DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 719
ria, não consentia que eu o demittisse por uma resolução minha.
O não demittir não é premiar. Demittil-o seria aggravar a pena que o digno par, como juiz, teve por justa e proporcionada ao delicto.
O correio Pina, como praça da reserva, foi julgado no fôro militar. O tribunal militar impoz-lhe a pena que entendeu justa. Esta pena, que foi a de deportação militar, não produz, como já observei, incapacidade alguma quer civil quer militar, nem perda de tempo de serviço. Não tem por effeito a demissão.
O tribunal entendeu que a pena em que o condemnou era a que correspondia ao delicto. Se eu lhe acrescentasse outra pena por meu motu-proprio, teria excedido os limites da justiça com que foi julgado pelos juizes competentes.
Ha crimes que inhabilitam legal ou moralmente os seus auctores para o exercicio de todos os cargos ou de certas funcções publicas. As vezes basta a suspeita, não é precisa a prova.
O delicto de que se trata não pertence a esta categoria. Portanto não era motivo para que o correio Pina fosse demittido de um cargo que sempre desempenhou com honra e zêlo.
Está suspenso. Na fórma do regulamento da secretaria da justiça, a suspensão é uma consequencia legal da sentença que o condemnou.
Nomeei outro para exercer provisoriamente o seu logar. O digno par não mostrou, nem póde mostrar, que eu, procedendo assim, tivesse saido para fóra da lei.
O sr. Visconde de Bivar: - Faz algumas considerações ácerca do objecto em discussão.
(O discurso do orador será publicado quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro da Justiça (Adriano Machado): - As verbas a que o sr. visconde de Bivar se referiu, que são, se bem o entendi, as rações aos guardas, e os guardas extraordinarios das cadeias de Lisboa e Porto, figuram; este anno pela primeira vez no orçamento. Mas a despeza não é nova: tem-se feito ha muitos annos, e saía da verba votada para o sustento dos presos e policia das cadeias.
Os guardas ordinarios tinham e têem um vencimento muito pequeno. Alguns não recebem mais de 160 réis, outros 165 réis, outros 200 réis?
Era impossivel ter guardas por este preço.
Os nossos criados recebem uma soldada igual ou maior, e ainda têem o sustento alem da soldada.
Aquelle emprego é arriscado, e bastava ver-se no orçamento aquelle vencimento, para se conhecer que não era possivel encontrar por tão pouco os guardas para as cadeias de Lisboa e Porto.
Na verdade, não se lhes dava só isso; abonavam-se-lhes rações, que saiam da verba destinada ao sustento dos presos.
Tambem se vê, pelo pequeno numero de guardas que figuram no orçamento, que não era possivel fazer-se com tão pequeno pessoal o serviço das cadeias. Empregavam-se, pois, guardas extraordinarios.
A verba descripta no orçamento d'este anno não é maior da que realmente se despendeu no anno passado. Mas pareceu-me que a de via descrever em separado, para que a nação podesse ver mais distinctamente no que se despende o seu dinheiro.
Quanto a continuar no orçamento d'este anno a verba para o sustento dos presos, é certo que pelo novo codigo administrativo esta despeza é obrigatoria dos districtos.
Mandei perguntar a todos os governadores civis, quanto haviam as juntas geraes votado para esta despeza. Algumas votaram as quantias necessarias. Outros governadores civis, porém, responderam que uma portaria do sr. Sampaio declarára que n'esta parte o codigo administrativo estava dependente d'um regulamento, e que por isso, em quanto este regulamento se não publicava, as juntas geraes não tinham votado verba alguma para este fim.
Pareceu-me que não devia exigir das juntas geraes, que tinham executado o codigo, quantia alguma, emquanto o mesmo codigo não fosse applicado a todos os districtos. Entendo que hoje esta despeza é districtal, e que os districtos devem restituir ao thesouro o que elle está dispendendo com o sustento dos presos. Mas no entretanto é necessario que o governo esteja habilitado para esta despeza impreterivel, e tal é a rasão por que ella figura n'este orçamento, como figurava nos; anteriores. A verba d'este anno é maior, mas é mais exacta, porque nos annos passados excedia-se sempre o orçamento.
No ponto de ser a despeza paga pelo estado ou pelos districtos, ha uma simples questão de deslocação de despeza; porque, quem paga, é sempre o contribuinte.
O sr. Carlos Bento: - Sr. presidente, pedi a palavra para chamar a attenção do sr. ministro da justiça sobre um assumpto que reputo de alta importancia.
Ninguem mais do que eu faz justiça á independencia da magistratura portugueza, todavia creio que o illustre ministro não terá deixado de reflectir que a morosidade na administração dá justiça produz grandes embaraços e difficuldades.
Esta morosidade não é culpa dos magistrados; entretanto, ninguem póde negar que, entre nós, a acção do poder judicial demora-se demasiadamente. Ha crimes ordinarios que são julgados depois de uma grande demora, emquanto que na Inglaterra, onde não ha ministerio publico, o julgamento é rapido.
Ha certas formalidades no andamento dos processos, que são garantias, mas se ellas passam uns certos limites, tornara-se em pesados encargos.
Chamo, pois, a attenção do sr. ministro da justiça para este ponto, para que elle auxiliado por magistrados tão zelosos e diligentes, como são os do nosso paiz, trate de o resolver de modo que a acção da justiça não seja morosa.
O sr. camara Leme: - O illustre ministro da justiça invocou ha pouco uma carta de lei, pela qual pretendeu justificar o seu procedimento em relação ao correio de que tenho fallado; mas eu vou ler á camara o que diz essa carta de lei.
(Leu.)
S. exa. leu o artigo 37.° do regulamento do ministerio dá justiça, mas esqueceu-se de ler o artigo 38.°, onde me parece que se acautella a hypothese a que ainda agora me referi.
(Leu.)
Pelo que si exa. disse, creio que está na intenção de não demittir o correio.
Ora, ou pergunto se o crime, por que foi condemnada esta praça licenciada do exercito, é ou não um dos que se mencionam no artigo 38.°
(Leu.)
É ou não de alta gravidade o crime que commetteu aquella praça do exercito? Tão grave se considerou que, apesar da benevolencia caracteristica dos portuguezes, foi o réu condemnado a cinco annos de deportação.
Pergunto a v. exa. se um crime, que importa tal sentença, tem pouca gravidade?
Eu, que vejo presente o sr. Barros e Sá, tão entendido n'esta materia, peço a s. exa., relator do tribunal superior de guerra e marinha, peço que me diga se se póde acceitar a theoria defendida pelo. sr. ministro, e estabelecer similhante precedente?
Eu tinha fundamento para mandar para a mesa uma moção dizendo que "a camara, não satisfeita com as explicações do sr. ministro da justiça, passava á ordem do dia"; mas não o faço.
Não é meu desejo aggravar á situação do individuo a quem me refiro; porém, não posso faltar ao dever que me incumbe de pugnar pela disciplina do exercito.