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O Sr. Marquez de Fronteira — Eu estou d'accordo com o que S. Ex.ª diz; mas se o Sr. Ministro não comparecer é porque póde passar muito bem sem essa lei.

(Pausa.)

O Sr. Marquez de Fronteira — V. Ex.ª já recebeu resposta da participação telegraphica que se dirigiu ao Sr. Ministro do Reino?

O Sr. Presidente — Ainda não, senhor.

O Sr. Marquez de Vallada — V. Ex.ª fez a participação para a Secretaria do Reino, e eu pedia que dirigisse outra para a dos Estrangeiros.

(Pausa.)

O Sr. Marquez de Vallada — Com quanto o Sr. Ministro do Reino não tenha iniciativa neste projecto, como S. Ex.ª é Presidente do Conselho, e por consequencia Chefe do Gabinete, intendo, e deve-se intender em boa philosophia politica, que o pensamento do Governo está emS. Ex.ª; parece-me pois que sobre um projecto de tanta gravidade e importancia, como é este dos cereaes, embora elle pertença ao Sr. Ministro das Obras Publicas, deve ser ouvido o Sr. Ministro do Reino; por consequencia, não havendo ainda proposta alguma a este respeito, faço-a eu; vem a ser —que este projecto se não discuta em quanto S. Ex.ª não estiver no seu logar.

Vozes — Não está dado para ordem do dia.

O Sr. Marquez de Vallada— Seja quando fôr; eu exijo a presença do Sr. Presidente do Conselho.

(Entraram os Srs. Ministros da Marinha e da Fazenda.)

O Sr. Presidente — Ha numero, vai lêr-se.

Leu-se a acta da sessão antecedente, contra a qual não houve reclamação.

Mencionou-se a seguinte correspondencia:

Dois officios da Camara dos Senhores Deputados, remettendo os seguintes projectos de lei:

1.º Sobre a concessão de uma pensão a Manoel Nunes Chanto. — À commissão de fazenda.

2.° Sobre ser auctorisada a Camara municipal de Coimbra a levantar um emprestimo para a reconstrucção da rua de Coruche, da mesma cidade. — Ás commissões de fazenda, e de obras publicas.

0 Sr. Conde de Linhares—Sr. Presidente, na sessão de 6 de Agosto corrente, tendo logar a segunda leitura de uma proposta que tive a honra demandar para a mesa, a Camara julgou conveniente adial-a até outra occasião, em consequencia de se achar reunida para discutir um projecto de consideração, já dado para ordem do dia. Eu creio, Sr. Presidente, que esta minha proposta deve ser discutida hoje, e que o seu adiamento não se póde estender por maior espaço de tempo sem a prejudicar, pois não sendo a mencionada proposta senão um adiamento do projecto vindo da Camara dos Srs. Deputados, que auctorisa o Governo a reformar as repartições da marinha, e tendo eu pedido na mesma sessão varios documentos que julgo indispensaveis para a discussão da auctorisação, e que ainda não foram remettidos para a Camara, importa a não acceitação da proposta o ser dado para ordem do dia o projecto de auctorisação que já se acha sobre a mesa, e que assignei vencido antes da remessa dos documentos pedidos. Pelo contrario, se hoje fosse approvada, isto não poderia acontecer, pois que ella é a seguinte (leu). Proponho o adiamento do projecto de lei vindo da Camara dos Srs. Deputados até que sejam remettidos para esta Camara todos os trabalhos que devem servir de base á refórma projectada.

Sr. Presidente, eu já disse em outra occasião quanto julgo necessario para justificar este meu pedido, e creio que S. Ex.ª tambem não terá muito que accrescentar ás razões que já deu para o não acceitar, por conseguinte só se tracta de uma votação que pouco tempo pede, e em nada prejudica aos outros trabalhos que estão dados como ordem do dia de hoje, e por ventura tenham maior urgencia do que esta simples decisão da Camara, que peço comtudo, lembrando que a sua rejeição importa a não satisfação da remessa em tempo opportuno dos esclarecimentos que pedi, facto este inteiramente novo nesta Camara, como disse ha dias um Digno Par o Sr. Aguiar, que certamente está muito mais ao facto do que eu dos usos desta casa. Talvez a minha proposta seja rejeitada, mas não se diga que a m pedido tão justo, e com tantos precedentes se negou mesmo uma votação.

