação não excedam a sete por cento ao anno, sendo destinado o producto deste emprestimo para a construcção de uma casa de Alfandega na cidade do Porto.
Art. 2.° O Governo poderá consignar para pagamento dos juros e amortisação do emprestimo contraído em virtude desta Lei, até á somma de quarenta e dois contos de réis em cada anno, deduzidos da receita da Alfandega do Porto.
Art. 3.° É o Governo auctorisado a fazer crear e emittir até á quantia de setecentos e cincoenta contos de réis em titulos de divida fundada interna ou externa de tres porcento, a fim de servirem de garantia ao mesmo emprestimo.
§ unico. O Governo fará entregar á Junta do Credito Publico, pelos cofres das Alfandegas grande de Lisboa e do Porto, a somma correspondente aos juros dos titulos creados em virtude deste artigo.
Art. 4.° O Governo dará conta ás Côrtes, na proxima sessão legislativa, do uso que tiver feito das auctorisações concedidas por esta Lei.
Art. 5.º Fica revogada toda a legislação em contrario.
Palacio das Côrtes, em 25 de Abril de 1859.
— Manoel Antonio Vellez Caldeira Castel-Branco, Deputado, Presidente — Miguel Osorio Cabral, Deputado, Secretario — Antonio Tiburcio Pinto Carneiro, Deputado, Secretario.
Entrou em discussão.
O Sr. Visconde de Fonte Arcada — Eu não me oppuz a que se dispensasse no regimento para entrar já em discussão este projecto, e não me oppuz porque isto até certo ponto é já um objecto conhecido da Camara, pois que já no tempo da Administração passada se discutiu aqui um projecto para uma auctorisação similhante, mas dessa vez parece-me que se pediam só 240 contos, e agora pedem-se 300 contos; quer dizer que no anno passado o Governo achou que para o mesmo objecto lhe eram necessarios 240 contos, e agora pede auctorisação para 300 contos. É verdade que este projecto diz — até 300 contos, e eu não sei se o outro dizia tambem até 240 contos, ou se fixava a quantia de 240 contos.
Desejava pois que alguem me explicasse isto, porque se então se disse tambem, que bastavam 240 contos, a differença desta auctorisação á outra é muito grande, e é preciso saber-se a razão porque.
O Sr. Eugenio de Almeida....
O Sr. Visconde de Castro — Não sou relator da commissão, mas acceito essa responsabilidade, e direi duas palavras, por isso mesmo que o Digno Par o Sr. Eugenio de Almeida julgou que eu o podia esclarecer nas suas duvidas.
Em primeiro logar, se o Digno Par julga que é necessario que o Ministro competente esteja presente, eu tambem assim o entendo (apoiados). Eu lembrei só, que sendo este pedido a repetição de outro analogo, ou quasi identico, nós podia-mos, pela simples leitura do parecer, votal-o, e adiantar assim os nossos trabalhos; mas não me opponho de maneira alguma a que se espere pelo Sr. Ministro.
Agora, em quanto á necessidade da obra, essa é geralmente conhecida.
Quanto á difficuldade de afazer com 240 contos de réis, creio que isso está provado até á saciedade na repartição competente. Aqui está presente o Sr. Inspector geral das obras publicas, o Sr. Visconde da Luz, que poderá informar a Camara a este respeito.
As Camaras votaram 240 contos de réis, mas viu-se logo, pela grandeza da obra, e pelas muitas expropriações que haveria a fazer, que esta cifra era insufficiente, e por isso é que se pede agora 300 contos de réis, e eu duvido ainda que isso chegue (apoiados).
Quanto á outra auctorisação, o Digno Par o Sr. Eugenio de Almeida ha de facilmente conhecer que caducou, porque quando ella se concedeu, disse-se expressamente que na sessão seguinte o Governo daria conta ás Côrtes; ora o Governo não deu conta porque não fez uso, e por consequencia esta Lei nos seus effeitos caducou. Parece-me portanto que podemos, sem inconveniente, ou esperar-mos pelo Sr. Ministro da Fazenda, ou continuarmos na discussão, promptificando-me a dar mais algumas explicações se fôr necessario.
