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nhecendo que o devia fazer em nome da constituição; desde que se collocou em posição igual áquella em que estava o partido a que eu tenho a honra de pertencer, julguei logo, e julgaram os que militaram commigo no mesmo campo, que em presença das circumstancias que se davam, e das crises que se estavam atravessando, muito conveniente seria esquecer antigos ressentimentos, ou mesmo algum odio, se o tivesse havido (o que não creio, e ao menos pela minha parte posso jurar que o não tinha a pessoa alguma), e em todo o caso pôr para sempre de parte quaesquer rivalidades ou alguma malquerença que houvesse, reconhecendo a necessidade de darmos mutuamente um abraço franco e leal, envidando de parte a parte as nossas forças, que ainda assim todas juntas seriam poucas, para conseguir o triumpho de uma causa commum. Foi este com effeito o principio fundamental que inspirou os homens que formaram a fusão; e desde esse momento ficou dado o abraço, tão sincero e fraternal, que estou intimamente convencido de que nem um só cavalheiro deixou ou deixa de reconhecer que todos cooperaram lealmente para se desempenhar bem o compromisso de honra e patriotismo que haviamos tomado reciprocamente.

Eis-aqui a historia da fusão; d'esse acontecimento que deixou intactas e honradas as tradições de cada partido, sem que alguem tivesse de que se envergonhar ou que apagar de sua bandeira alguma doutrina, nem esconder qualquer mancha no pendão que todos seguíamos.

Por fim de tudo isto, e como resultado ou consequencia d'este grande facto, é que a corôa, em nome da constituição e no exercicio liberrimo da real prerogativa, houve por bem chamar-nos aos seus conselhos; e é por isso que, depois de aceito por todos nós este encargo, em desempenho do nosso dever, e da obrigação que nos impõe a lei fundamental, nos apresentámos já hontem na camara dos senhores deputados, e hoje na dos dignos pares, por não ter sido possivel vir tambem logo aqui, como aliàs era o nosso desejo e vontade decidida (apoiados). Assim, a proposito d'esta declaração, digo, na presença de V. ex.ª e dos dignos pares, que o governo o que tem a pedir a esta camara é que lhes aguarde os seus actos, que espere ver o nosso procedimento, e que nos julgue depois com severidade, se quizer, porque a justiça não ha de faltar nas suas definitivas apreciações e decisões.

O que é certo sobretudo, sr. presidente, é que nós temos os mais sinceros e ardentes desejos de bem merecer o apoio dos representantes do paiz, de governar com a constituição e sempre conforme com as leis do estado (apoiados).

Feitas estas declarações, e deixando a questão politica que o meu illustre amigo e digno par, o sr. Sebastião José ' de Carvalho já taxou de impertinente e causadora até certo ponto do atraso no nosso desenvolvimento economico e administrativo, que de facto se póde quasi dizer que ha muito esta paralisado em consequencia das lutas pessoaes e politicas que se têem agitado dentro e fóra do parlamento, perdendo-se sempre um tempo precioso (apoiados); passarei em rapida resenha algumas observações que foram dirigidas ao governo pelos dignos pares que tomaram a palavra.

Direi primeiro ao meu antigo e honrado amigo, o sr. visconde de Fonte Arcada, que a lei que auctorisou a viagem de Sua Magestade foi approvada sem observação alguma em ambas as casas do parlamento, creio que logo depois apresentada ao poder moderador, e por este sanccionada; e assim que é um facto consummado sobre o qual creio que não ha logar a mais explicações, muito menos por parte da administração actual, que a ella foi absolutamente estranha. Quanto aos meios que possam ser necessarios para essa viagem se effectuar, o que é outra pergunta do digno par, direi a s. ex.ª que a lei a que me referi, e que ha poucos dias passou, não tratou d'isso nem remotamente, pelo que acredito que se não julgou necessario; mas o que tambem posso assegurar a s. ex.ª é que, se porventura ainda se julgasse necessario, o que não espero, o governo, a administração actual recorreria ao parlamento, respeitando sempre e em todo o caso os principios constitucionaes.