Já que estou em pé peço a V. Ex.ª licença para fazer uma simples observação. Coméço por declarar que respeito muito a pessoa do nobre Ministro da Marinha, e que tenho para com S. Ex.ª a maior consideração, por conseguinte está claro que, quando combato a maneira pela qual S. Ex.ª entende certos negocios da marinha, não é minha intenção offendel-o, bem pelo contrario (apoiados). Creio tambem que não soltei nas ultimas sessões nenhuma expressão, da qual S. Ex.ª se podesse escandalisar, se o fiz estou prompto a retiral-a, porém parece-me que não tenho que retirar; entretanto vou relatar um facto que se diz succedido o outro dia, ainda que eu não o notei, nem mesmo o acredito; lendo um jornal que se publica nesta capital, encontrei no extracto da sessão de 6 de Agosto corrente, a que alludo, que por occasião da segunda leitura da proposta S. Ex.ª o nobre Ministro pronunciára as seguintes palavras eu agora não respondo, porque não quero ou alguma cousa similhante, pois não estou bem presente, nem tenho aqui o jornal. Devo dizer, Sr. Presidente, que eu não ouvi essas expressões a S. Ex.ª, porém como appareceram em um jornal.... (O Sr. Visconde d'Athoguia —Eu tambem não ouvi, e estava attento á discussão). O orador—Muito bem, entretanto julguei conveniente fazer esta reflexão para S. Ex.ª o Sr. Ministro ter occasião de se explicar, o que estou certo fará com a delicadeza que lhe é propria.

Agora termino pedindo a V. Ex.ª submetta á votação dá Camara a minha proposta, que se fôr rejeitada me proponho renovar em occasião competente, na discussão da auctorisação dando-lhe outra fórma.

O Sr. Ministro da Marinha—Pedi a palavra unicamente para rectificar o que disse o Digno Par.

A noticia que a S. Ex.ª deram não e exacta; uma pessoa que tem alguma educação, nunca diz uma cousa que importa falta de cortezia e de delicadeza (apoiados).

Em quanto ás expressões que o Digno Par me dirigiu agradeço-as muito, assim como tomo sempre em muita consideração as reflexões que se fazem na discussão, pois é assim que. se chega á verdade. Podemos divergir, ainda os amigos mais Íntimos, e em opiniões eu divirjo de alguns muitas vezes; da discussão dirigida pela vontade de esclarecer os negocios, é que resulta a verdade (apoiados).

Quanto á proposta do Digno Par, a Camara fará o que entender; eu considerei-a unicamente pelo que respeita á ultima parte della, em que fazia dependente a approvação da Camara da apresentação de muitos documentos, e então disse que não tinha duvida alguma de apresentar todos os documentos officiaes que atai respeito houvessem no Ministerio a meu cargo, mas que julgava, e ainda julga, que uma tal proposição tendia a demonstrar, que tinha diminuido a confiança que esta Camara me havia concedido no anno passado. Foi por este motivo que eu disse, que adoptando-se a proposta do Digno Par, eu não acceitaria a auctorisação.

Em conclusão direi, que estou prompto a dar pessoalmente á commissão de marinha todos os esclarecimentos que ella julgar necessarios; estou prompto a enviar á mesma commissão todos os papeis que ella julgar precisos, mas se disso se fizesse depender a approvação do projecto de lei, eu não acceito a auctorisação de que ella tracta; é uma questão muito simples, e por isso nada mais me cumpre accrescentar.

O Sr. Presidente — Eu tenho alguma difficuldade em pôr á votação a indicação do Sr. Conde de Linhares, porque esse objecto não foi dado para ordem do dia, todavia consultarei a Camara, se quer que effectivamente se tracto desse objecto antes da ordem do dia, e que seja votado em primeiro logar.