O Sr. Presidente — Vou consultar a Camara se deve suspender-se a discussão deste projecto até que esteja presente o Sr. Ministro da Fazenda.
O Sr. Eugenio de Almeida — Eu não fiz tal proposta. Se V. Ex.ª julga conveniente dever referir-se a uma proposta que eu fizesse, é uma illusão, porque eu não fiz proposta nenhuma.
O St. Presidente — Então continua a discussão.
O Sr. Visconde de Fonte Arcada — Sr. Presidente, eu faço minha essa proposta, e vou mandal-a para a mesa.
«Proponho que se adie a discussão do projecto em discussão, até que esteja presente o Sr. Ministro da Fazenda. = Visconde de Fonte Areada.»
Foi admittida, e logo approvada sem discussão.
(Entrou o Sr. Ministro do Reino.)
O Sr. Presidente — Talvez V. Ex.ª, Sr. Ministro, esteja habilitado para responder pelo seu collega.
O Sr. Secretario Conde de Mello — Estava em discussão o projecto de lei para auctorisar o Governo a levantar um emprestimo de 300 contos de réis para a edificação da Alfandega do Porto: o parecer da commissão approva esta auctorisação, mas tendo-se feito sobre este objecto algumas observações, resolveu a Camara que se suspendesse a discussão até estar presente o Sr. Ministro da Fazenda. Agora o Sr. Presidente pergunta a V. Ex.ª se se acha habilitado para responder pelo seu collega?
O Sr. Ministro dos Negocios do Reino — Creio que poderei satisfazer, por parte do Governo, ás duvidas que se apresentem sobre este objecto: entretanto, se forem taes que não me julgue habilitado a responder, nesse caso esperar-se-ha que chegue o meu collega, mas julgo que posso responder.
O Sr. Presidente — Á vista do que acaba de dizer o Sr. Ministro do Reino, convido o Digno Par o Sr. Eugenio de Almeida a fazer as suas reflexões.
O Sr. Eugenio de Almeida....
O Sr. Visconde de Fonte Arcada — Eu tambem desejava saber qual é a razão porque se pede agora 300 contos de réis, quando na primeira proposta se pedia 240 contos. Eu não estou lembrado se a primeira proposta dizia até 2Í0 contos de réis, porque então effectivamente estava claro que se entendia que 240 contos chegavam para esta obra; mas agora diz-se até 300 contos de réis, e eu desejo saber qual é a razão porque o Governo suppõe agora que são precisos 300 contos de réis, em quanto a outra proposta que se votou aqui fallava unicamente em 240 contos?
Quanto ao que diz o Sr. Eugenio de Almeida, parece-me que se deve fazer menção na Lei, uma uma vez que não esteja claro que estes 300 contos de réis não são para se juntarem aos 240 contos já votados pela Camara, e é uma cousa inteiramente nova e diversa, quer dizer, são só 300 contos, caducando o pedido dos 210 contos que já se tinham votado.
O Sr. Ministro do Reino....
Não havendo mais quem pedisse a palavra, foi approvado na generalidade.
Entrou em discussão na especialidade
Art. 1.º—Approvado.
Art. 2.°—Approvado.
Art. 3.°
O Sr. Barão da Vargem — Sr. Presidente, o primeiro artigo deste projecto diz: que o Governo fica auctorisado para poder levantar essa quantia pelo melhor meio que possa ser; e o artigo 3.º expressamente diz: que poderá levantar réis 750:000$000, em titulos de divida fundada, para fazer face a esse emprestimo. Temos aqui portanto duas auctorisações; uma, para poder levantar esta quantia, do modo que julgar mais conveniente; e a outra, é para poder emittir réis 750:000$000, em titulos de divida fundada, para fazer face ao emprestimo. Eu não voto contra o projecto, mas faço esU observação, para que se
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dêem as necessarias explicações que esclareçam o meu voto.
O Sr. Ministro do Reino....