Perguntou ainda o mesmo digno par, se eu aceitava o orçamento do estado tal como foi apresentado; mas qual orçamento, pergunto eu? O ultimo que veiu ás côrtes? (O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Esta claro que é esse.); o ultimo orçamento não vigora por isso mesmo que desappareceu desde o momento em que a entidade governo ficou auctorisada a applicar ás despezas correntes toda a receita do thesouro; de maneira que depois d'isto não nos cumpre tomar responsabilidade alguma n'esse orçamento; não ha já logar a discuti-lo. A lei que passou para remediar a falta da discussão do orçamento, auctorisou o governo a arrecadar todos os rendimentos publicos, e fazer a applicação delles em conformidade com as leis; esse preceito ha de ser religiosamente observado, e quando as côrtes se reunirem de novo, que ha de ser proximamente, o governo apresentará ao parlamento as propostas de medidas que julgar necessarias para prover algumas lacunas que porventura existam em consequencia de ser a legislação auctorisada pela lei novissima um pouco mais retardada do que se as cousas tivessem corrido mais regularmente, como é proprio do estado normal.

Da mesma fórma direi, sr. presidente, quê" o governo não póde responder pelas opiniões que se contêem no discurso da corôa, lido ao parlamento quando occupavam as cadeiras de ministros outros cavalheiros que não são os actuaes, assim o digno par que reconhece ser o discurso da corôa um documento essencialmente ministerial, não vendo aqui nenhum dos ministros que então eram, não tem de certo a pretensão de nos exigir que tomemos a responsabilidade de um documento que legal e constitucionalmente é todo do ministerio que se demittiu. Nós outros nada temos com esse documento; não digo se são boas ou más essas opiniões, digo só, que são outros os cavalheiros a quem pertence responder por ellas, e todos são tão dignos e tão honrados, que ainda hoje não declinam a responsabilidade de nenhum de seus actos.

Ouvi depois, sr. presidente, que o meu illustre amigo o digno par o sr. Sebastião José de Carvalho mencionou varias reformas, que segundo a sua opinião nos deviam occupar. Eu confesso ingenuamente que sou o primeiro a acompanhar s. ex.ª nos justos desejos de que a administração actual, e as que se lhe seguirem, se occupem de assumptos de tão grave importancia como são aquelles a que s. ex.ª se referiu, mencionando especialmente o da questão da população, em que compendiou a questão da emigração, das rodas e da hygiene publica, todas sem duvida alguma, questões gravissimas, que se resolvem pelo ministerio do reino, mas cuja solução completa e absoluta, nem por agora, nem creio que ainda muito mais tarde se chegará a obter e conseguir, por isso mesmo que até hoje em parte alguma se tem obtido a solução completa d'essas questões a que o digno par mui judiciosamente alludio. Por exemplo, a questão das rodas, ainda esta sendo muito debatida pelos homens mais illustrados e que mais teem estudado não só em França, mas póde-se dizer por todo o mundo civilisado, uma questão das mais complexas que existem.

A questão da hygiene, essa esta mais conhecida e meditada por ser mais simples, comquanto de summa gravidade; mas a questão da emigração é uma das que tambem affecta profundamente alguns espiritos muito esclarecidos, dando logar a escreverem-se igualmente muitos volumes que têem servido de inspiração, por assim dizer, a muitas leis, mas de que a applicação, assim como o modo variam consideravelmente em relação aos differentes paizes, pelas circumstancias peculiares de cada um d'elles. De maneira que se o digno par falla da emigração pelo modo como se tem feito no nosso paiz, principalmente para o Brazil, se quer fallar dos vexames por que se tem feito muitas vezes passar os colonos, e os abusos que se têem commettido, a que é necessario pôr cobro por meio de disposições legaes bastante repressivas de todos esses abusos e vexames; n'uma palavra, se quer que nós procuremos obter o grande desideratum, de que os subditos portuguezes que tomam tal resolução não soffram vexames o torturas, estou perfeitamente de accordo; mas se s. ex.ª quer ir mais alem, que sê obste por qualquer modo a que o cidadão portuguez disponha de si, usando do direito que sabe que tem de ir para o Brazil ou para outra qualquer parte do mundo, então não posso estar de accordo. (O sr. S. J. de Carvalho: — Apoiado.) Não é pois essa a intenção do digno par, como eu previa; e então limito-me a dizer, que todas estas questões são gravissimas, são o que verdadeiramente se chama, questões do paiz, e por isso mesmo convem sobretudo que das casas do parlamento não sáiam vozes que possam fazer desvairar a publica opinião n'um assumpto que a fere muito de perto.