Não foi approvado.

O Sr. Conde de Linhares — Peço que então seja dado para ordem do dia da sessão seguinte.

G Sr. Presidente — Tomo em consideração o requerimento de V. Ex.ª

O Sr. Ferrão—É para pedir a V. Ex.ª haja de submetter á approvação da Camara este requerimento, que faço—que seja impresso no Diario do Governo o meu projecto do Código regulamentar da lei hypothecaria, que ha dias tive a honra de apresentar a esta Camara (apoiados).

Foi approvado.

O Sr. D. Carlos Mascarenhas — É para mandar para a Mesa um parecer da commissão de guerra sobre um projecto vindo da outra Camara (leu).

O Sr. Visconde de Ourem—É tambem para mandar para a Mesa um parecer da commissão de marinha e ultramar sobre um projecto de lei.

Foram mandados imprimir.

O Sr. Marquez de Ficalho — (Sobre a ordem.) Ha o parecer n.º 28 sobre a admissão dos cereaes, urgentissimo. (O Sr. Ministro da Fazenda — Apoiado.) Se a Camara entendesse que se podia occupar delle na ordem do dia de hoje, parece-me que fazia um serviço ao paiz (apoiados).

O Sr. Presidente — O Digno Par requer que, não sendo dado para ordem do dia o projecto dos cereaes, todavia, attendendo á sua necessidade, urgencia e utilidade, entre em discussão immediatamente (apoiados).

O Sr. Visconde d'Athoguia—Eu peço a palavra.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada — Tambem eu.

O Sr. Marquez de Vallada — Eu queria a palavra sobre a ordem, logo que entrasse o Sr. Ministro do Reino.

O Sr. Presidente — V. Ex.ª já está inscripto. (O Sr. Visconde de Castro — Peço a palavra.) Tem o Sr. Visconde d'Athoguia a palavra.

O Sr. Visconde d’Athoguia — Eu estou de accôrdo com o Sr. Marquez de Ficalho, que é da maior necessidade que se discuta quanto antes o projecto relativo á Lei de cereaes; mas permitta-me que eu observe que deverá ter alguma discussão esse projecto; não acontecerá assim aos projectos de lei n.ºs 9 e 10: ambos tem por fim continuar as disposições legislativas pelas quaes se augmentaram na ilha da Madeira os direitos a alguns generos de industria nascente: disposições que deixarão de ter execução por lhes ter acabado o tempo marcado.

O Sr. Presidente — Parecia-me que andava bem pondo estes projectos á discussão, e depois, se houver tempo, os outros, creio que é a fórma regular (apoiados).

O Sr. Visconde de Fonte Arcada — Sr. Presidente, primeiro que tudo desejava que V. Ex.ª tivesse a bondade de mandar vêr á secretaria se já foi satisfeito o meu requerimento de 2 da Agosto. Este requerimento é importante para a discussão que nos occupa, e tambem pedi naquelle dia que se tornasse a pedir pelo Ministerio das Obras Publicas a relação dos preços dos cereaes em certos portos, ora eu creio que esta é a terceira vez, desde Fevereiro, que faço este requerimento, porque foi renovado por vezes, e ainda não vieram para esta Camara os esclarecimentos que pedi; o portanto desejava que V. Ex.ª me fizesse o favor de mandar saber se já tinham vindo. (O Sr. Presidente—Ainda não veio esclarecimento algum sobre o requerimento de V. Ex.ª) Ora, além disso, eu precisava da presença do Sr. Ministro das Obras Publicas para a discussão deste projecto.

O Sr. Ministro da Fazenda — Elle virá quando começar a discussão.

O Sr. Presidente — Quando vierem os esclarecimentos será communicado ao Digno Par. Agora tem a palavra o Sr. Visconde de Castro. (O Sr. Visconde de Castro — Eu cedo da palavra.) Tem então o Sr. Marquez de Vallada a palavra.