O Sr. Baião da Vargem — Estimo muito que o projecto venha assim concebido; porque, quando se não possa realisar o emprestimo por outro meio, desejo então que na Lei fique consignado que o Ministerio póde crear as inscripções, pois o meu desejo é que se não criem inscripções que não estejam auctorisadas por Lei.
Não havendo mais quem pedisse a palavra, foi approvado o artigo 5.°, tem como os 4.º e 5.°. e a ultima redacção.
O Sr. Conde de Thomar (sobre a ordem) — Mando para a Mesa o parecer n 0 131, das tres commissões reunidas, de instrucção publica, administração e fazenda:
(Leu e mandou para a Mesa.)
A imprimir.
O Sr. Ferrão (sobre a ordem) — Mando para a Mesa o parecer n.º 132.° da commissão de legislação.
(Leu e mandou para a Mesa.)
O Sr. Marquez de Ficalho — Pedi a palavra sobre a ordem, para rogar a V. Ex.ª e á Camara, que empregassem todos os meios ao seu alcance para este projecto ser discutido quanto antes; porque, apezar de me não julgar competente para reconhecer a sua utilidade, julgo que é da dignidade da Camara, e para honra da nação, que este projecto seja votado quanto antes.
Este projecto refere-se a um crime, que faz pesar sobre Portugal uma responsabilidade extraordinaria, e por isso peço a V. Ex.ª que lhe dê o maior andamento possivel, a fim de que a sessão sé não encerre sem que elle seja discutido e approvado.
O Sr. Conde de Thomar — Segundo foi informado, veiu da outra Camara grande numero de exemplares deste projecto. Se elle não soffreu lá emendas, parece-lhe que seria muito conveniente que se distribuíssem pelos Dignos Pares, e era desnecessaria nova impressão.
O Sr. Presidente — Existem, e vão ser distribuidos.
O orador — Se o projecto não soffreu alteração alguma, para que é demorar este negocio? póde portanto adiantar-se uma sessão, e ser dado para a ordem do dia de ámanhã, porque havendo poucos dias de sessão, é absolutamente indispensavel que se discuta quanto antes. Depois da commissão de legislação, composta de caracteres tão eminentes, ter dado o seu parecer, o orador vota sem escrupulo sobre o projecto. Portanto, pede que se consulte a Camara, se se contenta com a distribuição dos projectos vindos da outra Camara.
O Sr. Visconde de Athouguia — Sr. Presidente, eu não sou jurisconsulto, mas sou portuguez! O que desejo, Sr. Presidente, é que esta nação não tenha o labeo de parecer que por qualquer modo quer encobrir as culpas de alguns malvados que roubam a Portugal seu bom nome, e a honra nacional (muitos apoiados).
Sr. Presidente, não sou eu que possa entrar tambem como os distinctos jurisconsultos nesta casa no exame desta questão, mas parece-me que o que acaba de dizer o Digno Par e meu nobre amigo o Sr. Conde de Thomar é rasoavel. e que a Camara ficará satisfeita com a distribuição desses papeis, porque, por elles, todos poderão cumprir o dever de examinar bem este negocio, para que, quanto antes, possa ser decidido nesta Camara (apoiados). E peço tambem a V. Ex.ª que o queira dar para ordem do dia de ámanhã e peço aos Srs. Ministros que sobre este objectos não hesitem e que, na repressão de tão grande crime j ponham em acção toda a sua actividade (apoiados), e se este projecto não fôr bastante venham tantos quantos forem precisos (apoiados repetidos), a fim de castigar aquelles que roubam os particulares, o paiz, os estrangeiros e a honra nacional (muitos e repetidos apoiados em toda a Camara e nos bancos dos Srs. Ministros).
O Sr. Presidente — Não posso deixar de dizer aos Dignos Pares, que vou, com a melhor vontade, consultar a Camara sobre este objecto. Assim se mostrará bem claramente que a nação se quer desaffrontar da mancha que homens indignos tem querido lançar na sua honra, e que nós temos a peito cumprir com o nosso dever (apoiados)
O Sr. Visconde de Fonte Arcada — Sr. Presidente, partilho inteiramente as idéas dos Dignos Pares; mas, no que tenho alguma duvida é que se estabeleça isto como precedente.
