DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 497
(O discurso será publicado, na integra se por acaso s. ex. nol-o devolver.)
O sr. Presidente:— A lei não está em discussão.
O Orador: — Então desde já peço a palavra para quando ella se discutir.
Devo, porem, dizer que no parecei da commissão de fazenda, a primeira impressão que senti ao lel-o, foi de um grandissimo pezar, quando observei que algumas da verbas que se apresentaram ao meu espirito, em medonhos milhares de cifras, vinham reduzidas a meia dezena de milhares, julgando então que tinha havido diminuição nas despezas publicas, de que tinha provindo aquelle milagroso resultado.
Depois, porem, de analysar o parecer, o enthusiasmo desappareceu de prompto, e por isso desde já peço a palavra para quando se discutir a lei da receita.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): —Tivesse eu a pretensão de ser o primeiro em alguma cousa, que não o desejara ser senão em manifestar o profundo respeito e attenção que me merece o digno par, o sr. Mendonça Cortez, muito embora em tudo mais fosse o ultimo.
Sr. presidente, ouvi, pois, com toda a attenção ò digno par, e supposto eu não concorde com a opinião de s. exa., não tenho duvida, todavia, em declarar que o seu discurso provou mais uma vez a sua grande illustração e profundos conhecimentos.
O assumpto que se discute é de sua natureza restricto, não se prestando, portanto, a grandes divagações; e comtudo s. exa., discutindo-o conseguiu entreter a camara por bastante tempo.
A junta do credito publico é uma instituição cuja dotação está marcada no orçamento geral do estado, cujo calculo de despeza é pouco sujeito a erros.
Existe uma certa divida publica interna, assim como tambem existe uma determinada divida externa, e a tudo isto corresponde um juro preciso e determinado.
Ha, comtudo, uma parte que póde variar, e a esta se referiu, tambem, o digno par, o sr. Cortez: é a despeza feita com os empregados.
Alem d’isso, n’este mesmo projecto, que estamos discutindo, se nos apresenta uma differença relativa ao juro da divida externa fundada; mas, n’esse ponto, o digno par deve considerar que, ainda assim, as contas da gerencia dos diversos annos provam que esta despeza é em uns maior, em outros menor, comquanto a differenca não seja muito grande.
Mas, admittida ella, claro está que deve haver uma tal ou qual explicação.
O digno par referiu-se aos orçamentos de 1872, 1874, 1870 e 1877; mas nós estamos discutindo agora o orçamento para o futuro anno.
No orçamento da junta do credito publico ha algumas verbas que, por sua natureza, podem ser variaveis, como, por exemplo, a verba que diz respeito a cambios.
O digno par sabe perfeitamente que os cambios podem variar a despeito da vontade do governo.
Nós, por exemplo, temos que mandar uma certa porção de dinheiro de Lisboa para Londres, sendo que elle ha de variar, conforme estiver o cambio.
S. exa. sabe que o orçamento pôde, effectivamente, determinar um certo cambio, mas a praça é que póde não estar por essa determinação.
O governo calcula uma determinada verba, correspondente ao cambio que ha, quando se faz o orçamento; mas, se o cambio, na occasião da remessa do dinheiro, for maior ou menor do que está calculado, de certo haverá uma differença que não estava prevista no orçamentos .
O digno par referiu-se tambem á amortisação a cargo da junta do credito publico.
Sobre este assumpto não entrarei em largas considerações porque s. exa. tambem as não fez, e eu desejo muito ser cuidadoso na economia do tempo, e, portanto, não entrarei em minudencias.
É certo, sr. presidente, que existe na legislação em vigor a amortisação da divida interna, que diz respeito aos coupons da camara municipal.
Esses coupons amortisam-se, e, desde que são apresentados, têem forçosamente que ser pagos, se bem por vezes se apresentem em maior ou menor quantidade.
Ora, é claro que, dada esta alternativa, as contas da gerencia hão de, naturalmente, accusar a differença que d’ahi resulta.
Aqui está como eu, bem ou mal, respondo á observação do digno par.
Emquanto ao cambio, permitta-me s. exa. lhe diga ainda que tratou a questão scientificamente: foi buscar o valor do oiro e da prata, para o que alludiu á lei de 1854, e fez diversos calculos muito exactos.
Deixou, porém, de considerar pequenas modificações, as quaes aliás teem occorrido, e que, supposto pareçam insignificantes, alteram muito os calculos.
Supponhamos, no emtanto, que não havia modificação nenhuma, e que era exactamente o que diria o digno par; isso apenas serviria para a apreciação do cambio legal, isto é, do que resulta do valor intrinseco do metal; mas o cambio effectivo, aquelle de que nós estamos tratando, é o cambio formado pelas praçes, em consequencia de certas leis economicas.
Se assim não fosse... o digno par, segundo os seus gestos, está-me dizendo que não é assim; mas digne-se v. exa. de me continuar a ouvir.
Se não fosse esta a rasão terminante, é claro que o cambio seria constante; mas a verdade é que elle varia muitas vezes de mez para mez, de semana para semana, e até de um dia para o outro, pela maior procura em consequencia da necessidade de ter em Londres o dinheiro necessario para o pagamento de uma certa quantia.
O sr. Mendonça Cortez: — Se v. exa. me dá licença é unicamente para rectificar uma asserção que me parece ou v. exa. não comprehendeu, ou, mais provavelmente, eu não consegui bem exprimir.
Não quizera, pois, que v. exa. estabelecesse um certo e determinado cambio, mas que marcasse um limite como já se tem feito.
O Orador: — O digno par acaba de confirmar o que eu ha pouco disse: desde que o cambio é variavel, que muda de mez para mez, e de dia para dia, o governo não podia estabelecer no orçamento o cambio determinado para fazer um pagamento num a certa epocha, não podia prever qual se seria n’essa occasião, e por isso fiz o que é costume fazer-se, e se tem feito nos annos anteriores, pois o cambio n’esta occasião, póde tanto ser prejudicial como favoravel ao governo, depende da oscillação.
(Observação do sr. Cortez que não se ouviu.) Mas o cambio ao par nem sempre existe, é quasi que aro, e o digno par sabe perfeitamente, porque tem dirigido superiormente um estabelecimento de primeira ordem na apitai, que nós não podemos calcular, senão o cambio hypothetico, o qual ha de ser necessariamente o do dia em que se fizer a operação.
E agora reparo eu na affirmação de um digno par, que tambem é conhecedor da materia, e me está indicando que tenho rasão. É o sr. Manuel Antonio de Seixas. (Riso.)
Ora, muito bem, isto é claro, toda a gente sabe isto. Riso.)
Agora, sr. presidente, tenho que responder ainda a certas observações apresentadas pelo digno par, não com o desenvolvimento com que s. exa. as apresentou, mas com aquelle de, que sou capaz de oppor & argumentação abundante de s. exa.
O digno par tratou a questão sobre um ponto de vista theorico, e eu tenho de o tratar debaixo do ponto de vista pratico.