O Sr. Marquez de Vallada — Sr. Presidente, o destino da humanidade parece um insondavel mysterio, ao qual se tem querido dar explicações contradictorias nos dois campos em que Se divide a humanidade: um, o do catholicismo, outro, o da falsa philosophia. Estremados bem esses dois campos, ergueu cada um delles a sua bandeira, cuja lenda exprime interesses oppostos, e que tem portanto differentes tendencias. Travou-se porfiada lucta, renhida contenda, e depois de muito combater propoz-se uma transacção, não lembrando aos que a propozeram que ella é impossivel; porque apezar de invocarem a palavra civilisação, essa palavra não exprime uma idéa que possa ter duas significações. Assim como o bem não póde transigir com o mal tambem a verdade nunca dará a mão ao erro. A impossibilidade do accôrdo era portanto manifesta; e destruiu-se assim toda a esperança de convenio.

E eu, Sr. Presidente, applaudo-me por isso. Felizmente não é já possivel a illusão por meio do sophisma: os dois campos estão bem estremados. É impossivel a confusão. N'um estão os homens que defendem os grandes interesses sociaes: no outro os homens que acham lícitos todos os meios para desorganisar o equilibrio desses grandes interesses, e destruirem o edificio da verdade, para levantarem sobre as suas minas o lúgubre estandarte do erro e da falsidade.

Pensando nisto, Sr. Presidente, eu sinto que ha occasiões na vida politica em que se póde convir que o homem publico seja reservado, e guarde silencio, que não só é então uma necessidade, mas tambem uma virtude; que outras occasiões ha porém em que não póde deixar de fallar, e exprimir as suas opiniões para dar uma satisfação ao paiz. Dizer-lhe a verdade, tal qual é, torna-se então um dever imperioso a que não é dado faltar ao christão catholico, e ao patriota sincero. Dizia um eloquente escriptor: — Tempus est loquenai, quia jam prmterit tempus tacendi: lacere signum est diffidentia; non modestia; ratio.

, Persuadido desta verdade, Sr. Presidente, não posso deixar de vir hoje a esta Camara, e do alto desta tribuna, em conformidade com os meus principios sempre liberaes, principios que tenho constantemente defendido desde o primeiro dia em que pronunciei um discurso nesta casa, desde que tracei pára mim um programma, ao qual digo com ufania que ainda não tenho faltado; julgo que é do meu restricto dever chamar a attenção dos Srs. Ministros sobre um negocio grave e importante, a respeito do qual é preciso não só dizer a verdade, más dizel-a toda inteira; e citarei para me auctorisar até certo ponto o que disse um escriptor bem conhecido pelas suas Revistas litterarias, mr. Philarete Charles. Dizia elle: — «Na época presente (referia-se aos acontecimentos da França em 48) é preciso dizer aos artistas, aos aristocratas, ao povo, a todos n'uma palavra, a verdade toda, a verdade sempre; citando um moralista do 10.° seculo, que tambem dizia: — «adorar a verdade ainda que esteja pendente de uma forca.» Fundado em tal auctoridade, direi a verdade, toda, a todos, e em tudo.

A verdade, Sr. Presidente, ás vezes é compromettida pela debilidade dos seus defensores. Espero que não se dirá isso de mim; porque, quando ella é defendida em termos convenientes, é certo o seu triumpho: posto que algumas vezes tarde a apparecer, é isso uma questão de tempo. A victoria a final é sua.

Sr. Presidente, já a Camara sabe quaes são as idéas que vou apresentar, e a proposito de que. Já tambem o sabe o Sr. Presidente do Conselho, e meu nobre amigo: pela deferencia que devo a S. Ex.ª tão propria de cavalheiros para cavalheiros, indiquei-lhe hontem os topicos que havia de tocar, quando tractasse do negocio de que me vou occupar agora.