Eu tenho toda a confiança na commissão de legislação desta Camara, confiança que ella merece, e que todos nós devemos ter; mas não basta isso, é essencialmente necessario que a Camara tenha tempo de examinar os diversos trabalhos que lhe são submettidos; reconheço, como os Dignos Pares, que é necessario que os trabalhos desta Camara se resolvam com brevidade, porém, é igualmente da dignidade da Camara que os seus membros tenham o tempo preciso, para examinar estes e outros trabalhos; eu estou de accôrdo com a opinião emittida pelos Dignos Pares, que me precederam, em quanto a este projecto; mas não quero que se estabeleça como precedente para todos os assumpto de que venhamos a occupar-nos. A isto hei de oppôr-me sempre, e já no anno passado se suscitou a mesma questão no fim da sessão. A Camara não tem culpa se projectos importantes não vem aqui senão no fim da sessão; mas do que teria culpa, e do que deve ser responsavel é de os tractar de leve, isto é o mesmo que approvar leis sem as discutir, como por mais de uma vez tem accontecido. Conseguintemente, se não se toma isto como precedente para os outros projectos, embora haja conveniencia na brevidade, embora haja toda a confiança nas commissões, seria da opinião dos dignos Pares, aliás terei de me oppôr, porque não quero que os negocios sejam tractados de leve.
O Sr. Presidente — Vou consultar a Camara se dispensa o regimento em relação a este projecto sobre a moeda falsa; e que, attenta a sua importancia, seja dado para ordem do dia de amanha.
Unanimemente approvado.
(Entrou o Sr. Ministro da Marinha.)
O Sr. Presidente — Está presente o Sr. Ministro da Marinha: tem a palavra o Sr. Conde de Linhares.
O Sr. Conde de Linhares — Pedi a palavra a V. Ex.ª, para logo que estivesse presente o Sr. Ministro da Marinha, porque eu desejava perguntar a S. Ex.ª, se elle julga poder proceder ao recrutamento indispensavel para a Marinha com a Lei existente que é a datada de 22 de Outubro de 1851. Existe entretanto na commissão de marinha desta Camara um projecto de lei sobre o qual a mesma commissão não julgou ainda dever dar o seu parecer, e que estabelece a maneira de fazer este recrutamento: esse projecto, vindo da Camara dos Srs. Deputados, tinha por fim harmonisar a Lei de 22 de Outubro com aquella que tracta do recrutamento para o Exercito, e que é datada de 17 de Julho de 1855. Ora, esta Lei de 17 de Julho de 1855 foi reconhecida por todos como difficiente, e até nociva pela intervenção das Camaras municipaes no recenseamento, provando a experiencia, que o numero de cidadãos isentos pelas ditas Camaras do serviço militar, era tão consideravel, que não havia recrutamento possivel.
Na Camara dos Srs. Deputados discute-se ou vai discutir-se uma proposta do Governo modificando a Lei de 17 de Julho; nestas circumstancias desejo saber do Sr. Ministro, se S. Ex.ª julga possivel fazer obra pela Lei de 22 de Outubro para o recrutamento da Marinha, recrutamento para o qual espero S. Ex.ª de as mais terminantes ordens se proceda immediatamente, porque a primeira necessidade para haver marinha é que hajam marinheiros (apoiados). S. Ex.ª sabe melhor do que eu, que no Corpo de Marinheiros Militares faltam hoje quinhentas praças (sem fallar nas companhias de deposito), e no estado actual da Europa é conveniente e prudente conservar este Corpo com toda a sua força (apoiados).