A este respeito direi apenas que a emigração em geral é mal vista, e eu pela minha parte desejaria que todos os meus concidadãos tivessem antes desejo e interesse (pois que o interesse é o que move em objectos d'esta natureza) de ficar no seu proprio paiz, antes que procurar outro estranho, transpondo-se a remotas praias, expondo-se ás intemperies do clima, a febres, e até ás vezes a epidemias devastadoras, sobretudo para aquelles que não estão habituados, por isso que o seu paiz é outro, ás temperaturas muito elevadas; estimaria eu muito que ninguem tivesse mesmo o mais pequeno desejo ou idéa de se expor por similhante fórma, pois que isso seria sobretudo uma prova real de que o estado economico e civil do meu paiz era satisfactorio. Seria isso a prova mais real e completa de que não havia nada a desejar sob esses dois aspectos, por isso que os seus habitantes não tinham interesse algum que os levasse a terras remotas e longiqnas, afastando-se da patria e da familia em busca do pão que não podem ganhar no seu paiz. Mas não acontece assim. E ha ainda outro incentivo que todos nós conhecemos, e que tem uma grande força para a emigração. Quem viaja pelas provincias acha coalhada a provincia do Minho principalmente, de bellissimas casas que n'estes ultimos tempos se têem construido, e que pertencem na maior parte a subditos portuguezes que emigraram para o Brazil, d'onde voltaram ricos.

Este incentivo que se apresenta aos olhos de todos é uma j das causas mais efficientes da nossa emigração para o Brasil. Naquella provincia encontra se a cada passo uma casa bem disposta, confortando, com bastante aceio e de grandeza comparativa; e quando se pergunta a quem pertence, a resposta é sempre a um brazileiro. O brazileiro é um homem que, quando esta no Brazil, se chama portuguez, e quando esta em Portugal, se chama brazileiro, e que a final é um portuguez emigrado que voltou ao seu paiz, trazido pelo santo amor da terra natal e da familia, e vem n'elle gastar o capital que adquiriu á custa do seu trabalho, o que é muito honroso, e não póde senão chamar-lhe os elogios de todos.

Mas que devemos fazer? Diz se que encaminhar a emigração, promover, empregar todas as diligencias, para facilitar os meios, a fim de que os emigrados vão de preferencia para as nossas colonias, em logar de irem para o Brasil. Ora, eu direi ao digno par, ainda que o sabe melhor do que eu, mas como vem a proposito não posso deixar de tocar n'este ponto; direi que não creio senão na emigração espontanea; não creio em nenhum meio inventado pelos homens de estado, nem em legislação ou regulamentos, por mais bem combinados que sejam para fazer que o homem, que tem em vista ir para certo ponto, onde julga que achará interesses, vá para outro ponto onde não sabe se os terá, e julga até que não poderá te-los. Posso citar em abono da minha opinião a historia das principaes colonias do mundo.

Sabem todos, por exemplo, que a França, que dispõe de recursos colossaes, tem procurado conservar e desenvolver a colonia da Argélia, principalmente como um viveiro para o seu exercito, onde se torna aguerrido e prompto para sustentar em logar mais distincto a honra do pavilhão francez. O governo da França tem empregado os meios ao seu alcance, e gasto milhões, centenares de milhões com aquella colonia, a fim de lhe dar o maior desenvolvimento; tem-se porém visto um facto que não póde passar desapercebido aos homens do governo.