É cousa de todos sabida que o Governo de Sua Magestado admittiu neste reino o instituto das irmãs da caridade em 1819; que por causas que é escusado referir esse instituto decaiu sensivelmente depois de 1834; e que pereceria infallivelmente, se se não procurasse fazel-o revigorar pelos unicos meios conducentes, e que são obvios; que o Governo concedeu a permissão para se applicarem esses meios; e que essa concessão deu pretexto a porfiadas e retinidas luctas na imprensa deste paiz. E cabe aqui dizer, mas digo-o com magoa, e só porque é preciso dizer neste particular a verdade, que se houve uma discussão placida da parte de alguns iludidos que nessa discussão queriam sómente manifestar a sua divisa, tambem deve confessar-se que alguns só procuraram desvairar o povo, e concitar as massas impellindo-as para a desordem, a perseguição, a revolta; pois outra cousa não é essa perseguição vil e torpe das pedradas, dos insultos grosseiros, e das insinuações ignobeis. Á vista desta demonstração, eu seria com razão arguido de pouco precatado se não chamasse a attenção dos Srs. Ministros sobre este objecto, que todos reputam grave, qualquer que seja á lado por onde se encare. Vou pois affastar de mim essa arguição, que me pesaria auctorisar com o meu silencio.

Dir-se-ha talvez, por parte dos Srs. Ministros, que é necessario respeitar a opinião publica. Será um grande principio respeitar a opinião publica, mas superior a elle está o dever dos Governos de extremarem a verdadeira opinião publica, sensata, christã, e que portanto só quer a justiça e o bem, e reclama que se respeitem e protejam os direitos legitimos de todos; superior a elle está o dever de se separarem da opinião volúvel, caprichosa, injusta e feroz, que usurpa muitas vezes o nome daquella, e que não é senão o bradar tumultuario dos interesses faciosos e dissolventes. Superior a tal principio, emfim, está o dever dos Governos de luctarem contra os preconceitos que ás vezes se apoderam do espirito das nações, e aballam e chegam até destruir os fundamentos da sociedade.

Eu não comprehendo, Sr. Presidente, um Governo desacompanhado da verdadeira opinião publica, porque fica privado da força moral, tão necessaria aos homens que presidem ao destino das nações; mas tambem não comprehendo um Governo attrelado ao jugo ignominioso da falsa opinião publica; e por isso tenho direito de exigir dos poderes publicos da minha terra o exacto, fiel e rigoroso cumprimento da sua missão, que o é de certo e muito grande, illustrar o espirito publico, oppôr-se a que seja desvairado a ponto de proclamar a soberania do erro, e 0 exílio da verdade. E se o facto se der oppôr-se a elle com toda a dedicação do seu encargo. Ora, é para que esse caso não chegue, que peço aos Srs. Ministros que fallem, que digam o que tencionam fazer para oppôr diques ao mal, porque é sempre muito melhor e mais conveniente previnir o mal do que ter depois que o remediar, o que já foi dito por um grande Poeta da antiguidade quando escreveu: — Principiis obsta, sero medicina paratur.

É preciso que os homens que teem de regeras nações tenham sempre em vista este grande principio: — é mais facil e melhor previnir o mal do que vêr-se na necessidade de remedial-o depois. Muitas vezes tenho ouvido invocar a força das cousas para desculpar o esquecimento deste principio; mas pouco depois reconheceu-se que não houve senão a fraqueza dos Governos.

Quando fallo assim, Sr. Presidente, não se diga, não se pense que provoco as perseguições contra individuos; por mais que os julgue culpados, e são-nos de certo, até perante a humanidade, porque são os seus erros o clarim bellicoso que chama os discolos ao combate contra a sociedade; eu não quero rigor senão contra os erros, para os que os professam não tenho mais sentimentos que os da compaixão e do amor. Eu digo com o virtuoso Guigues de Chartreux: «Diligite homines, interficite errores»; devem-se amar os homens, e ao mesmo tempo anniquilar os erros;

Sr. Presidente, acaba de apparecer n'alguns jornaes desta capital um requerimento, ou antes um protesto contra as decisões e arbitrios do Governo. Entende-se que é a expressão da opinião publica, que alli está manifestada? Entende-se tambem que o Governo deva ceder visto que a opinião publica se pronunciou? Eu não o entendo assim; e anima-me a dize-lo não só a força da minha convicção, mas igualmente o exemplo não mui distante dos tempos em que vivemos, pois teve logar ha doze annos apenas, que me deu um grande vulto historico em circumstancias quasi analogas.