Se, comtudo, S. Ex.ª declarasse não poder fazer o desejado recrutamento pela Lei de 22 de Outubro, então, mas unicamente nesse caso, a commissão apresentará, e com urgencia, o seu parecer sobre o projecto de lei vindo da outra Camara, embora os membros da commissão o não julguem perfeito; na illustrada discussão desta Camara elle poderá ser emendado no mesmo sentido em que o Governo emendou a Lei para o recrutamento do Exercito, e que tambem como eu já disse não preenchia convenientemente o seu fim. Porém parece-me que será mais conveniente esperar pela abertura da proxima sessão legislativa, para que o Governo então apresente uma Lei mais perfeita e em harmonia com aquella do Exercito.
Aguardo a resposta do Sr. Ministro, a fim de que nós membros da commissão possamos tomar a resolução mais conforme com os interesses do paiz e da marinha de guerra portugueza.
O Sr. Ministro da Marinha — Sr. Presidente, a Lei de 1851 não tem tido execução porque ainda se não fez a divisão dos departamentos, e a proposta que veiu da outra Camara é para aperfeiçoar aquella Lei e dar maior garantia aos cidadãos. Eu não estava agora preparado para esta discussão, e por isso não tenho aqui presente essa Lei, nem o projecto apresentado na outra casa, e que está na commissão de marinha desta; porém, se a minha memoria me não engana, um dos inconvenientes é estar o arrolamento entregue unicamente ás auctoridades militares; mas no projecto vem remediado esse inconveniente, pois que fica o arrolamento commettido ás Camaras Municipaes e esta garantia é inquestionavelmente vantajosa para os interessados. (O Sr. Visconde d'Athoguia — Peço a palavra.)
Agora, para levar a effeito o recrutamento com menos embaraços, estão propostas emendas na Camara dos Srs. Deputados, as quaes julgo convenientes para substituir nos pontos alterados o modo de fazer o recrutamento: por consequencia o projecto de lei que está affecto a esta Camara melhora a Lei de 1851, e as modificações que vão ser propostas á discussão da outra Camara tambem melhoram as deficiencias que se acham na Lei actual.
Uma das circumstancias attendivel é que na Lei de 1851, estando ausente qualquer individuo sujeito ao recrutamento, quando vier depois de fei:o o arrolamento, não é nelle comprehendido: agora porém, por este projecto são comprehendidos. Eu entendo que se póde fazer obra pela Lei de 1851 logo que o regulamento esteja em execução, e se não passar o projecto de lei hei seguir a ultima Lei. I
O Sr. Visconde d'Athoguia — Sr. Presidente, sou membro da commissão de marinha e tomei a peito com o Sr. Conde de Linhares, que não se fechasse a sessão sem ella dar o seu parecer sobre o projecto a que S. Ex.ª se referiu, porque com grande injustiça tem sido accusada esta Camara de demorar os negocios publicos e impedir que passem em lei os projectos vindos do outro ramo do Poder legislativo isto é uma inexactidão, e as commissões nesta Casa teem dado pareceres sobre todos os objectos; e se tem demorado algum é por circumstancias que dellas não dependiam (apoiados). Neste caso a commissão de marinha não tem dado o seu parecer por esperar que viesse da outra Casa o projecto para o recrutamento militar do Exercito, por isso que tem ligação com este objecto.
O ponto para decidir, Sr. Presidente, é se é mais util fazer o recrutamento maritimo só pelas auctoridades de marinha ou Commandantes dos portos, fazendo elles o arrolamento na conformidade da Lei que o determina, ou chamar para isso as Camaras Municipaes. Eu confesso a verdade ao nobre Ministro, que esta emenda parece-me mal, não julgo conveniente que as Camaras Municipaes intervenham neste objecto; porque, sendo compostas de membros das localidades, fogem muitas vezes ao cumprimento do seu dever; são auctoridades que não são pagas nem tem responsabilidade pelos seus actos, e geralmente fazem todo o favor que podem aos individuos do seu municipio. E se querem ser reeleitos o modo é tirar dos recrutamentos os individuos que são sorteados, porque obtém as sympathias dos pais e parentes. São elementos todos estes que concorrem para que o recrutamento se faça irregularmente, ou mesmo para que se não verifique como já tem acontecido, e portanto já vé S. Ex.ª que> tenho duvida em acceitar essa emenda.
