496 DIARIO DA CAMABA DOS DIGNOS PARES DO REINO
quecidas em Aden, ou por terem sido mandadas por engano para outros portos, e quando chegavam estavam muita vez deterioradas.
Disse o digno par que esperássemos por um periodo de maior prosperidade. Pois é exactamente para attingir esse periodo de prosperidade, que todos desejamos, que eu procurei estabelecer esta navegação directa e rapida, condição essencialissima para que Moçambique prospere.
E esta opinião não é só minha é partilhada por todos os membros das commissões do ultramar e de fazenda.
Não ha duvida que este contrato não considera a navegação directa de Lisboa para a India. No emtanto, não resulta d’ahi a interrupção das nossas relações em Goa.
Todos sabem que passageiros e carga podem aproveitar-se, com pequeno incommodo mais, e com tenue dispendio, de qualquer das tres linhas inglezas e franceza, indo procural-as a Gibraltar ou a Marselha, ou, ainda, aos portos do norte. Isto na hypothese de que a «British India» supprime a escala de Lisboa, o que não é ainda certo.
Para não cansar mais a attenção da camara em assumpto que a grande maioria dos membros d’esta casa, sem distincção de cores politicas, consideram do mesmo modo que eu, porei termo ás minhas explicações.
O sr. Pires de Lima: — Ouvi com toda a attenção as considerações apresentadas pelo nobre ministro da marinha, e das palavras que proferiu concluo que s. exa. é de opinião que, para melhorar algumas colonias de Africa, devemos impor excessivos sacrificios á metropole e devemos cortar as communicações entre Lisboa e Goa.
Eu tenho um grande amor ás nossas provincias ultramarinas, mas adoro muito mais a metropole, e vejo que o illustre ministro tem principios em diametral opposição com as minhas idéas. Quero que a metropole acuda ás provincias ultramarinas, mas não sou de parecer que esse auxilio vá ao ponto de se sacrificar por ellas, e muito menos entendo a conveniencia de cessar a communicação entre Lisboa e Goa.
Diz o illustre ministro que as relações commerciaes entre a nossa, cidade e Goa são actualmente insignificantes, mas não affirma s. exa. que o commercio que ha annos havia entre Lisboa e, algumas das nossas possessões, de limitado que era, se desenvolveu muito, e que revela tendencias de augmento e de grande prosperidade?
Pois que rasões ha para que se duvide que o movimento commercial entre Lisboa e a capital da Índia chegue a um certo grau de augmento? Em que bases assenta a resolução de se cortar a communicação directa entre Lisboa e Goa?
Acrescenta o illustre ministro que ha de trazer mais tarde um projecto que tenha por fim o estabelecimento de uma communicação directa entre os dois pontos. E porque ha de ser mais tarde e não hoje, quando, no fim de contas, as condições do novo contrato são inferiores ás do antigo? O antigo impunha-nos o pagamento de quarenta e tantos contos, e o novo, que está submettido á apreciação d’esta camara, obriga-nos a um dispendio de setenta e tantos, reduzindo-nos, note-se bem, á necessidade de mais tarde fazermos novo contrato especial para a communicação com Goa!.
Melhore-se Moçambique, trate-se do engrandecimento d’aquella provincia, mas façamos isto sem prejudicar a metropole e sem prejudicar as relações da nossa provincia de Goa, justamente quando essa provincia vae entrar em uma epocha de prosperidade.
(O orador não reviu,)
Posto o projecto á votação, foi approvado na generalidade e na especialidade.
SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA
Continua a discussão do orçamento de despeza da junta do credito publico
O sr. Mendonça Cortez: — Começou por estranhar na discussão se antepozesse o orçamento da junta do credito publico ao do ministerio da fazenda, alterando-se por esta fórma a ordem que logicamente n’ella se devora manter. Não obstante, acatava a resolução que n’este sentido a maioria tomara, porquanto lhe cumpria votar como entendesse.
Em seguida, entrando na apreciação do orçamento da junta, notou que a sua dotação augmentara, e havendo alguma differenca entre o por ella apresentado e o do sr. ministro resumiu, as rasões que a seu ver a motivara, juntando que a tal proposito faria ainda algumas observações, se a ventura lhe permittisse que s. exa., o sr. presidente, lhe prestasse attenção.
(O sr. presidente do conselho certificou-o de que estava attentissimo.)
Advertiu-lhe, porém, o orador que não se refirira a s. exa., mas ao sr. presidente da camara e proseguindo logo no que se propozera, depois de ampla e copiosa leitura de varias prescripções legaes e de fazer amiudadas referencias aos juros da divida fundada interna, bem como a diversos factos relativos á gerencia dos negocios da junta nos annos anteriores, comparado tudo com o projecto em discussão, surgiu por ultimo na inferencia de que as verbas d’este eram uma transparentissima illusão, visto como o sr. ministro frequentemente exorbitava das concedidas. Alem d’isto, se bem ás vezes, segundo em assumptos financeiros devem fazer todos os ministros, s. exa. pedia mais do que era presumivel gastar-se, comtudo succedia que nem sempre tornava extensiva essa boa doutrina ao que mais devera importar.
Alludindo depois á troca do cambios, e ao toque do oiro e prata de varias nações estranhas, censurou que um dos elementos de calculo fosse a libra esterlina, por já vir cerceada e ser esse o motivo da sua exportação para Portugal, quando ainda mesmo estando ella no seu estado perfeito, era superior o toque do oiro portuguez. Parecia-lhe, pois, que com os elementos que viera de subministrar, se poderia achar approximadamente o valor normal da libra ao par.
Mas attento o cambio designado no orçamento, aliás bem elaborado, e o que havia a despender com os empregados da agencia financeira e respectivo expediente, e outrosim com os juros em circulação na posse da fazenda, resultava, quanto aquellas, a necessidade de pagar cincoenta e tantos mil réis a mais e, quanto aos ultimos 18:000$000 réis. E não se taxassem de insignificantes estas verbas, pois se fosse a comparar-se a administração da divida publica portugueza com os seus proprios juros, chegar-se-ia ao triste corollario de estarmos na cabeça do rol das nações que fazem maior despeza. E no proposito de comprovar esta asserção, passou em revista a Prussia, a Austria, a Bélgica, a Dinamarca e a Inglaterra, reiterando que era effectivamente Portugal a nação que mais alardeava em luxo de administração.
Porém, sendo possivel contestar-lhe o sr. ministro quanto vinha de asseverar lhe, valendo-se a esse fim da circumstancia de alguem o exalçar como o primeiro dentre os melhores financeiros e por estar o seu nome vinculado a importantissimos melhoramentos, desde já o atalhava nos seus designios e do modo seguinte: que presidindo s. exa., haveria approximadamente já uns treze annos successivos, aos negocios publicos como ministro da fazenda, por tão dilatado este praso de tempo, lhe pertencia, ainda que maior, proporcional quinhão na responsabilidade do augmento da divida publica. Conseguinte evidentemente devera antes apresentar-se como um activo cooperador d’esses melhoramentos, porém jamais como o primeiro.
Finalmente, o orador poz termo ao seu discurso, com a chegada do relator da commissão de fazenda, protestando que seria desconsideral-o deixar de analysar o seu respectivo parecer; e posto que o devesse fazer só quando se discutisse a lei de receita publica do estado, no emtanto antecipar-se-ia caso lho permittisse o sr. presidente da camara,