Todas as colonias estabelecidas na Argélia, que têem sido formadas e desenvolvidas pelos meios artificiaes do governo, estão rachiticas ou pouco desenvolvidas em relação áquellas colonias formadas pela emigração espontanea, e por ella desenvolvidas. Todos conhecem as colonias mahonenses, assim chamadas, porque são principalmente formadas pela emigração dos habitantes das Baleares e Mahon. Estas colonias são as mais florescentes d'aquelle paiz. Superabundando a população das Baleares, para ali emigra espontaneamente uma parte d'ella, e leva comsigo os seus instrumentos, amor e habitos do trabalho e a sua industria, que emprega com toda a energia e actividade que distinguem aquelles insulares. O governo tem apenas prestado a essas colonias a feitura de alguns kilometros de estrada e a abertura de algumas fontes; o mais é tudo devido ao trabalho individual e á iniciativa propria, e sem auxilio quasi nenhum aquellas colonias têem prosperado bastante, emquanto as do governo, que tantos sacrificios lhe hão custado, jazem em estado mais debil e precario. Isto prova o que acabei de dizer, isto é, que a emigração espontanea, a que não é artificial e organisada pelos meios engenhosos, é a mais efficaz. Não fallo já nas colonias militares da Austria na Transylvania e na illyria, que têem uma rasão especial, pois que isso é uma questão á parte; não fallo tambem nas colonias penitenciarias, em que se podem classificar algumas colonias portuguezas dos primeiros seculos, mesmo a Austrália nos ultimos tempos; não fallo d'estas colonias que são de uma natureza especial, para as quaes o colono vae pela acção do governo em nome de outros principios e de outras rasões, que não as colonias povoadoras. Fallo d'estas que são para cultivar e desenvolver as riquezas de um paiz e para augmentar a sua producção.

Peço perdão á camara de ter entrado n'estas explicações, e de fazer esta divagação, a que fui levado pelas observações illustradas e benevolas do digno par.

Para não cansar a assembléa com um assumpto estranho ao objecto de que se tratava, depois de termos feito a nossa apresentação á camara, repetirei o que o meu illustrado collega, o sr. presidente do conselho, ha pouco disse. O governo deseja merecer o apoio das duas casas do parlamento, e ha de empenhar constantemente todos os meios ao seu alcance, e empregar toda a sua energia e dedicação até onde lhe permittam as suas forças para bem servir o seu paiz, e merecer a confiança das duas casas do parlamento.

O sr. Marquez de Sabugosa: — Não tomarei muito tempo á camara no que tenho a dizer, pois tinha tenção de faltar, mas fui levado a isso para levantar uma injuria que o digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, proferiu...

O sr. S. J. de Carvalho: — Pede que se tome nota do que acaba de dizer o digno par, ao qual responderá opportunamente.

O sr. Marquez de Sabugosa: — Disse eu que tinha pedido a palavra para levantar as palavras que me pareceram injuriosas, proferidas pelo digno par o sr. Sebastião José de Carvalho, que se não cança de as repetir, apesar de terem passado já quatro mezes, contra o governo de que eu fiz parte. Parece-me que dizer que o governo nunca desceu tão baixo como n'essa occasião, é proferir uma injuria contra a administração daquelle tempo. È por isso e para levanta-las que pedi a palavra, e direi que, pelo contrario, me parece que o paiz e o parlamento não se lembram de ver descer tão baixo como n'essa occasião talentos aliàs conhecidos na tribuna portugueza. Eu não quero tomar tempo á camara com isto, nem procurar renovar a questão politica, e por isso não direi mais nada a este respeito.

Aproveito a occasião de estar de pé para fazer uma pergunta ao governo, ao qual declaro desde já que apoio, porque tenho confiança que a administração actual ha de realisar os melhoramentos de que carecemos, se não todos, porque seria utopia esperar que possa um governo fazer tudo quanto é preciso fazer, mas aquillo que for mais instante, e que o estado da fazenda publica permitta.

A questão dos expostos é uma questão importantissima, e sobre a qual o sr. ministro da fazenda disse que ainda se não proferiu a ultima palavra; comtudo é urgente tratar de a estudar no paiz, para a pôr em termos regulares. O sr. ministro da fazenda, que já foi ministro do reino, sabe que no districto de Lisboa se acha este serviço organisado fóra da lei.

Ha outra pergunta que eu desejava fazer ao sr. ministro do reino, que sinto não ver agora no seu logar, e não sei se algum dos seus collegas estará habilitado para me responder...

Tendo dito hontem o governo, na outra casa do parlamento, que tencionava aconselhar ao chefe do estado o adiamento, eu desejava saber se haveria tempo, ou tinha o governo tenção de propor alguma alteração ao decreto com força de lei de 1 de dezembro de 1861, que torna excepcional a eleição municipal do concelho de Lisboa, que é feita por bairros, e não em todo o concelho, como se pratica no resto do paiz. Eu entendo, sr. presidente, que este projecto é muito urgente, por isso que este anno é que se tem de proceder á eleição da camara municipal de Lisboa, e portanto parecia-me muito mais conveniente que essa eleição fosse feita segundo a lei geral, e não com aquella excepção (apoiados).