Parece-me, mas o nobre Ministro melhor o decidirá, que S. Ex.ª póde proceder ao recrutamento pela Lei de 1851; porque o que é necessario é recrutar, e já, para a Armada, porque se dá o caso de que quando não tinhamos navios faltava-nos o que é propriamente marinha de guerra, e hoje, que alguns navios temos, não temos marinheiros! Sempre mal neste objecto! (Apoiados.) Pela observação que fez o meu nobre amigo parece-me que não estamos muito de accôrdo, e então não tenho a dizer senão que a commissão de marinha fica illibada da accusação que se lhe tem feito de demorar este projecto, e em tempo opportuno se occupará da Lei do recrutamento maritimo com toda a actividade. Se me não engano a commissão de marinha não tem um só projecto de lei vindo da outra Camara sobre o qual tenha de dar parecer.
O Sr. Conde de Linhares — Peço a palavra.
O Sr. Presidente — Tem o Digno Par a palavra.
O Sr. Conde de Linhares — Eu estou completamente satisfeito com o que ouvi ao illustre Ministro, e ao meu nobre amigo e collega na commissão de marinha o Sr. Visconde d'Athoguia.
Parece-me que V. Ex.ª comprehende facilmente a razão pela qual eu trouxe esta questão á Camara: como sou membro da commissão de marinha, e podia ser accusado de não ter concorrido para que se apresentasse um parecer sobre o projecto tendente a satisfazer esta necessidade publica do recrutamento de marinha, entendi que devia dar esta explicação, e perguntar ao nobre Ministro se S. Ex.ª julgava que pela legislação actual poderia proceder a esse recrutamento. Estimo pois muito que S. Ex.ª me respondesse afirmativamente, e eu me conformo com a sua opinião, porque o que desejo é que o recrutamento tenha logar, e que na occasião de approvarmos uma nova lei ella seja maduramente pensada e discutida com o vagar e ponderação que tão importante lei exige.
O Sr. Ministro da Marinha — De certo que da parte do Governo nunca houve a mais leve intenção ou idéa de extranhar que a illustre commissão de marinha não desse o seu parecer sobre o projecto de lei a que o Digno Par allude nas suas considerações.
O que seria para desejar era que se promulgasse uma lei que desse todas as garantias, e fosse o mais aperfeiçoada possivel, mas na estreiteza do tempo, que não dará logar á discussão do projecto, o Governo não tem duvida em fazer obra pela Lei de 22 de Outubro de 1851.
O Sr. Presidente — Vou designar a deputação que ámanhã ha de apresentar os authographos que se acham nas circumstancias de serem apresentados á Real Sancção.
Será composta, alem do Presidente e do Sr. Secretario Brito do Rio, dos Dignos Pares: Viscondes, de Castro, de Fonte Arcada, de Fornos de Algodres, da Luz, e de Monforte.
O Sr. Presidente — Não ha hoje objecto algum mais que se possa discutir. A ordem do dia para ámanhã será o projecto de lei relativo á moeda falsa. Está levantada a sessão.
Eram tres horas e meia da tarde.
Relação dos Dignos Pares que estiveram presentes na sessão de 18 de Maio de 1859,
- Os Srs.: Visconde de Laborim; Duque da Terceira; Marquezes: de Ficalho, das Minas, e de Vallada; Condes: das Alcaçovas, de Azinhaga, do Bomfim, de Linhares, de Mello, de Mesquitella, de Paraty, da Ponte, da Ponte de Santa Maria, do Sobral, e de Thomar; Viscondes: d'Algés, d'Athoguia, de Balsemão, de Benagazil, de Castro, de Fonte Arcada, da Luz, de Monforte, e de Ovar; Barões: da Arruda, de Porto de Moz, e da Vargem da Ordem; Mello e Saldanha, Pereira Coutinho, Sequeira Pinto, Pereira de Magalhães, Ferrão, Pessanha, Aguiar, Larcher, Eugenio de Almeida, Silva Sanches, e Brito do Rio.