DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 718
algum tempo; mas n'este caso deu-se inteiramente o contrario. O parecer do procurador geral foi contrario.
(Leu.}
Declaro que professo o maior respetio por esta sublime prerogativa da corôa; mas eu quero tornar o sr. ministro da justiça responsavel por este facto que reputo altamente prejudicial á disciplina militar.
Sinto não ver presente o sr. ministro da guerra, pois desejava recommendar a s. exa. que não deixasse a disciplina do exercito á disposição do qualquer secretario dos seus collegas, por mais respeitavel que elle fosse.
A consulta do procurador geral da corôa diz:
(Leu.}
Peço ao sr. ministro da justiça que me diga se s. exa. o demittiu depois da confirmação da sentença que o condemnou.
O sr. Ministro da Justiça (Adriano Machado): - Os casos que o digno par citou não têem nada que ver com o de que se trata, que se rege por legislação especial.
Do cidadão que foi demittido não me lembra agora o crime pelo qual foi pronunciado; mas sei que era um crime grave em relação ás funcções que exercia, e não podia continuar a exercel-as sem quebra da fé publica inherente ao seu cargo.
O outro que eu suspendi era conservador do registro predial e estava fazendo as vezes de delegado do procurador regio. Não era decoroso para a justiça que elle estivesse servindo de ministerio publico emquanto estava sujeito a um processo criminal.
O decreto de 19 de setembro de 1878 é especial para a secretaria da justiça a que serve de regulamento.
Esse decreto diz:
(Leu.}
Ora, o crime de que foi accusado o correio Pina não é nenhum d'aquelles em que da pronuncia resulte a suspensão, nem é d'aquelles em que a condenmação produza necessariamente a demissão.
Por isso não o suspendi dos vencimentos emquanto não transitou em julgado a sentença que o condemnou, nem o demitti depois d'esta sentença.
Verdadeiramente a sentença só passou em julgado dez dias depois do ultimo accordão do supremo tribunal de justiça militar, e o correio foi abonado dos seus vencimentos só até a data d'este accordão, e por consequencia antes de ser caso julgado a sua condemnação.
Demais, eu não tive participação official nem da sentença nem dos accordãos. Fiz obra pelas noticias dos periodicos, e podia muito bem ter esperado pelas communicações officiaes.
Portanto, a respeito dos vencimentos que lhe abonei, não póde notar-se offensa alguma de lei.
O digno par não citou a data do accordão do supremo tribunal de justiça militar. Se a citasse, e a cotejasse com a data em que cessaram os vencimentos do correio Pina, teria reconhecido a falta de fundamento para as suas arguições.
Quanto a não o ter demittido, já mostrei á face do regulamento da secretaria da justiça que eu não era, obrigado a demittil-o.
Devo suppor que a condemnação foi justa. Ha, é verdade, quem duvide da competencia do fôro militar para julgar o crime de que se trata. Eu não duvido. Acato as sentenças dos tribunaes, que são proferidas como os juizes em sua consciencia entendem que é justo.
Mas se a condemnação foi justa, se a pena foi medida segundo o delicto, não devia eu de meu motu proprio aggraval-a, acrescentando-lhe a demissão.
Aprecio a disciplina. O exercito não póde viver sem ella. Mas o tribunal competente para vingar as faltas da disciplina militar proferiu o seu juizo. Eu não tinha nada que acrescentar.
Não é só o exercito o que precisa de disciplina. Eu tambem a quero na minha secretaria. E não era nem boa justiça nem boa disciplina castigar com a demissão um empregado que na sua humildade era exemplar no desempenho de todas as obrigações do cargo que exercia n'aquella secretaria.
Não devia, pois, demittil-o, nem o demitti. A pena de deportação militar, que lhe impoz o tribunal, não produz incapacidade alguma nem perda de temoo do serviço. Portanto não me obrigava a aggravar com a demissão a pena que lhe foi imposta pelo tribunal que o julgou.
O digno par, o sr. Camara Leme, era o presidente do conselho de guerra. O processo do correio Pina foi submetido ao julgamento d'aquelle conselho. Se s. exa. entendeu que a pena era pequena, podia ter-lh'a augmentado.
Mas tendo-se contentado como juiz com a pena que lhe foi imposta, como vem agora para a camara dos dignos pares fazer de ministerio publico, accusar o correio e exigir-me que lhe imponha uma nova pena?
Diz o digno par que protegi por todos os modos aquelle infeliz. Quem ouvisse isto, havia de cuidar que eu, segundo o costume portuguez de pedir tudo, pedi ao digno par que o julgasse com benevolencia. Tenho com s. exa. relações antigas; mas s. exa. sabe perfeitamente que não lhe pedi nada.
Sou amigo do sr. Barros e Sá e do sr. general Palmeirim, e não lhes pedi nada (Apoiados.} nem a qualquer outro juiz do supremo tribunal de justiça militar, (Apoiados.} nem pratiquei acto algum para desviar a acção da justiça.
A commutação da pena não partiu de mim. Eu não disse nada a este respeito nem no conselho de ministros nem no conselho d'estado.
Já o digno par vê que a sua supposição de que protegi o correio Pina por todos os modos possiveis é completamente infundada.
O sr. camara Leme: - Tenho o desgosto de declarar ao sr. ministro da justiça que as suas explicações não me satisfizeram.
Creio que um regulamento de secretaria não póde alterar as leis geraes do estado.
Esse regulamento permitte pois que uma praça do exercito vá á frente de um corpo e tenha o arrojo de dar com o chicote no commandante de um pelotão; e não contente com isso, voltar e dizer que o que se devia era arrancar as divisas ao militar affrontado e dar-lhe com ellas na cara?
É esta a conclusão que posso tirar das palavras do sr. ministro da justiça, quando vem aqui invocar o regulamento da sua secretaria para conservar o logar ao réu de que se trata, a fim de que elle o venha exercer quando acabar de cumprir a sentença que o tribunal militar lhe applicou.
Pergunto á camara: É possivel admittir similhante doutrina? Póde um regulamento, repito, alterar o espirito das leis militares?
Oh! sr. presidente, precedente terrivel é este, que póde ser altamente nocivo á disciplina militar, porque a offende essencialmente.
Mas eu peço que me tirem d'este embaraço; que o governo ou algum dos illustres membros d'esta camara me diga, se a legislação do paiz póde ser alterada por um regulamento; e se póde ficar assim sanccionado este precedente que ataca os principios da justiça e da moralidade?
O sr. Ministro da Justiça (Adriano Machado): - O decreto de 1878, que organisou a secretaria dos negocios ecclesiasticos e de justiça, não é um simples acto do poder executivo. Foi feito em virtude de auctorisação concedida ao governo por uma lei. Este decreto é a lei que regula o serviço n'aquella secretaria, e eu tenho-o cumprido como é do meu dever.
Não demitti o correio, porque a lei não me obrigava a isso, e o bom serviço prestado por elle n'aquella secreta-