O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

776 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

que a occasião em que o documento a que acaba de se referir o digno par o sr. Barjona de Freitas provoca tantas declarações.

A camara desculpar-me-ha o tornar-lhe alguns instantes fallando a respeito da minha pessoa; mas perceberá que o que para ella nenhuma importancia tem, é para mim de primeira necessidade e que não posso deixar de historiar como estou e porque estou aqui.

Chegou a occasião de se extremarem bem os campos politicos e não quero que sobre mim haja equivocos.

E é certo, sr. presidente que não faço mais do que seguir exemplos dados já na actual sessão.

Ouvi ainda não ha muito tempo aqui um collega nosso levantar-se para dizer que pertencia a um determinado ministro; ouvi o digno par o sr. Manuel Vaz declarar que não pertencia ao governo, e por ultimo os signatarios do manifesto que provocou a declaração do orador que me precedeu não se dirigiam a esta camara mas ao para inteiro dizendo-lhe que pertenciam ao sr. conselheiro Antonio de Serpa, Pimentel.

A mim que pouco valho, tambem assiste o direito de declarar bem alto que não pertenço a ninguem, que não tenho compromisso algum e que estou no meu direito de assim o declarar sem receio de ser contradito.

A minha vida politica, sr. presidente, é muito curta. Ha pouco mais de dois annos não pensava sequer em entrar nas lides partidarias; o meu tempo gastava-o tratando da minha casa, dos meus negocios particulares e no convivio de amigos que, se enganam ás vezes nunca atraiçoam. Foi n'estas circumstancias que fui um dia procurado por um homem, que toda a gente chora, amigos como adversarios, que hoje se chora mais do que hontem, pelo sr. Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello, que vinha pedir-me que acceitasse as candidaturas, que outra cousa me não podia offerecer, de membro d'esta casa e de presidente da camara, municipal de Lisboa.

Lisonjeou-me a offerta; lisonjeou-me não só porque na minha vida não havia precedentes que me indicassem para o desempenho de cargos tão importantes, mas porque na occasião em que para elles era procurado, acabava eu, como já tive occasião de dizer n'esta casa, de ser o alvo das mais vis calumniadas de uma parte da imprensa portugueza, e não podia eu deixar de orgulhar-me vendo que um homem que se chamava Fontes Pereira de Mello, desprezando como devia a baba que sobre mim tinham lançado os calumniadores, vinha pedir-me que acceitasse uma missão tão honrosa quanto difficil, como era sobretudo a de presidente da camara municipal de Lisboa, embora eu reconhecesse quanto era grande, apesar da escolha que me honrava, a minha insufficiencia para o cabal desempenho do cargo que se pretendia confiar-me.

De uma unica condição fiz depender a minha acceitação: que aquelles que me tinham confiado o mandato, de outro genero, que eu então desempenhava, acceitassem a minha renuncia; e impuz esta condição, não porque julgasse que havia incompatibilidade entre uma e outra funcção mas porque julgo que são tão pesadas as obrigações de quem toma a seu cargo uma parte da administração publica que quem o faz deve estar, tanto quanto possivel, desprendido de quaesquer preoccupações, que não sejam as que derivam dos interesses que lhe são confiados.

E quem não podér proceder por esta fórma melhor é que se abstenha da vida publica.

Satisfeita a condição, por mim imposta, acceitei, e desde esse dia julguei-me filiado no partido regenerador e fil-o sem hesitar, não só porque com tal chefe eu não podia receiar, seguindo a sua bandeira, o ter um dia de partilhar responsabilidades que me envergonhassem, mas porque, embora não applaudisse todos os actos do partido regenerador, muitos havia em que me honraria ter collaborado e que eram inspirados pelos principios liberaes que mais prezo.

E já que fallo em principios partidarios, permitta-me v. exa. e permitta-me a camara que eu diga algumas palavras a este respeito, aproveitando a occasião para me referir a umas phrases que foram aqui ha tempos pronunciadas pelo digno par o sr. dr. Senna.

S. exa. mostrou-se muito espantado por ver, que no mesmo partido, ao lado dos homens rasgadamente liberaes, se levantavam outros que, em certos e determinados assumptos, emittiam opiniões que se não harmonisavam com as apregoadas tendencias da facção a que estavam ligados.

O digno par não está presente, mas apesar d'isso eu direi que aquelle nosso illustre collega deu n'essa occasião uma grande prova da sua ingenuidade, e digo isto na ausencia de s. exa., porque lhe pedi licença para o fazer.

S. exa. que conhece perfeitamente o caminho que o pensamento leva até chegar aos ultimos esconderijos do cerebro, não conhece por igual as partes componentes do cerebro da politica do nosso paiz.

Onde ha, em que partido se encontram principios definidos?

Quem são os progressistas e quem são os conservadores?

Ha trinta annos, pelo menos, a distincção é difficil.

Ha nomes, ha classificações que differençam os chamados partidos, mas os factos não são a base d'essas classificações.

Dizem-se uns os paladinos das doutrinas liberaes e para o provarem apontam para a bandeira onde inscreveram a desvinculação e a desamortisação; respondem os contrarios apontando para a sua onde se lê codigo civil, reformas politicas.

Dizia-se conservador o partido de Fontes Pereira de Mello e comtudo é d'elle o codigo administrativo de 1878.

Chama-se progressista o partido que sempre lhe foi contrario, e o codigo com que no anno passado substituiu o de 1878, apesar de em parte ter caminhado contém disposições que fazem lembrar um regimen que supponho ninguem quer fazer reviver, o regimen obnoxio do codigo de 1842.

Á vista d'este e de outros factos que eu poderia citar, póde porventura dizer-se com precisão quaes são os principios que animam os partidos politicos portuguezes?

Não são pois elles o que os dividem; serão as doutrinas economicas?

Não, eu não o vejo pelo menos traduzido em factos.

Paizes ha em que muitas vezes, durante longos annos, os partidos luctam em volta de um facto da sua vida economica, sem que entre elles haja mais differença do que a diversa solução que preconisam para o problema a resolver.

Na America, por exemplo, n'esse grande paiz, que em tanta cousa póde servir de modelo, durante muitos annos democratas e republicanos, se combateram quasi exclusivamente porque uns queriam conservar o papel moeda e os contrarios queriam abolil-o.

Qreen-backs ou no green-backs eram os lemmas das differentes bandeiras e mais nada. Mas esse pouco representava uma differença essencial sobre um ponto tambem essencial da organisação economica do paiz.

Entre nós podemos fazer igual observação?

Ufana-se o partido regenerador de lhe dever a nação a quasi totalidade dos melhoramentos materiaes; allega o partido progressista que lhe não é contrario e que não pequena parte por elle foi realisada; e a rede de caminhos de ferro sonhada pelo actual ministro das obras publicas vem a feição para provar a asserção.

Nem sequer podem os partidos provar que dissentem sobre cada obra especial; feriram os regeneradores renhidas pugnas combatendo o caminho de ferro de Torres, caíu o partido progressista, e um dos primeiros actos do que lhe succedeu foi contratar o mesmo caminho com os mesmos