Eu creio que tanto S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho, como todos os homens nas suas circumstancias teriam prazer em que se Honrasse o seu nome tanto quanto o daquelle foi honrado Ministro. Pois bem, com Sir Roberto Peell succedeu o seguinte:

Tractava aquelle homem de Estado de apresentar ao Parlamento um bill pelo qual se concedia uma prestação ao seminario catholico de Maynoth. Note-se que era um Ministro protestante, mas era homem liberal. Succedeu que, depois de apresentada áquella medida, um dos membros do Governo pediu a sua demissão e sahiu: os outros membros do gabinete não tinham uma opinião fixa sobre o negocio. Sir Robert Peell, desamparado dos seus collegas, e abandonado por um, achava diante de si uma opposição numerosa, e ameaçadora, que se preparava ã esmaga-lo com o peso de seus votos; e tanto mais encarniçada se mostrava, que o podér seria o despojo que tomariam os vencedores: sobre a mesa da presidencia achava-se uma petição contra o bill, firmada por 918 mil assignaturas; tal era a impopularidade do bill! E sabe V. Ex.ª, Sr. Presidente, o que fez Sir Robert Peell? Vendo a tempestade que ameaçava a sua proposta, que uns dos seus amigos o abandonavam, e que outros lhe pediam que fosse prudente; convencido da justiça do seu bill, apresentou-se no parlamento e fallou clara e francamente: fez mais, tractou de pôr fóra de combate todas as antipathias estabelecidas, e todas as repugnancias suscitadas. O resultado foi que esse bill foi approvado pela maioria de 119 votos. O Ministro viu coroados os seus esforços, porque tinha a consciencia de que as medidas que apresentava eram fundadas na razão, e na honra do seu paiz; e sabia que um Ministro que cede a exigencias desarrasoadas, debilita e avilta o podér, que não lhe pertence, porque é méramente o depositario delle.

Ao recordar este exemplo, sinto Sr. Presidente, que não esteja agora presente o Sr. Carlos Bento da Silva, Ministro das Obras Publicas, que tão enthusiasta e pelas cousas inglezas, para comigo dar o devido elogio ao proceder de Sir Robert Peell, no caso que acabei de referir; e sinto á ausencia de S. Ex.ª porque tambem sou enthusiasta, e muito do systema inglez, talvez devido isso á minha educação.

Continuarei dizendo, que Sir Robert Peell se apresentou no Parlamento, e disse: — «Ninguem mais do que eu se ufana do apoio de um partido politico, grande e illustre como é o que me apoia; mas estou resolvido a nunca ceder ás exigencias desvairadas de nenhum, nem do meu, estando prompto a largar o Ministerio antes do que a transigir com uma injustiça. Um dos mais felizes dias da minha vida será aquelle em que possa apresentar-me como um membro independente do Parlamento.» N'outra occasião; tambem notavel, disse este mesmo Ministro: — «Ninguem mais do que eu respeita a opinião publica; mas entendo que a opinião publica precisa de ser esclarecida para ser respeitavel, porque ella desvairada produz terriveis resultados.»

Sr. Presidente, assim entendo eu que se póde e deve ser Ministro, porque se conserva o podér com dignidade. Um homem qualquer é elevado ao podér, em vista das suas qualidades de homem de Estado acerca-se delle um partido politico, mas que nunca lhe imponha condições, ou antes, que elle as não acceite. E é isto o que acontece as mais das vezes? Não. O que se vê e que para os Ministros conservarem o podér, se lhes impõem condições servis e ignobeis que elles não coram de acceitar.

Trouxe estas palavras para mostrar que o Governo tem obrigação de investigar a opinião pu-