DIARIO CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 547
E não comprehendo como é que o sr. ministro da justiça e o sr. ministro das obras publicas, que são dois distinctos e talentosos jurisconsultos, não aconselharam ao poder moderador que não sanccionasse aquelle decreto.
Pois não previam s. exas. os embaraços que aquella lei ia promover?!
O que é certo, sr. presidente, é que a reacção religiosa, o ultramontanismo vae fazendo progressos no paiz, e o governo deve precaver-se contra esse facto.
Entendo, portanto, que o governo deve explicar claramente se reconhece ou não as irmãs hospitaleiras como constituidas legalmente, estando ellas sujeitas, como estão, a um prelado estrangeiro.
Se não reconhece, diga-o, porque eis- aqui uma errata que eu approvava de bom grado.
E com isto termino.
(O digno par não reviu este discurso.)
O sr. Barros e Sá: — Notou que o sr. ministro da justiça tinha d’esta. vez, tratado a questão com muita mais prudencia do que tinha usado na occasião em que n’uma das anteriores sessões lhe tinha respondido sobre este mesmo assumpto, e por isso tinha, elle orador, de dar ás suas considerações uma direcção differente d’aquella: que tencionava dar-lhes. Em seguida, conformando-se com as respostas do sr. ministro a algumas das perguntas feitas pelo digno par, sr. Ferrer, disse que não podia, comtudo, absolvel-o completamente, pois entendia que a continuação do sr. arcebispo de Braga no exercicio das suas funccões, depois de acceita pelo governo e pela santa sé, a pedido do governo, a renuncia apresentada pelo digno prelado, era resultante dá imposição de uma condição pela curia ao governo no acto da confirmação da renuncia que o governo pedia, certamente para lhe ser dada sem condições. A este proposito accusou o sr. ministro dá justiça de contradictorio.
Citou a data recente de uma sessão da camara dos senhores deputados, em que s. exa. havia declarado, com relação a este mesmo assumpto, a revogação da nomeação. Que, sendo aquillo assim, o sr. arcebispo de Braga desde a sua renuncia tinha como revogada a sua nomeação, e, sé pela nomeação devidamente confirmada foi que ao mesmo sr. arcebispo competiu a sua jurisdicção, era evidente que antes dá nomeação não a tinha, e por consequencia, estando elle pela sua renuncia justamente, segundo ás proprias palavras do sr. ministro, como se nunca fôra nomeado, é claro que não tem a jurisdicção, e se a não tem, como póde exercel-a, e como póde é sr. ministro consentir que a exerça?
Julgava, pois, flagrante a contradicção entre as palavras do sr. ministro e os seus actos.
Referiu-se á tendencia que desde antigos tempos a curia revelou sempre para ir restringindo ás prerogativas dá coroa, citando factos de differentes governos, inclusivamente do marquez de Pombal, que provavam o cuidado que á todos mereceram sempre aquellas prerogativas, e a energia com que souberam sempre conter em respeito essas pretensões da curia.
Lamentava que o sr. ministro não tivesse nesta questão correspondido aquellas honrosas tradições.
(O discurso do digno par será publicado quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro da Justiça: — Peço a palavra.
O sr. Presidente: — Eu vou dar a palavra ao sr. ministro; peço, porém, á camara que repare que já deram duas horas e meia ha muito tempo, e que considere os inconvenientes que podem resultar de alterarmos a divisão do tempo em que hontem tinhamos assentado para nós occuparmos da nossa ordem do dia.
O. sr. Ministro da Justiça: — N’esse caso eu cedo da palavra.
O sr. Presidente: — Já passou ã hora em que a camara devia continuar na discussão do projecto relativo ao porto de Leixões. (Apoiados.)
Continúa, portanto, á discussão do projecto que ficou hontem pendente.
Tem a palavra o sr. conde de Castro.
O sr. Ferrer: — Sr. presidente, eu peco a v. exa. que tenha á bondade de me informar se o sr. ministro da justiça cedeu dá palavra.
O sr. Presidente: — Sim, senhor.
O sr. Ferrer: — Peço aos srs. tachygraphos que tomem nota de que é sr. ministro da justiça cedeu da palavra.
Isto é novo nos annaes parlamentares! E um caso inaudito! É necessario que se saiba que o sr. ministro da justiça se não defendeu depois de haver sido aggredido tão violentamente, como é foi, pelo digno par o sr. Barros e Sá.
Ha um ministro que não responde a accusações tão graves, e que continua a estar assentado n’aquelle logar!!...
(S. exa. não reviu.)
O sr. Ministro dá Justiça: — Peço a palavra, sr. presidente.
O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. ministro da justiça.
O sr. Ministro dai Justiça: — Disse que não fôra o receio de responder pelos seus actos, que o levara a ceder dá palavra, mas unicamente a vontade de não contrariar o manifesto desejo da camara e as indicações da presidencia. Recebendo n’este momento muitos apoiados, continuou que não fora nem podia ter sido1 receio de discutir com o digno par o sr. Ferrer, de cujas perguntas nem uma deixara sem resposta clara e precisa, nem tão pouco com o sr. Barros e Sá, seu digno antecessor, com quem, pelo contrario, tinha até grande prazer em discutir.
Respondendo a todas as perguntas do digno par, o sr. Ferrer, e reforçando as declarações das suas respostas com a leitura das respectivas notas trocadas com a Santa Sé, julgava ter fornecido á camara as provas irrecusaveis de que em toda esta questão o governo havia cumprido o seu dever guardando escrupulosamente as prerogativas da corôa.
Que com effeito o sr. Barros e Sá menos tratara de provar o contrario do que de provar uma contradição d’elle sr. ministro entre o facto de se conformar com os termos em que a Santa Sé confirmára a renuncia do sr. arcebispo de Braga, na parte em que se estabelecia a condição de que o mesmo arcebispo continuaria a governar a diocese até á posse do seu successor, e uma declaração por elle sr. ministro feita n’uma sessão da camara dos senhores deputados, de que a renuncia implicava a revogação do decreto..
Que o sr. Barros e Sá concentrara n’este ponto a força dá sua accusação, argumentando que, se a renuncia implicava a revogação da nomeação, o sr. arcebispo, desde que renunciou, era como se não tivesse sido nomeado, e se era como se não tivesse sido nomeado, o governo não podia consentir que elle, por imposição da Santa Sé, continuasse a exercer funcções que já não tinha.
É certo que dissera aquellas palavras que agora repetia e confirmava.; a renuncia implicava a revogação da nomeação.
Simplesmente o" digno par fazia consistir a renuncia no unico facto da sua apresentação para, por esse unico facto, lhe attribuir todos os seus effeitos, elle orador fazia consistir a renuncia não sómente no facto da sua apresentação pelo renunciante, mas tambem no facto da sua acceitação pelo poder temporal e ainda no facto da sua confirmação pela imanta Sé, e só então se dava completa a renuncia e só então ella implicava a revogação da nomeação.
A Santa Sé, no acto da confirmação da renuncia, era tão absolutamente livre como o governo portuguez no exercicio das prerogativas da corôa portuguesa. No uso do seu